Dólar alto, risco fiscal, cenário externo volátil: entenda o que está em jogo na reunião do Copom


Selic deve permanecer em 10,5%, mas Banco Central tende a endurecer o discurso para tentar conter a piora das expectativas de inflação

Por Alvaro Gribel

BRASÍLIA – O Banco Central deve manter a taxa Selic em 10,5% ao ano de forma unânime nesta quarta-feira, 31, mas endurecer o discurso para uma possível alta dos juros mais à frente, em caso de piora do cenário. Essas são as apostas majoritárias do mercado financeiro, que irá analisar cada detalhe do comunicado da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), após o fechamento dos mercados.

Essa indicação de que a Selic poderá voltar a subir nas próximas reuniões é capaz de, por um lado, ajudar a acalmar o mercado e a conter a disparada do dólar; mas, por outro, pode acionar um gatilho para uma nova rodada de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à instituição.

O tom mais duro do Banco Central vai refletir a piora das expectativas de inflação, principalmente a desvalorização do real nas últimas semanas, o risco fiscal brasileiro, um cenário externo volátil marcado pelas eleições nos Estados Unidos, a expectativa por corte de juros pelos EUA em setembro e o risco de alta dos juros pelo Banco Central do Japão.

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Brasília, 31/01/2024 - Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB Foto: Raphael Ribeiro/BC

Dólar, inflação e atividade em alta

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Desde a última reunião do Copom, de 19 de junho, quando manteve a Selic em 10,5% ao ano, as projeções do mercado financeiro para o IPCA de 2024 subiram de 3,96% para 4,10%, enquanto as estimativas para 2025 – mais relevantes para a decisão do Banco Central, que olha a inflação entre 12 meses a 18 meses à frente – saltaram de 3,84% para 3,95%.

Em ambos os casos, os números estão se distanciando do centro da meta de 3%, o que exigirá uma resposta dura por parte do Copom.

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Para 2026, as projeções do mercado foram mantidas em 3,6%, e, para os dois próximos anos, em 3,5%. Ainda assim, permanecem “desancoradas”, como dizem os economistas, acima do centro da meta.

No mesmo período, o dólar também subiu: saltou de R$ 5,42, em 19 de junho, para R$ 5,61, nesta terça-feira – acima dos R$ 5,30 que o BC usou para fazer suas próprias projeções em seu cenário de referência, na última reunião. Desde o início do ano, quando valia R$ 4,85, a valorização da moeda americana sobre o real já chega a 15%. Isso alterou o cenário para a inflação.

Indicadores de atividade, principalmente no mercado de trabalho, também têm demonstrado sinais de aquecimento, o que pressiona os preços. Nesta terça-feira, o Ministério do Trabalho divulgou a abertura de 201 mil vagas com carteira assinada em junho, acima das expectativas de mercado.

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Tom mais duro, mas sem compromisso

Segundo o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, em relatório a clientes, a sinalização mais dura do Copom pode acontecer por meio do chamado “balanço de riscos”, quando o BC enfatiza que o cenário para a inflação está pior do que o esperado. Mesquita entende que a Selic precisa subir para pelo menos 11% para conseguir controlar as expectativas.

“Um possível sinal mais duro seria a descrição de um balanço de riscos assimétrico para cima, acompanhada da afirmação de que o comitê não hesitará em retomar o ciclo de ajuste (subir os juros)”, afirmou.

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Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe Warren Investimentos, aponta que o desafio do Copom será encontrar o tom ideal, para demonstrar preocupação com a inflação, mas sem se comprometer com uma nova alta. Ele lembra que o cenário está volátil e, da mesma forma que piorou, pode voltar a melhorar nas próximas semanas.

“Consideramos que uma sinalização muito dura do Copom seria precipitada e poderia levar os analistas a projetarem uma probabilidade ainda maior de retomada do ciclo de alta dos juros na próxima reunião, tornando o BC ‘refém’ do mercado”, disse. “Esperamos que a visão majoritária do Comitê seja por aguardar que patamar a taxa de câmbio irá se acomodar para então avaliar seus potenciais impactos sobre a inflação e as expectativas.”

Incertezas no campo fiscal

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O anúncio do governo de congelamento de R$ 15 bilhões em despesas no Orçamento de 2024 foi visto como um sinal positivo, mas insuficiente para passar confiança na política fiscal. Isso porque, como mostrou o Estadão, os economistas já antecipam a necessidade de uma nova contenção de gastos em setembro para cumprir o arcabouço e ao menos o piso da meta fiscal zero – que permite um déficit de até R$ 28,8 bilhões.

Além disso, nesta semana, o Banco Central divulgou que a dívida bruta do governo central saltou para 77,8% do PIB, o maior patamar desde novembro de 2021.

As declarações do presidente Lula, que tem demonstrado uma visão superficial sobre os riscos que envolvem as contas públicas, também têm minado a confiança de que a agenda defendida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é para valer.

Antes da próxima reunião do Copom, em setembro, o governo terá de enviar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025. Esse texto é visto como uma nova oportunidade para que a equipe econômica apresente medidas estruturais de cortes de despesas, mas o mercado é cético em relação a essa possibilidade.

Diretores ‘lulistas’ pressionados

O tom mais duro do Banco Central deve provocar uma nova rodada de críticas por parte do presidente Lula e de integrantes do governo e do PT contra a autoridade monetária. A pressão será maior sobre o diretor de política monetária, Gabriel Galípolo, que é o nome mais cotado para assumir a presidência do BC ao término do mandato de Roberto Campos Neto, em dezembro deste ano.

Galípolo precisará provar ao mercado que conseguirá suportar essa pressão política; do contrário, haverá uma nova rodada de piora das expectativas de inflação. Esse movimento, contudo, pode desagradar ao presidente Lula, sob risco de indicar um outro nome, mais à esquerda, para o cargo.

Galípolo, principal cotado para substituir Campos Neto na presidência do BC, precisará provar ao mercado que conseguirá suportar pressão política de Lula. Foto: Wilton Junior/Estadão

De um jeito ou de outro, a partir de janeiro do ano que vem, o Banco Central terá sete dos nove diretores indicados por Lula – o suficiente para formar maioria na decisão dos rumos da Selic. O mercado entende isso como um risco, o que também se reflete nas expectativas de inflação.

Cenário externo com boa e má notícia

O cenário externo caminha para o início dos cortes dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), em setembro. Depois de indicadores de inflação abaixo do esperado e de dados mais fracos de atividade e do mercado de trabalho, esse passou a ser o cenário base da maior parte dos economistas.

O início dos cortes deveria se refletir num ciclo de desvalorização do dólar, com fortalecimento de moedas emergentes, como o real. Mas o banco central do Japão, nesse período, começou a indicar que poderá subir os juros – o que tem atraído capital para o país, depreciando justamente as moedas de países como o Brasil.

“Antes, os investidores pegavam dinheiro no Japão à taxa zero e aplicavam em países com taxas mais altas. Agora, com risco de alta, o resultado do Banco Central do Japão passa a ser mais observado“, afirmou o economista Luis Otávio Leal, do G5 Partners. “Quanto maiores forem os juros por lá, maior a chance de uma reversão desta operação e, consequentemente, maior a chance de termos movimentos bruscos nas moedas mundo afora, como foi o caso do real e do peso mexicano na semana passada.”

Além da reunião desta quarta-feira, o Banco Central irá se reunir mais três vezes até dezembro com a atual diretoria. A partir de janeiro, já deverá estar sob nova presidência. O desejo do mercado é de que Lula indica o quanto antes o novo nome, para diminuir as especulações sobre quem irá ocupar o cargo.

BRASÍLIA – O Banco Central deve manter a taxa Selic em 10,5% ao ano de forma unânime nesta quarta-feira, 31, mas endurecer o discurso para uma possível alta dos juros mais à frente, em caso de piora do cenário. Essas são as apostas majoritárias do mercado financeiro, que irá analisar cada detalhe do comunicado da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), após o fechamento dos mercados.

Essa indicação de que a Selic poderá voltar a subir nas próximas reuniões é capaz de, por um lado, ajudar a acalmar o mercado e a conter a disparada do dólar; mas, por outro, pode acionar um gatilho para uma nova rodada de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à instituição.

O tom mais duro do Banco Central vai refletir a piora das expectativas de inflação, principalmente a desvalorização do real nas últimas semanas, o risco fiscal brasileiro, um cenário externo volátil marcado pelas eleições nos Estados Unidos, a expectativa por corte de juros pelos EUA em setembro e o risco de alta dos juros pelo Banco Central do Japão.

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Brasília, 31/01/2024 - Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB Foto: Raphael Ribeiro/BC

Dólar, inflação e atividade em alta

Desde a última reunião do Copom, de 19 de junho, quando manteve a Selic em 10,5% ao ano, as projeções do mercado financeiro para o IPCA de 2024 subiram de 3,96% para 4,10%, enquanto as estimativas para 2025 – mais relevantes para a decisão do Banco Central, que olha a inflação entre 12 meses a 18 meses à frente – saltaram de 3,84% para 3,95%.

Em ambos os casos, os números estão se distanciando do centro da meta de 3%, o que exigirá uma resposta dura por parte do Copom.

Para 2026, as projeções do mercado foram mantidas em 3,6%, e, para os dois próximos anos, em 3,5%. Ainda assim, permanecem “desancoradas”, como dizem os economistas, acima do centro da meta.

No mesmo período, o dólar também subiu: saltou de R$ 5,42, em 19 de junho, para R$ 5,61, nesta terça-feira – acima dos R$ 5,30 que o BC usou para fazer suas próprias projeções em seu cenário de referência, na última reunião. Desde o início do ano, quando valia R$ 4,85, a valorização da moeda americana sobre o real já chega a 15%. Isso alterou o cenário para a inflação.

Indicadores de atividade, principalmente no mercado de trabalho, também têm demonstrado sinais de aquecimento, o que pressiona os preços. Nesta terça-feira, o Ministério do Trabalho divulgou a abertura de 201 mil vagas com carteira assinada em junho, acima das expectativas de mercado.

Tom mais duro, mas sem compromisso

Segundo o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, em relatório a clientes, a sinalização mais dura do Copom pode acontecer por meio do chamado “balanço de riscos”, quando o BC enfatiza que o cenário para a inflação está pior do que o esperado. Mesquita entende que a Selic precisa subir para pelo menos 11% para conseguir controlar as expectativas.

“Um possível sinal mais duro seria a descrição de um balanço de riscos assimétrico para cima, acompanhada da afirmação de que o comitê não hesitará em retomar o ciclo de ajuste (subir os juros)”, afirmou.

Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe Warren Investimentos, aponta que o desafio do Copom será encontrar o tom ideal, para demonstrar preocupação com a inflação, mas sem se comprometer com uma nova alta. Ele lembra que o cenário está volátil e, da mesma forma que piorou, pode voltar a melhorar nas próximas semanas.

“Consideramos que uma sinalização muito dura do Copom seria precipitada e poderia levar os analistas a projetarem uma probabilidade ainda maior de retomada do ciclo de alta dos juros na próxima reunião, tornando o BC ‘refém’ do mercado”, disse. “Esperamos que a visão majoritária do Comitê seja por aguardar que patamar a taxa de câmbio irá se acomodar para então avaliar seus potenciais impactos sobre a inflação e as expectativas.”

Incertezas no campo fiscal

O anúncio do governo de congelamento de R$ 15 bilhões em despesas no Orçamento de 2024 foi visto como um sinal positivo, mas insuficiente para passar confiança na política fiscal. Isso porque, como mostrou o Estadão, os economistas já antecipam a necessidade de uma nova contenção de gastos em setembro para cumprir o arcabouço e ao menos o piso da meta fiscal zero – que permite um déficit de até R$ 28,8 bilhões.

Além disso, nesta semana, o Banco Central divulgou que a dívida bruta do governo central saltou para 77,8% do PIB, o maior patamar desde novembro de 2021.

As declarações do presidente Lula, que tem demonstrado uma visão superficial sobre os riscos que envolvem as contas públicas, também têm minado a confiança de que a agenda defendida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é para valer.

Antes da próxima reunião do Copom, em setembro, o governo terá de enviar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025. Esse texto é visto como uma nova oportunidade para que a equipe econômica apresente medidas estruturais de cortes de despesas, mas o mercado é cético em relação a essa possibilidade.

Diretores ‘lulistas’ pressionados

O tom mais duro do Banco Central deve provocar uma nova rodada de críticas por parte do presidente Lula e de integrantes do governo e do PT contra a autoridade monetária. A pressão será maior sobre o diretor de política monetária, Gabriel Galípolo, que é o nome mais cotado para assumir a presidência do BC ao término do mandato de Roberto Campos Neto, em dezembro deste ano.

Galípolo precisará provar ao mercado que conseguirá suportar essa pressão política; do contrário, haverá uma nova rodada de piora das expectativas de inflação. Esse movimento, contudo, pode desagradar ao presidente Lula, sob risco de indicar um outro nome, mais à esquerda, para o cargo.

Galípolo, principal cotado para substituir Campos Neto na presidência do BC, precisará provar ao mercado que conseguirá suportar pressão política de Lula. Foto: Wilton Junior/Estadão

De um jeito ou de outro, a partir de janeiro do ano que vem, o Banco Central terá sete dos nove diretores indicados por Lula – o suficiente para formar maioria na decisão dos rumos da Selic. O mercado entende isso como um risco, o que também se reflete nas expectativas de inflação.

Cenário externo com boa e má notícia

O cenário externo caminha para o início dos cortes dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), em setembro. Depois de indicadores de inflação abaixo do esperado e de dados mais fracos de atividade e do mercado de trabalho, esse passou a ser o cenário base da maior parte dos economistas.

O início dos cortes deveria se refletir num ciclo de desvalorização do dólar, com fortalecimento de moedas emergentes, como o real. Mas o banco central do Japão, nesse período, começou a indicar que poderá subir os juros – o que tem atraído capital para o país, depreciando justamente as moedas de países como o Brasil.

“Antes, os investidores pegavam dinheiro no Japão à taxa zero e aplicavam em países com taxas mais altas. Agora, com risco de alta, o resultado do Banco Central do Japão passa a ser mais observado“, afirmou o economista Luis Otávio Leal, do G5 Partners. “Quanto maiores forem os juros por lá, maior a chance de uma reversão desta operação e, consequentemente, maior a chance de termos movimentos bruscos nas moedas mundo afora, como foi o caso do real e do peso mexicano na semana passada.”

Além da reunião desta quarta-feira, o Banco Central irá se reunir mais três vezes até dezembro com a atual diretoria. A partir de janeiro, já deverá estar sob nova presidência. O desejo do mercado é de que Lula indica o quanto antes o novo nome, para diminuir as especulações sobre quem irá ocupar o cargo.

BRASÍLIA – O Banco Central deve manter a taxa Selic em 10,5% ao ano de forma unânime nesta quarta-feira, 31, mas endurecer o discurso para uma possível alta dos juros mais à frente, em caso de piora do cenário. Essas são as apostas majoritárias do mercado financeiro, que irá analisar cada detalhe do comunicado da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), após o fechamento dos mercados.

Essa indicação de que a Selic poderá voltar a subir nas próximas reuniões é capaz de, por um lado, ajudar a acalmar o mercado e a conter a disparada do dólar; mas, por outro, pode acionar um gatilho para uma nova rodada de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à instituição.

O tom mais duro do Banco Central vai refletir a piora das expectativas de inflação, principalmente a desvalorização do real nas últimas semanas, o risco fiscal brasileiro, um cenário externo volátil marcado pelas eleições nos Estados Unidos, a expectativa por corte de juros pelos EUA em setembro e o risco de alta dos juros pelo Banco Central do Japão.

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Brasília, 31/01/2024 - Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB Foto: Raphael Ribeiro/BC

Dólar, inflação e atividade em alta

Desde a última reunião do Copom, de 19 de junho, quando manteve a Selic em 10,5% ao ano, as projeções do mercado financeiro para o IPCA de 2024 subiram de 3,96% para 4,10%, enquanto as estimativas para 2025 – mais relevantes para a decisão do Banco Central, que olha a inflação entre 12 meses a 18 meses à frente – saltaram de 3,84% para 3,95%.

Em ambos os casos, os números estão se distanciando do centro da meta de 3%, o que exigirá uma resposta dura por parte do Copom.

Para 2026, as projeções do mercado foram mantidas em 3,6%, e, para os dois próximos anos, em 3,5%. Ainda assim, permanecem “desancoradas”, como dizem os economistas, acima do centro da meta.

No mesmo período, o dólar também subiu: saltou de R$ 5,42, em 19 de junho, para R$ 5,61, nesta terça-feira – acima dos R$ 5,30 que o BC usou para fazer suas próprias projeções em seu cenário de referência, na última reunião. Desde o início do ano, quando valia R$ 4,85, a valorização da moeda americana sobre o real já chega a 15%. Isso alterou o cenário para a inflação.

Indicadores de atividade, principalmente no mercado de trabalho, também têm demonstrado sinais de aquecimento, o que pressiona os preços. Nesta terça-feira, o Ministério do Trabalho divulgou a abertura de 201 mil vagas com carteira assinada em junho, acima das expectativas de mercado.

Tom mais duro, mas sem compromisso

Segundo o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, em relatório a clientes, a sinalização mais dura do Copom pode acontecer por meio do chamado “balanço de riscos”, quando o BC enfatiza que o cenário para a inflação está pior do que o esperado. Mesquita entende que a Selic precisa subir para pelo menos 11% para conseguir controlar as expectativas.

“Um possível sinal mais duro seria a descrição de um balanço de riscos assimétrico para cima, acompanhada da afirmação de que o comitê não hesitará em retomar o ciclo de ajuste (subir os juros)”, afirmou.

Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe Warren Investimentos, aponta que o desafio do Copom será encontrar o tom ideal, para demonstrar preocupação com a inflação, mas sem se comprometer com uma nova alta. Ele lembra que o cenário está volátil e, da mesma forma que piorou, pode voltar a melhorar nas próximas semanas.

“Consideramos que uma sinalização muito dura do Copom seria precipitada e poderia levar os analistas a projetarem uma probabilidade ainda maior de retomada do ciclo de alta dos juros na próxima reunião, tornando o BC ‘refém’ do mercado”, disse. “Esperamos que a visão majoritária do Comitê seja por aguardar que patamar a taxa de câmbio irá se acomodar para então avaliar seus potenciais impactos sobre a inflação e as expectativas.”

Incertezas no campo fiscal

O anúncio do governo de congelamento de R$ 15 bilhões em despesas no Orçamento de 2024 foi visto como um sinal positivo, mas insuficiente para passar confiança na política fiscal. Isso porque, como mostrou o Estadão, os economistas já antecipam a necessidade de uma nova contenção de gastos em setembro para cumprir o arcabouço e ao menos o piso da meta fiscal zero – que permite um déficit de até R$ 28,8 bilhões.

Além disso, nesta semana, o Banco Central divulgou que a dívida bruta do governo central saltou para 77,8% do PIB, o maior patamar desde novembro de 2021.

As declarações do presidente Lula, que tem demonstrado uma visão superficial sobre os riscos que envolvem as contas públicas, também têm minado a confiança de que a agenda defendida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é para valer.

Antes da próxima reunião do Copom, em setembro, o governo terá de enviar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025. Esse texto é visto como uma nova oportunidade para que a equipe econômica apresente medidas estruturais de cortes de despesas, mas o mercado é cético em relação a essa possibilidade.

Diretores ‘lulistas’ pressionados

O tom mais duro do Banco Central deve provocar uma nova rodada de críticas por parte do presidente Lula e de integrantes do governo e do PT contra a autoridade monetária. A pressão será maior sobre o diretor de política monetária, Gabriel Galípolo, que é o nome mais cotado para assumir a presidência do BC ao término do mandato de Roberto Campos Neto, em dezembro deste ano.

Galípolo precisará provar ao mercado que conseguirá suportar essa pressão política; do contrário, haverá uma nova rodada de piora das expectativas de inflação. Esse movimento, contudo, pode desagradar ao presidente Lula, sob risco de indicar um outro nome, mais à esquerda, para o cargo.

Galípolo, principal cotado para substituir Campos Neto na presidência do BC, precisará provar ao mercado que conseguirá suportar pressão política de Lula. Foto: Wilton Junior/Estadão

De um jeito ou de outro, a partir de janeiro do ano que vem, o Banco Central terá sete dos nove diretores indicados por Lula – o suficiente para formar maioria na decisão dos rumos da Selic. O mercado entende isso como um risco, o que também se reflete nas expectativas de inflação.

Cenário externo com boa e má notícia

O cenário externo caminha para o início dos cortes dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), em setembro. Depois de indicadores de inflação abaixo do esperado e de dados mais fracos de atividade e do mercado de trabalho, esse passou a ser o cenário base da maior parte dos economistas.

O início dos cortes deveria se refletir num ciclo de desvalorização do dólar, com fortalecimento de moedas emergentes, como o real. Mas o banco central do Japão, nesse período, começou a indicar que poderá subir os juros – o que tem atraído capital para o país, depreciando justamente as moedas de países como o Brasil.

“Antes, os investidores pegavam dinheiro no Japão à taxa zero e aplicavam em países com taxas mais altas. Agora, com risco de alta, o resultado do Banco Central do Japão passa a ser mais observado“, afirmou o economista Luis Otávio Leal, do G5 Partners. “Quanto maiores forem os juros por lá, maior a chance de uma reversão desta operação e, consequentemente, maior a chance de termos movimentos bruscos nas moedas mundo afora, como foi o caso do real e do peso mexicano na semana passada.”

Além da reunião desta quarta-feira, o Banco Central irá se reunir mais três vezes até dezembro com a atual diretoria. A partir de janeiro, já deverá estar sob nova presidência. O desejo do mercado é de que Lula indica o quanto antes o novo nome, para diminuir as especulações sobre quem irá ocupar o cargo.

BRASÍLIA – O Banco Central deve manter a taxa Selic em 10,5% ao ano de forma unânime nesta quarta-feira, 31, mas endurecer o discurso para uma possível alta dos juros mais à frente, em caso de piora do cenário. Essas são as apostas majoritárias do mercado financeiro, que irá analisar cada detalhe do comunicado da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), após o fechamento dos mercados.

Essa indicação de que a Selic poderá voltar a subir nas próximas reuniões é capaz de, por um lado, ajudar a acalmar o mercado e a conter a disparada do dólar; mas, por outro, pode acionar um gatilho para uma nova rodada de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à instituição.

O tom mais duro do Banco Central vai refletir a piora das expectativas de inflação, principalmente a desvalorização do real nas últimas semanas, o risco fiscal brasileiro, um cenário externo volátil marcado pelas eleições nos Estados Unidos, a expectativa por corte de juros pelos EUA em setembro e o risco de alta dos juros pelo Banco Central do Japão.

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Brasília, 31/01/2024 - Reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil. Foto: Raphael Ribeiro/BCB Foto: Raphael Ribeiro/BC

Dólar, inflação e atividade em alta

Desde a última reunião do Copom, de 19 de junho, quando manteve a Selic em 10,5% ao ano, as projeções do mercado financeiro para o IPCA de 2024 subiram de 3,96% para 4,10%, enquanto as estimativas para 2025 – mais relevantes para a decisão do Banco Central, que olha a inflação entre 12 meses a 18 meses à frente – saltaram de 3,84% para 3,95%.

Em ambos os casos, os números estão se distanciando do centro da meta de 3%, o que exigirá uma resposta dura por parte do Copom.

Para 2026, as projeções do mercado foram mantidas em 3,6%, e, para os dois próximos anos, em 3,5%. Ainda assim, permanecem “desancoradas”, como dizem os economistas, acima do centro da meta.

No mesmo período, o dólar também subiu: saltou de R$ 5,42, em 19 de junho, para R$ 5,61, nesta terça-feira – acima dos R$ 5,30 que o BC usou para fazer suas próprias projeções em seu cenário de referência, na última reunião. Desde o início do ano, quando valia R$ 4,85, a valorização da moeda americana sobre o real já chega a 15%. Isso alterou o cenário para a inflação.

Indicadores de atividade, principalmente no mercado de trabalho, também têm demonstrado sinais de aquecimento, o que pressiona os preços. Nesta terça-feira, o Ministério do Trabalho divulgou a abertura de 201 mil vagas com carteira assinada em junho, acima das expectativas de mercado.

Tom mais duro, mas sem compromisso

Segundo o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita, em relatório a clientes, a sinalização mais dura do Copom pode acontecer por meio do chamado “balanço de riscos”, quando o BC enfatiza que o cenário para a inflação está pior do que o esperado. Mesquita entende que a Selic precisa subir para pelo menos 11% para conseguir controlar as expectativas.

“Um possível sinal mais duro seria a descrição de um balanço de riscos assimétrico para cima, acompanhada da afirmação de que o comitê não hesitará em retomar o ciclo de ajuste (subir os juros)”, afirmou.

Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe Warren Investimentos, aponta que o desafio do Copom será encontrar o tom ideal, para demonstrar preocupação com a inflação, mas sem se comprometer com uma nova alta. Ele lembra que o cenário está volátil e, da mesma forma que piorou, pode voltar a melhorar nas próximas semanas.

“Consideramos que uma sinalização muito dura do Copom seria precipitada e poderia levar os analistas a projetarem uma probabilidade ainda maior de retomada do ciclo de alta dos juros na próxima reunião, tornando o BC ‘refém’ do mercado”, disse. “Esperamos que a visão majoritária do Comitê seja por aguardar que patamar a taxa de câmbio irá se acomodar para então avaliar seus potenciais impactos sobre a inflação e as expectativas.”

Incertezas no campo fiscal

O anúncio do governo de congelamento de R$ 15 bilhões em despesas no Orçamento de 2024 foi visto como um sinal positivo, mas insuficiente para passar confiança na política fiscal. Isso porque, como mostrou o Estadão, os economistas já antecipam a necessidade de uma nova contenção de gastos em setembro para cumprir o arcabouço e ao menos o piso da meta fiscal zero – que permite um déficit de até R$ 28,8 bilhões.

Além disso, nesta semana, o Banco Central divulgou que a dívida bruta do governo central saltou para 77,8% do PIB, o maior patamar desde novembro de 2021.

As declarações do presidente Lula, que tem demonstrado uma visão superficial sobre os riscos que envolvem as contas públicas, também têm minado a confiança de que a agenda defendida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é para valer.

Antes da próxima reunião do Copom, em setembro, o governo terá de enviar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025. Esse texto é visto como uma nova oportunidade para que a equipe econômica apresente medidas estruturais de cortes de despesas, mas o mercado é cético em relação a essa possibilidade.

Diretores ‘lulistas’ pressionados

O tom mais duro do Banco Central deve provocar uma nova rodada de críticas por parte do presidente Lula e de integrantes do governo e do PT contra a autoridade monetária. A pressão será maior sobre o diretor de política monetária, Gabriel Galípolo, que é o nome mais cotado para assumir a presidência do BC ao término do mandato de Roberto Campos Neto, em dezembro deste ano.

Galípolo precisará provar ao mercado que conseguirá suportar essa pressão política; do contrário, haverá uma nova rodada de piora das expectativas de inflação. Esse movimento, contudo, pode desagradar ao presidente Lula, sob risco de indicar um outro nome, mais à esquerda, para o cargo.

Galípolo, principal cotado para substituir Campos Neto na presidência do BC, precisará provar ao mercado que conseguirá suportar pressão política de Lula. Foto: Wilton Junior/Estadão

De um jeito ou de outro, a partir de janeiro do ano que vem, o Banco Central terá sete dos nove diretores indicados por Lula – o suficiente para formar maioria na decisão dos rumos da Selic. O mercado entende isso como um risco, o que também se reflete nas expectativas de inflação.

Cenário externo com boa e má notícia

O cenário externo caminha para o início dos cortes dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), em setembro. Depois de indicadores de inflação abaixo do esperado e de dados mais fracos de atividade e do mercado de trabalho, esse passou a ser o cenário base da maior parte dos economistas.

O início dos cortes deveria se refletir num ciclo de desvalorização do dólar, com fortalecimento de moedas emergentes, como o real. Mas o banco central do Japão, nesse período, começou a indicar que poderá subir os juros – o que tem atraído capital para o país, depreciando justamente as moedas de países como o Brasil.

“Antes, os investidores pegavam dinheiro no Japão à taxa zero e aplicavam em países com taxas mais altas. Agora, com risco de alta, o resultado do Banco Central do Japão passa a ser mais observado“, afirmou o economista Luis Otávio Leal, do G5 Partners. “Quanto maiores forem os juros por lá, maior a chance de uma reversão desta operação e, consequentemente, maior a chance de termos movimentos bruscos nas moedas mundo afora, como foi o caso do real e do peso mexicano na semana passada.”

Além da reunião desta quarta-feira, o Banco Central irá se reunir mais três vezes até dezembro com a atual diretoria. A partir de janeiro, já deverá estar sob nova presidência. O desejo do mercado é de que Lula indica o quanto antes o novo nome, para diminuir as especulações sobre quem irá ocupar o cargo.

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