O economista Bernard Appy, em artigo neste jornal, admitiu que a aprovação da PEC 110 passa pelo convencimento das capitais e do setor de serviços de que a junção do ICMS e ISS seria um bom negócio. Sem levar em conta os demais aspectos dessa PEC, vamos nos ater aos pontos centrais dessa fusão.
O primeiro problema é o aumento da tributação sobre o setor de serviços. A alíquota atual do ISS, pela legislação nacional, não pode ser maior que 5% nem menor que 2%. A alíquota do ICMS varia de um Estado para outro, mas gira em torno de 18%, podendo chegar a 25%. Estima-se que, somando as alíquotas do novo IBS e da CBS federal, a carga tributária sobre bens e serviços seria de 30% – de longe, o maior IVA do mundo. Seria preferível um IVA com alíquota menor e avançar na tributação da renda e do patrimônio, como vigora nas economias da OCDE. Uma reforma que resulta na criação do maior IVA do mundo parece-nos, no mínimo, contraproducente.
Elevar a tributação no setor de serviços trará inconvenientes graves. Além do impacto recessivo no setor que representa 72% do PIB, haverá um estímulo à pejotização – ameaçando o emprego formal no setor que mais emprega no País. Outro problema é o aumento da sonegação. Mesmo com uma alíquota de 5%, a sonegação no setor de serviços é significativa. Diferentemente das mercadorias, os serviços são “intangíveis”: uma vez prestados, dificilmente o Fisco tem como averiguar. Com uma alíquota de 30%, haverá uma generalização da prática.
Ao extinguir o ISS, a PEC 110 obriga o município a viver de repasses dos Estados – numa clara afronta ao pacto federativo. Além de alterar o principal critério de repartição entre os municípios, num rateio cujo efeito é incerto e injusto. A proposta prevê que o rateio seja feito de forma proporcional à população de cada cidade (60% do valor), 5% será dividido igualmente entre todos e os outros 35% conforme dispuserem as Assembleias Legislativas. Municípios que fomentaram o desenvolvimento econômico teriam de destinar parte da arrecadação para outros que sobrevivem dos repasses federais e estaduais.
Ou seja, a PEC 110 mexe em tudo, sem salvaguardas. Seria mais prudente fazer o IBS a partir da transformação das legislações estaduais do ICMS em prol de uma única legislação nacional, com imposto de alíquota única, no destino, unificação de base de cálculo, sem incidência em cascata, com um padrão de obrigações acessórias – num IVA “padrão ouro”.
Outra reforma poderia ser feita no ISS, unificando-os nacionalmente. Os problemas do ISS podem ser facilmente resolvidos com normas infraconstitucionais. Juntar o ICMS e o ISS, no complexo cenário brasileiro, pode produzir um resultado mais disfuncional que o atual. Não há margem para erros, apostas ou experimentalismos econômicos.
* PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DAS SECRETARIAS DE FINANÇAS DAS CAPITAIS (ABRASF) E SECRETÁRIO DA FAZENDA DE ARACAJU; E DIRETOR TÉCNICO DA ABRASF E SECRETÁRIO MUNICIPAL DE FINANÇAS DE CAMPO GRANDE