O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central poderá surpreender o mercado amanhã, ao se dividir na votação para a redução da taxa de juros que referenciará a economia pelos próximos 45 dias. É o que prevê o ex-secretário de Indústria e Comércio e Diretor de Programas do Ministério da Economia e atual economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale, em entrevista ao Estadão/Broadcast.
No mercado, segundo o economista, as previsões refletem dissenso no Copom, com alguns, inclusive ele, esperando corte de 0,25 ponto porcentual, mas com uma parte do colegiado votando ainda por mais um corte de 0,50 ponto porcentual. “Tem opiniões para todos os lados”, reforça o economista da XP.
Se a expectativa de Megale for sancionada, será a primeira divisão desde agosto de 2023, quando o comitê decidiu, por 5 votos a 4, reduzir a Selic em 0,5 ponto porcentual.
Megale diz não ver a tragédia climática do Rio Grande do Sul impactando muito a inflação e o fiscal e defende que se ajude rapidamente o Estado, cujo valor para sua reconstrução será menor que o Perse e as emendas parlamentares. “Só precisamos tomar cuidado para não repetir 2008, quando a crise se tornou pretexto para gastos que tiraram o fiscal dos trilhos”, alertou.
Sobre a mudança do outlook da dívida soberana do Brasil de neutro para positivo pela Moody’s, Megale diz se tratar de medida que considera o passado e que pouco olha para o cenário prospectivo.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
Diante das mudanças ocorridas do último Copom para cá, o que esperar do colegiado nesta quarta?
Vai ser um Copom divertido, que vai surpreender o mercado. Tem opiniões para todos os lados. Tem gente que acha que será 0,25 ponto dividido, outros que será unânime e tem os que acham que será 0,50 ponto porcentual unânime e com divisão.
E o que vocês da XP Investimentos esperam?
Estávamos com 0,50 ponto e em algum momento o cenário se estressou com a possibilidade de alta de juro nos EUA, o que mudou a perspectiva para a taxa de câmbio com o real se desvalorizando e mudanças das metas fiscais. Mas não foi o que vimos. A demanda continua aquecida, levando a inflação (na Focus) para perto de 4%. Diante disso, achamos que o BC pode desacelerar os cortes para 0,25 ponto porcentual até chegar à taxa terminal de 10% ao ano. Esperamos 0,25 pp. dividido amanhã e mais três cortes de igual magnitude, mas com consenso para nos próximos Copoms.
A ajuda que o Executivo quer dar para o Rio Grande do Sul pode afetar o fiscal?
A tragédia climática do Rio Grande do Sul pode bater na inflação, já que o Estado é grande produtor de arroz, por exemplo, mas o IBGE diz que, por enquanto, não tem nem como medir a inflação por lá. Quanto ao fiscal, a situação lá é tão dramática que os gastos não vão influenciá-lo. O Estado precisa de R$ 10 bilhões para ser reconstruído. Isso é menor que o Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos) e bem menor que as emendas parlamentares, de R$ 50 bilhões. Não é nada, tem que fazer o que precisa ser feito.
Mas há no governo receio de que a ajuda ao RS se torne um pretexto para mais pedidos de gastos.
O governo está conduzindo muito bem isso, cuidando para que se façam os créditos só para o Rio Grande do Sul. Está certo. Não podemos deixar que se repita 2008, quando o fiscal saiu dos trilhos sob o pretexto de que a crise, que nem nos afetava tanto, justificava os gastos feitos.
Como o senhor viu a mudança do outlook da dívida soberana do Brasil de neutro para positivo pela Moody’s?
Achei que a Moody’s usou como justificativas coisas que já aconteceram. Não teve nada de prospectivo na decisão dela. Me pareceu um movimento atrasado para corrigir coisas lá de trás. Quando olhamos para o futuro, vemos o fiscal piorar e a demanda por gastos crescendo. O cenário está muito incerto. Até por isso que achamos que o BC vai reduzir o tamanho do corte do juro.
Neste cenário com a Selic passando a cair 0,25 ponto até 10%, o senhor vê uma estratégia do Campos Neto para deixar o cenário azeitado para o próximo presidente do BC?
Eu acho que sim. Ele se compromete com menos cortes agora e mantém aberto o espaço para o próximo presidente cortar juros se preciso for ou parar. Para mim, passa pela cabeça do Campos Neto evitar o risco de exagerar nos cortes e depois, eventualmente, ter de elevar. Tem de ficar muito de olho também na volatilidade externa, porque a cada dado de inflação que sai nos EUA o mercado aqui reage.
Em sua opinião, a que justificativas recorrerão os diretores do Copom que, virtualmente, votarão pelo corte de 0,5 pp. da Selic?
Na cabeça deles, a inflação está boa, o câmbio foi para cima, mas voltou, a Petrobras vai pagar dividendos. Será que as coisas mudaram tanto do Copom de 0,50 lá atrás para reduzir agora o corte para 0,25pp? Eu acho que vai ter diretor votando pelo corte de 0,50 ponto.