Embate bilionário: Fazenda mira arrecadação e déficit zero, mas empresas veem empréstimo compulsório


Limite à compensação de créditos tributários gera críticas na iniciativa privada, que reclama de arbitrariedade do governo; equipe econômica alega forte aumento no uso do instrumento

Por Bianca Lima
Atualização:

BRASÍLIA – O ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tem um novo embate contratado: o limite à compensação de créditos tributários judiciais acima de R$ 10 milhões. A medida, que pode gerar R$ 24 bilhões extras neste ano e dar sobrevida à meta de déficit zero, vem gerando fortes críticas no setor privado – que, inclusive, já começou a judicializar o tema, como mostrou o Estadão.

Os empresários e representantes dos setores mais atingidos afirmam que a nova regra, editada por meio de Medida Provisória (MP) e ainda pendente de aprovação pelo Congresso, impacta o planejamento das empresas e reduz a capacidade de investimento.

“É o equivalente a um empréstimo compulsório. O governo diz: vou pagar com juros, mas só daqui a cinco anos”, afirma Pablo Cesário, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Para a entidade, que reúne boa parte das 495 companhias atingidas pela medida, a regra cria uma arrecadação ilusória e de curto prazo para a União.

continua após a publicidade

Isso porque a MP determina que as conciliações de alto valor – acima de R$ 10 milhões – passem a ser realizadas em um período mínimo de 12 a 60 meses, a depender do montante envolvido. Com essa mudança, as empresas demoram mais para usar os créditos, o que gera impacto no resultado fiscal do governo.

Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), critica medida de limitação de compensações tributárias. Foto: Dida Sampaio

“É um absurdo. Na minha visão, vai na mesma linha do que o (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes fez com os precatórios”, destaca Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF).

continua após a publicidade

Em 2019, o Congresso aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limitou o pagamento de precatórios, que são dívidas judiciais da União. O texto ficou conhecido como “PEC do Calote” e acabou sendo invalidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023.

“É ruim, porque são os casos que já passaram pela Justiça – e que a Justiça mandou compensar. Um dinheiro que o contribuinte pagou de forma indevida e que o governo precisa ressarcir. Então, não é dinheiro do governo”, diz Maia.

Outra crítica é de que o peso do ajuste fiscal, que vem sendo feito principalmente pelo lado da receita, recairá, mais uma vez, sobre as grandes empresas. Isso porque os outros três pontos previstos na mesma MP, também com impacto sobre a arrecadação, deverão ser anulados e rediscutidos por meio de projetos de lei.

continua após a publicidade

São eles: extinção de benefício tributário aos municípios, fim do programa de auxílio ao setor de eventos (Perse) e a reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia (esse já retirado da MP). “Ou seja, apenas nós que vamos pagar essa conta”, diz Valéria Lima, diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).

Ela afirma que o Estado não pode usar o seu poder arrecadatório de forma arbitrária e que “o combinado não sai caro”, frisando que as regras do jogo devem ser respeitadas.

O setor de óleo e gás é um dos maiores recolhedores de ICMS, o principal imposto estadual. Por esse motivo, tem volumosas quantias de crédito tributário judicial fruto da Tese do Século, o julgamento do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, duas contribuições federais.

continua após a publicidade

Apesar disso, ainda não há um movimento de judicialização dentro do segmento em relação a esse tema – o qual já é observado em outros ramos, como, por exemplo, dentre as varejistas.

Em meio a esse embate, os tributaristas estão em alerta e vão acompanhar com lupa o andamento da MP no Congresso. “Na minha opinião, as alterações promovidas nas regras de compensação ofendem uma série de princípios constitucionais, não devendo, portanto, prosperar”, afirma Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados.

‘Tábua de salvação’ da Fazenda

continua após a publicidade

Para a Fazenda, a avaliação do tema é completamente distinta. A limitação é vista como uma forma de resguardar a arrecadação federal diante de um aumento vertiginoso no uso desses créditos judiciais, como escreveu o ministro Haddad na justificativa da MP, em dezembro de 2023.

“A partir do ano de 2019, os créditos judiciais têm representado 38% dos créditos utilizados em compensações realizadas por meio do programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação. No período de 2005 a 2018, esse percentual era de 5%”, destaca o documento.

A estimativa, segundo a equipe econômica, é de que 90% dos créditos judiciais utilizados em compensação sejam relativos à exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos federais – ou seja, ligados à Tese do Século.

continua após a publicidade

O fato é que a limitação do uso desses créditos acabou se tornando uma espécie de “tábua de salvação” para a Fazenda em meio à revisão para baixo de outras ações arrecadatórias. É o caso da mudança na tributação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) – um tipo de remuneração das empresas a seus acionistas – e do programa Remessa Conforme, que combate a sonegação em compras realizadas por meio de varejistas internacionais.

Ambas tiveram a expectativa de receita zerada no último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado na sexta-feira, 22. Os técnicos também ajustaram a projeção para as subvenções do ICMS, que caiu quase R$ 10 bilhões: de R$ 35,3 bilhões para R$ 25,9 bilhões.

A Medida Provisória (MP) 1185, da chamada subvenção, fechou brechas para grandes empresas pagarem menos tributos federais, descontando incentivos fiscais concedidos pelos Estados. O texto, porém, passou por modificações no Congresso, o que levou ao ajuste da estimativa.

O que compensou praticamente todas essas reduções foi exatamente a limitação às compensações tributárias em valores acima de R$ 10 milhões. A medida não estava prevista na Lei Orçamentária e deve gerar um incremento de R$ 24 bilhões na arrecadação do ano, segundo os cálculos do Fisco.

Há, ainda, um outro efeito colateral da medida. Ao restringir o uso de créditos tributários, o governo acaba estimulando as empresas a optar pelo pagamento dos valores via precatórios, o que é conveniente à equipe econômica.

Isso porque o STF autorizou o pagamento de parte dos precatórios fora dos limites do novo arcabouço fiscal e da meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) até 2026, último ano do governo Lula. Ou seja, seria uma dupla ajuda orçamentária: pelo lado da receita, que ficará maior, e pelo lado gasto, que será feito fora das regras fiscais.

Procurados, Ministério da Fazenda, Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não se manifestaram.

BRASÍLIA – O ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tem um novo embate contratado: o limite à compensação de créditos tributários judiciais acima de R$ 10 milhões. A medida, que pode gerar R$ 24 bilhões extras neste ano e dar sobrevida à meta de déficit zero, vem gerando fortes críticas no setor privado – que, inclusive, já começou a judicializar o tema, como mostrou o Estadão.

Os empresários e representantes dos setores mais atingidos afirmam que a nova regra, editada por meio de Medida Provisória (MP) e ainda pendente de aprovação pelo Congresso, impacta o planejamento das empresas e reduz a capacidade de investimento.

“É o equivalente a um empréstimo compulsório. O governo diz: vou pagar com juros, mas só daqui a cinco anos”, afirma Pablo Cesário, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Para a entidade, que reúne boa parte das 495 companhias atingidas pela medida, a regra cria uma arrecadação ilusória e de curto prazo para a União.

Isso porque a MP determina que as conciliações de alto valor – acima de R$ 10 milhões – passem a ser realizadas em um período mínimo de 12 a 60 meses, a depender do montante envolvido. Com essa mudança, as empresas demoram mais para usar os créditos, o que gera impacto no resultado fiscal do governo.

Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), critica medida de limitação de compensações tributárias. Foto: Dida Sampaio

“É um absurdo. Na minha visão, vai na mesma linha do que o (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes fez com os precatórios”, destaca Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF).

Em 2019, o Congresso aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limitou o pagamento de precatórios, que são dívidas judiciais da União. O texto ficou conhecido como “PEC do Calote” e acabou sendo invalidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023.

“É ruim, porque são os casos que já passaram pela Justiça – e que a Justiça mandou compensar. Um dinheiro que o contribuinte pagou de forma indevida e que o governo precisa ressarcir. Então, não é dinheiro do governo”, diz Maia.

Outra crítica é de que o peso do ajuste fiscal, que vem sendo feito principalmente pelo lado da receita, recairá, mais uma vez, sobre as grandes empresas. Isso porque os outros três pontos previstos na mesma MP, também com impacto sobre a arrecadação, deverão ser anulados e rediscutidos por meio de projetos de lei.

São eles: extinção de benefício tributário aos municípios, fim do programa de auxílio ao setor de eventos (Perse) e a reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia (esse já retirado da MP). “Ou seja, apenas nós que vamos pagar essa conta”, diz Valéria Lima, diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).

Ela afirma que o Estado não pode usar o seu poder arrecadatório de forma arbitrária e que “o combinado não sai caro”, frisando que as regras do jogo devem ser respeitadas.

O setor de óleo e gás é um dos maiores recolhedores de ICMS, o principal imposto estadual. Por esse motivo, tem volumosas quantias de crédito tributário judicial fruto da Tese do Século, o julgamento do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, duas contribuições federais.

Apesar disso, ainda não há um movimento de judicialização dentro do segmento em relação a esse tema – o qual já é observado em outros ramos, como, por exemplo, dentre as varejistas.

Em meio a esse embate, os tributaristas estão em alerta e vão acompanhar com lupa o andamento da MP no Congresso. “Na minha opinião, as alterações promovidas nas regras de compensação ofendem uma série de princípios constitucionais, não devendo, portanto, prosperar”, afirma Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados.

‘Tábua de salvação’ da Fazenda

Para a Fazenda, a avaliação do tema é completamente distinta. A limitação é vista como uma forma de resguardar a arrecadação federal diante de um aumento vertiginoso no uso desses créditos judiciais, como escreveu o ministro Haddad na justificativa da MP, em dezembro de 2023.

“A partir do ano de 2019, os créditos judiciais têm representado 38% dos créditos utilizados em compensações realizadas por meio do programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação. No período de 2005 a 2018, esse percentual era de 5%”, destaca o documento.

A estimativa, segundo a equipe econômica, é de que 90% dos créditos judiciais utilizados em compensação sejam relativos à exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos federais – ou seja, ligados à Tese do Século.

O fato é que a limitação do uso desses créditos acabou se tornando uma espécie de “tábua de salvação” para a Fazenda em meio à revisão para baixo de outras ações arrecadatórias. É o caso da mudança na tributação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) – um tipo de remuneração das empresas a seus acionistas – e do programa Remessa Conforme, que combate a sonegação em compras realizadas por meio de varejistas internacionais.

Ambas tiveram a expectativa de receita zerada no último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado na sexta-feira, 22. Os técnicos também ajustaram a projeção para as subvenções do ICMS, que caiu quase R$ 10 bilhões: de R$ 35,3 bilhões para R$ 25,9 bilhões.

A Medida Provisória (MP) 1185, da chamada subvenção, fechou brechas para grandes empresas pagarem menos tributos federais, descontando incentivos fiscais concedidos pelos Estados. O texto, porém, passou por modificações no Congresso, o que levou ao ajuste da estimativa.

O que compensou praticamente todas essas reduções foi exatamente a limitação às compensações tributárias em valores acima de R$ 10 milhões. A medida não estava prevista na Lei Orçamentária e deve gerar um incremento de R$ 24 bilhões na arrecadação do ano, segundo os cálculos do Fisco.

Há, ainda, um outro efeito colateral da medida. Ao restringir o uso de créditos tributários, o governo acaba estimulando as empresas a optar pelo pagamento dos valores via precatórios, o que é conveniente à equipe econômica.

Isso porque o STF autorizou o pagamento de parte dos precatórios fora dos limites do novo arcabouço fiscal e da meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) até 2026, último ano do governo Lula. Ou seja, seria uma dupla ajuda orçamentária: pelo lado da receita, que ficará maior, e pelo lado gasto, que será feito fora das regras fiscais.

Procurados, Ministério da Fazenda, Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não se manifestaram.

BRASÍLIA – O ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tem um novo embate contratado: o limite à compensação de créditos tributários judiciais acima de R$ 10 milhões. A medida, que pode gerar R$ 24 bilhões extras neste ano e dar sobrevida à meta de déficit zero, vem gerando fortes críticas no setor privado – que, inclusive, já começou a judicializar o tema, como mostrou o Estadão.

Os empresários e representantes dos setores mais atingidos afirmam que a nova regra, editada por meio de Medida Provisória (MP) e ainda pendente de aprovação pelo Congresso, impacta o planejamento das empresas e reduz a capacidade de investimento.

“É o equivalente a um empréstimo compulsório. O governo diz: vou pagar com juros, mas só daqui a cinco anos”, afirma Pablo Cesário, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Para a entidade, que reúne boa parte das 495 companhias atingidas pela medida, a regra cria uma arrecadação ilusória e de curto prazo para a União.

Isso porque a MP determina que as conciliações de alto valor – acima de R$ 10 milhões – passem a ser realizadas em um período mínimo de 12 a 60 meses, a depender do montante envolvido. Com essa mudança, as empresas demoram mais para usar os créditos, o que gera impacto no resultado fiscal do governo.

Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), critica medida de limitação de compensações tributárias. Foto: Dida Sampaio

“É um absurdo. Na minha visão, vai na mesma linha do que o (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes fez com os precatórios”, destaca Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF).

Em 2019, o Congresso aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limitou o pagamento de precatórios, que são dívidas judiciais da União. O texto ficou conhecido como “PEC do Calote” e acabou sendo invalidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023.

“É ruim, porque são os casos que já passaram pela Justiça – e que a Justiça mandou compensar. Um dinheiro que o contribuinte pagou de forma indevida e que o governo precisa ressarcir. Então, não é dinheiro do governo”, diz Maia.

Outra crítica é de que o peso do ajuste fiscal, que vem sendo feito principalmente pelo lado da receita, recairá, mais uma vez, sobre as grandes empresas. Isso porque os outros três pontos previstos na mesma MP, também com impacto sobre a arrecadação, deverão ser anulados e rediscutidos por meio de projetos de lei.

São eles: extinção de benefício tributário aos municípios, fim do programa de auxílio ao setor de eventos (Perse) e a reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia (esse já retirado da MP). “Ou seja, apenas nós que vamos pagar essa conta”, diz Valéria Lima, diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).

Ela afirma que o Estado não pode usar o seu poder arrecadatório de forma arbitrária e que “o combinado não sai caro”, frisando que as regras do jogo devem ser respeitadas.

O setor de óleo e gás é um dos maiores recolhedores de ICMS, o principal imposto estadual. Por esse motivo, tem volumosas quantias de crédito tributário judicial fruto da Tese do Século, o julgamento do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, duas contribuições federais.

Apesar disso, ainda não há um movimento de judicialização dentro do segmento em relação a esse tema – o qual já é observado em outros ramos, como, por exemplo, dentre as varejistas.

Em meio a esse embate, os tributaristas estão em alerta e vão acompanhar com lupa o andamento da MP no Congresso. “Na minha opinião, as alterações promovidas nas regras de compensação ofendem uma série de princípios constitucionais, não devendo, portanto, prosperar”, afirma Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados.

‘Tábua de salvação’ da Fazenda

Para a Fazenda, a avaliação do tema é completamente distinta. A limitação é vista como uma forma de resguardar a arrecadação federal diante de um aumento vertiginoso no uso desses créditos judiciais, como escreveu o ministro Haddad na justificativa da MP, em dezembro de 2023.

“A partir do ano de 2019, os créditos judiciais têm representado 38% dos créditos utilizados em compensações realizadas por meio do programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação. No período de 2005 a 2018, esse percentual era de 5%”, destaca o documento.

A estimativa, segundo a equipe econômica, é de que 90% dos créditos judiciais utilizados em compensação sejam relativos à exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos federais – ou seja, ligados à Tese do Século.

O fato é que a limitação do uso desses créditos acabou se tornando uma espécie de “tábua de salvação” para a Fazenda em meio à revisão para baixo de outras ações arrecadatórias. É o caso da mudança na tributação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) – um tipo de remuneração das empresas a seus acionistas – e do programa Remessa Conforme, que combate a sonegação em compras realizadas por meio de varejistas internacionais.

Ambas tiveram a expectativa de receita zerada no último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado na sexta-feira, 22. Os técnicos também ajustaram a projeção para as subvenções do ICMS, que caiu quase R$ 10 bilhões: de R$ 35,3 bilhões para R$ 25,9 bilhões.

A Medida Provisória (MP) 1185, da chamada subvenção, fechou brechas para grandes empresas pagarem menos tributos federais, descontando incentivos fiscais concedidos pelos Estados. O texto, porém, passou por modificações no Congresso, o que levou ao ajuste da estimativa.

O que compensou praticamente todas essas reduções foi exatamente a limitação às compensações tributárias em valores acima de R$ 10 milhões. A medida não estava prevista na Lei Orçamentária e deve gerar um incremento de R$ 24 bilhões na arrecadação do ano, segundo os cálculos do Fisco.

Há, ainda, um outro efeito colateral da medida. Ao restringir o uso de créditos tributários, o governo acaba estimulando as empresas a optar pelo pagamento dos valores via precatórios, o que é conveniente à equipe econômica.

Isso porque o STF autorizou o pagamento de parte dos precatórios fora dos limites do novo arcabouço fiscal e da meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) até 2026, último ano do governo Lula. Ou seja, seria uma dupla ajuda orçamentária: pelo lado da receita, que ficará maior, e pelo lado gasto, que será feito fora das regras fiscais.

Procurados, Ministério da Fazenda, Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não se manifestaram.

BRASÍLIA – O ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tem um novo embate contratado: o limite à compensação de créditos tributários judiciais acima de R$ 10 milhões. A medida, que pode gerar R$ 24 bilhões extras neste ano e dar sobrevida à meta de déficit zero, vem gerando fortes críticas no setor privado – que, inclusive, já começou a judicializar o tema, como mostrou o Estadão.

Os empresários e representantes dos setores mais atingidos afirmam que a nova regra, editada por meio de Medida Provisória (MP) e ainda pendente de aprovação pelo Congresso, impacta o planejamento das empresas e reduz a capacidade de investimento.

“É o equivalente a um empréstimo compulsório. O governo diz: vou pagar com juros, mas só daqui a cinco anos”, afirma Pablo Cesário, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Para a entidade, que reúne boa parte das 495 companhias atingidas pela medida, a regra cria uma arrecadação ilusória e de curto prazo para a União.

Isso porque a MP determina que as conciliações de alto valor – acima de R$ 10 milhões – passem a ser realizadas em um período mínimo de 12 a 60 meses, a depender do montante envolvido. Com essa mudança, as empresas demoram mais para usar os créditos, o que gera impacto no resultado fiscal do governo.

Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), critica medida de limitação de compensações tributárias. Foto: Dida Sampaio

“É um absurdo. Na minha visão, vai na mesma linha do que o (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes fez com os precatórios”, destaca Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF).

Em 2019, o Congresso aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limitou o pagamento de precatórios, que são dívidas judiciais da União. O texto ficou conhecido como “PEC do Calote” e acabou sendo invalidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023.

“É ruim, porque são os casos que já passaram pela Justiça – e que a Justiça mandou compensar. Um dinheiro que o contribuinte pagou de forma indevida e que o governo precisa ressarcir. Então, não é dinheiro do governo”, diz Maia.

Outra crítica é de que o peso do ajuste fiscal, que vem sendo feito principalmente pelo lado da receita, recairá, mais uma vez, sobre as grandes empresas. Isso porque os outros três pontos previstos na mesma MP, também com impacto sobre a arrecadação, deverão ser anulados e rediscutidos por meio de projetos de lei.

São eles: extinção de benefício tributário aos municípios, fim do programa de auxílio ao setor de eventos (Perse) e a reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia (esse já retirado da MP). “Ou seja, apenas nós que vamos pagar essa conta”, diz Valéria Lima, diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).

Ela afirma que o Estado não pode usar o seu poder arrecadatório de forma arbitrária e que “o combinado não sai caro”, frisando que as regras do jogo devem ser respeitadas.

O setor de óleo e gás é um dos maiores recolhedores de ICMS, o principal imposto estadual. Por esse motivo, tem volumosas quantias de crédito tributário judicial fruto da Tese do Século, o julgamento do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, duas contribuições federais.

Apesar disso, ainda não há um movimento de judicialização dentro do segmento em relação a esse tema – o qual já é observado em outros ramos, como, por exemplo, dentre as varejistas.

Em meio a esse embate, os tributaristas estão em alerta e vão acompanhar com lupa o andamento da MP no Congresso. “Na minha opinião, as alterações promovidas nas regras de compensação ofendem uma série de princípios constitucionais, não devendo, portanto, prosperar”, afirma Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados.

‘Tábua de salvação’ da Fazenda

Para a Fazenda, a avaliação do tema é completamente distinta. A limitação é vista como uma forma de resguardar a arrecadação federal diante de um aumento vertiginoso no uso desses créditos judiciais, como escreveu o ministro Haddad na justificativa da MP, em dezembro de 2023.

“A partir do ano de 2019, os créditos judiciais têm representado 38% dos créditos utilizados em compensações realizadas por meio do programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação. No período de 2005 a 2018, esse percentual era de 5%”, destaca o documento.

A estimativa, segundo a equipe econômica, é de que 90% dos créditos judiciais utilizados em compensação sejam relativos à exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos federais – ou seja, ligados à Tese do Século.

O fato é que a limitação do uso desses créditos acabou se tornando uma espécie de “tábua de salvação” para a Fazenda em meio à revisão para baixo de outras ações arrecadatórias. É o caso da mudança na tributação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) – um tipo de remuneração das empresas a seus acionistas – e do programa Remessa Conforme, que combate a sonegação em compras realizadas por meio de varejistas internacionais.

Ambas tiveram a expectativa de receita zerada no último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado na sexta-feira, 22. Os técnicos também ajustaram a projeção para as subvenções do ICMS, que caiu quase R$ 10 bilhões: de R$ 35,3 bilhões para R$ 25,9 bilhões.

A Medida Provisória (MP) 1185, da chamada subvenção, fechou brechas para grandes empresas pagarem menos tributos federais, descontando incentivos fiscais concedidos pelos Estados. O texto, porém, passou por modificações no Congresso, o que levou ao ajuste da estimativa.

O que compensou praticamente todas essas reduções foi exatamente a limitação às compensações tributárias em valores acima de R$ 10 milhões. A medida não estava prevista na Lei Orçamentária e deve gerar um incremento de R$ 24 bilhões na arrecadação do ano, segundo os cálculos do Fisco.

Há, ainda, um outro efeito colateral da medida. Ao restringir o uso de créditos tributários, o governo acaba estimulando as empresas a optar pelo pagamento dos valores via precatórios, o que é conveniente à equipe econômica.

Isso porque o STF autorizou o pagamento de parte dos precatórios fora dos limites do novo arcabouço fiscal e da meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) até 2026, último ano do governo Lula. Ou seja, seria uma dupla ajuda orçamentária: pelo lado da receita, que ficará maior, e pelo lado gasto, que será feito fora das regras fiscais.

Procurados, Ministério da Fazenda, Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não se manifestaram.

BRASÍLIA – O ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já tem um novo embate contratado: o limite à compensação de créditos tributários judiciais acima de R$ 10 milhões. A medida, que pode gerar R$ 24 bilhões extras neste ano e dar sobrevida à meta de déficit zero, vem gerando fortes críticas no setor privado – que, inclusive, já começou a judicializar o tema, como mostrou o Estadão.

Os empresários e representantes dos setores mais atingidos afirmam que a nova regra, editada por meio de Medida Provisória (MP) e ainda pendente de aprovação pelo Congresso, impacta o planejamento das empresas e reduz a capacidade de investimento.

“É o equivalente a um empréstimo compulsório. O governo diz: vou pagar com juros, mas só daqui a cinco anos”, afirma Pablo Cesário, presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Para a entidade, que reúne boa parte das 495 companhias atingidas pela medida, a regra cria uma arrecadação ilusória e de curto prazo para a União.

Isso porque a MP determina que as conciliações de alto valor – acima de R$ 10 milhões – passem a ser realizadas em um período mínimo de 12 a 60 meses, a depender do montante envolvido. Com essa mudança, as empresas demoram mais para usar os créditos, o que gera impacto no resultado fiscal do governo.

Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), critica medida de limitação de compensações tributárias. Foto: Dida Sampaio

“É um absurdo. Na minha visão, vai na mesma linha do que o (ex-ministro da Economia) Paulo Guedes fez com os precatórios”, destaca Rodrigo Maia, ex-presidente da Câmara dos Deputados e atual presidente do Conselho de Representantes da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF).

Em 2019, o Congresso aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limitou o pagamento de precatórios, que são dívidas judiciais da União. O texto ficou conhecido como “PEC do Calote” e acabou sendo invalidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2023.

“É ruim, porque são os casos que já passaram pela Justiça – e que a Justiça mandou compensar. Um dinheiro que o contribuinte pagou de forma indevida e que o governo precisa ressarcir. Então, não é dinheiro do governo”, diz Maia.

Outra crítica é de que o peso do ajuste fiscal, que vem sendo feito principalmente pelo lado da receita, recairá, mais uma vez, sobre as grandes empresas. Isso porque os outros três pontos previstos na mesma MP, também com impacto sobre a arrecadação, deverão ser anulados e rediscutidos por meio de projetos de lei.

São eles: extinção de benefício tributário aos municípios, fim do programa de auxílio ao setor de eventos (Perse) e a reoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia (esse já retirado da MP). “Ou seja, apenas nós que vamos pagar essa conta”, diz Valéria Lima, diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).

Ela afirma que o Estado não pode usar o seu poder arrecadatório de forma arbitrária e que “o combinado não sai caro”, frisando que as regras do jogo devem ser respeitadas.

O setor de óleo e gás é um dos maiores recolhedores de ICMS, o principal imposto estadual. Por esse motivo, tem volumosas quantias de crédito tributário judicial fruto da Tese do Século, o julgamento do STF que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, duas contribuições federais.

Apesar disso, ainda não há um movimento de judicialização dentro do segmento em relação a esse tema – o qual já é observado em outros ramos, como, por exemplo, dentre as varejistas.

Em meio a esse embate, os tributaristas estão em alerta e vão acompanhar com lupa o andamento da MP no Congresso. “Na minha opinião, as alterações promovidas nas regras de compensação ofendem uma série de princípios constitucionais, não devendo, portanto, prosperar”, afirma Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão, Duque Estrada Advogados.

‘Tábua de salvação’ da Fazenda

Para a Fazenda, a avaliação do tema é completamente distinta. A limitação é vista como uma forma de resguardar a arrecadação federal diante de um aumento vertiginoso no uso desses créditos judiciais, como escreveu o ministro Haddad na justificativa da MP, em dezembro de 2023.

“A partir do ano de 2019, os créditos judiciais têm representado 38% dos créditos utilizados em compensações realizadas por meio do programa Pedido de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação. No período de 2005 a 2018, esse percentual era de 5%”, destaca o documento.

A estimativa, segundo a equipe econômica, é de que 90% dos créditos judiciais utilizados em compensação sejam relativos à exclusão do ICMS da base de cálculo dos tributos federais – ou seja, ligados à Tese do Século.

O fato é que a limitação do uso desses créditos acabou se tornando uma espécie de “tábua de salvação” para a Fazenda em meio à revisão para baixo de outras ações arrecadatórias. É o caso da mudança na tributação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) – um tipo de remuneração das empresas a seus acionistas – e do programa Remessa Conforme, que combate a sonegação em compras realizadas por meio de varejistas internacionais.

Ambas tiveram a expectativa de receita zerada no último relatório bimestral de receitas e despesas, divulgado na sexta-feira, 22. Os técnicos também ajustaram a projeção para as subvenções do ICMS, que caiu quase R$ 10 bilhões: de R$ 35,3 bilhões para R$ 25,9 bilhões.

A Medida Provisória (MP) 1185, da chamada subvenção, fechou brechas para grandes empresas pagarem menos tributos federais, descontando incentivos fiscais concedidos pelos Estados. O texto, porém, passou por modificações no Congresso, o que levou ao ajuste da estimativa.

O que compensou praticamente todas essas reduções foi exatamente a limitação às compensações tributárias em valores acima de R$ 10 milhões. A medida não estava prevista na Lei Orçamentária e deve gerar um incremento de R$ 24 bilhões na arrecadação do ano, segundo os cálculos do Fisco.

Há, ainda, um outro efeito colateral da medida. Ao restringir o uso de créditos tributários, o governo acaba estimulando as empresas a optar pelo pagamento dos valores via precatórios, o que é conveniente à equipe econômica.

Isso porque o STF autorizou o pagamento de parte dos precatórios fora dos limites do novo arcabouço fiscal e da meta de resultado primário (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida) até 2026, último ano do governo Lula. Ou seja, seria uma dupla ajuda orçamentária: pelo lado da receita, que ficará maior, e pelo lado gasto, que será feito fora das regras fiscais.

Procurados, Ministério da Fazenda, Receita Federal e Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), não se manifestaram.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.