Casos recentes de fraudes contábeis no Brasil levaram investidores e credores a questionar a credibilidade das informações financeiras divulgadas pelas companhias abertas e, como consequência, a integridade do mercado de valores mobiliários. Neste cenário de corrosão do regime informacional das sociedades, emergem questões acerca dos deveres dos administradores sobre o processo de elaboração e divulgação das demonstrações financeiras das empresas.
Os deveres fiduciários dos administradores encontram-se previstos nos artigos 153 a 157 da Lei 6.404/76 e representam padrões de comportamento (standards) que, quando não observados, podem gerar responsabilizações. Dentre os principais deveres encontram-se o dever de diligência (duty of care) e o dever de lealdade (duty of loyalty).
No caso da fraude contábil em que os administradores estão diretamente envolvidos – isto é, são autores, partícipes do ato ilícito – há claro descumprimento do dever de diligência e igualmente do dever de lealdade perante a companhia. Já nos casos em que não há dolo, isto é, a distorção contábil decorre de um erro, a avaliação acerca do descumprimento do dever de diligência torna-se mais complexa.
Como o legislador estabeleceu uma cláusula geral, genérica, no que tange ao dever de diligência, as análises fáticas dos casos concretos demandam interpretações deste dispositivo. Neste contexto, a doutrina tem buscado dar concretude ao artigo 153 da Lei das Sociedades Anônimas (LSA) a partir da identificação de uma série de subdeveres, dimensões, representações do dever de diligência. No que tange especificamente à diligência relacionada ao processo de elaboração e divulgação das demonstrações financeiras, estes subdeveres incluem:
I. Dever de se informar sobre as políticas e práticas contábeis da sociedade à luz da normatização vigente;
II. Dever de monitorar a efetividade dos controles internos da companhia incluindo eventuais deficiências de controle apontadas pela auditoria interna e externa;
III. Dever de contribuir para o processo de elaboração das demonstrações financeiras, incluindo aspectos relacionados aos processos e às pessoas;
IV. Dever de investigar sinais de alerta relacionados a possíveis erros ou fraudes nas demonstrações financeiras;
V. Dever de intervir no processo de elaboração das demonstrações financeiras, inclusive ajustando os Balanços de forma tempestiva, uma vez identificados sinais de alerta que possam gerar distorções contábeis;
VI. Dever de comunicar de forma tempestiva e transparente os órgãos de governança da companhia sobre eventuais falhas no processo de elaboração dos Balanços.