Consultoria técnica da Câmara diz que novo texto da LDO inviabiliza meta de déficit zero em 2024


Relatório deve ser votado nesta quarta-feira, 13, e limita bloqueio de despesas públicas a R$ 22,3 bi

Por Mariana Carneiro e Bianca Lima
Atualização:

BRASÍLIA - O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias, Danilo Forte (União-CE), fez alterações ao texto da lei que, na prática, inviabilizam o uso de instrumento, pelo governo, para se chegar à meta de zerar o déficit nas contas públicas no ano que vem, avalia a equipe de técnicos da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof) da Câmara dos Deputados.

Isso porque o texto da LDO 2024 elaborado por Forte limita o contingenciamento (bloqueio preventivo de despesas) máximo no Orçamento do ano que vem a R$ 22,3 bilhões, segundo diagnóstico da Conof.

Para alcançar a meta traçada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o governo teria de fazer um bloqueio bem mais elevado, de no mínimo R$ 56 bilhões, segundo os técnicos da Câmara - o que pode afetar o andamento de projetos como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e o Minha Casa Minha Vida.

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O novo parecer da Conof, concluído nesta terça-feira, 12 e a que o Estadão teve acesso, foi encomendado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), que embora vice-líder e integrante da base de apoio do governo no Congresso, vem vocalizando insatisfação com a condução da política fiscal da gestão Lula. Ele requisitou ainda um parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), tendo em vista o risco fiscal e jurídico embutidos na medida.

“Estamos vendo sucessivas tentativas por parte do governo de alargar o entendimento do arcabouço fiscal para gastar mais. Além de isso ser ruim do ponto de vista fiscal, o governo entra em uma nuvem de riscos jurídicos e que podem recair em ilegalidade”, afirma. A previsão é que o relatório da LDO seja votado na tarde desta quarta-feira, 13.

O compromisso firmado por Haddad está sob forte bombardeio no seu partido, o PT, e no próprio governo. Nesta terça, 12, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse não ver problemas em aumentar o endividamento público para fazer o País crescer, ignorando o efeito que isso provoca no aumento da taxa de juros e, consequentemente, na atividade econômica.

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O relator da LDO 2024, Danilo Forte (União-CE) Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Durante as discussões que antecederam a apresentação do relatório de Forte, o governo tentou emplacar uma proposta que ia na mesma linha, com a interpretação de que a lei que criou o arcabouço fiscal, nova regra para controle das contas públicas, obriga o Executivo a ampliar o gasto público anualmente dentro de um intervalo que varia entre 0,6% e 2,5% acima da inflação. Dessa forma, para cumprir o mínimo (0,6%), não seria possível contingenciar mais do R$ 22,3 bilhões.

O argumento foi rejeitado por Forte, que usou um parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) e um anterior, feito pelos técnicos da Câmara, para sustentar que a proposta padecia de “fragilidade jurídica”.

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No entanto, apesar de rejeitar a emenda proposta pelo governo, ao redigir o seu texto, Forte também acabou limitando o contingenciamento, atendendo à ala do governo que não endossa o compromisso de Fernando Haddad. Ou seja: a formatação legal é distinta, mas o efeito prático é idêntico.

No seu texto, Forte amplia indiscriminadamente as despesas que não podem ser contingenciadas - o que, na prática, inviabiliza o instrumento. Do total de R$ 225,8 bilhões em despesas passíveis de bloqueio, ele criou ressalvas sobre 90% delas (R$ 203 bilhões). Dessa forma, o governo não poderia contingenciar mais do R$ 22,3 bilhões.

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A nota técnica da Câmara sublinha que o bloqueio de despesas não é um fim em si mesmo e tem como objetivo o cumprimento da meta fiscal, estabelecida em zero pelo ministro Haddad. Portanto, sem o instrumento, o governo não tem chance de alcançar a meta.

“Não pode a LDO, a pretexto de ressalvar despesas, exaurir referida base de tal maneira a impedir ou inviabilizar contingenciamento no montante previsto (...), ditado em função da política fiscal estipulada, a meta de resultado primário”, diz a nota.

O parecer faz ainda uma avaliação jurídica das normas - afinal, a lei que criou o arcabouço fiscal é uma lei complementar, assim como a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), sendo a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) apenas uma lei ordinária, inferior aos dois primeiros dispositivos legais.

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“Diante do exposto, o texto do substitutivo ao PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) 2024 não é compatível com o disposto na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e na LC nº 200/23 (lei do Arcabouço Fiscal), na medida em que afasta exigência expressa nas leis complementares (o cumprimento da meta). Essa situação pode, portanto, provocar questionamentos a respeito da execução do orçamento, trazendo insegurança jurídica sobre a atuação dos gestores da política fiscal”, afirma.

Em entrevista ao Estadão, concedida na última segunda-feira, 11, Forte tentou afastar a interpretação de que cedeu à ala pró-gasto da gestão Lula e disse que o governo pode adotar o contingenciamento que quiser - interpretação diferente da feita pela equipe técnica da Câmara.

“A emenda do Randolfe (Rodrigues, líder do governo no Congresso) impunha um contingenciamento de R$ 23 bilhões. A minha remete o governo à possibilidade de contingenciar R$ 23 bilhões, R$ 56 bilhões, zero ou mudar a meta fiscal. Agora, impõe a ele o respeito ao arcabouço fiscal. Se estiver dentro do arcabouço e da Lei de Responsabilidade Fiscal, aí é autonomia do governo (decidir o quanto vai contingenciar)”, disse.

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Gastos do Legislativo se tornam mais ‘contingenciáveis’

A redação feita por Forte, com a ampliação irrestrita de despesas que não podem ser contingenciadas, provocou um efeito colateral que ainda não chegou ao radar de parlamentares, mas que pode provocar dor de cabeça. Ao ressalvar um conjunto grande de despesas sem especificá-las, Forte acabou preservando as despesas do Executivo, fazendo com que os gastos do Legislativo e do Judiciário sejam passíveis de um bloqueio maior.

Antes da redação dele, a base contingenciável do governo era de R$ 205,9 bilhões. Caso fosse necessário bloquear, por hipótese, R$ 20 bilhões, o Executivo arcaria com R$ 19,9 bilhões da conta e os demais Poderes, com apenas R$ 100 milhões.

Com as ressalvas levantadas pelo relator, o Executivo não pode bloquear mais do que R$ 19,2 bilhões, empurrando para os demais Poderes um valor maior para contingenciar: R$ 800 milhões.

A nota técnica afirma que este valor é praticamente tudo o que os dois Poderes têm à disposição para se bloquear, ou seja, livre de obrigações rotineiras.

“Nessa situação, é possível antever que tais órgãos experimentarão dificuldades decorrentes da implementação de tais limites, especialmente na execução de investimentos programados para o próximo exercício”, afirma o parecer.

A nota diz ainda que o novo arcabouço não limita o contingenciamento a 25% das despesas discricionárias (não obrigatórias) - como vem sendo interpretado pelo governo e por economistas da área fiscal - e que a letra da lei diz apenas que o gestor não será punido se ficar nesse percentual.

O esclarecimento ocorre no momento em que cálculos de boa parte de analistas do mercado indicam que o contingenciamento teria que ser ainda maior do que os R$ 56 bilhões - o equivalente a 25% das despesas discricionárias.

Caso ele cumpra os 25% e não alcance a meta de déficit de zero, observam os técnicos, as medidas de correção de rota seriam acionadas automaticamente.

“Observe-se que o afastamento da punibilidade do agente que adotou medidas de limitação até o nível exigível (25% do montante de despesas discricionárias) não impede o acionamento automático das medidas de ajuste previstas no regime fiscal sustentável (vedação ao aumento/criação de novas despesas obrigatórias), cujo propósito é corrigir o desequilíbrio fiscal”, diz o parecer.

BRASÍLIA - O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias, Danilo Forte (União-CE), fez alterações ao texto da lei que, na prática, inviabilizam o uso de instrumento, pelo governo, para se chegar à meta de zerar o déficit nas contas públicas no ano que vem, avalia a equipe de técnicos da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof) da Câmara dos Deputados.

Isso porque o texto da LDO 2024 elaborado por Forte limita o contingenciamento (bloqueio preventivo de despesas) máximo no Orçamento do ano que vem a R$ 22,3 bilhões, segundo diagnóstico da Conof.

Para alcançar a meta traçada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o governo teria de fazer um bloqueio bem mais elevado, de no mínimo R$ 56 bilhões, segundo os técnicos da Câmara - o que pode afetar o andamento de projetos como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e o Minha Casa Minha Vida.

O novo parecer da Conof, concluído nesta terça-feira, 12 e a que o Estadão teve acesso, foi encomendado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), que embora vice-líder e integrante da base de apoio do governo no Congresso, vem vocalizando insatisfação com a condução da política fiscal da gestão Lula. Ele requisitou ainda um parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), tendo em vista o risco fiscal e jurídico embutidos na medida.

“Estamos vendo sucessivas tentativas por parte do governo de alargar o entendimento do arcabouço fiscal para gastar mais. Além de isso ser ruim do ponto de vista fiscal, o governo entra em uma nuvem de riscos jurídicos e que podem recair em ilegalidade”, afirma. A previsão é que o relatório da LDO seja votado na tarde desta quarta-feira, 13.

O compromisso firmado por Haddad está sob forte bombardeio no seu partido, o PT, e no próprio governo. Nesta terça, 12, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse não ver problemas em aumentar o endividamento público para fazer o País crescer, ignorando o efeito que isso provoca no aumento da taxa de juros e, consequentemente, na atividade econômica.

O relator da LDO 2024, Danilo Forte (União-CE) Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Durante as discussões que antecederam a apresentação do relatório de Forte, o governo tentou emplacar uma proposta que ia na mesma linha, com a interpretação de que a lei que criou o arcabouço fiscal, nova regra para controle das contas públicas, obriga o Executivo a ampliar o gasto público anualmente dentro de um intervalo que varia entre 0,6% e 2,5% acima da inflação. Dessa forma, para cumprir o mínimo (0,6%), não seria possível contingenciar mais do R$ 22,3 bilhões.

O argumento foi rejeitado por Forte, que usou um parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) e um anterior, feito pelos técnicos da Câmara, para sustentar que a proposta padecia de “fragilidade jurídica”.

No entanto, apesar de rejeitar a emenda proposta pelo governo, ao redigir o seu texto, Forte também acabou limitando o contingenciamento, atendendo à ala do governo que não endossa o compromisso de Fernando Haddad. Ou seja: a formatação legal é distinta, mas o efeito prático é idêntico.

No seu texto, Forte amplia indiscriminadamente as despesas que não podem ser contingenciadas - o que, na prática, inviabiliza o instrumento. Do total de R$ 225,8 bilhões em despesas passíveis de bloqueio, ele criou ressalvas sobre 90% delas (R$ 203 bilhões). Dessa forma, o governo não poderia contingenciar mais do R$ 22,3 bilhões.

A nota técnica da Câmara sublinha que o bloqueio de despesas não é um fim em si mesmo e tem como objetivo o cumprimento da meta fiscal, estabelecida em zero pelo ministro Haddad. Portanto, sem o instrumento, o governo não tem chance de alcançar a meta.

“Não pode a LDO, a pretexto de ressalvar despesas, exaurir referida base de tal maneira a impedir ou inviabilizar contingenciamento no montante previsto (...), ditado em função da política fiscal estipulada, a meta de resultado primário”, diz a nota.

O parecer faz ainda uma avaliação jurídica das normas - afinal, a lei que criou o arcabouço fiscal é uma lei complementar, assim como a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), sendo a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) apenas uma lei ordinária, inferior aos dois primeiros dispositivos legais.

“Diante do exposto, o texto do substitutivo ao PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) 2024 não é compatível com o disposto na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e na LC nº 200/23 (lei do Arcabouço Fiscal), na medida em que afasta exigência expressa nas leis complementares (o cumprimento da meta). Essa situação pode, portanto, provocar questionamentos a respeito da execução do orçamento, trazendo insegurança jurídica sobre a atuação dos gestores da política fiscal”, afirma.

Em entrevista ao Estadão, concedida na última segunda-feira, 11, Forte tentou afastar a interpretação de que cedeu à ala pró-gasto da gestão Lula e disse que o governo pode adotar o contingenciamento que quiser - interpretação diferente da feita pela equipe técnica da Câmara.

“A emenda do Randolfe (Rodrigues, líder do governo no Congresso) impunha um contingenciamento de R$ 23 bilhões. A minha remete o governo à possibilidade de contingenciar R$ 23 bilhões, R$ 56 bilhões, zero ou mudar a meta fiscal. Agora, impõe a ele o respeito ao arcabouço fiscal. Se estiver dentro do arcabouço e da Lei de Responsabilidade Fiscal, aí é autonomia do governo (decidir o quanto vai contingenciar)”, disse.

Gastos do Legislativo se tornam mais ‘contingenciáveis’

A redação feita por Forte, com a ampliação irrestrita de despesas que não podem ser contingenciadas, provocou um efeito colateral que ainda não chegou ao radar de parlamentares, mas que pode provocar dor de cabeça. Ao ressalvar um conjunto grande de despesas sem especificá-las, Forte acabou preservando as despesas do Executivo, fazendo com que os gastos do Legislativo e do Judiciário sejam passíveis de um bloqueio maior.

Antes da redação dele, a base contingenciável do governo era de R$ 205,9 bilhões. Caso fosse necessário bloquear, por hipótese, R$ 20 bilhões, o Executivo arcaria com R$ 19,9 bilhões da conta e os demais Poderes, com apenas R$ 100 milhões.

Com as ressalvas levantadas pelo relator, o Executivo não pode bloquear mais do que R$ 19,2 bilhões, empurrando para os demais Poderes um valor maior para contingenciar: R$ 800 milhões.

A nota técnica afirma que este valor é praticamente tudo o que os dois Poderes têm à disposição para se bloquear, ou seja, livre de obrigações rotineiras.

“Nessa situação, é possível antever que tais órgãos experimentarão dificuldades decorrentes da implementação de tais limites, especialmente na execução de investimentos programados para o próximo exercício”, afirma o parecer.

A nota diz ainda que o novo arcabouço não limita o contingenciamento a 25% das despesas discricionárias (não obrigatórias) - como vem sendo interpretado pelo governo e por economistas da área fiscal - e que a letra da lei diz apenas que o gestor não será punido se ficar nesse percentual.

O esclarecimento ocorre no momento em que cálculos de boa parte de analistas do mercado indicam que o contingenciamento teria que ser ainda maior do que os R$ 56 bilhões - o equivalente a 25% das despesas discricionárias.

Caso ele cumpra os 25% e não alcance a meta de déficit de zero, observam os técnicos, as medidas de correção de rota seriam acionadas automaticamente.

“Observe-se que o afastamento da punibilidade do agente que adotou medidas de limitação até o nível exigível (25% do montante de despesas discricionárias) não impede o acionamento automático das medidas de ajuste previstas no regime fiscal sustentável (vedação ao aumento/criação de novas despesas obrigatórias), cujo propósito é corrigir o desequilíbrio fiscal”, diz o parecer.

BRASÍLIA - O relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias, Danilo Forte (União-CE), fez alterações ao texto da lei que, na prática, inviabilizam o uso de instrumento, pelo governo, para se chegar à meta de zerar o déficit nas contas públicas no ano que vem, avalia a equipe de técnicos da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (Conof) da Câmara dos Deputados.

Isso porque o texto da LDO 2024 elaborado por Forte limita o contingenciamento (bloqueio preventivo de despesas) máximo no Orçamento do ano que vem a R$ 22,3 bilhões, segundo diagnóstico da Conof.

Para alcançar a meta traçada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o governo teria de fazer um bloqueio bem mais elevado, de no mínimo R$ 56 bilhões, segundo os técnicos da Câmara - o que pode afetar o andamento de projetos como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e o Minha Casa Minha Vida.

O novo parecer da Conof, concluído nesta terça-feira, 12 e a que o Estadão teve acesso, foi encomendado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), que embora vice-líder e integrante da base de apoio do governo no Congresso, vem vocalizando insatisfação com a condução da política fiscal da gestão Lula. Ele requisitou ainda um parecer do Tribunal de Contas da União (TCU), tendo em vista o risco fiscal e jurídico embutidos na medida.

“Estamos vendo sucessivas tentativas por parte do governo de alargar o entendimento do arcabouço fiscal para gastar mais. Além de isso ser ruim do ponto de vista fiscal, o governo entra em uma nuvem de riscos jurídicos e que podem recair em ilegalidade”, afirma. A previsão é que o relatório da LDO seja votado na tarde desta quarta-feira, 13.

O compromisso firmado por Haddad está sob forte bombardeio no seu partido, o PT, e no próprio governo. Nesta terça, 12, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse não ver problemas em aumentar o endividamento público para fazer o País crescer, ignorando o efeito que isso provoca no aumento da taxa de juros e, consequentemente, na atividade econômica.

O relator da LDO 2024, Danilo Forte (União-CE) Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Durante as discussões que antecederam a apresentação do relatório de Forte, o governo tentou emplacar uma proposta que ia na mesma linha, com a interpretação de que a lei que criou o arcabouço fiscal, nova regra para controle das contas públicas, obriga o Executivo a ampliar o gasto público anualmente dentro de um intervalo que varia entre 0,6% e 2,5% acima da inflação. Dessa forma, para cumprir o mínimo (0,6%), não seria possível contingenciar mais do R$ 22,3 bilhões.

O argumento foi rejeitado por Forte, que usou um parecer do Tribunal de Contas da União (TCU) e um anterior, feito pelos técnicos da Câmara, para sustentar que a proposta padecia de “fragilidade jurídica”.

No entanto, apesar de rejeitar a emenda proposta pelo governo, ao redigir o seu texto, Forte também acabou limitando o contingenciamento, atendendo à ala do governo que não endossa o compromisso de Fernando Haddad. Ou seja: a formatação legal é distinta, mas o efeito prático é idêntico.

No seu texto, Forte amplia indiscriminadamente as despesas que não podem ser contingenciadas - o que, na prática, inviabiliza o instrumento. Do total de R$ 225,8 bilhões em despesas passíveis de bloqueio, ele criou ressalvas sobre 90% delas (R$ 203 bilhões). Dessa forma, o governo não poderia contingenciar mais do R$ 22,3 bilhões.

A nota técnica da Câmara sublinha que o bloqueio de despesas não é um fim em si mesmo e tem como objetivo o cumprimento da meta fiscal, estabelecida em zero pelo ministro Haddad. Portanto, sem o instrumento, o governo não tem chance de alcançar a meta.

“Não pode a LDO, a pretexto de ressalvar despesas, exaurir referida base de tal maneira a impedir ou inviabilizar contingenciamento no montante previsto (...), ditado em função da política fiscal estipulada, a meta de resultado primário”, diz a nota.

O parecer faz ainda uma avaliação jurídica das normas - afinal, a lei que criou o arcabouço fiscal é uma lei complementar, assim como a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), sendo a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) apenas uma lei ordinária, inferior aos dois primeiros dispositivos legais.

“Diante do exposto, o texto do substitutivo ao PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) 2024 não é compatível com o disposto na LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) e na LC nº 200/23 (lei do Arcabouço Fiscal), na medida em que afasta exigência expressa nas leis complementares (o cumprimento da meta). Essa situação pode, portanto, provocar questionamentos a respeito da execução do orçamento, trazendo insegurança jurídica sobre a atuação dos gestores da política fiscal”, afirma.

Em entrevista ao Estadão, concedida na última segunda-feira, 11, Forte tentou afastar a interpretação de que cedeu à ala pró-gasto da gestão Lula e disse que o governo pode adotar o contingenciamento que quiser - interpretação diferente da feita pela equipe técnica da Câmara.

“A emenda do Randolfe (Rodrigues, líder do governo no Congresso) impunha um contingenciamento de R$ 23 bilhões. A minha remete o governo à possibilidade de contingenciar R$ 23 bilhões, R$ 56 bilhões, zero ou mudar a meta fiscal. Agora, impõe a ele o respeito ao arcabouço fiscal. Se estiver dentro do arcabouço e da Lei de Responsabilidade Fiscal, aí é autonomia do governo (decidir o quanto vai contingenciar)”, disse.

Gastos do Legislativo se tornam mais ‘contingenciáveis’

A redação feita por Forte, com a ampliação irrestrita de despesas que não podem ser contingenciadas, provocou um efeito colateral que ainda não chegou ao radar de parlamentares, mas que pode provocar dor de cabeça. Ao ressalvar um conjunto grande de despesas sem especificá-las, Forte acabou preservando as despesas do Executivo, fazendo com que os gastos do Legislativo e do Judiciário sejam passíveis de um bloqueio maior.

Antes da redação dele, a base contingenciável do governo era de R$ 205,9 bilhões. Caso fosse necessário bloquear, por hipótese, R$ 20 bilhões, o Executivo arcaria com R$ 19,9 bilhões da conta e os demais Poderes, com apenas R$ 100 milhões.

Com as ressalvas levantadas pelo relator, o Executivo não pode bloquear mais do que R$ 19,2 bilhões, empurrando para os demais Poderes um valor maior para contingenciar: R$ 800 milhões.

A nota técnica afirma que este valor é praticamente tudo o que os dois Poderes têm à disposição para se bloquear, ou seja, livre de obrigações rotineiras.

“Nessa situação, é possível antever que tais órgãos experimentarão dificuldades decorrentes da implementação de tais limites, especialmente na execução de investimentos programados para o próximo exercício”, afirma o parecer.

A nota diz ainda que o novo arcabouço não limita o contingenciamento a 25% das despesas discricionárias (não obrigatórias) - como vem sendo interpretado pelo governo e por economistas da área fiscal - e que a letra da lei diz apenas que o gestor não será punido se ficar nesse percentual.

O esclarecimento ocorre no momento em que cálculos de boa parte de analistas do mercado indicam que o contingenciamento teria que ser ainda maior do que os R$ 56 bilhões - o equivalente a 25% das despesas discricionárias.

Caso ele cumpra os 25% e não alcance a meta de déficit de zero, observam os técnicos, as medidas de correção de rota seriam acionadas automaticamente.

“Observe-se que o afastamento da punibilidade do agente que adotou medidas de limitação até o nível exigível (25% do montante de despesas discricionárias) não impede o acionamento automático das medidas de ajuste previstas no regime fiscal sustentável (vedação ao aumento/criação de novas despesas obrigatórias), cujo propósito é corrigir o desequilíbrio fiscal”, diz o parecer.

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