Bastou que o secretário de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, Regis Dudena, dissesse que um esclarecimento em relação ao sócio brasileiro das operadoras de apostas que desejam se instalar no País sairia em instantes, para que quase 300 pessoas sacassem seus telefones do bolso para entrar no site da secretaria. “Pena que celular não tem F5, né?”, brincou Dudena, referindo-se à função de computadores que atualiza automaticamente uma página da internet. A plateia no evento, que tentava decifrar a regulamentação das apostas, caiu na gargalhada. Foi um alívio na tensão de uma corrida contra o tempo. No caso, o esclarecimento a ser publicado era se o sócio local precisa ser pessoa física natural do Brasil, se pode ser uma empresa constituída no País ou ambos – e é apenas uma entre as muitas dúvidas que tem vivido a área.
Mais do que ser pujante, o mercado de bets pretende regularizar e deixar dentro do País apostas que movimentam R$ 150 bilhões anuais, sendo que muito desse dinheiro hoje passa pelo exterior. Com a regulamentação do setor, será criado um novo mercado formal, que tem atraído a atenção dos maiores competidores do mercado financeiro.
No evento que aconteceu hoje, 06, no escritório Pinheiro Neto, em São Paulo, havia grandes bancos estrangeiros, bancos digitais, fornecedoras de meios de pagamento, muitas companhias de bets, certificadoras, e representantes de entidades públicas como Banco Central e Ministério da Fazenda. Transmitido em tempo real com tradução simultânea, também contava com plateias de outros países interessadas no tema.
Órgão foi criado há três meses
Criada há pouco mais de três meses, a Secretaria de Prêmios e Apostas (cujo acrônimo SPA, por conta do ambiente “tranquilo”, também levou a plateia a dar risada) corre contra o tempo para criar as regras e tirar o atraso das discussões parlamentares que começaram em 2018. Com a publicação da primeira fase das 11 regulamentações infralegais, no fim do mês passado, começou a correr o prazo que concederá a prestação do serviço público de apostas – a chamada lotérica de aposta fixa, que incluem também as online – a concessionários.
Nessa primeira fase, foram apresentadas regras que habilitam laboratórios capazes de atestar tecnicamente a capacidade dos operadores das apostas. “Já temos os quatro maiores laboratórios do mundo habilitados no País”, disse Dudena. Também foram estabelecidas regras para meios de pagamento (como requisitos obrigatórios e formas de fluxos de pagamento), sistemas e plataformas, que deram o início ao processo de implantação do sistema.
Na fase dois, serão apresentadas portarias referentes à lavagem de dinheiro e outros delitos, bem como direitos e obrigações dos participantes deste mercado. Na terceira, serão regulados jogos online, fiscalização e ações sancionadoras. Na última, serão determinadas regras para jogos responsáveis e as destinações sociais sobre os 12% dos recursos que circulam pelo sistema e serão recolhidos compulsoriamente. A edição da última portaria está prevista para o fim de julho.
Para operar em 2025, pedido deve ser feito até agosto
Apesar de os interessados nessa prestação de serviços poderem se inscrever a qualquer tempo para a exploração dos serviços de apostas no Ministério da Fazenda, os que quiserem começar 2025 em operação têm até o dia 20 de agosto para pedir autorização. A SPA revisará a ampla lista de documentos, que inclui o protocolo de que a operadora está sendo analisada por um laboratório, bem como quem são os controladores, a origem e o destino dos recursos movimentados.
Os aprovados serão notificados até 18 de novembro, sendo que o pagamento da taxa de outorga, de R$ 30 milhões, deve ser feito até 18 de dezembro. Em 31 de dezembro, as autorizações serão concedidas e os operadores de apostas começarão a prestar serviços no País. Segundo Daniela Olímpio, subsecretária de Autorização da SPA, houve manifestação de interesse de 136 pessoas jurídicas no processo regulatório. O Sistema de Gestão de Apostas (Sigap), plataforma do Ministério da Fazenda, tem apenas um inscrito, a Kaizen Gaming Brasil.
Segundo Dudena, foi criado um grupo de trabalho com o Ministério da Saúde para dar respostas à sociedade com relação à saúde mental e financeira dos apostadores. Entre outras iniciativas de controle, os apostadores terão de se cadastrar por biometria e o dinheiro das apostas sairá de contas em que forem titulares, apenas em transações eletrônicas.
Pagamento só por instituições autorizadas pelo BC
Em relação à segurança do sistema para evitar lavagem de dinheiro, a SPA também trabalhou em conjunto com o Banco Central para estabelecer regras de movimento e fiscalização de fluxo financeiro. No caso, serão apenas instituições financeiras e de pagamento autorizadas a funcionar pelo BC.
“Precisamos ter pleno controle do fluxo financeiro, de onde saiu e para onde migrou”, diz ele. “O modelo foi pensado para conseguir total visibilidade no ‘siga o dinheiro’”. Segundo Dudena, a perspectiva de aumento dos fornecedores de serviços financeiros ou a entrada de criptoativos não acontecerá no curto prazo. “Pelo menos nos próximos três anos, precisaremos testar o sistema, identificar eventuais falhas e corrigi-las”, afirma.
Na área de segurança financeira, as casas de apostas terão de ter três contas bancárias: uma transacional (onde ficará depositado o dinheiro dos apostadores), uma conta proprietária (com os recursos dos operadores de apostas) e uma conta liquidez (com R$ 5 milhões disponíveis para casos em que a banca tenha perdas acentuadas). Também foram discutidos pontos da tributação em diferentes frentes, que devem ajudar a melhorar a situação fiscal do País apenas a partir de 2026.
Em tempo: os sócios brasileiros das empresas de apostas, que terão de ter uma fatia de pelo menos 20% da concessionária, podem ser tanto pessoas naturais brasileiras, quanto pessoas jurídicas brasileiras, constituída sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Este texto foi publicado no Broadcast no dia 06/06/24, às 15h32
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