Mudanças no mercado de cartão de crédito podem criar efeito ‘pega-vareta’; entenda


Mexer em apenas um elo da cadeia pode estremecer os demais; especialistas dizem que mudanças têm de ser feitas com cautela

Por Matheus Piovesana e Thaís Barcellos
Atualização:

SÃO PAULO E BRASÍLIA – Pagar uma compra com cartão de crédito significa colocar para “conversar” um banco emissor, uma empresa de maquininhas, uma bandeira e um estabelecimento comercial, além, claro, do cliente. São tantos elos na cadeia que mudanças podem gerar um efeito “pega-vareta”: mexer em um pode estremecer os demais. Exatamente por isso, na visão de especialistas, as alterações no crédito rotativo e no próprio formato dos cartões de crédito precisam ser discutidas com cautela.

Em meio aos debates sobre o crédito rotativo, os bancos demandam uma redistribuição dos riscos entre agentes. Hoje, cada compra com cartão gera um recebível, um título que diz que o lojista tem o direito a receber aquele valor do banco que emitiu o cartão dali a 28 dias.

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Esse pagamento é feito pelo banco mesmo que o cliente dê o calote na fatura – ou seja, o banco é quem garante o pagamento ao lojista ou à maquininha que antecipou os recursos, afinal, é o emissor que vai receber o valor da fatura do cliente.

De acordo com especialistas, o atual modelo do parcelamento sem juros, que inclui a garantia dos bancos, é uma evolução do antigo cheque pré-datado. “No cheque pré-datado, o risco estava todo com o lojista”, diz Boanerges Ramos Freire, consultor e presidente da Boanerges & Cia, especialista no mercado de pagamentos. “Os varejistas foram extremamente beneficiados pelo sistema de cartão de crédito.”

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Segundo ele, uma redistribuição dos riscos do parcelado é necessária, mas também é complexa. “Não foi feita porque é extremamente complexa, quase como um jogo de pega-vareta. Não dá para mexer só em uma parte, tem de mexer no todo.”

Enquanto os bancos trazem à mesa possíveis restrições ao parcelado sem juros para acabar com o rotativo, as maquininhas independentes alegam que isso não seria necessário porque a tarifa de intercâmbio, paga pela maquininha ao emissor a cada transação, já cumpriria o papel de remunerar os riscos.

Maquininhas são um dos elos na cadeia dos pagamentos em cartão de débito ou crédito Foto: Gabriela Biló / Estadão
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Segundo dados do BC do ano passado, a tarifa média cobrada do crédito à vista era de 1,32%, aumentando para 2,07% quando o cliente divide a compra em sete vezes ou mais. “O emissor está cobrando taxa de intercâmbio crescente a cada parcela, é remunerado”, sustenta Carol Conway, presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet).

Ela cita ainda que a média de taxa de antecipação é de 19% ao ano, enquanto a do rotativo é de 446%, segundo dados de julho. “A antecipação de recebíveis é uma parcela do setor financeiro que passou a ter competição. Incitados a reduzir o rotativo, querem fazer o lojista ficar prisioneiro.”

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Questões de competição

A avaliação de executivos ligados às maquininhas independentes é de que os bancos buscam chancela institucional, seja do BC, do Ministério da Fazenda ou do Conselho Monetário Nacional (CMN), para limitar o parcelado. Em tese, nada impede que eles mesmos façam as mudanças, mas, se outros não aderirem, podem perder espaço no mercado.

“Querem que o governo meio que padronize essa questão”, avalia Conway. “Sugere que a coordenação para limitar parcelas é para diminuir a competição”, completou uma fonte do ramo.

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A Febraban afirma que busca a divisão dos riscos entre os agentes do setor. “A Febraban e os bancos, dentro da conduta legal e concorrencial que sempre tiveram e prezam, perseguirão um caminho que dilua o risco de crédito entre os elos da cadeia e elimine os subsídios cruzados, numa transição sem rupturas do produto do cartão de crédito e de como ele se financia”, disse a entidade, em nota.

Como mostrou o Estadão/Broadcast, nas discussões entre a indústria de cartões, o governo, o Banco Central e o varejo, discute-se o virtual fim do rotativo, com a substituição pelo parcelamento de faturas com juros. O debate esbarra justamente na discordância sobre o papel que o parcelado sem juros tem nos custos do rotativo para os clientes, e sobre o que vai acontecer com ele.

O rotativo tem os juros mais altos do crédito pessoa física, e também a mais alta inadimplência, de 49,5%, de acordo com os dados do BC referentes a julho. Estes altos patamares fizeram com que a discussão começasse, e a relação de causa e consequência entre eles tem dividido o setor.

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No BC, o presidente Roberto Campos Neto disse que o parcelamento sem juros atualmente é uma “anomalia”, porque representa 15% do crédito total e não incide juros. Campos Neto chegou a falar na criação de uma tarifa para desestimular o “parcelado longo”, afirmando que a média de parcelas já alcançava 13 meses.

Dados do BC do fim de 2022 mostram que, em valor financeiro, as compras à vista representavam 52,7% do total, seguido por 17,6% de 2 a 3 parcelas, 14% de 4 a 6 vezes e 15,7% em sete parcelas ou mais.

Do lado do governo, a avaliação é de que o tema deve ser retomado no momento da autorregulamentação estabelecida pelo projeto de lei do Desenrola, se aprovado, mas a equipe econômica vê dificuldade de os bancos fazerem a discussão sozinhos.

No desdobramento mais recente da queda de braço, a Febraban afirmou que as taxas de antecipação de recebíveis cobradas pelas independentes são três vezes maiores que as cobradas pelas maquininhas ligadas a banco, em especial nas compras a prazo, o que explicaria, segundo a entidade, a contrariedade dessas empresas a restrições ao parcelado sem juros. As maquininhas independentes rebatem esse ponto e afirmam que o ganho de participação de mercado nos últimos anos não sugere que oferecem um produto caro.

Ressaca

A guerra de versões acontece em um momento em que o mercado de cartões vive a ressaca dos anos de forte expansão da base de clientes. Desde 2013, quando as chamadas instituições de pagamento foram criadas, o número de cartões ativos no Brasil aumentou 155%, considerando o número do fim de 2022 (208,8 milhões). Até o início de 2019, a quantidade ainda estava abaixo de 100 milhões.

As instituições de pagamentos e bancos digitais usaram o cartão para fazer frente aos bancos tradicionais, que em reação, também aumentaram a oferta. Os limites se empilharam, mas a renda dos clientes não, e com o aumento da inflação e dos juros entre 2021 e 2022, a inadimplência deu um salto. O mercado se viu obrigado a colocar o pé no freio.

O BC reconhece que houve uma emissão exagerada de cartões nos últimos anos, não necessariamente com a análise mais criteriosa de crédito, o que fez saltar o número de cartões por pessoa - e se correlaciona com o aumento da inadimplência, na avaliação do regulador.

No debate sobre o rotativo, entidades como a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) propuseram a portabilidade das dívidas do cartão de crédito. Também está sobre a mesa a ideia de que os dados de cartão sejam obrigatoriamente compartilhados via Open Finance, para que todos os emissores saibam exatamente quanto de limite cada pessoa tem antes de conceder mais.

SÃO PAULO E BRASÍLIA – Pagar uma compra com cartão de crédito significa colocar para “conversar” um banco emissor, uma empresa de maquininhas, uma bandeira e um estabelecimento comercial, além, claro, do cliente. São tantos elos na cadeia que mudanças podem gerar um efeito “pega-vareta”: mexer em um pode estremecer os demais. Exatamente por isso, na visão de especialistas, as alterações no crédito rotativo e no próprio formato dos cartões de crédito precisam ser discutidas com cautela.

Em meio aos debates sobre o crédito rotativo, os bancos demandam uma redistribuição dos riscos entre agentes. Hoje, cada compra com cartão gera um recebível, um título que diz que o lojista tem o direito a receber aquele valor do banco que emitiu o cartão dali a 28 dias.

Esse pagamento é feito pelo banco mesmo que o cliente dê o calote na fatura – ou seja, o banco é quem garante o pagamento ao lojista ou à maquininha que antecipou os recursos, afinal, é o emissor que vai receber o valor da fatura do cliente.

De acordo com especialistas, o atual modelo do parcelamento sem juros, que inclui a garantia dos bancos, é uma evolução do antigo cheque pré-datado. “No cheque pré-datado, o risco estava todo com o lojista”, diz Boanerges Ramos Freire, consultor e presidente da Boanerges & Cia, especialista no mercado de pagamentos. “Os varejistas foram extremamente beneficiados pelo sistema de cartão de crédito.”

Segundo ele, uma redistribuição dos riscos do parcelado é necessária, mas também é complexa. “Não foi feita porque é extremamente complexa, quase como um jogo de pega-vareta. Não dá para mexer só em uma parte, tem de mexer no todo.”

Enquanto os bancos trazem à mesa possíveis restrições ao parcelado sem juros para acabar com o rotativo, as maquininhas independentes alegam que isso não seria necessário porque a tarifa de intercâmbio, paga pela maquininha ao emissor a cada transação, já cumpriria o papel de remunerar os riscos.

Maquininhas são um dos elos na cadeia dos pagamentos em cartão de débito ou crédito Foto: Gabriela Biló / Estadão

Segundo dados do BC do ano passado, a tarifa média cobrada do crédito à vista era de 1,32%, aumentando para 2,07% quando o cliente divide a compra em sete vezes ou mais. “O emissor está cobrando taxa de intercâmbio crescente a cada parcela, é remunerado”, sustenta Carol Conway, presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet).

Ela cita ainda que a média de taxa de antecipação é de 19% ao ano, enquanto a do rotativo é de 446%, segundo dados de julho. “A antecipação de recebíveis é uma parcela do setor financeiro que passou a ter competição. Incitados a reduzir o rotativo, querem fazer o lojista ficar prisioneiro.”

Questões de competição

A avaliação de executivos ligados às maquininhas independentes é de que os bancos buscam chancela institucional, seja do BC, do Ministério da Fazenda ou do Conselho Monetário Nacional (CMN), para limitar o parcelado. Em tese, nada impede que eles mesmos façam as mudanças, mas, se outros não aderirem, podem perder espaço no mercado.

“Querem que o governo meio que padronize essa questão”, avalia Conway. “Sugere que a coordenação para limitar parcelas é para diminuir a competição”, completou uma fonte do ramo.

A Febraban afirma que busca a divisão dos riscos entre os agentes do setor. “A Febraban e os bancos, dentro da conduta legal e concorrencial que sempre tiveram e prezam, perseguirão um caminho que dilua o risco de crédito entre os elos da cadeia e elimine os subsídios cruzados, numa transição sem rupturas do produto do cartão de crédito e de como ele se financia”, disse a entidade, em nota.

Como mostrou o Estadão/Broadcast, nas discussões entre a indústria de cartões, o governo, o Banco Central e o varejo, discute-se o virtual fim do rotativo, com a substituição pelo parcelamento de faturas com juros. O debate esbarra justamente na discordância sobre o papel que o parcelado sem juros tem nos custos do rotativo para os clientes, e sobre o que vai acontecer com ele.

O rotativo tem os juros mais altos do crédito pessoa física, e também a mais alta inadimplência, de 49,5%, de acordo com os dados do BC referentes a julho. Estes altos patamares fizeram com que a discussão começasse, e a relação de causa e consequência entre eles tem dividido o setor.

No BC, o presidente Roberto Campos Neto disse que o parcelamento sem juros atualmente é uma “anomalia”, porque representa 15% do crédito total e não incide juros. Campos Neto chegou a falar na criação de uma tarifa para desestimular o “parcelado longo”, afirmando que a média de parcelas já alcançava 13 meses.

Dados do BC do fim de 2022 mostram que, em valor financeiro, as compras à vista representavam 52,7% do total, seguido por 17,6% de 2 a 3 parcelas, 14% de 4 a 6 vezes e 15,7% em sete parcelas ou mais.

Do lado do governo, a avaliação é de que o tema deve ser retomado no momento da autorregulamentação estabelecida pelo projeto de lei do Desenrola, se aprovado, mas a equipe econômica vê dificuldade de os bancos fazerem a discussão sozinhos.

No desdobramento mais recente da queda de braço, a Febraban afirmou que as taxas de antecipação de recebíveis cobradas pelas independentes são três vezes maiores que as cobradas pelas maquininhas ligadas a banco, em especial nas compras a prazo, o que explicaria, segundo a entidade, a contrariedade dessas empresas a restrições ao parcelado sem juros. As maquininhas independentes rebatem esse ponto e afirmam que o ganho de participação de mercado nos últimos anos não sugere que oferecem um produto caro.

Ressaca

A guerra de versões acontece em um momento em que o mercado de cartões vive a ressaca dos anos de forte expansão da base de clientes. Desde 2013, quando as chamadas instituições de pagamento foram criadas, o número de cartões ativos no Brasil aumentou 155%, considerando o número do fim de 2022 (208,8 milhões). Até o início de 2019, a quantidade ainda estava abaixo de 100 milhões.

As instituições de pagamentos e bancos digitais usaram o cartão para fazer frente aos bancos tradicionais, que em reação, também aumentaram a oferta. Os limites se empilharam, mas a renda dos clientes não, e com o aumento da inflação e dos juros entre 2021 e 2022, a inadimplência deu um salto. O mercado se viu obrigado a colocar o pé no freio.

O BC reconhece que houve uma emissão exagerada de cartões nos últimos anos, não necessariamente com a análise mais criteriosa de crédito, o que fez saltar o número de cartões por pessoa - e se correlaciona com o aumento da inadimplência, na avaliação do regulador.

No debate sobre o rotativo, entidades como a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) propuseram a portabilidade das dívidas do cartão de crédito. Também está sobre a mesa a ideia de que os dados de cartão sejam obrigatoriamente compartilhados via Open Finance, para que todos os emissores saibam exatamente quanto de limite cada pessoa tem antes de conceder mais.

SÃO PAULO E BRASÍLIA – Pagar uma compra com cartão de crédito significa colocar para “conversar” um banco emissor, uma empresa de maquininhas, uma bandeira e um estabelecimento comercial, além, claro, do cliente. São tantos elos na cadeia que mudanças podem gerar um efeito “pega-vareta”: mexer em um pode estremecer os demais. Exatamente por isso, na visão de especialistas, as alterações no crédito rotativo e no próprio formato dos cartões de crédito precisam ser discutidas com cautela.

Em meio aos debates sobre o crédito rotativo, os bancos demandam uma redistribuição dos riscos entre agentes. Hoje, cada compra com cartão gera um recebível, um título que diz que o lojista tem o direito a receber aquele valor do banco que emitiu o cartão dali a 28 dias.

Esse pagamento é feito pelo banco mesmo que o cliente dê o calote na fatura – ou seja, o banco é quem garante o pagamento ao lojista ou à maquininha que antecipou os recursos, afinal, é o emissor que vai receber o valor da fatura do cliente.

De acordo com especialistas, o atual modelo do parcelamento sem juros, que inclui a garantia dos bancos, é uma evolução do antigo cheque pré-datado. “No cheque pré-datado, o risco estava todo com o lojista”, diz Boanerges Ramos Freire, consultor e presidente da Boanerges & Cia, especialista no mercado de pagamentos. “Os varejistas foram extremamente beneficiados pelo sistema de cartão de crédito.”

Segundo ele, uma redistribuição dos riscos do parcelado é necessária, mas também é complexa. “Não foi feita porque é extremamente complexa, quase como um jogo de pega-vareta. Não dá para mexer só em uma parte, tem de mexer no todo.”

Enquanto os bancos trazem à mesa possíveis restrições ao parcelado sem juros para acabar com o rotativo, as maquininhas independentes alegam que isso não seria necessário porque a tarifa de intercâmbio, paga pela maquininha ao emissor a cada transação, já cumpriria o papel de remunerar os riscos.

Maquininhas são um dos elos na cadeia dos pagamentos em cartão de débito ou crédito Foto: Gabriela Biló / Estadão

Segundo dados do BC do ano passado, a tarifa média cobrada do crédito à vista era de 1,32%, aumentando para 2,07% quando o cliente divide a compra em sete vezes ou mais. “O emissor está cobrando taxa de intercâmbio crescente a cada parcela, é remunerado”, sustenta Carol Conway, presidente da Associação Brasileira de Internet (Abranet).

Ela cita ainda que a média de taxa de antecipação é de 19% ao ano, enquanto a do rotativo é de 446%, segundo dados de julho. “A antecipação de recebíveis é uma parcela do setor financeiro que passou a ter competição. Incitados a reduzir o rotativo, querem fazer o lojista ficar prisioneiro.”

Questões de competição

A avaliação de executivos ligados às maquininhas independentes é de que os bancos buscam chancela institucional, seja do BC, do Ministério da Fazenda ou do Conselho Monetário Nacional (CMN), para limitar o parcelado. Em tese, nada impede que eles mesmos façam as mudanças, mas, se outros não aderirem, podem perder espaço no mercado.

“Querem que o governo meio que padronize essa questão”, avalia Conway. “Sugere que a coordenação para limitar parcelas é para diminuir a competição”, completou uma fonte do ramo.

A Febraban afirma que busca a divisão dos riscos entre os agentes do setor. “A Febraban e os bancos, dentro da conduta legal e concorrencial que sempre tiveram e prezam, perseguirão um caminho que dilua o risco de crédito entre os elos da cadeia e elimine os subsídios cruzados, numa transição sem rupturas do produto do cartão de crédito e de como ele se financia”, disse a entidade, em nota.

Como mostrou o Estadão/Broadcast, nas discussões entre a indústria de cartões, o governo, o Banco Central e o varejo, discute-se o virtual fim do rotativo, com a substituição pelo parcelamento de faturas com juros. O debate esbarra justamente na discordância sobre o papel que o parcelado sem juros tem nos custos do rotativo para os clientes, e sobre o que vai acontecer com ele.

O rotativo tem os juros mais altos do crédito pessoa física, e também a mais alta inadimplência, de 49,5%, de acordo com os dados do BC referentes a julho. Estes altos patamares fizeram com que a discussão começasse, e a relação de causa e consequência entre eles tem dividido o setor.

No BC, o presidente Roberto Campos Neto disse que o parcelamento sem juros atualmente é uma “anomalia”, porque representa 15% do crédito total e não incide juros. Campos Neto chegou a falar na criação de uma tarifa para desestimular o “parcelado longo”, afirmando que a média de parcelas já alcançava 13 meses.

Dados do BC do fim de 2022 mostram que, em valor financeiro, as compras à vista representavam 52,7% do total, seguido por 17,6% de 2 a 3 parcelas, 14% de 4 a 6 vezes e 15,7% em sete parcelas ou mais.

Do lado do governo, a avaliação é de que o tema deve ser retomado no momento da autorregulamentação estabelecida pelo projeto de lei do Desenrola, se aprovado, mas a equipe econômica vê dificuldade de os bancos fazerem a discussão sozinhos.

No desdobramento mais recente da queda de braço, a Febraban afirmou que as taxas de antecipação de recebíveis cobradas pelas independentes são três vezes maiores que as cobradas pelas maquininhas ligadas a banco, em especial nas compras a prazo, o que explicaria, segundo a entidade, a contrariedade dessas empresas a restrições ao parcelado sem juros. As maquininhas independentes rebatem esse ponto e afirmam que o ganho de participação de mercado nos últimos anos não sugere que oferecem um produto caro.

Ressaca

A guerra de versões acontece em um momento em que o mercado de cartões vive a ressaca dos anos de forte expansão da base de clientes. Desde 2013, quando as chamadas instituições de pagamento foram criadas, o número de cartões ativos no Brasil aumentou 155%, considerando o número do fim de 2022 (208,8 milhões). Até o início de 2019, a quantidade ainda estava abaixo de 100 milhões.

As instituições de pagamentos e bancos digitais usaram o cartão para fazer frente aos bancos tradicionais, que em reação, também aumentaram a oferta. Os limites se empilharam, mas a renda dos clientes não, e com o aumento da inflação e dos juros entre 2021 e 2022, a inadimplência deu um salto. O mercado se viu obrigado a colocar o pé no freio.

O BC reconhece que houve uma emissão exagerada de cartões nos últimos anos, não necessariamente com a análise mais criteriosa de crédito, o que fez saltar o número de cartões por pessoa - e se correlaciona com o aumento da inadimplência, na avaliação do regulador.

No debate sobre o rotativo, entidades como a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) propuseram a portabilidade das dívidas do cartão de crédito. Também está sobre a mesa a ideia de que os dados de cartão sejam obrigatoriamente compartilhados via Open Finance, para que todos os emissores saibam exatamente quanto de limite cada pessoa tem antes de conceder mais.

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