A Receita Federal decidiu acabar com a isenção de imposto para encomendas internacionais de até US$ 50 (cerca de R$ 250), regra que era válida exclusivamente para remessas de pessoa física para pessoa física, sem fins comerciais.
A medida foi tomada para combater a sonegação de impostos. Segundo a Receita, algumas empresas estariam usando a norma de maneira ilegal ao enviar encomendas como se o remetente fosse uma pessoa física. Além disso, outra estratégia apontada é a divisão de um mesmo pedido em vários pacotes menores, a fim de não ultrapassar a faixa de isenção.
Com a nova regra, as compras em sites internacionais populares no Brasil como Aliexpress, Shopee e Shein ficarão mais caras? Como calcular o imposto? Tire suas dúvidas abaixo.
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A Receita está taxando as plataformas de e-commerce internacionais?
Não. A medida anunciada pela Receita não significa a criação de um novo tributo para varejistas internacionais. As plataformas estrangeiras já estão sujeitas ao imposto de importação.
A mudança é uma tentativa de combater a sonegação do comércio eletrônico do exterior. Segundo a Receita, empresas estariam usando a norma válida apenas para pessoas físicas para pagar menos impostos nas remessas, o que é ilegal.
As compras de produtos importados vão ficar mais caras?
Se as empresas já estiverem cumprindo as regras previstas para importação, os preços de produtos comprados em e-commerces internacionais permanecerão os mesmos, uma vez que não houve mudança ou criação de tributo para essas plataformas, explica Rodrigo Helfstein, advogado tributário. Mas, segundo ele, caso a empresa estiver usando uma brecha ao fazer remessas internacionais entre pessoas físicas, os preços podem aumentar, uma vez que todo envio passará a ser taxado.
A mudança da norma tem o objetivo de promover um controle maior, afirma o advogado: “Isso contribui para não haver um prejuízo e uma concorrência desleal em relação a empresas nacionais do mesmo segmento”.
Assim, não haverá mais distinção de tratamento nas remessas por pessoas jurídicas e físicas. Segundo a Receita, as remessas entre pessoas físicas hoje são “absolutamente inexpressivas”. “Essa distinção só está servindo para fraudes generalizadas”, diz o órgão em nota.
Além disso, para o advogado, não dá para dizer que a medida vai repercutir num volume grande de operações: “Muitos desses e-commerces já possuem operações no Brasil. Isso quer dizer que já possuem caráter nacional e os produtos estão no Brasil. O impacto, se houver, é aplicável para mercadorias que chegam diretamente do exterior”, explica.
Quanto de imposto é pago em compras internacionais?
Pela tributação federal, qualquer produto vendido no País tem incidência de IPI, PIS e Cofins. Para produtos importados, há ainda o Imposto de Importação, que é variável conforme a classificação fiscal de cada produto.
No Regime de Tributação Simplificada (RTS), é aplicada uma alíquota única de 60% sobre o chamado valor aduaneiro: soma do valor da mercadoria, taxa do frete e seguro, se houver. Numa compra em que o valor é de US$ 100, incluindo frete e seguro, o imposto será de US$ 60. O total pago pelo consumidor será, portanto, US$ 100 do valor aduaneiro mais US$ 60 do imposto, no total de US$ 160.
Segundo a Receita, a opção pelo RTS será considerada automática para as remessas que se enquadrem nos requisitos, com valor total dos bens contidos na remessa internacional de até US$ 3 mil, que é o limite de importação para pessoa física.
São exceções as remessas não tributáveis ou aquelas em que o destinatário indicar aos Correios, até o momento da postagem da remessa no exterior, sua intenção de não utilizar o RTS, o que deve ser comunicado ao cliente da respectiva empresa.
As importações efetuadas por meio do RTS também estão sujeitas ao Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), conforme legislação específica de cada unidade da federação. A sua cobrança cabe aos Correios ou às empresas de courier (serviços de entregas rápidas).
Além dos impostos, a Receita informa que os Correios e as empresas de courier também cobram do destinatário outras tarifas, como custos do despacho alfandegário, por exemplo.
Como é possível pagar os impostos de produtos de e-commerces estrangeiros?
O imposto de importação pode já estar embutido no valor do produto e será pago logo no momento da compra, diz Helfstein. A empresa deve deixar isso claro ao consumidor.
É possível também que o valor do imposto seja cobrado do consumidor para liberar o produto, no chamado desembaraço aduaneiro. Neste caso, se for uma remessa postal, a Receita informa que o pagamento deverá ser realizado exclusivamente por meio do portal Minhas Importações, no site dos Correios.
Reações
Igor Luna, consultor jurídico da Câmara Brasileira da Economia Digital (camara-e.net), associação que reúne empresas da economia digital brasileira, relata que, segundo estimativas do grupo, as compras internacionais podem sofrer com, no mínimo, 60% de aumento com a mudança, valor da alíquota já cobrada para compras por plataformas internacionais. De acordo com ele, o principal impactado será o consumidor final.
Luna coloca que esse tipo de decisão não deve ser tomada sem consultar todos os participantes do sistema. “É preciso ter uma discussão transparente com toda a população e com o setor privado, a fim de construir uma solução conjunta”, defende.
Além disso, ainda não há um regramento específico voltado para o e-commerce estrangeiro. Segundo Gustavo Rizzo, do setor de importação da Efficienza, que presta serviços de assessoria em comércio internacional, a norma da isenção de impostos de remessas entre pessoas físicas em compras até US$ 50 é de 1999 e não considera o desenvolvimento das compras internacionais no e-commerce.
“Tivemos nos últimos 24 anos um desenvolvimento bastante desproporcional com essas normas. Não se imaginava, na época, que com um clique seria possível fazer uma compra e trazer um produto diretamente da China”, explica.
O que dizem as grandes varejistas
Sites internacionais populares entre os consumidores brasileiros se manifestaram sobre as novas regras. A Shopee afirmou em nota que as possíveis mudanças tributárias não afetarão os consumidores da plataforma. “Mais de 85% das vendas da Shopee são de vendedores brasileiros e não de fora do país”, escreveu a empresa. “Temos origem em Singapura, mas o nosso foco é local”, complementou. A Shopee também ressaltou que apoia o governo em qualquer mudança tributária que beneficie o empreendedorismo brasileiro.
A empresa AliExpress declarou que, ao dar acesso a milhões de brasileiros, de diversos níveis de renda, a fabricantes do mundo todo, consegue ofertar produtos de qualidade a preços acessíveis. “Acreditamos que possíveis atualizações regulatórias serão feitas com total consideração para aumentar os benefícios de escolha e valor para os consumidores brasileiros”, disse a plataforma, em nota.
O Estadão também procurou a Shein, mas não obteve resposta.