Os planos médico-hospitalares fecharam o ano passado com 51 milhões de beneficiários no Brasil, com projeção da Abramge de acréscimo de 1,2 milhão de beneficiários ao longo de 2024. Mesmo com o incremento de novas vidas, o setor ainda patina nos mesmos níveis registrados há 10 anos quando 50,5 milhões de brasileiros tinham acesso ao sistema privado de saúde. Diante de um crescimento populacional de 10% no País na última década, fica evidente o encolhimento do setor.
Marcos Novais, diretor executivo da Abramge, lembra que, mesmo sem crescer como poderia ao longo dos últimos anos, o mercado brasileiro de saúde suplementar é relevante. “Somos o terceiro país com mais pessoas desfrutando de planos de saúde, em números absolutos, atrás apenas dos Estados Unidos e da China”, descreve. Outro aspecto que deve ser muito valorizado, ele observa, é que o sistema público de saúde brasileiro, considerado referência mundial, vem sendo em parte subsidiado pelo sistema privado, especialmente no que diz respeito ao financiamento de novas tecnologias.
A Abramge acredita que haja como ampliar rapidamente o mercado brasileiro de saúde suplementar com a criação de uma nova faixa de produtos que possam ser a porta de entrada ao sistema privado. Seriam os planos verdadeiramente ambulatoriais, direcionados exclusivamente a consultas e exames, procedimentos que resolvem cerca de 80% dos casos. “Esses produtos teriam o valor da mensalidade bem mais baixo e um potencial gigantesco de evitar doenças mais graves, dando acesso a consultas, exames e o adequado acompanhamento dos pacientes. Um evento grave como o infarto poderia ser evitado com o simples acompanhamento médico e controle de pressão e diabetes”, descreve o executivo da Abramge. Os atuais planos ambulatoriais são disfuncionais, já que a regulação da ANS determina que devem cobrir internação de até 12 horas, sem se preocupar com o cuidado do paciente após esse período, e também por incluir quimioterapia, um procedimento de altíssimo custo, sem prever a cirurgia necessária para a retirada do tumor.
Todo o sistema de saúde se beneficiaria de um serviço com o perfil proposto. Especialmente os beneficiários que atualmente são 100% dependentes da saúde pública ou que recorrem aos chamados “cartões de desconto” – um tipo de produto que, embora não seja regulamentado e tenha regras nebulosas de coparticipação, vem proliferando nos últimos anos. “Estimamos que algo entre 20 milhões e 25 milhões de brasileiros conseguiriam pagar e contar com a segurança de um plano de saúde nessa faixa de preço mais acessível, contando ainda com a regulação e fiscalização da ANS”, diz Novais. “Isso ajudaria a reduzir e muito a pressão sobre o sistema público, inclusive no que diz respeito a doenças que dependem de acompanhamento para evitar complicações, como hipertensão e diabetes.”
Direito de acesso
Além de mudanças na regulamentação atual, é importante haver interoperacionalidade entre os setores público e privado de saúde, e, também, a troca mais efetiva de informações entre operadoras de planos, hospitais, laboratórios, clínicas e médicos. Uma das vantagens seria a forte redução em exames desnecessários ou redundantes, problema que é reflexo direto da falta de intercâmbio de dados. Sem controle eficiente sobre o fluxo de requisições, o índice de exames por paciente no sistema de saúde complementar no Brasil é quase três vezes superior ao registrado pelos países desenvolvidos que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
O presidente da Abramge, Gustavo Ribeiro, afirma que o setor de saúde suplementar tem todo o interesse em estreitar o planejamento conjunto com o sistema público, por vislumbrar vantagens para todas as partes, sobretudo para a população. Ele cita, como exemplo de cooperação em potencial, os medicamentos de alto custo. “É preciso buscar uma solução que seja aplicável ao todo da população e dê às pessoas o mesmo direito de acesso, independentemente de ter plano de saúde ou não.”
A solução seria criar um fundo para os remédios de alto custo e uma fila única para utilização desses medicamentos. “Seria uma mecânica semelhante à dos transplantes, em que o acesso das pessoas está assegurado por critérios que ninguém contesta, e tanto faz se a pessoa tem ou não plano de saúde”, compara Ribeiro. A iniciativa seria vantajosa para as operadoras por conta da previsibilidade de possíveis contribuições ao fundo e da sensível queda dos custos de judicialização que a medida proporcionaria. Mas seria especialmente mais transparente, justa e democrática para a população brasileira.