SEUL - Na segunda-feira, os mercados acionários do Japão sofreram a maior queda desde 1987 - e a maior, em pontos, da história -, enviando ondas de choque aos mercados globais. Porém, no dia seguinte, os mercados japoneses se recuperaram com força, registrando o maior ganho diário desde 2008.
O caos nos mercados financeiros globais nesta semana provocou turbulência na Ásia, nos Estados Unidos e em outras partes do mundo.
Mas o Japão, a quarta maior economia do mundo, está passando por um momento particularmente turbulento.
Isso se deve, em parte, ao que está acontecendo na maior economia global: números inesperadamente baixos de empregos nos EUA em julho e um aumento na taxa de desemprego, bem como a possibilidade de o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) cortar as taxas de juros em resposta, levaram a temores de uma desaceleração nos Estados Unidos e no crescimento global.
Além disso, as rápidas mudanças no valor da moeda japonesa e as recentes decisões de política monetária do Banco do Japão alimentaram ainda mais o pânico no mercado, dizem os especialistas.
“Os sinais de fraqueza na economia dos EUA agiram como a faísca para esses eventos, enquanto os fatores técnicos nos mercados financeiros japoneses são o combustível”, disse Kyle Rodda, analista sênior de mercado da Capital.com, com sede em Melbourne, Austrália.
Por que os mercados japoneses foram tão duramente atingidos?
Uma combinação de fatores levou os mercados japoneses a sofrerem um grande golpe. Na segunda-feira, o índice de ações Nikki 225 do país sofreu a maior queda em um dia desde 1987, de mais de 12%. Entre esses fatores está a rápida valorização da moeda japonesa, dizem os especialistas.
O iene permaneceu fraco em relação ao dólar nos últimos cinco anos, perdendo mais de 40% de seu valor, mas se fortaleceu nas últimas semanas, atingindo, na quinta-feira, 1.º, seu ponto mais alto em relação ao dólar desde março.
Isso ocorreu após uma rara decisão do Banco do Japão de aumentar as taxas de juros.
A valorização do iene levou a preocupações de que as empresas exportadoras japonesas veriam seus lucros caírem, disse Hirokazu Kabeya, estrategista-chefe global da Daiwa Securities, em Tóquio. Essas preocupações contribuíram para a queda nos preços das ações e para o aumento das vendas, disse.
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As ações de tecnologia em todo o mundo também caíram depois que o governo Biden indicou, no mês passado, que iria impor mais restrições às exportações de semicondutores para a China. Esse anúncio afetou os mercados com grandes fabricantes de chips, como Japão, Coreia do Sul e Taiwan.
Em seguida, o relatório de empregos dos EUA de sexta-feira ficou abaixo das expectativas do mercado, o que gerou incertezas sobre a economia americana e perguntas sobre a possibilidade de uma intervenção do Federal Reserve. Na quarta-feira, 31, o Fed havia decidido deixar as taxas de juros inalteradas.
O que é o “carry trade” do iene e o que ele tem a ver com o caos mais recente?
Durante anos, enquanto lutava contra a deflação, o Japão manteve as taxas de juros negativas. Isso tornou atraente para os investidores tomar emprestado o iene a baixo custo e depois usá-lo para comprar ativos em moedas com juros altos e retornos previsíveis, como títulos do Tesouro dos EUA ou ações de tecnologia de empresas americanas. Essa estratégia de investimento de “carry trade” tornou-se popular nos últimos anos.
“Portanto, se você tomar um empréstimo em ienes e comprar ativos de maior rendimento no exterior, poderá obter um lucro considerável”, disse Kei Okamura, gerente de portfólio da empresa de investimentos Neuberger Berman, sediada no Japão.
Porém, em março, o BC do Japão aumentou as taxas de juros pela primeira vez desde 2007. Em 31 de julho, o Banco do Japão aumentou novamente a taxa de juros para cerca de 0,25%, causando um aumento no valor do iene em relação ao dólar.
O aumento mais recente da taxa foi inesperado - o mercado presumiu que ocorreria em setembro - e o presidente do Banco do Japão, Kazuo Ueda, disse que os aumentos poderiam continuar. Isso provocou uma rápida valorização do iene, disse Rina Oshimo, estrategista sênior da Okasan Securities, em Tóquio.
Quando o iene se valoriza, ele torna os investimentos em “carry trade” mais arriscados, e os investidores venderão o iene, disseram os especialistas. Foi isso que aconteceu após a decisão do Banco do Japão: uma dramática liquidação global de ativos de risco comprados com o iene, perturbando os mercados em todo o mundo.
O que acontecerá agora?
Após a queda de 12% na segunda-feira, o índice de ações Nikkei 225 registrou seu maior ganho diário desde outubro de 2008, fechando com alta de 10,23% na terça-feira. Nesta quarta-feira, 7, a Bolsa abriu em queda, mas acabou fechando com ganho de 1,2%.
Os economistas japoneses dizem que as últimas flutuações do mercado são um fenômeno de curto prazo e não necessariamente um sinal de deterioração estrutural significativa na economia do país.
“Neste momento, não há muito impacto de longo prazo sobre a economia japonesa”, disse Takahide Kiuchi, economista executivo do Nomura Research Institute, em Tóquio. “A rápida valorização do iene e a queda dos preços das ações serão um obstáculo para a economia como um todo, inclusive para os gastos dos consumidores.”
Algumas das flutuações de segunda-feira tiveram origem na “reação exagerada dos participantes do mercado”, disse Kabeya, da Daiwa Securities. De uma perspectiva de longo prazo, as ações japonesas continuam promissoras.
Espera-se que a política de juros baixos do Japão continue, apesar de sua atual fase de aumentos, disse Takehiko Masuzawa, chefe de negociação de ações da Phillip Securities Japan, acrescentando que ele espera que o mercado se acalme.