Credit Suisse: como memes abalaram um dos bancos mais antigos e tradicionais da Suíça


Problemas de longa data do Credit Suisse chamaram atenção de investidores amadores cujos posts levaram o banco a perdas

Por The New York Times
Atualização:

“O Credit Suisse está provavelmente quebrando.” Jim Lewis, que tuíta frequentemente sob a alcunha Wall Street Silver, fez essa afirmação para seus mais de 300 mil seguidores em 1.º de outubro, um sábado. “Os mercados estão dizendo que ele está insolvente e provavelmente quebrado. Será que estamos próximos de um momento como o de 2008?”

Lewis era um entre centenas de indivíduos – muitos deles investidores amadores – que vinham especulando a respeito do destino do banco suíço Credit Suisse. A instituição passava por uma reestruturação e tinha se tornado alvo fácil após décadas de escândalos, tentativas fracassadas de reformas e reveses administrativos.

Ações do Credit Suisse perderam 6% em um dia após os memes Foto: Reuters
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Parece não ter havido nenhum motivo imediato para o tuíte de Lewis naquele sábado, a não ser um memorando que Ulrich Körner, o diretor executivo do Credit Suisse, havia mandado para os funcionários no dia anterior, garantindo-lhes que o banco estava em boa condição financeira.

Mas o tuíte, que recebeu mais de 11 mil curtidas e foi retuitado mais de 3 mil vezes, foi um dos muitos posts que ajudaram a incendiar fóruns em redes sociais como Twitter e Reddit. O rumor de que o Credit Suisse estava em apuros ricocheteou pelo mundo inteiro, deixando perplexos os executivos do banco, forçando-os a telefonar para acionistas, parceiros comerciais e analistas para tranquilizá-los, garantindo que tudo ia bem, antes da reabertura dos mercados na segunda-feira.

Por meio de mensagens privadas no Twitter, Lewis disse à reportagem que tudo que tinha consultado antes do seu tuíte tinha sido “o preço baixo das ações (do Credit Suisse) e memes no Reddit”.

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Uma instituição histórica viu seus papéis transformados em ações meme.

No mesmo dia que Lewis tuitou que o banco poderia quebrar, Hunter Kikut postou: “Alta probabilidade do Credit Suisse falir. Venderei minhas posições na segunda-feira”.

Kikut, de 22 anos e morador de Charlotte, na Carolina do Norte, afirmou não se lembrar de ter visto o tuíte de Lewis, mas que, em vez disso, um post da Unusual Whales – que se classifica como um serviço de corretagem que “empodera o pequeno investidor” – chamou sua atenção. “Foi por causa do Twitter que fiquei sabendo disso”, afirmou Kikut em entrevista. “Era fim de semana, a coisa simplesmente explodiu. E comecei a fuçar.”

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Medo de investidores

Após os mercados abrirem, na segunda-feira, 3 de outubro, Kikut começou a vender a descoberto ações do Credit Suisse – ou apostar que o valor das ações do banco cairiam. Naquela manhã, o preço das ações do Credit Suisse despencou quase 6%, retirando cerca de US$ 600 milhões de sua capitalização de mercado e baixando temporariamente o valor de uma ação cujo preço já havia caído mais que a metade desde o início do ano. Conforme se espalhou o medo entre investidores profissionais de que algo poderia estar acontecendo, o custo para segurar a dívida do Credit Suisse contra calote foi às alturas.

Não era a primeira vez que investidores individuais, agrupando-se em redes sociais, haviam deslocado o preço de uma ação tão significativamente. No ano passado, eles agiram de forma concertada para aumentar o valor das ações da GameStop, uma rede de lojas de videogames, determinados a passar a perna em fundos de hedge que haviam apostado que as ações da empresa cairiam.

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Mas, desde então, o que começou como um esforço espontâneo para derrubar Wall Street se tornou uma presença comum no mercado. Milhões de investidores amadores entraram no jogo da corretagem de ações, incluindo com uso de estratégias mais sofisticadas como vendas a descoberto. Conforme demonstra o incidente do Credit Suisse, esses atos sublinham uma nova fonte de risco para empresas em apuros.

Fundado na Suíça, em 1856, para ajudar a financiar a expansão das ferrovias no minúsculo país europeu, o banco com frequência teve dificuldades em manter a reputação limpa.

Desde a sua fundação, o Credit Suisse tem sido repositório de fundos de empresários sancionados, abusadores de direitos humanos e autoridades de inteligência. O governo dos Estados Unidos multou a instituição em bilhões de dólares em função de seu papel em ajudar americanos a solicitar declarações falsas de imposto de renda, vender valores mobiliários garantidos por hipotecas ligados à crise financeira de 2008 e ajudar clientes no Irã, no Sudão e em outros países a contornar sanções americanas.

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Nos Estados Unidos, o Credit Suisse construiu seu banco de investimentos por meio de aquisições, começando pela compra, em 1990, do First Boston. Mas, sem um foco central, o banco – cujos mais graduados diretores trabalham na Suíça – com frequência permitiu que aventureiros perseguissem novos fluxos de renda e assumissem riscos desproporcionais sem supervisão adequada

Colapso da Archegos Capital

Seus problemas mais recentes começaram na primavera de 2021, quando a Archegos Capital Management colapsou.

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O Credit Suisse era um dos muitos bancos com presença em Wall Street que negociava com a Archegos, a firma de investimento privado de Bill Hwang, um antigo astro da gestão financeira. Mesmo assim, o Credit Suisse perdeu US$ 5,5 bilhões, muito mais do que seus rivais. O banco admitiu posteriormente que “uma falha fundamental de gestão e controles” havia ocasionado o desastre.

A alta rotatividade nos mais altos níveis do Credit Suisse não ajudou. Em 2015, o banco contratou Tidjane Thiam como diretor-executivo. Thiam, ex-consultor da McKinsey, escorou o preço das ações do banco e sua lucratividade amplamente em cortes de custos, de acordo com cinco indivíduos familiarizados com seus métodos de tomada de decisão. Ele demitiu gestores de risco experientes e investiu menos do que deveria em novos sistemas de corretagem, afirmaram as fontes.

Thiam deixou o Credit Suisse no início de 2020, após um escândalo que envolveu investigações de executivos sob suas ordens. Ele saiu do banco em uma posição estável e vantajosa, investindo apropriadamente em suas várias divisões, afirmou seu porta-voz, Andy Smith.

O Credit Suisse substituiu Thiam por Thomas Gottstein, executivo que trabalhava havia muito na instituição. Quando a Archegos colapsou, o banco manteve Gottstein no cargo, mas ele começou a trabalhar com um novo presidente, António Horta-Osório, que tinha sido nomeado poucos meses antes, durante uma reestruturação da instituição.

Em janeiro deste ano, Horta-Osório demitiu-se abruptamente, em meio a uma investigação a respeito de uma suspeita de ele ter violado regras de quarentena durante a pandemia. Mas ele operou mudanças importantes em seu curto mandato. Para reduzir a tomada de risco, afirmou Horta-Osório, o banco fecharia a maior parte de seu negócio na corretagem de ações, que envolvia emprestar para grandes firmas de gestão de ativos, como a Archegos. O Credit Suisse também perdeu uma importante fonte de receita conforme esfriou o mercado das empresas com propósito especial de aquisição, ou SPACs.

Em julho, o Credit Suisse anunciou sua terceira perda trimestral consecutiva. Gottstein foi substituído por Körner, veterano do setor que trabalhava no banco suíço rival UBS.

Espera-se que Körner e o atual presidente, Axel Lehmann, que substituiu Horta-Osório, revelem um novo plano de reestruturação em 27 de outubro, em um esforço para convencer investidores a respeito da viabilidade a longo prazo do banco e sua lucratividade. O preço da ação do Credit Suisse caiu tanto no ano recente que o valor de mercado da empresa - situado em torno de US$ 12 bilhões - é comparável ao de um banco regional nos EUA, inferior ao Fifth Third ou ao Citizens Financial Group.

Segundo os planos em discussão, o Credit Suisse venderá ou desmembrará algumas unidades, afirmaram três indivíduos familiarizados com os planos da empresa.

A divisão de ativos privados deverá se sustentar por conta própria. O banco de investimentos seria desmembrado, e os executivos mais graduados teriam participação na nova entidade, que ficaria com o nome do First Boston, afirmaram as fontes.

“No mercado atual, vender qualquer empresa é complicado, e todos sabem que o Credit Suisse está sendo forçado a vender”, afirmou Johann Scholtz, analista da consultoria Morningstar que estuda o banco.

“Muitos dos tópicos citados nesta reportagem são questões anteriores”, afirmou Candice Sun, porta-voz do Credit Suisse, em um comunicado.

Mesmo enquanto o Credit Suisse enfrentava dificuldades para reparar seus problemas, um novo fenômeno agitava os mercados financeiros. Pequenos investidores, muitos deles presos em casa durante os lockdowns da pandemia e cheios de dinheiro extra dos auxílios do governo e de suas economias, começaram a conversar entre si nas redes sociais.

Seu maior triunfo: comprar as ações da GameStop para pressionar um fundo de hedge que havia apostado que o valor das ações da empresa cairia. Maravilhados com seu sucesso, alguns investidores procuraram outros alvos, desenvolvendo mitos de governança e códigos próprios ao longo do caminho. Uma de suas plataformas online favoritas foi o Reddit, além de fóruns como WallStreetBets, onde os usuários compartilham ideias e chacotas a respeito do mundo dos investimentos. E alguns finalmente voltaram a atenção para o Credit Suisse.

Alguns investidores afirmaram que o memorando enviado em 30 de setembro por Körner, o diretor-executivo do banco, garantindo aos funcionários que o Credit Suisse tinha uma “firme base de capital e posição de liquidez” apesar dos recentes giros do mercado, surtiu o efeito oposto em observadores do mercado de ações.

O Credit Suisse tratou seriamente do assunto. Ao logo do fim de semana daquele 1.º de outubro, executivos do banco telefonaram para os clientes para lhes assegurar que tinham capital mais que suficiente para atender as exigências das regulações. A maior preocupação era a possibilidade de o rumor de uma crise de liquidez se tornar uma profecia iminente, levando credores a retirar linhas de crédito e correntistas a sacar seu dinheiro, o que poderia drenar o capital do banco rapidamente — um cenário extremo e até improvável, dada a firme posição financeira do Credit Suisse.

“Bancos dependem de humores”, afirmou Scholtz, o analista da Morningstar. “Se todos os correntistas quiserem sacar seu dinheiro amanhã, o dinheiro não estará lá. Esta é a realidade do sistema bancário. Essas coisas podem assumir uma dimensão crescentemente desproporcional.”

Desproporcional foi o volume da negociação das ações do Credit Suisse por pequenos investidores, que praticamente dobrou entre a sexta-feira e a segunda-feira, de acordo com o medidor de atividade no mercado do Nasdaq Data Link. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

“O Credit Suisse está provavelmente quebrando.” Jim Lewis, que tuíta frequentemente sob a alcunha Wall Street Silver, fez essa afirmação para seus mais de 300 mil seguidores em 1.º de outubro, um sábado. “Os mercados estão dizendo que ele está insolvente e provavelmente quebrado. Será que estamos próximos de um momento como o de 2008?”

Lewis era um entre centenas de indivíduos – muitos deles investidores amadores – que vinham especulando a respeito do destino do banco suíço Credit Suisse. A instituição passava por uma reestruturação e tinha se tornado alvo fácil após décadas de escândalos, tentativas fracassadas de reformas e reveses administrativos.

Ações do Credit Suisse perderam 6% em um dia após os memes Foto: Reuters

Parece não ter havido nenhum motivo imediato para o tuíte de Lewis naquele sábado, a não ser um memorando que Ulrich Körner, o diretor executivo do Credit Suisse, havia mandado para os funcionários no dia anterior, garantindo-lhes que o banco estava em boa condição financeira.

Mas o tuíte, que recebeu mais de 11 mil curtidas e foi retuitado mais de 3 mil vezes, foi um dos muitos posts que ajudaram a incendiar fóruns em redes sociais como Twitter e Reddit. O rumor de que o Credit Suisse estava em apuros ricocheteou pelo mundo inteiro, deixando perplexos os executivos do banco, forçando-os a telefonar para acionistas, parceiros comerciais e analistas para tranquilizá-los, garantindo que tudo ia bem, antes da reabertura dos mercados na segunda-feira.

Por meio de mensagens privadas no Twitter, Lewis disse à reportagem que tudo que tinha consultado antes do seu tuíte tinha sido “o preço baixo das ações (do Credit Suisse) e memes no Reddit”.

Uma instituição histórica viu seus papéis transformados em ações meme.

No mesmo dia que Lewis tuitou que o banco poderia quebrar, Hunter Kikut postou: “Alta probabilidade do Credit Suisse falir. Venderei minhas posições na segunda-feira”.

Kikut, de 22 anos e morador de Charlotte, na Carolina do Norte, afirmou não se lembrar de ter visto o tuíte de Lewis, mas que, em vez disso, um post da Unusual Whales – que se classifica como um serviço de corretagem que “empodera o pequeno investidor” – chamou sua atenção. “Foi por causa do Twitter que fiquei sabendo disso”, afirmou Kikut em entrevista. “Era fim de semana, a coisa simplesmente explodiu. E comecei a fuçar.”

Medo de investidores

Após os mercados abrirem, na segunda-feira, 3 de outubro, Kikut começou a vender a descoberto ações do Credit Suisse – ou apostar que o valor das ações do banco cairiam. Naquela manhã, o preço das ações do Credit Suisse despencou quase 6%, retirando cerca de US$ 600 milhões de sua capitalização de mercado e baixando temporariamente o valor de uma ação cujo preço já havia caído mais que a metade desde o início do ano. Conforme se espalhou o medo entre investidores profissionais de que algo poderia estar acontecendo, o custo para segurar a dívida do Credit Suisse contra calote foi às alturas.

Não era a primeira vez que investidores individuais, agrupando-se em redes sociais, haviam deslocado o preço de uma ação tão significativamente. No ano passado, eles agiram de forma concertada para aumentar o valor das ações da GameStop, uma rede de lojas de videogames, determinados a passar a perna em fundos de hedge que haviam apostado que as ações da empresa cairiam.

Mas, desde então, o que começou como um esforço espontâneo para derrubar Wall Street se tornou uma presença comum no mercado. Milhões de investidores amadores entraram no jogo da corretagem de ações, incluindo com uso de estratégias mais sofisticadas como vendas a descoberto. Conforme demonstra o incidente do Credit Suisse, esses atos sublinham uma nova fonte de risco para empresas em apuros.

Fundado na Suíça, em 1856, para ajudar a financiar a expansão das ferrovias no minúsculo país europeu, o banco com frequência teve dificuldades em manter a reputação limpa.

Desde a sua fundação, o Credit Suisse tem sido repositório de fundos de empresários sancionados, abusadores de direitos humanos e autoridades de inteligência. O governo dos Estados Unidos multou a instituição em bilhões de dólares em função de seu papel em ajudar americanos a solicitar declarações falsas de imposto de renda, vender valores mobiliários garantidos por hipotecas ligados à crise financeira de 2008 e ajudar clientes no Irã, no Sudão e em outros países a contornar sanções americanas.

Nos Estados Unidos, o Credit Suisse construiu seu banco de investimentos por meio de aquisições, começando pela compra, em 1990, do First Boston. Mas, sem um foco central, o banco – cujos mais graduados diretores trabalham na Suíça – com frequência permitiu que aventureiros perseguissem novos fluxos de renda e assumissem riscos desproporcionais sem supervisão adequada

Colapso da Archegos Capital

Seus problemas mais recentes começaram na primavera de 2021, quando a Archegos Capital Management colapsou.

O Credit Suisse era um dos muitos bancos com presença em Wall Street que negociava com a Archegos, a firma de investimento privado de Bill Hwang, um antigo astro da gestão financeira. Mesmo assim, o Credit Suisse perdeu US$ 5,5 bilhões, muito mais do que seus rivais. O banco admitiu posteriormente que “uma falha fundamental de gestão e controles” havia ocasionado o desastre.

A alta rotatividade nos mais altos níveis do Credit Suisse não ajudou. Em 2015, o banco contratou Tidjane Thiam como diretor-executivo. Thiam, ex-consultor da McKinsey, escorou o preço das ações do banco e sua lucratividade amplamente em cortes de custos, de acordo com cinco indivíduos familiarizados com seus métodos de tomada de decisão. Ele demitiu gestores de risco experientes e investiu menos do que deveria em novos sistemas de corretagem, afirmaram as fontes.

Thiam deixou o Credit Suisse no início de 2020, após um escândalo que envolveu investigações de executivos sob suas ordens. Ele saiu do banco em uma posição estável e vantajosa, investindo apropriadamente em suas várias divisões, afirmou seu porta-voz, Andy Smith.

O Credit Suisse substituiu Thiam por Thomas Gottstein, executivo que trabalhava havia muito na instituição. Quando a Archegos colapsou, o banco manteve Gottstein no cargo, mas ele começou a trabalhar com um novo presidente, António Horta-Osório, que tinha sido nomeado poucos meses antes, durante uma reestruturação da instituição.

Em janeiro deste ano, Horta-Osório demitiu-se abruptamente, em meio a uma investigação a respeito de uma suspeita de ele ter violado regras de quarentena durante a pandemia. Mas ele operou mudanças importantes em seu curto mandato. Para reduzir a tomada de risco, afirmou Horta-Osório, o banco fecharia a maior parte de seu negócio na corretagem de ações, que envolvia emprestar para grandes firmas de gestão de ativos, como a Archegos. O Credit Suisse também perdeu uma importante fonte de receita conforme esfriou o mercado das empresas com propósito especial de aquisição, ou SPACs.

Em julho, o Credit Suisse anunciou sua terceira perda trimestral consecutiva. Gottstein foi substituído por Körner, veterano do setor que trabalhava no banco suíço rival UBS.

Espera-se que Körner e o atual presidente, Axel Lehmann, que substituiu Horta-Osório, revelem um novo plano de reestruturação em 27 de outubro, em um esforço para convencer investidores a respeito da viabilidade a longo prazo do banco e sua lucratividade. O preço da ação do Credit Suisse caiu tanto no ano recente que o valor de mercado da empresa - situado em torno de US$ 12 bilhões - é comparável ao de um banco regional nos EUA, inferior ao Fifth Third ou ao Citizens Financial Group.

Segundo os planos em discussão, o Credit Suisse venderá ou desmembrará algumas unidades, afirmaram três indivíduos familiarizados com os planos da empresa.

A divisão de ativos privados deverá se sustentar por conta própria. O banco de investimentos seria desmembrado, e os executivos mais graduados teriam participação na nova entidade, que ficaria com o nome do First Boston, afirmaram as fontes.

“No mercado atual, vender qualquer empresa é complicado, e todos sabem que o Credit Suisse está sendo forçado a vender”, afirmou Johann Scholtz, analista da consultoria Morningstar que estuda o banco.

“Muitos dos tópicos citados nesta reportagem são questões anteriores”, afirmou Candice Sun, porta-voz do Credit Suisse, em um comunicado.

Mesmo enquanto o Credit Suisse enfrentava dificuldades para reparar seus problemas, um novo fenômeno agitava os mercados financeiros. Pequenos investidores, muitos deles presos em casa durante os lockdowns da pandemia e cheios de dinheiro extra dos auxílios do governo e de suas economias, começaram a conversar entre si nas redes sociais.

Seu maior triunfo: comprar as ações da GameStop para pressionar um fundo de hedge que havia apostado que o valor das ações da empresa cairia. Maravilhados com seu sucesso, alguns investidores procuraram outros alvos, desenvolvendo mitos de governança e códigos próprios ao longo do caminho. Uma de suas plataformas online favoritas foi o Reddit, além de fóruns como WallStreetBets, onde os usuários compartilham ideias e chacotas a respeito do mundo dos investimentos. E alguns finalmente voltaram a atenção para o Credit Suisse.

Alguns investidores afirmaram que o memorando enviado em 30 de setembro por Körner, o diretor-executivo do banco, garantindo aos funcionários que o Credit Suisse tinha uma “firme base de capital e posição de liquidez” apesar dos recentes giros do mercado, surtiu o efeito oposto em observadores do mercado de ações.

O Credit Suisse tratou seriamente do assunto. Ao logo do fim de semana daquele 1.º de outubro, executivos do banco telefonaram para os clientes para lhes assegurar que tinham capital mais que suficiente para atender as exigências das regulações. A maior preocupação era a possibilidade de o rumor de uma crise de liquidez se tornar uma profecia iminente, levando credores a retirar linhas de crédito e correntistas a sacar seu dinheiro, o que poderia drenar o capital do banco rapidamente — um cenário extremo e até improvável, dada a firme posição financeira do Credit Suisse.

“Bancos dependem de humores”, afirmou Scholtz, o analista da Morningstar. “Se todos os correntistas quiserem sacar seu dinheiro amanhã, o dinheiro não estará lá. Esta é a realidade do sistema bancário. Essas coisas podem assumir uma dimensão crescentemente desproporcional.”

Desproporcional foi o volume da negociação das ações do Credit Suisse por pequenos investidores, que praticamente dobrou entre a sexta-feira e a segunda-feira, de acordo com o medidor de atividade no mercado do Nasdaq Data Link. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

“O Credit Suisse está provavelmente quebrando.” Jim Lewis, que tuíta frequentemente sob a alcunha Wall Street Silver, fez essa afirmação para seus mais de 300 mil seguidores em 1.º de outubro, um sábado. “Os mercados estão dizendo que ele está insolvente e provavelmente quebrado. Será que estamos próximos de um momento como o de 2008?”

Lewis era um entre centenas de indivíduos – muitos deles investidores amadores – que vinham especulando a respeito do destino do banco suíço Credit Suisse. A instituição passava por uma reestruturação e tinha se tornado alvo fácil após décadas de escândalos, tentativas fracassadas de reformas e reveses administrativos.

Ações do Credit Suisse perderam 6% em um dia após os memes Foto: Reuters

Parece não ter havido nenhum motivo imediato para o tuíte de Lewis naquele sábado, a não ser um memorando que Ulrich Körner, o diretor executivo do Credit Suisse, havia mandado para os funcionários no dia anterior, garantindo-lhes que o banco estava em boa condição financeira.

Mas o tuíte, que recebeu mais de 11 mil curtidas e foi retuitado mais de 3 mil vezes, foi um dos muitos posts que ajudaram a incendiar fóruns em redes sociais como Twitter e Reddit. O rumor de que o Credit Suisse estava em apuros ricocheteou pelo mundo inteiro, deixando perplexos os executivos do banco, forçando-os a telefonar para acionistas, parceiros comerciais e analistas para tranquilizá-los, garantindo que tudo ia bem, antes da reabertura dos mercados na segunda-feira.

Por meio de mensagens privadas no Twitter, Lewis disse à reportagem que tudo que tinha consultado antes do seu tuíte tinha sido “o preço baixo das ações (do Credit Suisse) e memes no Reddit”.

Uma instituição histórica viu seus papéis transformados em ações meme.

No mesmo dia que Lewis tuitou que o banco poderia quebrar, Hunter Kikut postou: “Alta probabilidade do Credit Suisse falir. Venderei minhas posições na segunda-feira”.

Kikut, de 22 anos e morador de Charlotte, na Carolina do Norte, afirmou não se lembrar de ter visto o tuíte de Lewis, mas que, em vez disso, um post da Unusual Whales – que se classifica como um serviço de corretagem que “empodera o pequeno investidor” – chamou sua atenção. “Foi por causa do Twitter que fiquei sabendo disso”, afirmou Kikut em entrevista. “Era fim de semana, a coisa simplesmente explodiu. E comecei a fuçar.”

Medo de investidores

Após os mercados abrirem, na segunda-feira, 3 de outubro, Kikut começou a vender a descoberto ações do Credit Suisse – ou apostar que o valor das ações do banco cairiam. Naquela manhã, o preço das ações do Credit Suisse despencou quase 6%, retirando cerca de US$ 600 milhões de sua capitalização de mercado e baixando temporariamente o valor de uma ação cujo preço já havia caído mais que a metade desde o início do ano. Conforme se espalhou o medo entre investidores profissionais de que algo poderia estar acontecendo, o custo para segurar a dívida do Credit Suisse contra calote foi às alturas.

Não era a primeira vez que investidores individuais, agrupando-se em redes sociais, haviam deslocado o preço de uma ação tão significativamente. No ano passado, eles agiram de forma concertada para aumentar o valor das ações da GameStop, uma rede de lojas de videogames, determinados a passar a perna em fundos de hedge que haviam apostado que as ações da empresa cairiam.

Mas, desde então, o que começou como um esforço espontâneo para derrubar Wall Street se tornou uma presença comum no mercado. Milhões de investidores amadores entraram no jogo da corretagem de ações, incluindo com uso de estratégias mais sofisticadas como vendas a descoberto. Conforme demonstra o incidente do Credit Suisse, esses atos sublinham uma nova fonte de risco para empresas em apuros.

Fundado na Suíça, em 1856, para ajudar a financiar a expansão das ferrovias no minúsculo país europeu, o banco com frequência teve dificuldades em manter a reputação limpa.

Desde a sua fundação, o Credit Suisse tem sido repositório de fundos de empresários sancionados, abusadores de direitos humanos e autoridades de inteligência. O governo dos Estados Unidos multou a instituição em bilhões de dólares em função de seu papel em ajudar americanos a solicitar declarações falsas de imposto de renda, vender valores mobiliários garantidos por hipotecas ligados à crise financeira de 2008 e ajudar clientes no Irã, no Sudão e em outros países a contornar sanções americanas.

Nos Estados Unidos, o Credit Suisse construiu seu banco de investimentos por meio de aquisições, começando pela compra, em 1990, do First Boston. Mas, sem um foco central, o banco – cujos mais graduados diretores trabalham na Suíça – com frequência permitiu que aventureiros perseguissem novos fluxos de renda e assumissem riscos desproporcionais sem supervisão adequada

Colapso da Archegos Capital

Seus problemas mais recentes começaram na primavera de 2021, quando a Archegos Capital Management colapsou.

O Credit Suisse era um dos muitos bancos com presença em Wall Street que negociava com a Archegos, a firma de investimento privado de Bill Hwang, um antigo astro da gestão financeira. Mesmo assim, o Credit Suisse perdeu US$ 5,5 bilhões, muito mais do que seus rivais. O banco admitiu posteriormente que “uma falha fundamental de gestão e controles” havia ocasionado o desastre.

A alta rotatividade nos mais altos níveis do Credit Suisse não ajudou. Em 2015, o banco contratou Tidjane Thiam como diretor-executivo. Thiam, ex-consultor da McKinsey, escorou o preço das ações do banco e sua lucratividade amplamente em cortes de custos, de acordo com cinco indivíduos familiarizados com seus métodos de tomada de decisão. Ele demitiu gestores de risco experientes e investiu menos do que deveria em novos sistemas de corretagem, afirmaram as fontes.

Thiam deixou o Credit Suisse no início de 2020, após um escândalo que envolveu investigações de executivos sob suas ordens. Ele saiu do banco em uma posição estável e vantajosa, investindo apropriadamente em suas várias divisões, afirmou seu porta-voz, Andy Smith.

O Credit Suisse substituiu Thiam por Thomas Gottstein, executivo que trabalhava havia muito na instituição. Quando a Archegos colapsou, o banco manteve Gottstein no cargo, mas ele começou a trabalhar com um novo presidente, António Horta-Osório, que tinha sido nomeado poucos meses antes, durante uma reestruturação da instituição.

Em janeiro deste ano, Horta-Osório demitiu-se abruptamente, em meio a uma investigação a respeito de uma suspeita de ele ter violado regras de quarentena durante a pandemia. Mas ele operou mudanças importantes em seu curto mandato. Para reduzir a tomada de risco, afirmou Horta-Osório, o banco fecharia a maior parte de seu negócio na corretagem de ações, que envolvia emprestar para grandes firmas de gestão de ativos, como a Archegos. O Credit Suisse também perdeu uma importante fonte de receita conforme esfriou o mercado das empresas com propósito especial de aquisição, ou SPACs.

Em julho, o Credit Suisse anunciou sua terceira perda trimestral consecutiva. Gottstein foi substituído por Körner, veterano do setor que trabalhava no banco suíço rival UBS.

Espera-se que Körner e o atual presidente, Axel Lehmann, que substituiu Horta-Osório, revelem um novo plano de reestruturação em 27 de outubro, em um esforço para convencer investidores a respeito da viabilidade a longo prazo do banco e sua lucratividade. O preço da ação do Credit Suisse caiu tanto no ano recente que o valor de mercado da empresa - situado em torno de US$ 12 bilhões - é comparável ao de um banco regional nos EUA, inferior ao Fifth Third ou ao Citizens Financial Group.

Segundo os planos em discussão, o Credit Suisse venderá ou desmembrará algumas unidades, afirmaram três indivíduos familiarizados com os planos da empresa.

A divisão de ativos privados deverá se sustentar por conta própria. O banco de investimentos seria desmembrado, e os executivos mais graduados teriam participação na nova entidade, que ficaria com o nome do First Boston, afirmaram as fontes.

“No mercado atual, vender qualquer empresa é complicado, e todos sabem que o Credit Suisse está sendo forçado a vender”, afirmou Johann Scholtz, analista da consultoria Morningstar que estuda o banco.

“Muitos dos tópicos citados nesta reportagem são questões anteriores”, afirmou Candice Sun, porta-voz do Credit Suisse, em um comunicado.

Mesmo enquanto o Credit Suisse enfrentava dificuldades para reparar seus problemas, um novo fenômeno agitava os mercados financeiros. Pequenos investidores, muitos deles presos em casa durante os lockdowns da pandemia e cheios de dinheiro extra dos auxílios do governo e de suas economias, começaram a conversar entre si nas redes sociais.

Seu maior triunfo: comprar as ações da GameStop para pressionar um fundo de hedge que havia apostado que o valor das ações da empresa cairia. Maravilhados com seu sucesso, alguns investidores procuraram outros alvos, desenvolvendo mitos de governança e códigos próprios ao longo do caminho. Uma de suas plataformas online favoritas foi o Reddit, além de fóruns como WallStreetBets, onde os usuários compartilham ideias e chacotas a respeito do mundo dos investimentos. E alguns finalmente voltaram a atenção para o Credit Suisse.

Alguns investidores afirmaram que o memorando enviado em 30 de setembro por Körner, o diretor-executivo do banco, garantindo aos funcionários que o Credit Suisse tinha uma “firme base de capital e posição de liquidez” apesar dos recentes giros do mercado, surtiu o efeito oposto em observadores do mercado de ações.

O Credit Suisse tratou seriamente do assunto. Ao logo do fim de semana daquele 1.º de outubro, executivos do banco telefonaram para os clientes para lhes assegurar que tinham capital mais que suficiente para atender as exigências das regulações. A maior preocupação era a possibilidade de o rumor de uma crise de liquidez se tornar uma profecia iminente, levando credores a retirar linhas de crédito e correntistas a sacar seu dinheiro, o que poderia drenar o capital do banco rapidamente — um cenário extremo e até improvável, dada a firme posição financeira do Credit Suisse.

“Bancos dependem de humores”, afirmou Scholtz, o analista da Morningstar. “Se todos os correntistas quiserem sacar seu dinheiro amanhã, o dinheiro não estará lá. Esta é a realidade do sistema bancário. Essas coisas podem assumir uma dimensão crescentemente desproporcional.”

Desproporcional foi o volume da negociação das ações do Credit Suisse por pequenos investidores, que praticamente dobrou entre a sexta-feira e a segunda-feira, de acordo com o medidor de atividade no mercado do Nasdaq Data Link. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

“O Credit Suisse está provavelmente quebrando.” Jim Lewis, que tuíta frequentemente sob a alcunha Wall Street Silver, fez essa afirmação para seus mais de 300 mil seguidores em 1.º de outubro, um sábado. “Os mercados estão dizendo que ele está insolvente e provavelmente quebrado. Será que estamos próximos de um momento como o de 2008?”

Lewis era um entre centenas de indivíduos – muitos deles investidores amadores – que vinham especulando a respeito do destino do banco suíço Credit Suisse. A instituição passava por uma reestruturação e tinha se tornado alvo fácil após décadas de escândalos, tentativas fracassadas de reformas e reveses administrativos.

Ações do Credit Suisse perderam 6% em um dia após os memes Foto: Reuters

Parece não ter havido nenhum motivo imediato para o tuíte de Lewis naquele sábado, a não ser um memorando que Ulrich Körner, o diretor executivo do Credit Suisse, havia mandado para os funcionários no dia anterior, garantindo-lhes que o banco estava em boa condição financeira.

Mas o tuíte, que recebeu mais de 11 mil curtidas e foi retuitado mais de 3 mil vezes, foi um dos muitos posts que ajudaram a incendiar fóruns em redes sociais como Twitter e Reddit. O rumor de que o Credit Suisse estava em apuros ricocheteou pelo mundo inteiro, deixando perplexos os executivos do banco, forçando-os a telefonar para acionistas, parceiros comerciais e analistas para tranquilizá-los, garantindo que tudo ia bem, antes da reabertura dos mercados na segunda-feira.

Por meio de mensagens privadas no Twitter, Lewis disse à reportagem que tudo que tinha consultado antes do seu tuíte tinha sido “o preço baixo das ações (do Credit Suisse) e memes no Reddit”.

Uma instituição histórica viu seus papéis transformados em ações meme.

No mesmo dia que Lewis tuitou que o banco poderia quebrar, Hunter Kikut postou: “Alta probabilidade do Credit Suisse falir. Venderei minhas posições na segunda-feira”.

Kikut, de 22 anos e morador de Charlotte, na Carolina do Norte, afirmou não se lembrar de ter visto o tuíte de Lewis, mas que, em vez disso, um post da Unusual Whales – que se classifica como um serviço de corretagem que “empodera o pequeno investidor” – chamou sua atenção. “Foi por causa do Twitter que fiquei sabendo disso”, afirmou Kikut em entrevista. “Era fim de semana, a coisa simplesmente explodiu. E comecei a fuçar.”

Medo de investidores

Após os mercados abrirem, na segunda-feira, 3 de outubro, Kikut começou a vender a descoberto ações do Credit Suisse – ou apostar que o valor das ações do banco cairiam. Naquela manhã, o preço das ações do Credit Suisse despencou quase 6%, retirando cerca de US$ 600 milhões de sua capitalização de mercado e baixando temporariamente o valor de uma ação cujo preço já havia caído mais que a metade desde o início do ano. Conforme se espalhou o medo entre investidores profissionais de que algo poderia estar acontecendo, o custo para segurar a dívida do Credit Suisse contra calote foi às alturas.

Não era a primeira vez que investidores individuais, agrupando-se em redes sociais, haviam deslocado o preço de uma ação tão significativamente. No ano passado, eles agiram de forma concertada para aumentar o valor das ações da GameStop, uma rede de lojas de videogames, determinados a passar a perna em fundos de hedge que haviam apostado que as ações da empresa cairiam.

Mas, desde então, o que começou como um esforço espontâneo para derrubar Wall Street se tornou uma presença comum no mercado. Milhões de investidores amadores entraram no jogo da corretagem de ações, incluindo com uso de estratégias mais sofisticadas como vendas a descoberto. Conforme demonstra o incidente do Credit Suisse, esses atos sublinham uma nova fonte de risco para empresas em apuros.

Fundado na Suíça, em 1856, para ajudar a financiar a expansão das ferrovias no minúsculo país europeu, o banco com frequência teve dificuldades em manter a reputação limpa.

Desde a sua fundação, o Credit Suisse tem sido repositório de fundos de empresários sancionados, abusadores de direitos humanos e autoridades de inteligência. O governo dos Estados Unidos multou a instituição em bilhões de dólares em função de seu papel em ajudar americanos a solicitar declarações falsas de imposto de renda, vender valores mobiliários garantidos por hipotecas ligados à crise financeira de 2008 e ajudar clientes no Irã, no Sudão e em outros países a contornar sanções americanas.

Nos Estados Unidos, o Credit Suisse construiu seu banco de investimentos por meio de aquisições, começando pela compra, em 1990, do First Boston. Mas, sem um foco central, o banco – cujos mais graduados diretores trabalham na Suíça – com frequência permitiu que aventureiros perseguissem novos fluxos de renda e assumissem riscos desproporcionais sem supervisão adequada

Colapso da Archegos Capital

Seus problemas mais recentes começaram na primavera de 2021, quando a Archegos Capital Management colapsou.

O Credit Suisse era um dos muitos bancos com presença em Wall Street que negociava com a Archegos, a firma de investimento privado de Bill Hwang, um antigo astro da gestão financeira. Mesmo assim, o Credit Suisse perdeu US$ 5,5 bilhões, muito mais do que seus rivais. O banco admitiu posteriormente que “uma falha fundamental de gestão e controles” havia ocasionado o desastre.

A alta rotatividade nos mais altos níveis do Credit Suisse não ajudou. Em 2015, o banco contratou Tidjane Thiam como diretor-executivo. Thiam, ex-consultor da McKinsey, escorou o preço das ações do banco e sua lucratividade amplamente em cortes de custos, de acordo com cinco indivíduos familiarizados com seus métodos de tomada de decisão. Ele demitiu gestores de risco experientes e investiu menos do que deveria em novos sistemas de corretagem, afirmaram as fontes.

Thiam deixou o Credit Suisse no início de 2020, após um escândalo que envolveu investigações de executivos sob suas ordens. Ele saiu do banco em uma posição estável e vantajosa, investindo apropriadamente em suas várias divisões, afirmou seu porta-voz, Andy Smith.

O Credit Suisse substituiu Thiam por Thomas Gottstein, executivo que trabalhava havia muito na instituição. Quando a Archegos colapsou, o banco manteve Gottstein no cargo, mas ele começou a trabalhar com um novo presidente, António Horta-Osório, que tinha sido nomeado poucos meses antes, durante uma reestruturação da instituição.

Em janeiro deste ano, Horta-Osório demitiu-se abruptamente, em meio a uma investigação a respeito de uma suspeita de ele ter violado regras de quarentena durante a pandemia. Mas ele operou mudanças importantes em seu curto mandato. Para reduzir a tomada de risco, afirmou Horta-Osório, o banco fecharia a maior parte de seu negócio na corretagem de ações, que envolvia emprestar para grandes firmas de gestão de ativos, como a Archegos. O Credit Suisse também perdeu uma importante fonte de receita conforme esfriou o mercado das empresas com propósito especial de aquisição, ou SPACs.

Em julho, o Credit Suisse anunciou sua terceira perda trimestral consecutiva. Gottstein foi substituído por Körner, veterano do setor que trabalhava no banco suíço rival UBS.

Espera-se que Körner e o atual presidente, Axel Lehmann, que substituiu Horta-Osório, revelem um novo plano de reestruturação em 27 de outubro, em um esforço para convencer investidores a respeito da viabilidade a longo prazo do banco e sua lucratividade. O preço da ação do Credit Suisse caiu tanto no ano recente que o valor de mercado da empresa - situado em torno de US$ 12 bilhões - é comparável ao de um banco regional nos EUA, inferior ao Fifth Third ou ao Citizens Financial Group.

Segundo os planos em discussão, o Credit Suisse venderá ou desmembrará algumas unidades, afirmaram três indivíduos familiarizados com os planos da empresa.

A divisão de ativos privados deverá se sustentar por conta própria. O banco de investimentos seria desmembrado, e os executivos mais graduados teriam participação na nova entidade, que ficaria com o nome do First Boston, afirmaram as fontes.

“No mercado atual, vender qualquer empresa é complicado, e todos sabem que o Credit Suisse está sendo forçado a vender”, afirmou Johann Scholtz, analista da consultoria Morningstar que estuda o banco.

“Muitos dos tópicos citados nesta reportagem são questões anteriores”, afirmou Candice Sun, porta-voz do Credit Suisse, em um comunicado.

Mesmo enquanto o Credit Suisse enfrentava dificuldades para reparar seus problemas, um novo fenômeno agitava os mercados financeiros. Pequenos investidores, muitos deles presos em casa durante os lockdowns da pandemia e cheios de dinheiro extra dos auxílios do governo e de suas economias, começaram a conversar entre si nas redes sociais.

Seu maior triunfo: comprar as ações da GameStop para pressionar um fundo de hedge que havia apostado que o valor das ações da empresa cairia. Maravilhados com seu sucesso, alguns investidores procuraram outros alvos, desenvolvendo mitos de governança e códigos próprios ao longo do caminho. Uma de suas plataformas online favoritas foi o Reddit, além de fóruns como WallStreetBets, onde os usuários compartilham ideias e chacotas a respeito do mundo dos investimentos. E alguns finalmente voltaram a atenção para o Credit Suisse.

Alguns investidores afirmaram que o memorando enviado em 30 de setembro por Körner, o diretor-executivo do banco, garantindo aos funcionários que o Credit Suisse tinha uma “firme base de capital e posição de liquidez” apesar dos recentes giros do mercado, surtiu o efeito oposto em observadores do mercado de ações.

O Credit Suisse tratou seriamente do assunto. Ao logo do fim de semana daquele 1.º de outubro, executivos do banco telefonaram para os clientes para lhes assegurar que tinham capital mais que suficiente para atender as exigências das regulações. A maior preocupação era a possibilidade de o rumor de uma crise de liquidez se tornar uma profecia iminente, levando credores a retirar linhas de crédito e correntistas a sacar seu dinheiro, o que poderia drenar o capital do banco rapidamente — um cenário extremo e até improvável, dada a firme posição financeira do Credit Suisse.

“Bancos dependem de humores”, afirmou Scholtz, o analista da Morningstar. “Se todos os correntistas quiserem sacar seu dinheiro amanhã, o dinheiro não estará lá. Esta é a realidade do sistema bancário. Essas coisas podem assumir uma dimensão crescentemente desproporcional.”

Desproporcional foi o volume da negociação das ações do Credit Suisse por pequenos investidores, que praticamente dobrou entre a sexta-feira e a segunda-feira, de acordo com o medidor de atividade no mercado do Nasdaq Data Link. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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