Crise do teto da dívida dos EUA: o que é e por que ela é importante?


Governo americano atingiu o limite estabelecido por lei para tomada de empréstimos; presidente Joe Biden tenta negociar acordo com o Congresso para tentar evitar um calote com repercussões mundiais

Por Redação
Atualização:

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, se aproximam de um acordo que resolveria o impasse persistente nas negociações sobre o teto da dívida dos EUA, diz a Reuters. O governo americano chega perto do limite de prazo para tentar evitar um calote, que seria a partir de 1º de junho, quando ficaria sem dinheiro para cumprir suas obrigações financeiras.

Segundo fontes com conhecimento do assunto ouvidas pela agência de notícias, o acordo que está sendo costurado aumentaria o teto da dívida do governo, hoje em US$ 31,4 trilhões, por dois anos, limitando os gastos na maioria dos itens. Tanto Biden como McCarthy estão otimistas e esperam chegar a um acordo final até este fim de semana. Em meio às expectativas pelo acordo, entenda abaixo os principais pontos da crise do teto da dívida dos EUA.

O que é o teto da dívida dos EUA?

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O governo dos Estados Unidos atingiu, em janeiro deste ano, o teto da dívida, dispositivo que foi introduzido em 1917 como forma de dar flexibilidade ao governo para arrecadar dinheiro durante a Primeira Guerra Mundial. Em teoria, isso daria ao Congresso uma maneira de manter certo controle sobre os gastos do Executivo.

Atingir o teto da dívida significa que o governo não tem mais permissão para tomar dinheiro emprestado - a menos que o Congresso concorde em suspender ou alterar esse teto, que atualmente é de cerca de US$ 31,4 trilhões. Os acordos com o Congresso nesses casos são comuns, e, desde 1960, os políticos aumentaram, estenderam ou revisaram a definição do limite da dívida em 78 ocasiões - incluindo três apenas nos últimos seis meses.

Desde que o teto da dívida foi atingido, o Departamento do Tesouro americano vem empregando manobras contábeis para sustentar suas reservas de caixa, mas o órgão estima que essas reservas podem se esgotar em 1º de junho. Por isso, o Congresso tem um prazo apertado para aprovar uma legislação para aumentar ou suspender o teto.

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Se o teto da dívida não for aumentado antes que o governo fique sem dinheiro - o que é conhecido como Data X -, ele poderá não conseguir pagar todas as suas contas em dia, incluindo salários militares, pagamentos a detentores de títulos da dívida pública e a Previdência Social, levando os EUA a um calote intencional pela primeira vez em sua história.

Qual é o impasse sobre o teto da dívida dos EUA?

O teto da dívida sempre foi uma moeda de barganha política, mas as brigas tornaram-se cada vez mais polarizadas entre os dois principais partidos americanos, o Democrata e o Republicano, e a dívida dos EUA disparou, praticamente dobrando em uma década. Em 2011, por exemplo, o impasse foi resolvido quando o então presidente democrata Barack Obama concordou com cortes de gastos exigidos pelos republicanos no valor de mais de US$ 900 bilhões - e o limite da dívida foi aumentado em um valor semelhante.

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Desde que os republicanos assumiram o controle da Câmara dos Representantes, novas tensões surgiram no Congresso, e alguns republicanos estão pressionando por cortes de gastos novamente agora - mas desta vez os democratas rejeitam a ideia.

Durante meses, Biden se recusou a se envolver em negociações, argumentando que os republicanos no Congresso estavam tentando usar o voto sobre o limite de empréstimos como alavanca para extrair concessões do governo em outras prioridades políticas. O presidente cedeu e iniciou as tratativas, mas as negociações ocorrem de forma truncada, com inúmeros encontros e conversas entre Biden e o presidente da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, sobre o tema.

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A legenda de oposição exige condicionar o aumento do teto da dívida a cortes profundos nas despesas públicas, além do endurecimento de regras para beneficiários de programas sociais. Um grupo de 57 deputados republicanos foi além e argumentou que a legislação deve incluir ainda restrições para a imigração ilegal. O governo Biden veemente se opõe a todas essas demandas. O presidente chegou a dizer que os republicanos insistem em “posições extremas” e os republicanos acusaram o governo de não estar sendo “razoável” e criticaram Biden por não ter iniciado as negociações antes.

O governo propôs manter as despesas estáveis, o que economizaria US$ 90 bilhões no orçamento de 2024 e US$ 1 trilhão em 10 anos. “Acho que podemos chegar a um acordo”, disse Biden, embora tenha acrescentado: “Não posso garantir que eles - republicanos - não forçariam um default (calote) fazendo algo ultrajante”.

O impasse levantou questões sobre como o governo federal pode tentar priorizar certos pagamentos se ficar sem dinheiro, se o presidente Biden poderia ignorar totalmente o limite da dívida e ordenar que o Departamento do Tesouro continue a contrair empréstimos. Duas táticas mais anticonvencionais se mostram populares entre os progressistas: Biden declarar o teto da dívida anticonstitucional, apontando para a 14ª Emenda, que reza que “a validade da dívida pública dos EUA [...] não será questionada”; ou o Tesouro usar uma brecha em uma lei de 1997 para cunhar uma moeda de platina de qualquer valor que escolher, como uma moeda de US$ 1 trilhão, por exemplo, usando o dinheiro novo para continuar a pagar as dívidas do governo.

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Kevin McCarthy, presidente da Câmara dos Representantes, participa de negociações sobre o teto da dívida com o governo americano.  Foto: Jonathan Ernst/Reuters

Há ainda o fato de que a inadimplência pode ocorrer mais cedo do que o esperado, porque as receitas fiscais estão chegando aos cofres do governo apenas no próximo mês. O ritmo lento se deve em parte a uma decisão do Internal Revenue Service, órgão correspondente à Receita Federal nos EUA, de dar aos contribuintes em Estados que foram afetados pelo clima severo mais tempo para declarar seus impostos de 2022.

O impasse precisa ter um desenlace até 1º de junho para afastar o risco de calote. As negociações parecem ter avançado desde a última quinta-feira, 25, como reportado pela Reuters, com Biden e McCarthy otimistas para alcançarem um acordo ainda neste final de semana.

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Quais as possíveis consequências de um calote dos EUA?

O governo tenta evitar um calote que poderia ser devastador para a economia do país com repercussões para o resto do mundo. Exceto por uma solução rápida, milhões de americanos podem parar de receber benefícios do governo, as bolsas de valores podem despencar e uma crise constitucional pode ocorrer. Pode haver um colapso nos mercados de ações, um aumento do desemprego e pânico em toda a economia global.

Os EUA já enfrentaram prazos como este no passado, o que tranquiliza os observadores com a crença de que irá, mais uma vez, aumentar seu teto da dívida no último minuto.

A secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, advertiu na quarta-feira, 24, em evento do The Wall Street Journal, para o risco de consequências “altamente adversas” caso o Congresso e a Casa Branca não cheguem a um acordo para elevar o teto da dívida do governo federal. A autoridade disse que já vê estresse nos mercados financeiros devido ao impasse, inclusive em leilão de títulos (bills).

Yellen disse ainda ser “muito importante” o compromisso de governo e oposição para que o país não entre em default. Questionada sobre preparos para um eventual calote, a autoridade disse que o Tesouro não está envolvido nessas conversas, mas sim em buscar contornar o problema.

Janet Yellen, secretária do Tesouro dos Estados Unidos; Yellen advertiu para o risco de consequências 'altamente adversas' caso o Congresso e a Casa Branca não cheguem a um acordo sobre o teto da dívida.  Foto: Joshua Roberts/Reuters

Em outro evento, do Independent Community Bankers of America (ICBA, pela sigla em inglês), no dia 16 de maio, Yellen disse que um eventual calote poderá levar a uma “quebra” dos mercados financeiros e “pânico mundial”. Ainda segundo ela, um calote deflagraria uma “tempestade econômica e financeira” sem precedentes e “o choque de renda resultante” poderá levar os EUA a uma recessão.

Em carta endereçada a lideranças do Congresso americano no dia 15 de maio, Yellen afirmou que a demora para suspender ou elevar o limite para o passivo público pode causar “sérios danos” à confiança de empresas e consumidores, além de aumentar os custos de financiamento de curto prazo e afetar o rating de crédito soberano dos EUA.

“De fato, já vimos os custos de empréstimo do Tesouro aumentarem substancialmente para os títulos com vencimento no início de junho”, disse. “Se o Congresso não aumentar o limite da dívida, isso causaria graves dificuldades às famílias americanas, prejudicaria nossa posição de liderança global e levantaria questões sobre nossa capacidade de defender nossos interesses de segurança nacional”, pontuou.

A Moody’s Analytics estima que mesmo uma ruptura breve do teto da dívida pode provocar uma recessão. Uma análise feita pelo Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca modelou uma moratória mais prolongada e previu um crash comparável à crise financeira de 2008. As bolsas caem 45%, o desemprego sobe em cinco pontos percentuais e os custos de empréstimos de longo prazo dos EUA ficam muito, muito mais altos.

O calote pode ter duas variantes: um momento crítico mais breve ou uma crise mais longa, segundo o The Economist. Embora as consequências de ambas sejam nefastas, a segunda opção seria muito pior. Seja como for, o banco central americano desempenharia um papel crucial no controle das consequências; este papel crucial seria, entretanto, o de limitar os danos. Todos os mercados e economias pelo mundo sentiriam o impacto, independentemente das ações do banco central americano. / COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, se aproximam de um acordo que resolveria o impasse persistente nas negociações sobre o teto da dívida dos EUA, diz a Reuters. O governo americano chega perto do limite de prazo para tentar evitar um calote, que seria a partir de 1º de junho, quando ficaria sem dinheiro para cumprir suas obrigações financeiras.

Segundo fontes com conhecimento do assunto ouvidas pela agência de notícias, o acordo que está sendo costurado aumentaria o teto da dívida do governo, hoje em US$ 31,4 trilhões, por dois anos, limitando os gastos na maioria dos itens. Tanto Biden como McCarthy estão otimistas e esperam chegar a um acordo final até este fim de semana. Em meio às expectativas pelo acordo, entenda abaixo os principais pontos da crise do teto da dívida dos EUA.

O que é o teto da dívida dos EUA?

O governo dos Estados Unidos atingiu, em janeiro deste ano, o teto da dívida, dispositivo que foi introduzido em 1917 como forma de dar flexibilidade ao governo para arrecadar dinheiro durante a Primeira Guerra Mundial. Em teoria, isso daria ao Congresso uma maneira de manter certo controle sobre os gastos do Executivo.

Atingir o teto da dívida significa que o governo não tem mais permissão para tomar dinheiro emprestado - a menos que o Congresso concorde em suspender ou alterar esse teto, que atualmente é de cerca de US$ 31,4 trilhões. Os acordos com o Congresso nesses casos são comuns, e, desde 1960, os políticos aumentaram, estenderam ou revisaram a definição do limite da dívida em 78 ocasiões - incluindo três apenas nos últimos seis meses.

Desde que o teto da dívida foi atingido, o Departamento do Tesouro americano vem empregando manobras contábeis para sustentar suas reservas de caixa, mas o órgão estima que essas reservas podem se esgotar em 1º de junho. Por isso, o Congresso tem um prazo apertado para aprovar uma legislação para aumentar ou suspender o teto.

Se o teto da dívida não for aumentado antes que o governo fique sem dinheiro - o que é conhecido como Data X -, ele poderá não conseguir pagar todas as suas contas em dia, incluindo salários militares, pagamentos a detentores de títulos da dívida pública e a Previdência Social, levando os EUA a um calote intencional pela primeira vez em sua história.

Qual é o impasse sobre o teto da dívida dos EUA?

O teto da dívida sempre foi uma moeda de barganha política, mas as brigas tornaram-se cada vez mais polarizadas entre os dois principais partidos americanos, o Democrata e o Republicano, e a dívida dos EUA disparou, praticamente dobrando em uma década. Em 2011, por exemplo, o impasse foi resolvido quando o então presidente democrata Barack Obama concordou com cortes de gastos exigidos pelos republicanos no valor de mais de US$ 900 bilhões - e o limite da dívida foi aumentado em um valor semelhante.

Desde que os republicanos assumiram o controle da Câmara dos Representantes, novas tensões surgiram no Congresso, e alguns republicanos estão pressionando por cortes de gastos novamente agora - mas desta vez os democratas rejeitam a ideia.

Durante meses, Biden se recusou a se envolver em negociações, argumentando que os republicanos no Congresso estavam tentando usar o voto sobre o limite de empréstimos como alavanca para extrair concessões do governo em outras prioridades políticas. O presidente cedeu e iniciou as tratativas, mas as negociações ocorrem de forma truncada, com inúmeros encontros e conversas entre Biden e o presidente da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, sobre o tema.

A legenda de oposição exige condicionar o aumento do teto da dívida a cortes profundos nas despesas públicas, além do endurecimento de regras para beneficiários de programas sociais. Um grupo de 57 deputados republicanos foi além e argumentou que a legislação deve incluir ainda restrições para a imigração ilegal. O governo Biden veemente se opõe a todas essas demandas. O presidente chegou a dizer que os republicanos insistem em “posições extremas” e os republicanos acusaram o governo de não estar sendo “razoável” e criticaram Biden por não ter iniciado as negociações antes.

O governo propôs manter as despesas estáveis, o que economizaria US$ 90 bilhões no orçamento de 2024 e US$ 1 trilhão em 10 anos. “Acho que podemos chegar a um acordo”, disse Biden, embora tenha acrescentado: “Não posso garantir que eles - republicanos - não forçariam um default (calote) fazendo algo ultrajante”.

O impasse levantou questões sobre como o governo federal pode tentar priorizar certos pagamentos se ficar sem dinheiro, se o presidente Biden poderia ignorar totalmente o limite da dívida e ordenar que o Departamento do Tesouro continue a contrair empréstimos. Duas táticas mais anticonvencionais se mostram populares entre os progressistas: Biden declarar o teto da dívida anticonstitucional, apontando para a 14ª Emenda, que reza que “a validade da dívida pública dos EUA [...] não será questionada”; ou o Tesouro usar uma brecha em uma lei de 1997 para cunhar uma moeda de platina de qualquer valor que escolher, como uma moeda de US$ 1 trilhão, por exemplo, usando o dinheiro novo para continuar a pagar as dívidas do governo.

Kevin McCarthy, presidente da Câmara dos Representantes, participa de negociações sobre o teto da dívida com o governo americano.  Foto: Jonathan Ernst/Reuters

Há ainda o fato de que a inadimplência pode ocorrer mais cedo do que o esperado, porque as receitas fiscais estão chegando aos cofres do governo apenas no próximo mês. O ritmo lento se deve em parte a uma decisão do Internal Revenue Service, órgão correspondente à Receita Federal nos EUA, de dar aos contribuintes em Estados que foram afetados pelo clima severo mais tempo para declarar seus impostos de 2022.

O impasse precisa ter um desenlace até 1º de junho para afastar o risco de calote. As negociações parecem ter avançado desde a última quinta-feira, 25, como reportado pela Reuters, com Biden e McCarthy otimistas para alcançarem um acordo ainda neste final de semana.

Quais as possíveis consequências de um calote dos EUA?

O governo tenta evitar um calote que poderia ser devastador para a economia do país com repercussões para o resto do mundo. Exceto por uma solução rápida, milhões de americanos podem parar de receber benefícios do governo, as bolsas de valores podem despencar e uma crise constitucional pode ocorrer. Pode haver um colapso nos mercados de ações, um aumento do desemprego e pânico em toda a economia global.

Os EUA já enfrentaram prazos como este no passado, o que tranquiliza os observadores com a crença de que irá, mais uma vez, aumentar seu teto da dívida no último minuto.

A secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, advertiu na quarta-feira, 24, em evento do The Wall Street Journal, para o risco de consequências “altamente adversas” caso o Congresso e a Casa Branca não cheguem a um acordo para elevar o teto da dívida do governo federal. A autoridade disse que já vê estresse nos mercados financeiros devido ao impasse, inclusive em leilão de títulos (bills).

Yellen disse ainda ser “muito importante” o compromisso de governo e oposição para que o país não entre em default. Questionada sobre preparos para um eventual calote, a autoridade disse que o Tesouro não está envolvido nessas conversas, mas sim em buscar contornar o problema.

Janet Yellen, secretária do Tesouro dos Estados Unidos; Yellen advertiu para o risco de consequências 'altamente adversas' caso o Congresso e a Casa Branca não cheguem a um acordo sobre o teto da dívida.  Foto: Joshua Roberts/Reuters

Em outro evento, do Independent Community Bankers of America (ICBA, pela sigla em inglês), no dia 16 de maio, Yellen disse que um eventual calote poderá levar a uma “quebra” dos mercados financeiros e “pânico mundial”. Ainda segundo ela, um calote deflagraria uma “tempestade econômica e financeira” sem precedentes e “o choque de renda resultante” poderá levar os EUA a uma recessão.

Em carta endereçada a lideranças do Congresso americano no dia 15 de maio, Yellen afirmou que a demora para suspender ou elevar o limite para o passivo público pode causar “sérios danos” à confiança de empresas e consumidores, além de aumentar os custos de financiamento de curto prazo e afetar o rating de crédito soberano dos EUA.

“De fato, já vimos os custos de empréstimo do Tesouro aumentarem substancialmente para os títulos com vencimento no início de junho”, disse. “Se o Congresso não aumentar o limite da dívida, isso causaria graves dificuldades às famílias americanas, prejudicaria nossa posição de liderança global e levantaria questões sobre nossa capacidade de defender nossos interesses de segurança nacional”, pontuou.

A Moody’s Analytics estima que mesmo uma ruptura breve do teto da dívida pode provocar uma recessão. Uma análise feita pelo Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca modelou uma moratória mais prolongada e previu um crash comparável à crise financeira de 2008. As bolsas caem 45%, o desemprego sobe em cinco pontos percentuais e os custos de empréstimos de longo prazo dos EUA ficam muito, muito mais altos.

O calote pode ter duas variantes: um momento crítico mais breve ou uma crise mais longa, segundo o The Economist. Embora as consequências de ambas sejam nefastas, a segunda opção seria muito pior. Seja como for, o banco central americano desempenharia um papel crucial no controle das consequências; este papel crucial seria, entretanto, o de limitar os danos. Todos os mercados e economias pelo mundo sentiriam o impacto, independentemente das ações do banco central americano. / COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o presidente da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, se aproximam de um acordo que resolveria o impasse persistente nas negociações sobre o teto da dívida dos EUA, diz a Reuters. O governo americano chega perto do limite de prazo para tentar evitar um calote, que seria a partir de 1º de junho, quando ficaria sem dinheiro para cumprir suas obrigações financeiras.

Segundo fontes com conhecimento do assunto ouvidas pela agência de notícias, o acordo que está sendo costurado aumentaria o teto da dívida do governo, hoje em US$ 31,4 trilhões, por dois anos, limitando os gastos na maioria dos itens. Tanto Biden como McCarthy estão otimistas e esperam chegar a um acordo final até este fim de semana. Em meio às expectativas pelo acordo, entenda abaixo os principais pontos da crise do teto da dívida dos EUA.

O que é o teto da dívida dos EUA?

O governo dos Estados Unidos atingiu, em janeiro deste ano, o teto da dívida, dispositivo que foi introduzido em 1917 como forma de dar flexibilidade ao governo para arrecadar dinheiro durante a Primeira Guerra Mundial. Em teoria, isso daria ao Congresso uma maneira de manter certo controle sobre os gastos do Executivo.

Atingir o teto da dívida significa que o governo não tem mais permissão para tomar dinheiro emprestado - a menos que o Congresso concorde em suspender ou alterar esse teto, que atualmente é de cerca de US$ 31,4 trilhões. Os acordos com o Congresso nesses casos são comuns, e, desde 1960, os políticos aumentaram, estenderam ou revisaram a definição do limite da dívida em 78 ocasiões - incluindo três apenas nos últimos seis meses.

Desde que o teto da dívida foi atingido, o Departamento do Tesouro americano vem empregando manobras contábeis para sustentar suas reservas de caixa, mas o órgão estima que essas reservas podem se esgotar em 1º de junho. Por isso, o Congresso tem um prazo apertado para aprovar uma legislação para aumentar ou suspender o teto.

Se o teto da dívida não for aumentado antes que o governo fique sem dinheiro - o que é conhecido como Data X -, ele poderá não conseguir pagar todas as suas contas em dia, incluindo salários militares, pagamentos a detentores de títulos da dívida pública e a Previdência Social, levando os EUA a um calote intencional pela primeira vez em sua história.

Qual é o impasse sobre o teto da dívida dos EUA?

O teto da dívida sempre foi uma moeda de barganha política, mas as brigas tornaram-se cada vez mais polarizadas entre os dois principais partidos americanos, o Democrata e o Republicano, e a dívida dos EUA disparou, praticamente dobrando em uma década. Em 2011, por exemplo, o impasse foi resolvido quando o então presidente democrata Barack Obama concordou com cortes de gastos exigidos pelos republicanos no valor de mais de US$ 900 bilhões - e o limite da dívida foi aumentado em um valor semelhante.

Desde que os republicanos assumiram o controle da Câmara dos Representantes, novas tensões surgiram no Congresso, e alguns republicanos estão pressionando por cortes de gastos novamente agora - mas desta vez os democratas rejeitam a ideia.

Durante meses, Biden se recusou a se envolver em negociações, argumentando que os republicanos no Congresso estavam tentando usar o voto sobre o limite de empréstimos como alavanca para extrair concessões do governo em outras prioridades políticas. O presidente cedeu e iniciou as tratativas, mas as negociações ocorrem de forma truncada, com inúmeros encontros e conversas entre Biden e o presidente da Câmara dos Representantes, Kevin McCarthy, sobre o tema.

A legenda de oposição exige condicionar o aumento do teto da dívida a cortes profundos nas despesas públicas, além do endurecimento de regras para beneficiários de programas sociais. Um grupo de 57 deputados republicanos foi além e argumentou que a legislação deve incluir ainda restrições para a imigração ilegal. O governo Biden veemente se opõe a todas essas demandas. O presidente chegou a dizer que os republicanos insistem em “posições extremas” e os republicanos acusaram o governo de não estar sendo “razoável” e criticaram Biden por não ter iniciado as negociações antes.

O governo propôs manter as despesas estáveis, o que economizaria US$ 90 bilhões no orçamento de 2024 e US$ 1 trilhão em 10 anos. “Acho que podemos chegar a um acordo”, disse Biden, embora tenha acrescentado: “Não posso garantir que eles - republicanos - não forçariam um default (calote) fazendo algo ultrajante”.

O impasse levantou questões sobre como o governo federal pode tentar priorizar certos pagamentos se ficar sem dinheiro, se o presidente Biden poderia ignorar totalmente o limite da dívida e ordenar que o Departamento do Tesouro continue a contrair empréstimos. Duas táticas mais anticonvencionais se mostram populares entre os progressistas: Biden declarar o teto da dívida anticonstitucional, apontando para a 14ª Emenda, que reza que “a validade da dívida pública dos EUA [...] não será questionada”; ou o Tesouro usar uma brecha em uma lei de 1997 para cunhar uma moeda de platina de qualquer valor que escolher, como uma moeda de US$ 1 trilhão, por exemplo, usando o dinheiro novo para continuar a pagar as dívidas do governo.

Kevin McCarthy, presidente da Câmara dos Representantes, participa de negociações sobre o teto da dívida com o governo americano.  Foto: Jonathan Ernst/Reuters

Há ainda o fato de que a inadimplência pode ocorrer mais cedo do que o esperado, porque as receitas fiscais estão chegando aos cofres do governo apenas no próximo mês. O ritmo lento se deve em parte a uma decisão do Internal Revenue Service, órgão correspondente à Receita Federal nos EUA, de dar aos contribuintes em Estados que foram afetados pelo clima severo mais tempo para declarar seus impostos de 2022.

O impasse precisa ter um desenlace até 1º de junho para afastar o risco de calote. As negociações parecem ter avançado desde a última quinta-feira, 25, como reportado pela Reuters, com Biden e McCarthy otimistas para alcançarem um acordo ainda neste final de semana.

Quais as possíveis consequências de um calote dos EUA?

O governo tenta evitar um calote que poderia ser devastador para a economia do país com repercussões para o resto do mundo. Exceto por uma solução rápida, milhões de americanos podem parar de receber benefícios do governo, as bolsas de valores podem despencar e uma crise constitucional pode ocorrer. Pode haver um colapso nos mercados de ações, um aumento do desemprego e pânico em toda a economia global.

Os EUA já enfrentaram prazos como este no passado, o que tranquiliza os observadores com a crença de que irá, mais uma vez, aumentar seu teto da dívida no último minuto.

A secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, advertiu na quarta-feira, 24, em evento do The Wall Street Journal, para o risco de consequências “altamente adversas” caso o Congresso e a Casa Branca não cheguem a um acordo para elevar o teto da dívida do governo federal. A autoridade disse que já vê estresse nos mercados financeiros devido ao impasse, inclusive em leilão de títulos (bills).

Yellen disse ainda ser “muito importante” o compromisso de governo e oposição para que o país não entre em default. Questionada sobre preparos para um eventual calote, a autoridade disse que o Tesouro não está envolvido nessas conversas, mas sim em buscar contornar o problema.

Janet Yellen, secretária do Tesouro dos Estados Unidos; Yellen advertiu para o risco de consequências 'altamente adversas' caso o Congresso e a Casa Branca não cheguem a um acordo sobre o teto da dívida.  Foto: Joshua Roberts/Reuters

Em outro evento, do Independent Community Bankers of America (ICBA, pela sigla em inglês), no dia 16 de maio, Yellen disse que um eventual calote poderá levar a uma “quebra” dos mercados financeiros e “pânico mundial”. Ainda segundo ela, um calote deflagraria uma “tempestade econômica e financeira” sem precedentes e “o choque de renda resultante” poderá levar os EUA a uma recessão.

Em carta endereçada a lideranças do Congresso americano no dia 15 de maio, Yellen afirmou que a demora para suspender ou elevar o limite para o passivo público pode causar “sérios danos” à confiança de empresas e consumidores, além de aumentar os custos de financiamento de curto prazo e afetar o rating de crédito soberano dos EUA.

“De fato, já vimos os custos de empréstimo do Tesouro aumentarem substancialmente para os títulos com vencimento no início de junho”, disse. “Se o Congresso não aumentar o limite da dívida, isso causaria graves dificuldades às famílias americanas, prejudicaria nossa posição de liderança global e levantaria questões sobre nossa capacidade de defender nossos interesses de segurança nacional”, pontuou.

A Moody’s Analytics estima que mesmo uma ruptura breve do teto da dívida pode provocar uma recessão. Uma análise feita pelo Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca modelou uma moratória mais prolongada e previu um crash comparável à crise financeira de 2008. As bolsas caem 45%, o desemprego sobe em cinco pontos percentuais e os custos de empréstimos de longo prazo dos EUA ficam muito, muito mais altos.

O calote pode ter duas variantes: um momento crítico mais breve ou uma crise mais longa, segundo o The Economist. Embora as consequências de ambas sejam nefastas, a segunda opção seria muito pior. Seja como for, o banco central americano desempenharia um papel crucial no controle das consequências; este papel crucial seria, entretanto, o de limitar os danos. Todos os mercados e economias pelo mundo sentiriam o impacto, independentemente das ações do banco central americano. / COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS

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