BRASÍLIA - O governo federal estima um aumento de 34,8% das despesas do seguro-desemprego e abono salarial entre 2024 e 2028 — crescimento de R$ 28,2 bilhões no período. Os gastos vão passar de R$ 81 bilhões neste ano para R$ 109,2 bilhões daqui a quatro anos. O Estadão/Broadcast apurou que a equipe econômica observa com atenção a elevação dos gastos com o seguro-desemprego, em especial, para avaliar sua dinâmica, já que a elevação responde à nova política de valorização do salário mínimo e à movimentação do mercado de trabalho.
As duas rubricas também pressionam a elaboração do Orçamento para 2025, por representar um gasto extra de R$ 6,5 bilhões no próximo ano. Como são despesas obrigatórias, o governo precisa arrumar espaço para executá-las, o que diminui ainda mais a disponibilidade de recursos para investimentos. Para o ano que vem, já foi anunciada uma redução de R$ 25,9 bilhões em despesas obrigatórias, sobretudo de benefícios, que incluem o seguro-defeso, uma modalidade do seguro-desemprego paga a pescadores artesanais durante o período em que ficam impossibilitados de exercer a atividade.
O governo quer reduzir em até 20% a quantidade de beneficiários do seguro-defeso, o que vai gerar uma economia de R$ 4,96 bilhões entre 2024 e 2028. Os dados constam em nota técnica do Ministério do Trabalho e Emprego obtida pelo Estadão/Broadcast via Lei de Acesso à Informação e são preliminares.
“Salientamos que, se houver alterações nos valores apresentados pela grade, especialmente em relação ao salário mínimo e ao comportamento do mercado de trabalho, haverá impacto nas estimativas de gastos com seguro-desemprego e abono salarial”, diz a nota técnica que subsidiou a elaboração do 3º Relatório Bimestral de Avaliação de Receitas e Despesas. Todos os cálculos do MTE consideram a elevação do salário mínimo — foram consideradas as projeções de R$ 1.509 para 2025, R$ 1.595 para 2026, R$ 1.687 para 2027 e R$ 1.783 para 2028.
Seguro-desemprego
Os gastos com o seguro-desemprego estão no radar do governo. Isso não implica revisão da política, mas sim monitoramento dos gastos. Um interlocutor da equipe econômica ponderou que, no Brasil, essa despesa é pró-cíclica e, mesmo com a geração de novos postos de trabalho e diminuição da taxa de desemprego, que atingiu o mínimo histórico, o pagamento do benefício não cede.
Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o desemprego caiu para 6,9% no trimestre terminado em junho, sendo o porcentual mais baixo para o período em dez anos. Apesar da redução da desocupação, as projeções do Ministério do Trabalho indicam que a despesa com o seguro-desemprego deve crescer R$ 17,6 bilhões entre 2024 e 2028, o que representa uma alta de 33%.
Como mostrou o Estadão, há três explicações para esse forte crescimento. Primeiro, o número de pessoas desempregadas no País é maior do que em outros momentos da série, mesmo com a redução da taxa de desemprego, uma vez que mais pessoas ingressaram no mercado de trabalho, ou seja, passaram a procurar emprego. Segundo: a política de valorização do salário mínimo, indexada ao PIB para dar ganhos acima da inflação, aumenta o valor pago pelo governo no benefício. Terceiro: o mercado de trabalho aquecido aumenta a rotatividade, com trabalhadores forçando demissão para receber o benefício e trabalhar na informalidade.
Os números para este ano não consideram as parcelas adicionais que serão pagas aos trabalhadores do Rio Grande do Sul, em virtude da tragédia das enchentes, e que serão custeadas com créditos extraordinários de R$ 497,8 milhões. Segundo projeções do Ministério do Trabalho, essa despesa deve passar de R$ 53,1 bilhões neste ano para R$ 70,7 bilhões em 2028.
O economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores, avalia que a despesa já é um ponto de atenção no Orçamento, já que o mercado de trabalho aquecido e a política de valorização do salário mínimo vão seguir estimulando a projeção dessa rubrica, dificultando o ajuste de gasto do governo mesmo que sejam alterados critérios de concessão do benefício.
“Do jeito que a política do seguro-desemprego é, fica inviável não esperar aumento do gasto. A gente teria de adotar uma política anticíclica, mas uma mudança dessa exige esforço econômico, governamental, da população e político. Não parece que vai ser algo muito discutido e esse é o momento de discutir, com o mercado aquecido e o crescimento da renda. Não dá para fazer só quando apertar mais para o governo”, diz.
Uma política de seguro-desemprego anticíclica poderia ser flexível, com critérios de elegibilidade menos acessíveis e valores menores em momentos de crescimento econômico e o inverso nos períodos recessivos. Essa mudança, no entanto, é complexa e levantaria questionamentos jurídicos.
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As projeções do MTE consideram cinco modalidades de pagamento deste auxílio — trabalhador formal, pescador artesanal, bolsa de qualificação profissional, empregado doméstico e trabalhador resgatado da condição análoga à de escravo. Todas registram elevação no período, com exceção da bolsa de qualificação profissional, em que a projeção é de redução de 10,7% ao ano na concessão do benefício.
“O seguro-desemprego modalidade trabalhador formal tem grande impacto no valor global de execução desse programa. No exercício de 2023, essa modalidade respondeu por 87,42% dos pagamentos realizados”, observa a nota. A estimativa leva considera uma projeção da evolução do estoque de emprego formal e pondera que o benefício será pago a 15% destes trabalhadores. “Com os números estimados anualmente de habilitados, foram projetados os valores de pagamento aos trabalhadores, que receberão em média 3,97 parcelas de 1,24 salários mínimos”, explica.
No caso dos pescadores artesanais, o gasto com o seguro-defeso é um dos alvos do pente-fino do governo, que estima reduzir o número de beneficiários e controlar esse gasto. Já na modalidade empregado doméstico, a projeção considera que 10,7% desses trabalhadores, em relação ao estoque, poderão receber as três parcelas do seguro-desemprego, no valor de um salário mínimo, a cada ano. Já para os trabalhadores em condições análogas à escravidão, como não há um padrão médio de crescimento e houve períodos de aumentos expressivos, foi estimada a elevação de 7,24% no número de beneficiários por ano.
Abono
Os gastos com o abono salarial — um benefício no valor de um salário mínimo pago a trabalhadores que recebem no máximo dois mínimos mensais e contribuem com o PIS/Pasep — também devem aumentar R$ 10,6 bilhões no período entre 2024 e 2028, um crescimento de 38%.
Os técnicos do Ministério do Trabalho estimam que a proporção de pessoas que receberão o abono é de 49,5% em relação ao estoque de trabalhadores na Relação Anual de Informações Sociais (Rais). Embora o gasto com o abono aumente a cada ano, os técnicos já projetaram que a taxa de crescimento do emprego formal deve desacelerar no período.
Na avaliação de Imaizumi, a tendência de elevação de gastos não é exclusiva do abono e do seguro-desemprego, mas sim um movimento de diversas despesas obrigatórias. “Nesse caso, ainda temos uma questão demográfica. Tem mais pessoas no mercado de trabalho formal porque tem mais pessoas aptas a trabalhar. Com a expansão da formalização de crescimento da população, a gente sabe que vai ter aumento de gastos. Quando batemos no ponto de reformas — tributária, administrativa, previdenciária — é porque desde sempre o problema central do Brasil é equilibrar as contas públicas e o tema fiscal vem pesando na discussão econômica”, afirma.
Tanto o abono salarial quanto o seguro-desemprego consideram o valor do salário mínimo vigente para o pagamento dos benefícios. Por isso, os técnicos também alertam para o impacto da elevação da remuneração básica nessas despesas.
As projeções mostram que, em 2025, a cada R$ 1 de aumento no mínimo, o custo do seguro-desemprego será elevado em R$ 37,6 milhões e o abono salarial em R$ 20,4 milhões. Em 2028, esse impacto será de R$ 39,6 milhões para o seguro-desemprego e de R$ 21,6 milhões para o abono.
Ao fim da nota, ainda há um alerta em relação ao pagamento do abono salarial, em função de recomendação de 2021 feita pela Controladoria-Geral da União, que trata da atualização das rotinas de execução contábil e orçamentária do benefício em função do princípio da anualidade. “Assim, merece avaliação e manifestação dos Órgãos Centrais de orçamento e finanças a possibilidade de abertura de créditos para empenhos e pagamentos do abono salarial relativo ao ano-base 2023, cujas informações sociais necessárias ao processo de identificação serão transmitidas pelos empregadores por meio da Rais e eSocial no exercício de 2024″, pontuam os técnicos.