Cinema crescerá 32% ao ano no Brasil, mas faturamento pré-pandemia só voltará em 2026, diz estudo


Plataformas de streaming de vídeo deverão crescer 9,8% ao ano no País, movimentando cadeia de negócios do setor de audiovisual, mostra estudo global da consultoria sobre setor de mídia e entretenimento

Por Vinicius Neder

RIO – Após passar pelo olho do furacão da covid-19, o setor do audiovisual brasileiro pode estar diante de uma oportunidade de crescimento a partir do ano que vem. Segundo dados de um estudo da consultoria PwC, ao qual o Estadão teve acesso, o cinema nacional deverá registrar uma taxa anual de crescimento de 32,1% de 2022 a 2026, enquanto a estimativa de crescimento anual para o mercado de streaming é de 9,8%, no mesmo período.

Embora a pandemia tenha virado o setor de audiovisual de cabeça para baixo, e o cenário ainda seja marcado por incertezas em relação à sustentabilidade de novos modelos de negócios, o otimismo se justifica por uma combinação de perspectiva de aumento da demanda, capacidade de oferta de qualidade por uma cadeia diversificada de produção, a existência de um grande ator de mercado nacional, a Globo, e até a perspectiva de uma retomada das políticas públicas de incentivo, com a mudança do governo federal.

Sala do cinema do Reserva Cultural, em São Paulo, logo no início da pandemia de covid-19, em 2020 Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 16/3/2020
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Não é um mar de rosas. Mesmo com o crescimento anual projetado na Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia 2022-2026, da PwC, o cinema brasileiro voltaria aos níveis de antes da pandemia apenas em 2026, quando a receita da atividade chegaria a US$ 681 milhões (R$ 3,5 bilhões, pelo câmbio atual). Em 2022, essa receita deverá ficar em R$ 404 milhões (R$ 2,1 bilhões). Mesmo assim, para 2026, a PwC estima um total de 191 milhões de ingressos de cinema vendidos, abaixo dos 206 milhões de 2019.

No pós-pandemia, essa retomada se dará num mercado diferente. As plataformas de streaming, que experimentaram um boom na demanda em 2020, auge do isolamento social provocado pela covid-19, e em 2021, investiram bilhões para conquistar assinantes, o que inclui o aumento frenético da oferta de conteúdo. É uma demanda crescente para produtoras e distribuidoras de audiovisual.

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Para Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, as oportunidades para a cadeia de negócios do setor de audiovisual no País surgirão no meio termo entre o roteiro de filme de catástrofe que se ensaiava com o vazio das salas de cinema em 2020, o que atrasou produções, filmagens e lançamentos, e a euforia dos investimentos aparentemente ilimitados das plataformas de streaming. O País disputa a posição de segundo ou terceiro maior mercado de streaming do mundo, disse o executivo.

O número de espectadores de cinema pode sofrer uma redução estrutural, que veio para ficar, mas isso não significa o fim das salas. Os grandes estúdios produtores de filmes chegaram a apostar em lançamentos simultâneos nos cinemas e nas plataformas de streaming. Novos atores, com destaque para a Netflix, apostaram suas fichas em produções de olho nas tradicionais premiações do cinema, como o Oscar. Agora, a estratégia dos lançamentos simultâneos parece estar sendo deixada de lado.

Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, acha que a pandemia reforçou a vontade dos espectadores de ir ao cinema, ainda que com menor frequência Foto: Divulgação/PwC
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“As experiencias durante a pandemia nunca vão permitir que a gente volte a ser o que era. Aprendemos bastante coisa. Inclusive, que a experiencia presencial é insubstituível”, afirma Queiroz, ao explicar porque as plataformas de streaming talvez não consigam substituir totalmente a experiencia imersiva das salas de cinema.

Por outro lado, a combinação de mídia, entretenimento e tecnologia coloca em xeque o modelo de negócios dos estúdios de cinema e dos canais de televisão, mas não parece oferecer alternativas claramente sustentáveis. Não faltaram sinais de alerta recentemente. O relatório da PwC lembra que a Discovery desistiu de um investimento de US$ 300 milhões na CNN+, apenas três semanas após o lançamento.

E o alerta mais notório veio em abril deste ano, quando a Netflix anunciou que o número de assinantes da plataforma caiu em 200 mil no primeiro trimestre, a primeira queda em 11 anos. A empresa colocou a culpa no aperto dos orçamentos das famílias, por causa da disparada da inflação em todo o mundo, provocadas pela crise da covid-19 e pela guerra na Ucrânia, mas as dúvidas pairam mesmo é sobre a capacidade de a receita com assinaturas ser suficiente para cobrir os elevados custos de produção e ainda sobrar lucros.

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Concorrência acirrada

Queiroz, da PwC, lembra que, “quando descobriu o oceano azul” do streaming de vídeo, a Netflix era apenas um “repositório”, um meio de levar o conteúdo ao consumidor final – no percurso para chegar lá, a empresa levou à falência a Blockbuster, mais famosa rede de locadoras de vídeos e DVDs do mundo até o início dos anos 2000.

Só que os estúdios de cinema e televisão entenderam que a Netflix ganhava dinheiro com o conteúdo produzido por eles. Essas companhias, algumas gigantes com elevada capacidade financeira, correram para lançar suas plataformas de streaming. Lançada em novembro de 2019, nos Estados Unidos, e, em 2020, no Brasil, a plataforma Disney+, do estúdio homônimo, seguia crescendo o número de assinantes no terceiro trimestre deste ano.

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Em 2021, estreou a plataforma Paramount Plus. No mesmo ano, a Warner Media – dona dos canais CNN, HBO, TNT e do estúdio de cinema Warner Bros. –, controlada pela gigante americana das telecomunicações AT&T, anunciou a fusão com a Discovery. O presidente da AT&T, John Stankey, citou “as oportunidades de streaming direto para o consumidor” para defender o negócio.

A Netflix também enfrenta a concorrência com empresas cujas capacidades bilionárias de investimentos nas produções próprias parecem almejar menos as receitas com assinatura e mais a atração de consumidores dispostos a gastar em outras coisas, como a Apple TV e a Amazon Prime Video. A gigante americana do comércio eletrônico e da tecnologia confirmou no início deste ano a compra do estúdio de cinema MGM, por US$ 8,45 bilhões, de olho no imenso e tradicional acervo de filmes, com foco no streaming. Como reação, a Netflix decidiu apostar em mensalidades mais baratas, combinadas com publicidade.

Para Queiroz, ainda é cedo para dizer se a nova estratégia dará certo, mas o ponto é que “ninguém vai assinar dez plataformas diferentes”. “Nos Estados Unidos, o consumidor pode assinar três ou quatro. No Brasil, podem ser duas”, disse o sócio da PwC.

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Conteúdo local

Mesmo assim, a necessidade de esses novos atores do mercado audiovisual investirem na produção de conteúdo local se mantém, conforme o relatório da consultoria. E nisso o Brasil se destaca, pois tem oferta de conteúdo local.

O destaque é o grupo Globo, numa posição mais parecida com a dos grandes estúdios, combinando vasto acerto de obras com capacidade de investimento em novas produções. Segundo o relatório da PwC, a Globo anunciou investimento de R$ 1 bilhão no Globoplay, como parte da estratégia “Uma Só Globo”, de unificar marcas e canais. Em 2021, o Globoplay registrou um salto de 42% no número de assinantes, informou a consultoria no estudo. Conforme Queiroz, o Globoplay cresce mais do que a Netflix no País por causa do conteúdo local.

A demanda por mais produções movimenta os negócios no setor, disse Sabrina Nudeliman, presidente da Elo Company, empresa que começou em 2005 como distribuidora de filmes e hoje também produz. A distribuidora tem no portfólio em torno de 500 títulos distribuídos desde então, incluindo o sucesso internacional com a animação O Menino e o Mundo e, mais recentemente, o sucesso nacional com o longa-metragem Medida Provisória, dirigido por Lázaro Ramos.

Sabrina Nudeliman, presidente da distribuidora e produtora Elo Company, está otimista sobre 2023, quando a empresa lançará 14 filmes nas salas de cinema do País Foto: Werther Santana/Estadão - 8/4/2019

A Elo Company projeta um crescimento de oito vezes na receita para 2023, em boa parte por causa da recuperação das perdas com os anos de pandemia, disse Nudeliman. Catorze filmes serão lançados pela distribuidora. A executiva vê um ciclo virtuoso de recuperação. Além da retomada de produções e lançamentos adiados pela pandemia, há novos investimentos.

Se os aportes mais pesados das grandes plataformas de streaming, como Netflix e Amazon Prime Video, acabam demandando as produtoras de grande porte do País, a perspectiva de retomada das políticas públicas de incentivo é uma esperança para obras alternativas e de menor orçamento, tocada por produtoras menores.

Para Nudeliman, as mudanças trazidas pela pandemia trazem oportunidades em diferentes canais. Se antes da covid-19, se montava uma estratégia de distribuição mirando um público de 2 milhões de espectadores no cinema, agora, o trabalho passa a apostar em 500 mil. A divulgação passa pelas redes sociais e pode ser regionalizada. Embora a situação econômica pese sobre a demanda – afinal, o ingresso é caro perante a renda média nacional –, no pós-pandemia, o afeto ou o engajamento provocado pela narrativa audiovisual ganharam peso na decisão de ir ao cinema.

“O consumidor quer algo além. O que faz valer a pena sair de casa?”, questiona a presidente da Elo Company.

No caso de Medida Provisória, a aposta foi de que o engajamento em torno da narrativa distópica sobre a questão racial poderia tirar o filme do nicho de arte ou alternativo e atingir um público mais amplo. O lançamento envolveu ações nas redes sociais e no Big Brother Brasil. Com 480 mil espectadores, o filme de Lázaro Ramos foi sucesso de bilheteria. Segundo a Elo Company, o longa estreou em abril, em 250 salas de todo o País. Na segunda semana de exibição, passou a ocupar 338 salas. Entre abril e junho, foi o filme brasileiro mais assistido nos cinemas.

Nesse cenário, a executiva vê também espaço para atrair mais recursos de patrocínio para a produção e a distribuição de filmes e séries. Companhias em geral estão, segundo Nudeliman, atentas a oportunidades de associar suas marcas a histórias que provoquem afeto ou engajamento em seus consumidores, independentemente de incentivo fiscal ao patrocínio. O objetivo não é apenas incluir as marcas na lista de “apoios” no crédito dos filmes. Na fase de distribuição de Medida Provisória, sete marcas entraram com patrocínio em diferentes formados, disse Nudeliman.

RIO – Após passar pelo olho do furacão da covid-19, o setor do audiovisual brasileiro pode estar diante de uma oportunidade de crescimento a partir do ano que vem. Segundo dados de um estudo da consultoria PwC, ao qual o Estadão teve acesso, o cinema nacional deverá registrar uma taxa anual de crescimento de 32,1% de 2022 a 2026, enquanto a estimativa de crescimento anual para o mercado de streaming é de 9,8%, no mesmo período.

Embora a pandemia tenha virado o setor de audiovisual de cabeça para baixo, e o cenário ainda seja marcado por incertezas em relação à sustentabilidade de novos modelos de negócios, o otimismo se justifica por uma combinação de perspectiva de aumento da demanda, capacidade de oferta de qualidade por uma cadeia diversificada de produção, a existência de um grande ator de mercado nacional, a Globo, e até a perspectiva de uma retomada das políticas públicas de incentivo, com a mudança do governo federal.

Sala do cinema do Reserva Cultural, em São Paulo, logo no início da pandemia de covid-19, em 2020 Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 16/3/2020

Não é um mar de rosas. Mesmo com o crescimento anual projetado na Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia 2022-2026, da PwC, o cinema brasileiro voltaria aos níveis de antes da pandemia apenas em 2026, quando a receita da atividade chegaria a US$ 681 milhões (R$ 3,5 bilhões, pelo câmbio atual). Em 2022, essa receita deverá ficar em R$ 404 milhões (R$ 2,1 bilhões). Mesmo assim, para 2026, a PwC estima um total de 191 milhões de ingressos de cinema vendidos, abaixo dos 206 milhões de 2019.

No pós-pandemia, essa retomada se dará num mercado diferente. As plataformas de streaming, que experimentaram um boom na demanda em 2020, auge do isolamento social provocado pela covid-19, e em 2021, investiram bilhões para conquistar assinantes, o que inclui o aumento frenético da oferta de conteúdo. É uma demanda crescente para produtoras e distribuidoras de audiovisual.

Para Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, as oportunidades para a cadeia de negócios do setor de audiovisual no País surgirão no meio termo entre o roteiro de filme de catástrofe que se ensaiava com o vazio das salas de cinema em 2020, o que atrasou produções, filmagens e lançamentos, e a euforia dos investimentos aparentemente ilimitados das plataformas de streaming. O País disputa a posição de segundo ou terceiro maior mercado de streaming do mundo, disse o executivo.

O número de espectadores de cinema pode sofrer uma redução estrutural, que veio para ficar, mas isso não significa o fim das salas. Os grandes estúdios produtores de filmes chegaram a apostar em lançamentos simultâneos nos cinemas e nas plataformas de streaming. Novos atores, com destaque para a Netflix, apostaram suas fichas em produções de olho nas tradicionais premiações do cinema, como o Oscar. Agora, a estratégia dos lançamentos simultâneos parece estar sendo deixada de lado.

Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, acha que a pandemia reforçou a vontade dos espectadores de ir ao cinema, ainda que com menor frequência Foto: Divulgação/PwC

“As experiencias durante a pandemia nunca vão permitir que a gente volte a ser o que era. Aprendemos bastante coisa. Inclusive, que a experiencia presencial é insubstituível”, afirma Queiroz, ao explicar porque as plataformas de streaming talvez não consigam substituir totalmente a experiencia imersiva das salas de cinema.

Por outro lado, a combinação de mídia, entretenimento e tecnologia coloca em xeque o modelo de negócios dos estúdios de cinema e dos canais de televisão, mas não parece oferecer alternativas claramente sustentáveis. Não faltaram sinais de alerta recentemente. O relatório da PwC lembra que a Discovery desistiu de um investimento de US$ 300 milhões na CNN+, apenas três semanas após o lançamento.

E o alerta mais notório veio em abril deste ano, quando a Netflix anunciou que o número de assinantes da plataforma caiu em 200 mil no primeiro trimestre, a primeira queda em 11 anos. A empresa colocou a culpa no aperto dos orçamentos das famílias, por causa da disparada da inflação em todo o mundo, provocadas pela crise da covid-19 e pela guerra na Ucrânia, mas as dúvidas pairam mesmo é sobre a capacidade de a receita com assinaturas ser suficiente para cobrir os elevados custos de produção e ainda sobrar lucros.

Concorrência acirrada

Queiroz, da PwC, lembra que, “quando descobriu o oceano azul” do streaming de vídeo, a Netflix era apenas um “repositório”, um meio de levar o conteúdo ao consumidor final – no percurso para chegar lá, a empresa levou à falência a Blockbuster, mais famosa rede de locadoras de vídeos e DVDs do mundo até o início dos anos 2000.

Só que os estúdios de cinema e televisão entenderam que a Netflix ganhava dinheiro com o conteúdo produzido por eles. Essas companhias, algumas gigantes com elevada capacidade financeira, correram para lançar suas plataformas de streaming. Lançada em novembro de 2019, nos Estados Unidos, e, em 2020, no Brasil, a plataforma Disney+, do estúdio homônimo, seguia crescendo o número de assinantes no terceiro trimestre deste ano.

Em 2021, estreou a plataforma Paramount Plus. No mesmo ano, a Warner Media – dona dos canais CNN, HBO, TNT e do estúdio de cinema Warner Bros. –, controlada pela gigante americana das telecomunicações AT&T, anunciou a fusão com a Discovery. O presidente da AT&T, John Stankey, citou “as oportunidades de streaming direto para o consumidor” para defender o negócio.

A Netflix também enfrenta a concorrência com empresas cujas capacidades bilionárias de investimentos nas produções próprias parecem almejar menos as receitas com assinatura e mais a atração de consumidores dispostos a gastar em outras coisas, como a Apple TV e a Amazon Prime Video. A gigante americana do comércio eletrônico e da tecnologia confirmou no início deste ano a compra do estúdio de cinema MGM, por US$ 8,45 bilhões, de olho no imenso e tradicional acervo de filmes, com foco no streaming. Como reação, a Netflix decidiu apostar em mensalidades mais baratas, combinadas com publicidade.

Para Queiroz, ainda é cedo para dizer se a nova estratégia dará certo, mas o ponto é que “ninguém vai assinar dez plataformas diferentes”. “Nos Estados Unidos, o consumidor pode assinar três ou quatro. No Brasil, podem ser duas”, disse o sócio da PwC.

Conteúdo local

Mesmo assim, a necessidade de esses novos atores do mercado audiovisual investirem na produção de conteúdo local se mantém, conforme o relatório da consultoria. E nisso o Brasil se destaca, pois tem oferta de conteúdo local.

O destaque é o grupo Globo, numa posição mais parecida com a dos grandes estúdios, combinando vasto acerto de obras com capacidade de investimento em novas produções. Segundo o relatório da PwC, a Globo anunciou investimento de R$ 1 bilhão no Globoplay, como parte da estratégia “Uma Só Globo”, de unificar marcas e canais. Em 2021, o Globoplay registrou um salto de 42% no número de assinantes, informou a consultoria no estudo. Conforme Queiroz, o Globoplay cresce mais do que a Netflix no País por causa do conteúdo local.

A demanda por mais produções movimenta os negócios no setor, disse Sabrina Nudeliman, presidente da Elo Company, empresa que começou em 2005 como distribuidora de filmes e hoje também produz. A distribuidora tem no portfólio em torno de 500 títulos distribuídos desde então, incluindo o sucesso internacional com a animação O Menino e o Mundo e, mais recentemente, o sucesso nacional com o longa-metragem Medida Provisória, dirigido por Lázaro Ramos.

Sabrina Nudeliman, presidente da distribuidora e produtora Elo Company, está otimista sobre 2023, quando a empresa lançará 14 filmes nas salas de cinema do País Foto: Werther Santana/Estadão - 8/4/2019

A Elo Company projeta um crescimento de oito vezes na receita para 2023, em boa parte por causa da recuperação das perdas com os anos de pandemia, disse Nudeliman. Catorze filmes serão lançados pela distribuidora. A executiva vê um ciclo virtuoso de recuperação. Além da retomada de produções e lançamentos adiados pela pandemia, há novos investimentos.

Se os aportes mais pesados das grandes plataformas de streaming, como Netflix e Amazon Prime Video, acabam demandando as produtoras de grande porte do País, a perspectiva de retomada das políticas públicas de incentivo é uma esperança para obras alternativas e de menor orçamento, tocada por produtoras menores.

Para Nudeliman, as mudanças trazidas pela pandemia trazem oportunidades em diferentes canais. Se antes da covid-19, se montava uma estratégia de distribuição mirando um público de 2 milhões de espectadores no cinema, agora, o trabalho passa a apostar em 500 mil. A divulgação passa pelas redes sociais e pode ser regionalizada. Embora a situação econômica pese sobre a demanda – afinal, o ingresso é caro perante a renda média nacional –, no pós-pandemia, o afeto ou o engajamento provocado pela narrativa audiovisual ganharam peso na decisão de ir ao cinema.

“O consumidor quer algo além. O que faz valer a pena sair de casa?”, questiona a presidente da Elo Company.

No caso de Medida Provisória, a aposta foi de que o engajamento em torno da narrativa distópica sobre a questão racial poderia tirar o filme do nicho de arte ou alternativo e atingir um público mais amplo. O lançamento envolveu ações nas redes sociais e no Big Brother Brasil. Com 480 mil espectadores, o filme de Lázaro Ramos foi sucesso de bilheteria. Segundo a Elo Company, o longa estreou em abril, em 250 salas de todo o País. Na segunda semana de exibição, passou a ocupar 338 salas. Entre abril e junho, foi o filme brasileiro mais assistido nos cinemas.

Nesse cenário, a executiva vê também espaço para atrair mais recursos de patrocínio para a produção e a distribuição de filmes e séries. Companhias em geral estão, segundo Nudeliman, atentas a oportunidades de associar suas marcas a histórias que provoquem afeto ou engajamento em seus consumidores, independentemente de incentivo fiscal ao patrocínio. O objetivo não é apenas incluir as marcas na lista de “apoios” no crédito dos filmes. Na fase de distribuição de Medida Provisória, sete marcas entraram com patrocínio em diferentes formados, disse Nudeliman.

RIO – Após passar pelo olho do furacão da covid-19, o setor do audiovisual brasileiro pode estar diante de uma oportunidade de crescimento a partir do ano que vem. Segundo dados de um estudo da consultoria PwC, ao qual o Estadão teve acesso, o cinema nacional deverá registrar uma taxa anual de crescimento de 32,1% de 2022 a 2026, enquanto a estimativa de crescimento anual para o mercado de streaming é de 9,8%, no mesmo período.

Embora a pandemia tenha virado o setor de audiovisual de cabeça para baixo, e o cenário ainda seja marcado por incertezas em relação à sustentabilidade de novos modelos de negócios, o otimismo se justifica por uma combinação de perspectiva de aumento da demanda, capacidade de oferta de qualidade por uma cadeia diversificada de produção, a existência de um grande ator de mercado nacional, a Globo, e até a perspectiva de uma retomada das políticas públicas de incentivo, com a mudança do governo federal.

Sala do cinema do Reserva Cultural, em São Paulo, logo no início da pandemia de covid-19, em 2020 Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 16/3/2020

Não é um mar de rosas. Mesmo com o crescimento anual projetado na Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia 2022-2026, da PwC, o cinema brasileiro voltaria aos níveis de antes da pandemia apenas em 2026, quando a receita da atividade chegaria a US$ 681 milhões (R$ 3,5 bilhões, pelo câmbio atual). Em 2022, essa receita deverá ficar em R$ 404 milhões (R$ 2,1 bilhões). Mesmo assim, para 2026, a PwC estima um total de 191 milhões de ingressos de cinema vendidos, abaixo dos 206 milhões de 2019.

No pós-pandemia, essa retomada se dará num mercado diferente. As plataformas de streaming, que experimentaram um boom na demanda em 2020, auge do isolamento social provocado pela covid-19, e em 2021, investiram bilhões para conquistar assinantes, o que inclui o aumento frenético da oferta de conteúdo. É uma demanda crescente para produtoras e distribuidoras de audiovisual.

Para Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, as oportunidades para a cadeia de negócios do setor de audiovisual no País surgirão no meio termo entre o roteiro de filme de catástrofe que se ensaiava com o vazio das salas de cinema em 2020, o que atrasou produções, filmagens e lançamentos, e a euforia dos investimentos aparentemente ilimitados das plataformas de streaming. O País disputa a posição de segundo ou terceiro maior mercado de streaming do mundo, disse o executivo.

O número de espectadores de cinema pode sofrer uma redução estrutural, que veio para ficar, mas isso não significa o fim das salas. Os grandes estúdios produtores de filmes chegaram a apostar em lançamentos simultâneos nos cinemas e nas plataformas de streaming. Novos atores, com destaque para a Netflix, apostaram suas fichas em produções de olho nas tradicionais premiações do cinema, como o Oscar. Agora, a estratégia dos lançamentos simultâneos parece estar sendo deixada de lado.

Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, acha que a pandemia reforçou a vontade dos espectadores de ir ao cinema, ainda que com menor frequência Foto: Divulgação/PwC

“As experiencias durante a pandemia nunca vão permitir que a gente volte a ser o que era. Aprendemos bastante coisa. Inclusive, que a experiencia presencial é insubstituível”, afirma Queiroz, ao explicar porque as plataformas de streaming talvez não consigam substituir totalmente a experiencia imersiva das salas de cinema.

Por outro lado, a combinação de mídia, entretenimento e tecnologia coloca em xeque o modelo de negócios dos estúdios de cinema e dos canais de televisão, mas não parece oferecer alternativas claramente sustentáveis. Não faltaram sinais de alerta recentemente. O relatório da PwC lembra que a Discovery desistiu de um investimento de US$ 300 milhões na CNN+, apenas três semanas após o lançamento.

E o alerta mais notório veio em abril deste ano, quando a Netflix anunciou que o número de assinantes da plataforma caiu em 200 mil no primeiro trimestre, a primeira queda em 11 anos. A empresa colocou a culpa no aperto dos orçamentos das famílias, por causa da disparada da inflação em todo o mundo, provocadas pela crise da covid-19 e pela guerra na Ucrânia, mas as dúvidas pairam mesmo é sobre a capacidade de a receita com assinaturas ser suficiente para cobrir os elevados custos de produção e ainda sobrar lucros.

Concorrência acirrada

Queiroz, da PwC, lembra que, “quando descobriu o oceano azul” do streaming de vídeo, a Netflix era apenas um “repositório”, um meio de levar o conteúdo ao consumidor final – no percurso para chegar lá, a empresa levou à falência a Blockbuster, mais famosa rede de locadoras de vídeos e DVDs do mundo até o início dos anos 2000.

Só que os estúdios de cinema e televisão entenderam que a Netflix ganhava dinheiro com o conteúdo produzido por eles. Essas companhias, algumas gigantes com elevada capacidade financeira, correram para lançar suas plataformas de streaming. Lançada em novembro de 2019, nos Estados Unidos, e, em 2020, no Brasil, a plataforma Disney+, do estúdio homônimo, seguia crescendo o número de assinantes no terceiro trimestre deste ano.

Em 2021, estreou a plataforma Paramount Plus. No mesmo ano, a Warner Media – dona dos canais CNN, HBO, TNT e do estúdio de cinema Warner Bros. –, controlada pela gigante americana das telecomunicações AT&T, anunciou a fusão com a Discovery. O presidente da AT&T, John Stankey, citou “as oportunidades de streaming direto para o consumidor” para defender o negócio.

A Netflix também enfrenta a concorrência com empresas cujas capacidades bilionárias de investimentos nas produções próprias parecem almejar menos as receitas com assinatura e mais a atração de consumidores dispostos a gastar em outras coisas, como a Apple TV e a Amazon Prime Video. A gigante americana do comércio eletrônico e da tecnologia confirmou no início deste ano a compra do estúdio de cinema MGM, por US$ 8,45 bilhões, de olho no imenso e tradicional acervo de filmes, com foco no streaming. Como reação, a Netflix decidiu apostar em mensalidades mais baratas, combinadas com publicidade.

Para Queiroz, ainda é cedo para dizer se a nova estratégia dará certo, mas o ponto é que “ninguém vai assinar dez plataformas diferentes”. “Nos Estados Unidos, o consumidor pode assinar três ou quatro. No Brasil, podem ser duas”, disse o sócio da PwC.

Conteúdo local

Mesmo assim, a necessidade de esses novos atores do mercado audiovisual investirem na produção de conteúdo local se mantém, conforme o relatório da consultoria. E nisso o Brasil se destaca, pois tem oferta de conteúdo local.

O destaque é o grupo Globo, numa posição mais parecida com a dos grandes estúdios, combinando vasto acerto de obras com capacidade de investimento em novas produções. Segundo o relatório da PwC, a Globo anunciou investimento de R$ 1 bilhão no Globoplay, como parte da estratégia “Uma Só Globo”, de unificar marcas e canais. Em 2021, o Globoplay registrou um salto de 42% no número de assinantes, informou a consultoria no estudo. Conforme Queiroz, o Globoplay cresce mais do que a Netflix no País por causa do conteúdo local.

A demanda por mais produções movimenta os negócios no setor, disse Sabrina Nudeliman, presidente da Elo Company, empresa que começou em 2005 como distribuidora de filmes e hoje também produz. A distribuidora tem no portfólio em torno de 500 títulos distribuídos desde então, incluindo o sucesso internacional com a animação O Menino e o Mundo e, mais recentemente, o sucesso nacional com o longa-metragem Medida Provisória, dirigido por Lázaro Ramos.

Sabrina Nudeliman, presidente da distribuidora e produtora Elo Company, está otimista sobre 2023, quando a empresa lançará 14 filmes nas salas de cinema do País Foto: Werther Santana/Estadão - 8/4/2019

A Elo Company projeta um crescimento de oito vezes na receita para 2023, em boa parte por causa da recuperação das perdas com os anos de pandemia, disse Nudeliman. Catorze filmes serão lançados pela distribuidora. A executiva vê um ciclo virtuoso de recuperação. Além da retomada de produções e lançamentos adiados pela pandemia, há novos investimentos.

Se os aportes mais pesados das grandes plataformas de streaming, como Netflix e Amazon Prime Video, acabam demandando as produtoras de grande porte do País, a perspectiva de retomada das políticas públicas de incentivo é uma esperança para obras alternativas e de menor orçamento, tocada por produtoras menores.

Para Nudeliman, as mudanças trazidas pela pandemia trazem oportunidades em diferentes canais. Se antes da covid-19, se montava uma estratégia de distribuição mirando um público de 2 milhões de espectadores no cinema, agora, o trabalho passa a apostar em 500 mil. A divulgação passa pelas redes sociais e pode ser regionalizada. Embora a situação econômica pese sobre a demanda – afinal, o ingresso é caro perante a renda média nacional –, no pós-pandemia, o afeto ou o engajamento provocado pela narrativa audiovisual ganharam peso na decisão de ir ao cinema.

“O consumidor quer algo além. O que faz valer a pena sair de casa?”, questiona a presidente da Elo Company.

No caso de Medida Provisória, a aposta foi de que o engajamento em torno da narrativa distópica sobre a questão racial poderia tirar o filme do nicho de arte ou alternativo e atingir um público mais amplo. O lançamento envolveu ações nas redes sociais e no Big Brother Brasil. Com 480 mil espectadores, o filme de Lázaro Ramos foi sucesso de bilheteria. Segundo a Elo Company, o longa estreou em abril, em 250 salas de todo o País. Na segunda semana de exibição, passou a ocupar 338 salas. Entre abril e junho, foi o filme brasileiro mais assistido nos cinemas.

Nesse cenário, a executiva vê também espaço para atrair mais recursos de patrocínio para a produção e a distribuição de filmes e séries. Companhias em geral estão, segundo Nudeliman, atentas a oportunidades de associar suas marcas a histórias que provoquem afeto ou engajamento em seus consumidores, independentemente de incentivo fiscal ao patrocínio. O objetivo não é apenas incluir as marcas na lista de “apoios” no crédito dos filmes. Na fase de distribuição de Medida Provisória, sete marcas entraram com patrocínio em diferentes formados, disse Nudeliman.

RIO – Após passar pelo olho do furacão da covid-19, o setor do audiovisual brasileiro pode estar diante de uma oportunidade de crescimento a partir do ano que vem. Segundo dados de um estudo da consultoria PwC, ao qual o Estadão teve acesso, o cinema nacional deverá registrar uma taxa anual de crescimento de 32,1% de 2022 a 2026, enquanto a estimativa de crescimento anual para o mercado de streaming é de 9,8%, no mesmo período.

Embora a pandemia tenha virado o setor de audiovisual de cabeça para baixo, e o cenário ainda seja marcado por incertezas em relação à sustentabilidade de novos modelos de negócios, o otimismo se justifica por uma combinação de perspectiva de aumento da demanda, capacidade de oferta de qualidade por uma cadeia diversificada de produção, a existência de um grande ator de mercado nacional, a Globo, e até a perspectiva de uma retomada das políticas públicas de incentivo, com a mudança do governo federal.

Sala do cinema do Reserva Cultural, em São Paulo, logo no início da pandemia de covid-19, em 2020 Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 16/3/2020

Não é um mar de rosas. Mesmo com o crescimento anual projetado na Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia 2022-2026, da PwC, o cinema brasileiro voltaria aos níveis de antes da pandemia apenas em 2026, quando a receita da atividade chegaria a US$ 681 milhões (R$ 3,5 bilhões, pelo câmbio atual). Em 2022, essa receita deverá ficar em R$ 404 milhões (R$ 2,1 bilhões). Mesmo assim, para 2026, a PwC estima um total de 191 milhões de ingressos de cinema vendidos, abaixo dos 206 milhões de 2019.

No pós-pandemia, essa retomada se dará num mercado diferente. As plataformas de streaming, que experimentaram um boom na demanda em 2020, auge do isolamento social provocado pela covid-19, e em 2021, investiram bilhões para conquistar assinantes, o que inclui o aumento frenético da oferta de conteúdo. É uma demanda crescente para produtoras e distribuidoras de audiovisual.

Para Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, as oportunidades para a cadeia de negócios do setor de audiovisual no País surgirão no meio termo entre o roteiro de filme de catástrofe que se ensaiava com o vazio das salas de cinema em 2020, o que atrasou produções, filmagens e lançamentos, e a euforia dos investimentos aparentemente ilimitados das plataformas de streaming. O País disputa a posição de segundo ou terceiro maior mercado de streaming do mundo, disse o executivo.

O número de espectadores de cinema pode sofrer uma redução estrutural, que veio para ficar, mas isso não significa o fim das salas. Os grandes estúdios produtores de filmes chegaram a apostar em lançamentos simultâneos nos cinemas e nas plataformas de streaming. Novos atores, com destaque para a Netflix, apostaram suas fichas em produções de olho nas tradicionais premiações do cinema, como o Oscar. Agora, a estratégia dos lançamentos simultâneos parece estar sendo deixada de lado.

Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, acha que a pandemia reforçou a vontade dos espectadores de ir ao cinema, ainda que com menor frequência Foto: Divulgação/PwC

“As experiencias durante a pandemia nunca vão permitir que a gente volte a ser o que era. Aprendemos bastante coisa. Inclusive, que a experiencia presencial é insubstituível”, afirma Queiroz, ao explicar porque as plataformas de streaming talvez não consigam substituir totalmente a experiencia imersiva das salas de cinema.

Por outro lado, a combinação de mídia, entretenimento e tecnologia coloca em xeque o modelo de negócios dos estúdios de cinema e dos canais de televisão, mas não parece oferecer alternativas claramente sustentáveis. Não faltaram sinais de alerta recentemente. O relatório da PwC lembra que a Discovery desistiu de um investimento de US$ 300 milhões na CNN+, apenas três semanas após o lançamento.

E o alerta mais notório veio em abril deste ano, quando a Netflix anunciou que o número de assinantes da plataforma caiu em 200 mil no primeiro trimestre, a primeira queda em 11 anos. A empresa colocou a culpa no aperto dos orçamentos das famílias, por causa da disparada da inflação em todo o mundo, provocadas pela crise da covid-19 e pela guerra na Ucrânia, mas as dúvidas pairam mesmo é sobre a capacidade de a receita com assinaturas ser suficiente para cobrir os elevados custos de produção e ainda sobrar lucros.

Concorrência acirrada

Queiroz, da PwC, lembra que, “quando descobriu o oceano azul” do streaming de vídeo, a Netflix era apenas um “repositório”, um meio de levar o conteúdo ao consumidor final – no percurso para chegar lá, a empresa levou à falência a Blockbuster, mais famosa rede de locadoras de vídeos e DVDs do mundo até o início dos anos 2000.

Só que os estúdios de cinema e televisão entenderam que a Netflix ganhava dinheiro com o conteúdo produzido por eles. Essas companhias, algumas gigantes com elevada capacidade financeira, correram para lançar suas plataformas de streaming. Lançada em novembro de 2019, nos Estados Unidos, e, em 2020, no Brasil, a plataforma Disney+, do estúdio homônimo, seguia crescendo o número de assinantes no terceiro trimestre deste ano.

Em 2021, estreou a plataforma Paramount Plus. No mesmo ano, a Warner Media – dona dos canais CNN, HBO, TNT e do estúdio de cinema Warner Bros. –, controlada pela gigante americana das telecomunicações AT&T, anunciou a fusão com a Discovery. O presidente da AT&T, John Stankey, citou “as oportunidades de streaming direto para o consumidor” para defender o negócio.

A Netflix também enfrenta a concorrência com empresas cujas capacidades bilionárias de investimentos nas produções próprias parecem almejar menos as receitas com assinatura e mais a atração de consumidores dispostos a gastar em outras coisas, como a Apple TV e a Amazon Prime Video. A gigante americana do comércio eletrônico e da tecnologia confirmou no início deste ano a compra do estúdio de cinema MGM, por US$ 8,45 bilhões, de olho no imenso e tradicional acervo de filmes, com foco no streaming. Como reação, a Netflix decidiu apostar em mensalidades mais baratas, combinadas com publicidade.

Para Queiroz, ainda é cedo para dizer se a nova estratégia dará certo, mas o ponto é que “ninguém vai assinar dez plataformas diferentes”. “Nos Estados Unidos, o consumidor pode assinar três ou quatro. No Brasil, podem ser duas”, disse o sócio da PwC.

Conteúdo local

Mesmo assim, a necessidade de esses novos atores do mercado audiovisual investirem na produção de conteúdo local se mantém, conforme o relatório da consultoria. E nisso o Brasil se destaca, pois tem oferta de conteúdo local.

O destaque é o grupo Globo, numa posição mais parecida com a dos grandes estúdios, combinando vasto acerto de obras com capacidade de investimento em novas produções. Segundo o relatório da PwC, a Globo anunciou investimento de R$ 1 bilhão no Globoplay, como parte da estratégia “Uma Só Globo”, de unificar marcas e canais. Em 2021, o Globoplay registrou um salto de 42% no número de assinantes, informou a consultoria no estudo. Conforme Queiroz, o Globoplay cresce mais do que a Netflix no País por causa do conteúdo local.

A demanda por mais produções movimenta os negócios no setor, disse Sabrina Nudeliman, presidente da Elo Company, empresa que começou em 2005 como distribuidora de filmes e hoje também produz. A distribuidora tem no portfólio em torno de 500 títulos distribuídos desde então, incluindo o sucesso internacional com a animação O Menino e o Mundo e, mais recentemente, o sucesso nacional com o longa-metragem Medida Provisória, dirigido por Lázaro Ramos.

Sabrina Nudeliman, presidente da distribuidora e produtora Elo Company, está otimista sobre 2023, quando a empresa lançará 14 filmes nas salas de cinema do País Foto: Werther Santana/Estadão - 8/4/2019

A Elo Company projeta um crescimento de oito vezes na receita para 2023, em boa parte por causa da recuperação das perdas com os anos de pandemia, disse Nudeliman. Catorze filmes serão lançados pela distribuidora. A executiva vê um ciclo virtuoso de recuperação. Além da retomada de produções e lançamentos adiados pela pandemia, há novos investimentos.

Se os aportes mais pesados das grandes plataformas de streaming, como Netflix e Amazon Prime Video, acabam demandando as produtoras de grande porte do País, a perspectiva de retomada das políticas públicas de incentivo é uma esperança para obras alternativas e de menor orçamento, tocada por produtoras menores.

Para Nudeliman, as mudanças trazidas pela pandemia trazem oportunidades em diferentes canais. Se antes da covid-19, se montava uma estratégia de distribuição mirando um público de 2 milhões de espectadores no cinema, agora, o trabalho passa a apostar em 500 mil. A divulgação passa pelas redes sociais e pode ser regionalizada. Embora a situação econômica pese sobre a demanda – afinal, o ingresso é caro perante a renda média nacional –, no pós-pandemia, o afeto ou o engajamento provocado pela narrativa audiovisual ganharam peso na decisão de ir ao cinema.

“O consumidor quer algo além. O que faz valer a pena sair de casa?”, questiona a presidente da Elo Company.

No caso de Medida Provisória, a aposta foi de que o engajamento em torno da narrativa distópica sobre a questão racial poderia tirar o filme do nicho de arte ou alternativo e atingir um público mais amplo. O lançamento envolveu ações nas redes sociais e no Big Brother Brasil. Com 480 mil espectadores, o filme de Lázaro Ramos foi sucesso de bilheteria. Segundo a Elo Company, o longa estreou em abril, em 250 salas de todo o País. Na segunda semana de exibição, passou a ocupar 338 salas. Entre abril e junho, foi o filme brasileiro mais assistido nos cinemas.

Nesse cenário, a executiva vê também espaço para atrair mais recursos de patrocínio para a produção e a distribuição de filmes e séries. Companhias em geral estão, segundo Nudeliman, atentas a oportunidades de associar suas marcas a histórias que provoquem afeto ou engajamento em seus consumidores, independentemente de incentivo fiscal ao patrocínio. O objetivo não é apenas incluir as marcas na lista de “apoios” no crédito dos filmes. Na fase de distribuição de Medida Provisória, sete marcas entraram com patrocínio em diferentes formados, disse Nudeliman.

RIO – Após passar pelo olho do furacão da covid-19, o setor do audiovisual brasileiro pode estar diante de uma oportunidade de crescimento a partir do ano que vem. Segundo dados de um estudo da consultoria PwC, ao qual o Estadão teve acesso, o cinema nacional deverá registrar uma taxa anual de crescimento de 32,1% de 2022 a 2026, enquanto a estimativa de crescimento anual para o mercado de streaming é de 9,8%, no mesmo período.

Embora a pandemia tenha virado o setor de audiovisual de cabeça para baixo, e o cenário ainda seja marcado por incertezas em relação à sustentabilidade de novos modelos de negócios, o otimismo se justifica por uma combinação de perspectiva de aumento da demanda, capacidade de oferta de qualidade por uma cadeia diversificada de produção, a existência de um grande ator de mercado nacional, a Globo, e até a perspectiva de uma retomada das políticas públicas de incentivo, com a mudança do governo federal.

Sala do cinema do Reserva Cultural, em São Paulo, logo no início da pandemia de covid-19, em 2020 Foto: Daniel Teixeira/Estadão - 16/3/2020

Não é um mar de rosas. Mesmo com o crescimento anual projetado na Pesquisa Global de Entretenimento e Mídia 2022-2026, da PwC, o cinema brasileiro voltaria aos níveis de antes da pandemia apenas em 2026, quando a receita da atividade chegaria a US$ 681 milhões (R$ 3,5 bilhões, pelo câmbio atual). Em 2022, essa receita deverá ficar em R$ 404 milhões (R$ 2,1 bilhões). Mesmo assim, para 2026, a PwC estima um total de 191 milhões de ingressos de cinema vendidos, abaixo dos 206 milhões de 2019.

No pós-pandemia, essa retomada se dará num mercado diferente. As plataformas de streaming, que experimentaram um boom na demanda em 2020, auge do isolamento social provocado pela covid-19, e em 2021, investiram bilhões para conquistar assinantes, o que inclui o aumento frenético da oferta de conteúdo. É uma demanda crescente para produtoras e distribuidoras de audiovisual.

Para Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, as oportunidades para a cadeia de negócios do setor de audiovisual no País surgirão no meio termo entre o roteiro de filme de catástrofe que se ensaiava com o vazio das salas de cinema em 2020, o que atrasou produções, filmagens e lançamentos, e a euforia dos investimentos aparentemente ilimitados das plataformas de streaming. O País disputa a posição de segundo ou terceiro maior mercado de streaming do mundo, disse o executivo.

O número de espectadores de cinema pode sofrer uma redução estrutural, que veio para ficar, mas isso não significa o fim das salas. Os grandes estúdios produtores de filmes chegaram a apostar em lançamentos simultâneos nos cinemas e nas plataformas de streaming. Novos atores, com destaque para a Netflix, apostaram suas fichas em produções de olho nas tradicionais premiações do cinema, como o Oscar. Agora, a estratégia dos lançamentos simultâneos parece estar sendo deixada de lado.

Ricardo Queiroz, sócio da PwC Brasil, acha que a pandemia reforçou a vontade dos espectadores de ir ao cinema, ainda que com menor frequência Foto: Divulgação/PwC

“As experiencias durante a pandemia nunca vão permitir que a gente volte a ser o que era. Aprendemos bastante coisa. Inclusive, que a experiencia presencial é insubstituível”, afirma Queiroz, ao explicar porque as plataformas de streaming talvez não consigam substituir totalmente a experiencia imersiva das salas de cinema.

Por outro lado, a combinação de mídia, entretenimento e tecnologia coloca em xeque o modelo de negócios dos estúdios de cinema e dos canais de televisão, mas não parece oferecer alternativas claramente sustentáveis. Não faltaram sinais de alerta recentemente. O relatório da PwC lembra que a Discovery desistiu de um investimento de US$ 300 milhões na CNN+, apenas três semanas após o lançamento.

E o alerta mais notório veio em abril deste ano, quando a Netflix anunciou que o número de assinantes da plataforma caiu em 200 mil no primeiro trimestre, a primeira queda em 11 anos. A empresa colocou a culpa no aperto dos orçamentos das famílias, por causa da disparada da inflação em todo o mundo, provocadas pela crise da covid-19 e pela guerra na Ucrânia, mas as dúvidas pairam mesmo é sobre a capacidade de a receita com assinaturas ser suficiente para cobrir os elevados custos de produção e ainda sobrar lucros.

Concorrência acirrada

Queiroz, da PwC, lembra que, “quando descobriu o oceano azul” do streaming de vídeo, a Netflix era apenas um “repositório”, um meio de levar o conteúdo ao consumidor final – no percurso para chegar lá, a empresa levou à falência a Blockbuster, mais famosa rede de locadoras de vídeos e DVDs do mundo até o início dos anos 2000.

Só que os estúdios de cinema e televisão entenderam que a Netflix ganhava dinheiro com o conteúdo produzido por eles. Essas companhias, algumas gigantes com elevada capacidade financeira, correram para lançar suas plataformas de streaming. Lançada em novembro de 2019, nos Estados Unidos, e, em 2020, no Brasil, a plataforma Disney+, do estúdio homônimo, seguia crescendo o número de assinantes no terceiro trimestre deste ano.

Em 2021, estreou a plataforma Paramount Plus. No mesmo ano, a Warner Media – dona dos canais CNN, HBO, TNT e do estúdio de cinema Warner Bros. –, controlada pela gigante americana das telecomunicações AT&T, anunciou a fusão com a Discovery. O presidente da AT&T, John Stankey, citou “as oportunidades de streaming direto para o consumidor” para defender o negócio.

A Netflix também enfrenta a concorrência com empresas cujas capacidades bilionárias de investimentos nas produções próprias parecem almejar menos as receitas com assinatura e mais a atração de consumidores dispostos a gastar em outras coisas, como a Apple TV e a Amazon Prime Video. A gigante americana do comércio eletrônico e da tecnologia confirmou no início deste ano a compra do estúdio de cinema MGM, por US$ 8,45 bilhões, de olho no imenso e tradicional acervo de filmes, com foco no streaming. Como reação, a Netflix decidiu apostar em mensalidades mais baratas, combinadas com publicidade.

Para Queiroz, ainda é cedo para dizer se a nova estratégia dará certo, mas o ponto é que “ninguém vai assinar dez plataformas diferentes”. “Nos Estados Unidos, o consumidor pode assinar três ou quatro. No Brasil, podem ser duas”, disse o sócio da PwC.

Conteúdo local

Mesmo assim, a necessidade de esses novos atores do mercado audiovisual investirem na produção de conteúdo local se mantém, conforme o relatório da consultoria. E nisso o Brasil se destaca, pois tem oferta de conteúdo local.

O destaque é o grupo Globo, numa posição mais parecida com a dos grandes estúdios, combinando vasto acerto de obras com capacidade de investimento em novas produções. Segundo o relatório da PwC, a Globo anunciou investimento de R$ 1 bilhão no Globoplay, como parte da estratégia “Uma Só Globo”, de unificar marcas e canais. Em 2021, o Globoplay registrou um salto de 42% no número de assinantes, informou a consultoria no estudo. Conforme Queiroz, o Globoplay cresce mais do que a Netflix no País por causa do conteúdo local.

A demanda por mais produções movimenta os negócios no setor, disse Sabrina Nudeliman, presidente da Elo Company, empresa que começou em 2005 como distribuidora de filmes e hoje também produz. A distribuidora tem no portfólio em torno de 500 títulos distribuídos desde então, incluindo o sucesso internacional com a animação O Menino e o Mundo e, mais recentemente, o sucesso nacional com o longa-metragem Medida Provisória, dirigido por Lázaro Ramos.

Sabrina Nudeliman, presidente da distribuidora e produtora Elo Company, está otimista sobre 2023, quando a empresa lançará 14 filmes nas salas de cinema do País Foto: Werther Santana/Estadão - 8/4/2019

A Elo Company projeta um crescimento de oito vezes na receita para 2023, em boa parte por causa da recuperação das perdas com os anos de pandemia, disse Nudeliman. Catorze filmes serão lançados pela distribuidora. A executiva vê um ciclo virtuoso de recuperação. Além da retomada de produções e lançamentos adiados pela pandemia, há novos investimentos.

Se os aportes mais pesados das grandes plataformas de streaming, como Netflix e Amazon Prime Video, acabam demandando as produtoras de grande porte do País, a perspectiva de retomada das políticas públicas de incentivo é uma esperança para obras alternativas e de menor orçamento, tocada por produtoras menores.

Para Nudeliman, as mudanças trazidas pela pandemia trazem oportunidades em diferentes canais. Se antes da covid-19, se montava uma estratégia de distribuição mirando um público de 2 milhões de espectadores no cinema, agora, o trabalho passa a apostar em 500 mil. A divulgação passa pelas redes sociais e pode ser regionalizada. Embora a situação econômica pese sobre a demanda – afinal, o ingresso é caro perante a renda média nacional –, no pós-pandemia, o afeto ou o engajamento provocado pela narrativa audiovisual ganharam peso na decisão de ir ao cinema.

“O consumidor quer algo além. O que faz valer a pena sair de casa?”, questiona a presidente da Elo Company.

No caso de Medida Provisória, a aposta foi de que o engajamento em torno da narrativa distópica sobre a questão racial poderia tirar o filme do nicho de arte ou alternativo e atingir um público mais amplo. O lançamento envolveu ações nas redes sociais e no Big Brother Brasil. Com 480 mil espectadores, o filme de Lázaro Ramos foi sucesso de bilheteria. Segundo a Elo Company, o longa estreou em abril, em 250 salas de todo o País. Na segunda semana de exibição, passou a ocupar 338 salas. Entre abril e junho, foi o filme brasileiro mais assistido nos cinemas.

Nesse cenário, a executiva vê também espaço para atrair mais recursos de patrocínio para a produção e a distribuição de filmes e séries. Companhias em geral estão, segundo Nudeliman, atentas a oportunidades de associar suas marcas a histórias que provoquem afeto ou engajamento em seus consumidores, independentemente de incentivo fiscal ao patrocínio. O objetivo não é apenas incluir as marcas na lista de “apoios” no crédito dos filmes. Na fase de distribuição de Medida Provisória, sete marcas entraram com patrocínio em diferentes formados, disse Nudeliman.

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