Defensoria pública pede anulação de contrato que libera megaprojeto de ouro em área de Belo Monte


Belo Sun pretende iniciar o garimpo industrial na região da Volta Grande do Xingu, no Pará

Por André Borges
Atualização:

BRASÍLIA - A Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) ingressaram com ação civil pública na Justiça para pedir a anulação do contrato que libera a instalação do maior projeto de mineração de ouro do País, pela empresa canadense Belo Sun. A companhia pretende iniciar o garimpo industrial na região da Volta Grande do Xingu, no Pará, uma área já profundamente impactada pela escassez de água causada pela hidrelétrica de Belo Monte.

A DPU afirma, em sua ação, que a área requerida, de 2,4 mil hectares, é originalmente destinada à reforma agrária e abriga famílias tradicionais que exercem atividades de agricultura, pesca e extrativismo voltadas à subsistência. Os defensores públicos apontam irregularidades na concessão de terras à empresa canadense Belo Sun, feita sob a justificativa infundada de que estariam desocupadas.

Assentamento Ressaca, no Pará; Incra fez acordo com a mineradora Belo Sun para exploração de ouro na região. Foto: Andrew Christian Johnson
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Uma série de reportagens publicadas em dezembro de 2021 e janeiro deste ano pelo Estadão revelou que o Incra, órgão federal responsável pela política de reforma agrária no País, decidiu reduzir a área de um assentamento criado há 22 anos no Pará, para abrir espaço à mineração de ouro. No acordo, o Incra concordou em reduzir uma área de 2.428 hectares da região, cortando o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, onde vivem cerca de 600 famílias. Em troca, o Incra vai receber uma fazenda localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância dali, no município de Luciara, em Mato Grosso, nas margens do Rio Araguaia.

O acordo apontava, especificamente, o repasse ao Incra da Fazenda Ricaville, que tem área de 1,898 mil de hectares. A negociação determina ainda que a Belo Sun compre, para o Incra, duas caminhonetes com tração 4x4 e de cabine dupla, dez notebooks, dez tablets, quatro scanners e aparelhos GPS.

Como mostraram as reportagens, a Belo Sun fez aquisições de uma série de lotes da reforma agrária na região, em transações irregulares. Pelo menos 21 lotes de famílias assentadas na Vila Ressaca, localizada no município de Senador José Porfírio, foram negociados diretamente pela empresa e os moradores. O Estadão teve acesso a contratos nos quais a empresa desembolsa valores de até R$ 1 milhão e registra os atos em cartório. Neles, a Belo Sun estabelece, por exemplo, que os assentados transferem a posse da terra para a mineradora, livre de qualquer tipo de embaraço.

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Para que um lote da reforma agrária seja vendido por seu morador, a lei impõe uma série de condicionantes, como o fato de o ocupante ter vivido sobre aquela terra pelo prazo mínimo de dez anos e terreno ter a emissão de seu título definitivo de posse. Ocorre que praticamente nenhum lote da Vila Ressaca tem esse documento, que é emitido pelo Incra.

De acordo com a DPU, o Incra reconheceu que a Belo Sun se apropriou ilegalmente de terras e que, por isso, tais áreas já estariam desocupadas e desafetadas, podendo ser usadas para a mineração. Contudo, os defensores afirmaram que a autarquia não formalizou essa desafetação e se baseou na “invocação de um motivo falso”, a desocupação, para reconhecer a nova destinação da área.

Por meio de pareceres técnicos, DPU e DPE/PA sustentam que é recorrente a conduta da mineradora Belo Sun na aquisição irregular de lotes na região. E o Incra, mesmo após receber denúncias, não fez nada para impedir as ilicitudes praticadas pela empresa.

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Redução injustificada

A ação também destaca a redução injustificada de área diretamente impactada pelo empreendimento. Os processos minerários da Belo Sun em curso na Agência Nacional de Mineração (ANM) incidem sobre uma área muito maior, que alcança outros assentamentos estaduais e federais. Tal informação é amplamente divulgada pela própria Belo Sun aos seus investidores internacionais.

Há registros que a Belo Sun já adquiriu ilegalmente cerca de 3,5 mil hectares na região, segundo os defensores. Na ação, a DPU e DPE/PA destacam que, caso a área total do contrato ultrapassasse 2,5 mil hectares, seria necessária prévia aprovação do Congresso Nacional para consolidar a concessão, conforme artigos da Constituição Federal.

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A reportagem questionou o Incra e a Belo Sun sobre o assunto. Não houve posicionamento até a publicação deste texto.

Licença suspensa

Desde o início, em 2012, o empreendimento da Belo Sun enfrentou processos judiciais. Além da DPU e DPE/PA, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Pará apontam diversas falhas no processo de licenciamento. Uma decisão judicial de 2017, ainda válida, suspendeu a Licença de Instalação do projeto.

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A nova ação civil pública ajuizada pela DPU e pela DPE/PA pede que esta suspensão seja mantida e a licença, posteriormente, seja anulada. Os defensores públicos solicitam, ainda, o direito à participação social antes de qualquer ato administrativo ou de contrato que implique em concessão de uso ou transferência de terras públicas para a mineradora Belo Sun.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) também solicitou à corte que analise o contrato firmado entre o Incra e a mineradora Belo Sun. “Causa espécie que um órgão constituído exatamente para fazer reforma agrária, esteja fazendo o diametralmente oposto, retirando, compulsoriamente, pessoas assentadas em projeto criado nos idos de 1999, sem que esses assentados tenham sequer notícia de seu destino, e, ao mesmo tempo, esteja se tornando ‘sócio do garimpo’, já que terá participação nos lucros decorrentes da atividade de exploração”, declara em sua representação, o subprocurador-geral do MP-TCU, Lucas Rocha Furtado.

BRASÍLIA - A Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) ingressaram com ação civil pública na Justiça para pedir a anulação do contrato que libera a instalação do maior projeto de mineração de ouro do País, pela empresa canadense Belo Sun. A companhia pretende iniciar o garimpo industrial na região da Volta Grande do Xingu, no Pará, uma área já profundamente impactada pela escassez de água causada pela hidrelétrica de Belo Monte.

A DPU afirma, em sua ação, que a área requerida, de 2,4 mil hectares, é originalmente destinada à reforma agrária e abriga famílias tradicionais que exercem atividades de agricultura, pesca e extrativismo voltadas à subsistência. Os defensores públicos apontam irregularidades na concessão de terras à empresa canadense Belo Sun, feita sob a justificativa infundada de que estariam desocupadas.

Assentamento Ressaca, no Pará; Incra fez acordo com a mineradora Belo Sun para exploração de ouro na região. Foto: Andrew Christian Johnson

Uma série de reportagens publicadas em dezembro de 2021 e janeiro deste ano pelo Estadão revelou que o Incra, órgão federal responsável pela política de reforma agrária no País, decidiu reduzir a área de um assentamento criado há 22 anos no Pará, para abrir espaço à mineração de ouro. No acordo, o Incra concordou em reduzir uma área de 2.428 hectares da região, cortando o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, onde vivem cerca de 600 famílias. Em troca, o Incra vai receber uma fazenda localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância dali, no município de Luciara, em Mato Grosso, nas margens do Rio Araguaia.

O acordo apontava, especificamente, o repasse ao Incra da Fazenda Ricaville, que tem área de 1,898 mil de hectares. A negociação determina ainda que a Belo Sun compre, para o Incra, duas caminhonetes com tração 4x4 e de cabine dupla, dez notebooks, dez tablets, quatro scanners e aparelhos GPS.

Como mostraram as reportagens, a Belo Sun fez aquisições de uma série de lotes da reforma agrária na região, em transações irregulares. Pelo menos 21 lotes de famílias assentadas na Vila Ressaca, localizada no município de Senador José Porfírio, foram negociados diretamente pela empresa e os moradores. O Estadão teve acesso a contratos nos quais a empresa desembolsa valores de até R$ 1 milhão e registra os atos em cartório. Neles, a Belo Sun estabelece, por exemplo, que os assentados transferem a posse da terra para a mineradora, livre de qualquer tipo de embaraço.

Para que um lote da reforma agrária seja vendido por seu morador, a lei impõe uma série de condicionantes, como o fato de o ocupante ter vivido sobre aquela terra pelo prazo mínimo de dez anos e terreno ter a emissão de seu título definitivo de posse. Ocorre que praticamente nenhum lote da Vila Ressaca tem esse documento, que é emitido pelo Incra.

De acordo com a DPU, o Incra reconheceu que a Belo Sun se apropriou ilegalmente de terras e que, por isso, tais áreas já estariam desocupadas e desafetadas, podendo ser usadas para a mineração. Contudo, os defensores afirmaram que a autarquia não formalizou essa desafetação e se baseou na “invocação de um motivo falso”, a desocupação, para reconhecer a nova destinação da área.

Por meio de pareceres técnicos, DPU e DPE/PA sustentam que é recorrente a conduta da mineradora Belo Sun na aquisição irregular de lotes na região. E o Incra, mesmo após receber denúncias, não fez nada para impedir as ilicitudes praticadas pela empresa.

Redução injustificada

A ação também destaca a redução injustificada de área diretamente impactada pelo empreendimento. Os processos minerários da Belo Sun em curso na Agência Nacional de Mineração (ANM) incidem sobre uma área muito maior, que alcança outros assentamentos estaduais e federais. Tal informação é amplamente divulgada pela própria Belo Sun aos seus investidores internacionais.

Há registros que a Belo Sun já adquiriu ilegalmente cerca de 3,5 mil hectares na região, segundo os defensores. Na ação, a DPU e DPE/PA destacam que, caso a área total do contrato ultrapassasse 2,5 mil hectares, seria necessária prévia aprovação do Congresso Nacional para consolidar a concessão, conforme artigos da Constituição Federal.

A reportagem questionou o Incra e a Belo Sun sobre o assunto. Não houve posicionamento até a publicação deste texto.

Licença suspensa

Desde o início, em 2012, o empreendimento da Belo Sun enfrentou processos judiciais. Além da DPU e DPE/PA, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Pará apontam diversas falhas no processo de licenciamento. Uma decisão judicial de 2017, ainda válida, suspendeu a Licença de Instalação do projeto.

A nova ação civil pública ajuizada pela DPU e pela DPE/PA pede que esta suspensão seja mantida e a licença, posteriormente, seja anulada. Os defensores públicos solicitam, ainda, o direito à participação social antes de qualquer ato administrativo ou de contrato que implique em concessão de uso ou transferência de terras públicas para a mineradora Belo Sun.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) também solicitou à corte que analise o contrato firmado entre o Incra e a mineradora Belo Sun. “Causa espécie que um órgão constituído exatamente para fazer reforma agrária, esteja fazendo o diametralmente oposto, retirando, compulsoriamente, pessoas assentadas em projeto criado nos idos de 1999, sem que esses assentados tenham sequer notícia de seu destino, e, ao mesmo tempo, esteja se tornando ‘sócio do garimpo’, já que terá participação nos lucros decorrentes da atividade de exploração”, declara em sua representação, o subprocurador-geral do MP-TCU, Lucas Rocha Furtado.

BRASÍLIA - A Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) ingressaram com ação civil pública na Justiça para pedir a anulação do contrato que libera a instalação do maior projeto de mineração de ouro do País, pela empresa canadense Belo Sun. A companhia pretende iniciar o garimpo industrial na região da Volta Grande do Xingu, no Pará, uma área já profundamente impactada pela escassez de água causada pela hidrelétrica de Belo Monte.

A DPU afirma, em sua ação, que a área requerida, de 2,4 mil hectares, é originalmente destinada à reforma agrária e abriga famílias tradicionais que exercem atividades de agricultura, pesca e extrativismo voltadas à subsistência. Os defensores públicos apontam irregularidades na concessão de terras à empresa canadense Belo Sun, feita sob a justificativa infundada de que estariam desocupadas.

Assentamento Ressaca, no Pará; Incra fez acordo com a mineradora Belo Sun para exploração de ouro na região. Foto: Andrew Christian Johnson

Uma série de reportagens publicadas em dezembro de 2021 e janeiro deste ano pelo Estadão revelou que o Incra, órgão federal responsável pela política de reforma agrária no País, decidiu reduzir a área de um assentamento criado há 22 anos no Pará, para abrir espaço à mineração de ouro. No acordo, o Incra concordou em reduzir uma área de 2.428 hectares da região, cortando o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, onde vivem cerca de 600 famílias. Em troca, o Incra vai receber uma fazenda localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância dali, no município de Luciara, em Mato Grosso, nas margens do Rio Araguaia.

O acordo apontava, especificamente, o repasse ao Incra da Fazenda Ricaville, que tem área de 1,898 mil de hectares. A negociação determina ainda que a Belo Sun compre, para o Incra, duas caminhonetes com tração 4x4 e de cabine dupla, dez notebooks, dez tablets, quatro scanners e aparelhos GPS.

Como mostraram as reportagens, a Belo Sun fez aquisições de uma série de lotes da reforma agrária na região, em transações irregulares. Pelo menos 21 lotes de famílias assentadas na Vila Ressaca, localizada no município de Senador José Porfírio, foram negociados diretamente pela empresa e os moradores. O Estadão teve acesso a contratos nos quais a empresa desembolsa valores de até R$ 1 milhão e registra os atos em cartório. Neles, a Belo Sun estabelece, por exemplo, que os assentados transferem a posse da terra para a mineradora, livre de qualquer tipo de embaraço.

Para que um lote da reforma agrária seja vendido por seu morador, a lei impõe uma série de condicionantes, como o fato de o ocupante ter vivido sobre aquela terra pelo prazo mínimo de dez anos e terreno ter a emissão de seu título definitivo de posse. Ocorre que praticamente nenhum lote da Vila Ressaca tem esse documento, que é emitido pelo Incra.

De acordo com a DPU, o Incra reconheceu que a Belo Sun se apropriou ilegalmente de terras e que, por isso, tais áreas já estariam desocupadas e desafetadas, podendo ser usadas para a mineração. Contudo, os defensores afirmaram que a autarquia não formalizou essa desafetação e se baseou na “invocação de um motivo falso”, a desocupação, para reconhecer a nova destinação da área.

Por meio de pareceres técnicos, DPU e DPE/PA sustentam que é recorrente a conduta da mineradora Belo Sun na aquisição irregular de lotes na região. E o Incra, mesmo após receber denúncias, não fez nada para impedir as ilicitudes praticadas pela empresa.

Redução injustificada

A ação também destaca a redução injustificada de área diretamente impactada pelo empreendimento. Os processos minerários da Belo Sun em curso na Agência Nacional de Mineração (ANM) incidem sobre uma área muito maior, que alcança outros assentamentos estaduais e federais. Tal informação é amplamente divulgada pela própria Belo Sun aos seus investidores internacionais.

Há registros que a Belo Sun já adquiriu ilegalmente cerca de 3,5 mil hectares na região, segundo os defensores. Na ação, a DPU e DPE/PA destacam que, caso a área total do contrato ultrapassasse 2,5 mil hectares, seria necessária prévia aprovação do Congresso Nacional para consolidar a concessão, conforme artigos da Constituição Federal.

A reportagem questionou o Incra e a Belo Sun sobre o assunto. Não houve posicionamento até a publicação deste texto.

Licença suspensa

Desde o início, em 2012, o empreendimento da Belo Sun enfrentou processos judiciais. Além da DPU e DPE/PA, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Pará apontam diversas falhas no processo de licenciamento. Uma decisão judicial de 2017, ainda válida, suspendeu a Licença de Instalação do projeto.

A nova ação civil pública ajuizada pela DPU e pela DPE/PA pede que esta suspensão seja mantida e a licença, posteriormente, seja anulada. Os defensores públicos solicitam, ainda, o direito à participação social antes de qualquer ato administrativo ou de contrato que implique em concessão de uso ou transferência de terras públicas para a mineradora Belo Sun.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) também solicitou à corte que analise o contrato firmado entre o Incra e a mineradora Belo Sun. “Causa espécie que um órgão constituído exatamente para fazer reforma agrária, esteja fazendo o diametralmente oposto, retirando, compulsoriamente, pessoas assentadas em projeto criado nos idos de 1999, sem que esses assentados tenham sequer notícia de seu destino, e, ao mesmo tempo, esteja se tornando ‘sócio do garimpo’, já que terá participação nos lucros decorrentes da atividade de exploração”, declara em sua representação, o subprocurador-geral do MP-TCU, Lucas Rocha Furtado.

BRASÍLIA - A Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) ingressaram com ação civil pública na Justiça para pedir a anulação do contrato que libera a instalação do maior projeto de mineração de ouro do País, pela empresa canadense Belo Sun. A companhia pretende iniciar o garimpo industrial na região da Volta Grande do Xingu, no Pará, uma área já profundamente impactada pela escassez de água causada pela hidrelétrica de Belo Monte.

A DPU afirma, em sua ação, que a área requerida, de 2,4 mil hectares, é originalmente destinada à reforma agrária e abriga famílias tradicionais que exercem atividades de agricultura, pesca e extrativismo voltadas à subsistência. Os defensores públicos apontam irregularidades na concessão de terras à empresa canadense Belo Sun, feita sob a justificativa infundada de que estariam desocupadas.

Assentamento Ressaca, no Pará; Incra fez acordo com a mineradora Belo Sun para exploração de ouro na região. Foto: Andrew Christian Johnson

Uma série de reportagens publicadas em dezembro de 2021 e janeiro deste ano pelo Estadão revelou que o Incra, órgão federal responsável pela política de reforma agrária no País, decidiu reduzir a área de um assentamento criado há 22 anos no Pará, para abrir espaço à mineração de ouro. No acordo, o Incra concordou em reduzir uma área de 2.428 hectares da região, cortando o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, onde vivem cerca de 600 famílias. Em troca, o Incra vai receber uma fazenda localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância dali, no município de Luciara, em Mato Grosso, nas margens do Rio Araguaia.

O acordo apontava, especificamente, o repasse ao Incra da Fazenda Ricaville, que tem área de 1,898 mil de hectares. A negociação determina ainda que a Belo Sun compre, para o Incra, duas caminhonetes com tração 4x4 e de cabine dupla, dez notebooks, dez tablets, quatro scanners e aparelhos GPS.

Como mostraram as reportagens, a Belo Sun fez aquisições de uma série de lotes da reforma agrária na região, em transações irregulares. Pelo menos 21 lotes de famílias assentadas na Vila Ressaca, localizada no município de Senador José Porfírio, foram negociados diretamente pela empresa e os moradores. O Estadão teve acesso a contratos nos quais a empresa desembolsa valores de até R$ 1 milhão e registra os atos em cartório. Neles, a Belo Sun estabelece, por exemplo, que os assentados transferem a posse da terra para a mineradora, livre de qualquer tipo de embaraço.

Para que um lote da reforma agrária seja vendido por seu morador, a lei impõe uma série de condicionantes, como o fato de o ocupante ter vivido sobre aquela terra pelo prazo mínimo de dez anos e terreno ter a emissão de seu título definitivo de posse. Ocorre que praticamente nenhum lote da Vila Ressaca tem esse documento, que é emitido pelo Incra.

De acordo com a DPU, o Incra reconheceu que a Belo Sun se apropriou ilegalmente de terras e que, por isso, tais áreas já estariam desocupadas e desafetadas, podendo ser usadas para a mineração. Contudo, os defensores afirmaram que a autarquia não formalizou essa desafetação e se baseou na “invocação de um motivo falso”, a desocupação, para reconhecer a nova destinação da área.

Por meio de pareceres técnicos, DPU e DPE/PA sustentam que é recorrente a conduta da mineradora Belo Sun na aquisição irregular de lotes na região. E o Incra, mesmo após receber denúncias, não fez nada para impedir as ilicitudes praticadas pela empresa.

Redução injustificada

A ação também destaca a redução injustificada de área diretamente impactada pelo empreendimento. Os processos minerários da Belo Sun em curso na Agência Nacional de Mineração (ANM) incidem sobre uma área muito maior, que alcança outros assentamentos estaduais e federais. Tal informação é amplamente divulgada pela própria Belo Sun aos seus investidores internacionais.

Há registros que a Belo Sun já adquiriu ilegalmente cerca de 3,5 mil hectares na região, segundo os defensores. Na ação, a DPU e DPE/PA destacam que, caso a área total do contrato ultrapassasse 2,5 mil hectares, seria necessária prévia aprovação do Congresso Nacional para consolidar a concessão, conforme artigos da Constituição Federal.

A reportagem questionou o Incra e a Belo Sun sobre o assunto. Não houve posicionamento até a publicação deste texto.

Licença suspensa

Desde o início, em 2012, o empreendimento da Belo Sun enfrentou processos judiciais. Além da DPU e DPE/PA, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Pará apontam diversas falhas no processo de licenciamento. Uma decisão judicial de 2017, ainda válida, suspendeu a Licença de Instalação do projeto.

A nova ação civil pública ajuizada pela DPU e pela DPE/PA pede que esta suspensão seja mantida e a licença, posteriormente, seja anulada. Os defensores públicos solicitam, ainda, o direito à participação social antes de qualquer ato administrativo ou de contrato que implique em concessão de uso ou transferência de terras públicas para a mineradora Belo Sun.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) também solicitou à corte que analise o contrato firmado entre o Incra e a mineradora Belo Sun. “Causa espécie que um órgão constituído exatamente para fazer reforma agrária, esteja fazendo o diametralmente oposto, retirando, compulsoriamente, pessoas assentadas em projeto criado nos idos de 1999, sem que esses assentados tenham sequer notícia de seu destino, e, ao mesmo tempo, esteja se tornando ‘sócio do garimpo’, já que terá participação nos lucros decorrentes da atividade de exploração”, declara em sua representação, o subprocurador-geral do MP-TCU, Lucas Rocha Furtado.

BRASÍLIA - A Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) ingressaram com ação civil pública na Justiça para pedir a anulação do contrato que libera a instalação do maior projeto de mineração de ouro do País, pela empresa canadense Belo Sun. A companhia pretende iniciar o garimpo industrial na região da Volta Grande do Xingu, no Pará, uma área já profundamente impactada pela escassez de água causada pela hidrelétrica de Belo Monte.

A DPU afirma, em sua ação, que a área requerida, de 2,4 mil hectares, é originalmente destinada à reforma agrária e abriga famílias tradicionais que exercem atividades de agricultura, pesca e extrativismo voltadas à subsistência. Os defensores públicos apontam irregularidades na concessão de terras à empresa canadense Belo Sun, feita sob a justificativa infundada de que estariam desocupadas.

Assentamento Ressaca, no Pará; Incra fez acordo com a mineradora Belo Sun para exploração de ouro na região. Foto: Andrew Christian Johnson

Uma série de reportagens publicadas em dezembro de 2021 e janeiro deste ano pelo Estadão revelou que o Incra, órgão federal responsável pela política de reforma agrária no País, decidiu reduzir a área de um assentamento criado há 22 anos no Pará, para abrir espaço à mineração de ouro. No acordo, o Incra concordou em reduzir uma área de 2.428 hectares da região, cortando o território do assentamento Ressaca e da gleba Ituna, onde vivem cerca de 600 famílias. Em troca, o Incra vai receber uma fazenda localizada a mais de 1.500 quilômetros de distância dali, no município de Luciara, em Mato Grosso, nas margens do Rio Araguaia.

O acordo apontava, especificamente, o repasse ao Incra da Fazenda Ricaville, que tem área de 1,898 mil de hectares. A negociação determina ainda que a Belo Sun compre, para o Incra, duas caminhonetes com tração 4x4 e de cabine dupla, dez notebooks, dez tablets, quatro scanners e aparelhos GPS.

Como mostraram as reportagens, a Belo Sun fez aquisições de uma série de lotes da reforma agrária na região, em transações irregulares. Pelo menos 21 lotes de famílias assentadas na Vila Ressaca, localizada no município de Senador José Porfírio, foram negociados diretamente pela empresa e os moradores. O Estadão teve acesso a contratos nos quais a empresa desembolsa valores de até R$ 1 milhão e registra os atos em cartório. Neles, a Belo Sun estabelece, por exemplo, que os assentados transferem a posse da terra para a mineradora, livre de qualquer tipo de embaraço.

Para que um lote da reforma agrária seja vendido por seu morador, a lei impõe uma série de condicionantes, como o fato de o ocupante ter vivido sobre aquela terra pelo prazo mínimo de dez anos e terreno ter a emissão de seu título definitivo de posse. Ocorre que praticamente nenhum lote da Vila Ressaca tem esse documento, que é emitido pelo Incra.

De acordo com a DPU, o Incra reconheceu que a Belo Sun se apropriou ilegalmente de terras e que, por isso, tais áreas já estariam desocupadas e desafetadas, podendo ser usadas para a mineração. Contudo, os defensores afirmaram que a autarquia não formalizou essa desafetação e se baseou na “invocação de um motivo falso”, a desocupação, para reconhecer a nova destinação da área.

Por meio de pareceres técnicos, DPU e DPE/PA sustentam que é recorrente a conduta da mineradora Belo Sun na aquisição irregular de lotes na região. E o Incra, mesmo após receber denúncias, não fez nada para impedir as ilicitudes praticadas pela empresa.

Redução injustificada

A ação também destaca a redução injustificada de área diretamente impactada pelo empreendimento. Os processos minerários da Belo Sun em curso na Agência Nacional de Mineração (ANM) incidem sobre uma área muito maior, que alcança outros assentamentos estaduais e federais. Tal informação é amplamente divulgada pela própria Belo Sun aos seus investidores internacionais.

Há registros que a Belo Sun já adquiriu ilegalmente cerca de 3,5 mil hectares na região, segundo os defensores. Na ação, a DPU e DPE/PA destacam que, caso a área total do contrato ultrapassasse 2,5 mil hectares, seria necessária prévia aprovação do Congresso Nacional para consolidar a concessão, conforme artigos da Constituição Federal.

A reportagem questionou o Incra e a Belo Sun sobre o assunto. Não houve posicionamento até a publicação deste texto.

Licença suspensa

Desde o início, em 2012, o empreendimento da Belo Sun enfrentou processos judiciais. Além da DPU e DPE/PA, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado do Pará apontam diversas falhas no processo de licenciamento. Uma decisão judicial de 2017, ainda válida, suspendeu a Licença de Instalação do projeto.

A nova ação civil pública ajuizada pela DPU e pela DPE/PA pede que esta suspensão seja mantida e a licença, posteriormente, seja anulada. Os defensores públicos solicitam, ainda, o direito à participação social antes de qualquer ato administrativo ou de contrato que implique em concessão de uso ou transferência de terras públicas para a mineradora Belo Sun.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU) também solicitou à corte que analise o contrato firmado entre o Incra e a mineradora Belo Sun. “Causa espécie que um órgão constituído exatamente para fazer reforma agrária, esteja fazendo o diametralmente oposto, retirando, compulsoriamente, pessoas assentadas em projeto criado nos idos de 1999, sem que esses assentados tenham sequer notícia de seu destino, e, ao mesmo tempo, esteja se tornando ‘sócio do garimpo’, já que terá participação nos lucros decorrentes da atividade de exploração”, declara em sua representação, o subprocurador-geral do MP-TCU, Lucas Rocha Furtado.

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