BRASÍLIA - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central começa nesta terça-feira, 10, sua reunião para definir a nova taxa de juros sob enorme pressão. Desde a última reunião, em novembro, quando a taxa Selic subiu de 10,75% para 11,25% ao ano, todas as variáveis usadas pela autoridade para conduzir os juros pioraram. Se antes uma alta de 0,5 ponto porcentual no juro era praticamente unanimidade, hoje a expectativa do mercado é de aumento de 0,75 ponto - e uma alta ainda maior, de 1 ponto porcentual, não seria surpresa para ninguém.
A disparada do dólar para acima de R$ 6,00 após a frustração do mercado com o pacote de corte de gastos do governo é o principal retrato da deterioração do cenário. A desancoragem das expectativas se aprofundou. A mediana do mercado financeiro para a inflação no segundo trimestre de 2026, o horizonte que é levado em conta na política monetária, saltou de 3,86% para 4,16%, ante os 3,60% esperados pelo BC. Essa piora já incorpora uma trajetória muito mais alta para a Selic no relatório Focus, do BC, já que a projeção de juro ao final do ciclo de alta subiu de 12,5% para 13,75% nos últimos 45 dias.
Ao mesmo tempo, dados correntes também se mostram mais desafiadores para o BC. A atividade econômica continuou resiliente, com crescimento de 0,9% do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre e queda do desemprego à mínima histórica de 6,2%. Na última leitura de inflação, divulgada nesta terça-feira, o IPCA acumulado em 12 meses acelerou para 4,87%.
A combinação desses fatores deve levar a um novo aumento das projeções de inflação do Comitê, o que reforça a necessidade de intensificação do ritmo de alta dos juros e endurecimento da comunicação. O Goldman Sachs, por exemplo, espera elevação das estimativas do BC para o IPCA de 2024 (4,6% para 4,8%), 2025 (3,9% para 4,2%) e do segundo trimestre de 2026 (3,6% para 3,7%).
“Quando passamos parágrafo por parágrafo do comunicado da reunião passada, o que chama atenção é que tudo piorou”, diz o economista-chefe da Oriz Partners, Marcos de Marchi. “Olhando para o balanço de riscos do BC, a desancoragem aumentou, a resiliência da inflação piorou, e a taxa de câmbio, nem se fala. O BC já tinha dito que tudo isso demanda uma política monetária mais contracionista.”
Marchi espera que o Copom intensifique o ritmo de aperto monetário, com alta de 0,75 ponto porcentual na Selic nesta quarta-feira, 11 - em linha com as medianas do relatório Focus e da mais recente pesquisa Projeções Broadcast. A opção por 0,75, em vez de 1 ponto, estaria em linha com as preferências desenhadas na última ata, quando o Comitê pregou a necessidade de “maior cautela na condução da política monetária doméstica”, afirma.
Na mesma linha, o economista-chefe da EQI Investimentos, Stephan Kautz, afirma que a opção por um aumento de 0,75 ponto parece mais adequada diante das incertezas do cenário. A tramitação do pacote de ajuste fiscal no Congresso e as dúvidas sobre a política econômica americana, após a eleição do republicano Donald Trump para a presidência do país, demandam uma posição mais cautelosa, ele afirma.
A economista-chefe da consultoria Buysidebrazil, Andrea Damico, por sua vez, avalia que a piora do cenário já é suficiente para justificar aceleração do ritmo de aperto para 1 ponto porcentual. Ela destaca que, na comparação interanual, a demanda doméstica cresceu 5,7% no PIB do terceiro trimestre, demonstrando resiliência maior da atividade econômica. Além disso, o cenário externo piorou desde a última reunião. Aqui, as incertezas fiscais cresceram.
“Ao invés de termos um choque positivo no fiscal, veio um choque negativo. E o próprio Galípolo (Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária e próximo presidente do BC) e o Roberto Campos Neto (atual presidente do BC) falaram que, independentemente da política fiscal ou dos resultados fiscais propriamente ditos, o BC levaria em conta para a tomada de decisão o impacto do fiscal nos ativos”, ela diz.
Nesta segunda-feira, 9, o Itaú anunciou a revisão na sua estimativa para a taxa Selic na reunião do Copom desta quarta-feira. O banco elevou sua projeção de alta de 0,75 ponto porcentual para 1 ponto. “Tal decisão, unânime, seria justificada pela piora do cenário base e das projeções de inflação, com um balanço de riscos ainda assimétrico para cima, que levam à necessidade de avançar mais em território contracionista”, afirma a equipe de Macroeconomia, liderada pelo economista-chefe Mario Mesquita.
Comunicação
Diante da piora generalizada do cenário, todos os analistas concordam que o BC deve endurecer a comunicação nesta quarta-feira, especialmente no que diz respeito ao ritmo da atividade e ao comportamento das expectativas. Mesmo assim, avaliam que o trecho do último comunicado sobre a política fiscal - quando o Copom destacou a importância de uma “política fiscal crível e comprometida com a sustentabilidade da dívida, com a apresentação e execução de medidas estruturais para o orçamento fiscal” - pouco deve mudar.
“Se for para pensar em um parágrafo que tende a mexer muito pouco no comunicado, seria esse. O BC não vai adjetivar, não vai falar se foi ruim, se foi bom. Ele deve ir aos fatos, falando que o cenário está atrapalhando ainda mais a desancoragem”, diz Marchi, da Oriz.
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Kautz, da EQI, também espera a manutenção desse trecho no comunicado, inclusive por causa da tramitação do pacote fiscal no Congresso. “Faz sentido manter esse aviso, essa preocupação, até pela maneira como o mercado reagiu e o ceticismo que existe sobre a capacidade de implementar, sobre se serão necessárias novas medidas”, explica o analista.
Para Damico, da Buysidebrazil, algum endurecimento do tom sobre o fiscal deve ser esperado, mesmo que falando do comportamento dos ativos. “Deve ser um comunicado muito duro, para minimamente justificar essa aceleração, e também para tentar ancorar, porque estamos num momento muito crítico do regime de metas. É um momento em que qualquer deslize pode custar muito.”
Segundo o Itaú, para a reunião seguinte, o Copom deve afirmar que antevê um novo ajuste de 1 ponto. Além disso, a expectativa é de indicação de manutenção da taxa básica em patamar contracionista pelo tempo necessário, diante da piora das projeções e do balanço de riscos, além da possibilidade de desancoragem adicional das expectativas, considerando o firme compromisso no processo de convergência da inflação à meta. “Com esse contexto, acreditamos que a taxa terminal (ao fim do ciclo de alta) deve ser maior que nossa atual projeção de 13,50% ao ano”, diz o banco.