Aumento da conta de água tende a ser maior sem a privatização, diz presidente da Sabesp


À frente da companhia, André Salcedo nega que apagão de energia atrapalhe processo de privatização da concessionária: ‘Robustece o debate’

Por Beatriz Bulla
Atualização:
Foto: TABA BENEDICTO
Entrevista comAndré SalcedoPresidente da Sabesp

Diretor-presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), André Salcedo nega que o apagão no fornecimento de energia elétrica da última semana e as críticas à Enel atrapalhem o processo de privatização da empresa de saneamento paulista. “Robustece o debate”, diz Salcedo, em entrevista ao Estadão. Entusiasta da privatização da Sabesp, que tem como principal garoto-propaganda o governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Salcedo afirma que o caso da Sabesp é diferente do da Enel.

Ao Estadao, ele também diz que o aumento de investimentos necessário para universalizar o tratamento de água no Estado de São Paulo fará a tarifa subir. A privatização, segundo ele, pode segurar esse aumento, através da melhora de eficiência da empresa.

Presidente da Sabesp, Andre Salcedo Foto: TABA BENEDICTO
continua após a publicidade

Tarcísio enviou no dia 17 de outubro à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, projeto de lei de privatização da Sabesp. Atualmente, o governo detém 50,3% das ações da empresa. A intenção do Estado é ter sua participação reduzida a algo entre 15% e 30%.

Leia abaixo a entrevista:

O apagão da última semana e as críticas sobre a Enel atrapalham o processo de privatização da Sabesp?

continua após a publicidade

Acho que robustece o debate. Eventos como esse, numa concessão de 30 anos, vão acontecer. E como é que você trata isso? Com uma regulação bem construída. O debate sobre por que aconteceu aqui e não vai acontecer lá enriquece a tomada de decisão e permite que o governo, a empresa, a agência reguladora se coloquem exatamente para separar e dizer “no nosso caso, isso não é aplicável”.

O modelo da Sabesp é mais sólido do que do que o contrato de concessão da Enel, como sugere o governador Tarcísio?

Tem o aspecto do tipo de infraestrutura, do relacionamento com o poder concedente e regulador e da regulação. Então, pelo tipo de infraestrutura são coisas diferentes. Não é melhor ou pior, mas a nossa infraestrutura é enterrada. Os efeitos de eventos climáticos atípicos nos afetam, mas de um jeito diferente. Tivemos a crise hídrica. Foi um tremendo trabalho de mobilização para repensar o que é resiliência hídrica dentro da região metropolitana de São Paulo. Precisamos pensar a longo prazo, acrescentando essa mudança que está acontecendo no mundo todo, de eventos extremos climáticos, no nosso planejamento estratégico. Isso já estamos fazendo. Anunciamos, no contexto do processo de desestatização, o projeto de resiliência hídrica também para o litoral, por exemplo.

continua após a publicidade

Além disso, o ente regulador, no nosso caso, é uma agência estadual muito mais próxima (do que o ente regulador da Enel) e acompanha o dia a dia com muito mais proximidade da Sabesp; e nos cobra. E o poder concedente, diferentemente da distribuidora de energia, ele é municipal ou compartilhado entre o município e o Estado. O dono da concessão é o município. Nosso cliente é o prefeito. E essa relação (com os prefeitos) é uma relação muito importante, de garantir que o plano de investimento está sendo executado, que há transparência na prestação de contas, que as demandas associadas ao saneamento do município, expansão, crescimento de áreas são contempladas pela empresa.

Tem vários aspectos que nos diferenciam. O fato de a nossa infraestrutura ser enterrada também ajuda, porque exige mais investimento para botar tudo debaixo da terra, mas ao mesmo tempo é mais sólida e resistente ao tipo de intempérie temporal.

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que trabalha pela aprovação do projeto para privatizar a Sabesp. Foto: Marcelo S. Camargo/Governo do Estado de SP
continua após a publicidade

Isso falando das questões estruturais, mas e sobre o desenho dessa privatização?

Há pontos positivos: existem investimentos adicionais ao nosso plano de investimento para garantir um aumento da área atendida pela Sabesp. Hoje temos três tipos de contratos: os que envolvem somente regiões metropolitanas, tem contratos que desenham a área que atendemos e outros que não falam especificamente. Uma das propostas da privatização é expandir o escopo do contrato, para que seja o município inteiro. Isso nos ajuda a garantir que aqueles que estavam fora do escopo anterior irão ter seu esgoto coletado e tratado. Isso nos ajuda a melhorar a qualidade dos mananciais.

Sem a privatização, seria possível fazer isso? Qual seria o outro cenário?

continua após a publicidade

A privatização permite que isso seja feito. A análise de se poderia ser feito de outro jeito, eu não sei te responder. No contexto do marco do saneamento, há um dispositivo que determina que em um processo de venda de controle a partir do Estado, há a possibilidade de alteração contratual, de escopo, prazo, objeto. E, dentro desse contexto, está sendo colocado como uma vantagem o atendimento pela Sabesp integral do município, incluindo zonas rurais e zonas urbanas informais consolidadas. Estamos falando de um milhão de pessoas que hoje consomem água de algum lugar e produzem esgoto residencial. Além disso, há um conjunto de investimentos que envolvem dessalinização, um tratamento melhor adicional da água que hoje é tratada nas estações de tratamento de esgoto. Esses investimentos adicionais somam R$ 10 bilhões.

Quando se fala em privatização, o receio de parte da população é de que haja uma diminuição de investimento ou uma precarização do serviço e/ou um aumento na tarifa cobrada do usuário, para gerar mais lucro para o investidor. O que o sr. diria para o cidadão, para a população, para assegurar que não é isso que irá acontecer?

Eventualmente a gente põe uma temática de desestatização como um grande marco. Mas pega a história da Sabesp: em 1994, ela abriu o capital junto à CVM. Em 1997, ela fez o IPO, ou seja, atraiu o capital privado. Em 2002, ela fez uma nova oferta, listou no novo mercado da B3, a antiga Bovespa, e em Nova York. Ela vem se privatizando ao longo do tempo. O processo de atração de capital privado para o capital da companhia já existe.

continua após a publicidade

E por que ele existe? Por que empresas do setor conseguem atrair capital privado para a venda de ações? Porque é um negócio regulado com uma previsibilidade de retorno aos investimentos feitos. A Sabesp já tem hoje na sua regulação, assim como todas as outras empresas que atuam no mesmo formato de regulação, um retorno que chama de WACC regulatório (taxa de retorno mínima), que é o retorno que a agência estabelece com base em métricas de mercado. A Aneel também tem essa lógica e as agências estaduais também têm essa lógica. A capacidade econômica e financeira da Sabesp para concluir a universalização em São Paulo está associada a um retorno desse investimento que está sendo feito. A nossa taxa de retorno hoje, estabelecida pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), é 8,1%. Todo investimento que a empresa faz é remunerado nessa taxa de retorno, que baliza a tarifa que é estabelecida no começo do ciclo.

SAO PAULO SP 10/11/2023 ECONOMIA - RETRATO/ PRESIDENTE DA SABESP/ ANDRE SALCEDO - O presidente da SABESP, Andre Salcedo, durante entrevista para o Estadao, na sede da empresa em Sao Paulo. FOTO TABA BENEDICTO / ESTADAO Foto: TABA BENEDICTO

No início do ciclo, a Arsesp diz: você tem de investir tantos bilhões de reais para avançar do nível de cobertura que tem hoje para o nível de cobertura que queremos. Esse volume de investimento vai demandar tanto de capital. Esse capital tem de ser remunerado desse jeito. Você tem de ter uma receita mínima para que pague suas despesas e retorne o dinheiro para os investidores e você consiga fazer esses investimentos.

O retorno já existe, já é disciplinado. O que está sendo estudado é o que pode ser melhorado nesse modelo de regulação. Tem alguma forma que esse modelo possa ser ajustado e melhore a perspectiva de ganho de eficiência em comparação com uma empresa pública? Ela (empresa pública) tem restrições com relação a como ela pode gerir, contratar obras, serviços de terceiros e mesmo funcionários de uma empresa privada? Uma empresa privada tem mais flexibilidade, pode ser mais eficiente. Como o modelo de regulação pode capturar isso de um jeito a incentivar o player privado a ser mais eficiente, capturar parte desse ganho e partir para tarifa? Esse é o debate que está acontecendo hoje. Como melhoramos o modelo regulatório para que ele incentive ganhos de eficiência e essa eficiência seja compartilhada também com a tarifa?

Então, se nada for feito, temos uma curva tarifária que tende a aumentar, porque os investimentos vão aumentar. Temos hoje uma necessidade de investimento R$ 56 bilhões para universalização (do saneamento).

Em quanto tempo?

Até 2033. A nossa base de ativos hoje está na ordem de R$ 60, 70 bilhões. Vai crescer muito. Esse processo, naturalmente, vai demandar uma recomposição tarifária. A tarifa tende a aumentar nesse período para remunerar esse investimento. Há as melhorias que estão sendo desenhadas exatamente para conseguir capturar e acelerar o processo de ganho de eficiência na companhia após desestatização e essa grande eficiência, junto com uma melhoria na regulação, trazer essa curva (de aumento da tarifa) para um patamar menor. Ou seja, a evolução tarifária seria menor no cenário de desestatização do que se nada fosse feito.

Estação de água da Sabesp. Foto: Google Streetview

Na Alesp, uma das coisas que se falou é que não há elementos suficientes para deliberar sobre a privatização. Os srs. têm mantido diálogo com os deputados?

O governador é o grande garoto-propaganda do projeto. Ele acredita muito e eu acredito, da mesma forma que ele, num projeto que tem um potencial gigantesco de melhorar a vida de todas as pessoas na nossa área de concessão, habilita a Sabesp a expandir territorialmente não só em São Paulo, mas no Brasil, levando essa tecnologia, essa inteligência operacional que a empresa tem para outros rincões do País, que não tem acesso à água ou coleta tratamento de esgoto. Por que faz sentido? Para além de tudo isso, tem o potencial gigantesco de levar qualidade de vida para lugares que a gente hoje não opera.

O nosso papel é de dar todo o subsídio para o governo do Estado, para tomada de decisão, para analisar cenários, para contribuir na melhoria regulatória, na definição de investimentos para o município. Esse detalhamento técnico, a gente faz. A coordenação política e a interação com o processo de tomada de decisão na Alesp fica a cargo do governo.

Qual o estado da empresa hoje? O sr. assumiu em janeiro, foi feito um programa para enxugar o quadro de funcionários.

A Sabesp é uma empresa impressionante do ponto de vista de qualidade das pessoas, da história. Ao longo do tempo construiu uma estrutura física, uma estrutura de tomada de decisão que foi muito eficiente em um determinado momento, mas deixou de ser. Vimos muitas oportunidades de melhorar a eficiência da companhia. Transformar a empresa numa empresa mais moderna, mais próxima dos clientes, com alinhamento de visão, de disciplina regulatória.

Identificamos uma oportunidade de otimização do número de posições. Nós tínhamos, até a metade do ano, 12.500 pessoas, e a nossa percepção é que poderíamos reduzir o quadro fixo da empresa em 2.000 pessoas. Essa era uma demanda inclusive dos próprios sindicatos, que queriam incentivo para o pessoal mais velho sair e dar espaço para o pessoal mais novo ascender na carreira.

O governo do Estado entendeu que era pertinente. Aprovamos. No âmbito estadual, iniciamos o processo de adesão ao programa (de desligamento) em junho. Nosso foco eram duas mil pessoas e 1.862 aderiram, 93% do foco.

Outro destaque positivo: é a primeira vez que investimos, nos nove meses do ano, de janeiro a setembro, R$ 3,9 bilhões. Então, é o maior investimento em nove meses que a companhia já fez na sua história. Conseguimos acelerar o investimento e antecipar a universalização na nossa área de atuação. Conseguimos antecipar esses investimentos por conta dos ganhos de eficiência que capturamos neste ano.

E com relação ao lucro? (O lucro da Sabesp caiu 21,7% no terceiro trimestre de 2023, em comparação com igual período do ano passado)

O lucro está caminhando dentro do que a gente planeja, sim. Temos o componente que a gente controla bem, que é o desempenho operacional. O desempenho financeiro depende de taxas de juros, etc. Do ano passado para este, teve uma variação, mas que está dentro das expectativas. Então, o lucro final foi melhor do que alguns analistas esperavam, mas em grande parte em linha com a média de mercado nas expectativas dos analistas.

O cenário ideal, na leitura do sr., para a Sabesp, em termos de prazos para privatização e valores, qual é?

O nosso cenário base é que a desestatização vai acontecer no meio do ano que vem. Trabalhamos todos os dias com esse cenário, mas a companhia, hoje, não é desestatizada. Então, seguimos com todos os ritos típicos de uma empresa estatal. No nosso planejamento de curto prazo, mensal, trimestral, jogamos com a realidade que temos. Novas obras estão todas sendo feitas, licitadas, com rito que já existe, que a empresa tem de seguir. Nós temos uma expectativa no meio do ano que vem, de que isso vai mudar.

Vou dar um exemplo. Nosso ciclo de contratação para grandes obras, obras mais estruturantes, demora mais de 180 dias desde a concepção do projeto até a assinatura do contrato. Se der tudo certo, seis meses. Deu errado? Alguém impugnou? O negócio pode se arrastar mais alguns meses e aí você passa às vezes um ano contratando uma obra que não se implementa por causa do regime de contratação. Numa empresa que não tem esse fluxo, isso leva 60 dias. Conseguiremos acelerar bastante o processo de investimento.

Queremos ser a melhor empresa de saneamento do Brasil e possivelmente do mundo. O que faz brilhar os olhos de todo mundo que trabalha aqui nesse projeto é conseguir transformar essa empresa em algo muito maior do que ela já é, que possa atender a população, não só nas áreas que está hoje, com qualidade, com com presteza, com eficiência e dentro de um tempo adequado, mas também expandir para outros lugares. O Tarcísio diz que vai virar uma multinacional de saneamento. E vai mesmo.

Diretor-presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), André Salcedo nega que o apagão no fornecimento de energia elétrica da última semana e as críticas à Enel atrapalhem o processo de privatização da empresa de saneamento paulista. “Robustece o debate”, diz Salcedo, em entrevista ao Estadão. Entusiasta da privatização da Sabesp, que tem como principal garoto-propaganda o governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Salcedo afirma que o caso da Sabesp é diferente do da Enel.

Ao Estadao, ele também diz que o aumento de investimentos necessário para universalizar o tratamento de água no Estado de São Paulo fará a tarifa subir. A privatização, segundo ele, pode segurar esse aumento, através da melhora de eficiência da empresa.

Presidente da Sabesp, Andre Salcedo Foto: TABA BENEDICTO

Tarcísio enviou no dia 17 de outubro à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, projeto de lei de privatização da Sabesp. Atualmente, o governo detém 50,3% das ações da empresa. A intenção do Estado é ter sua participação reduzida a algo entre 15% e 30%.

Leia abaixo a entrevista:

O apagão da última semana e as críticas sobre a Enel atrapalham o processo de privatização da Sabesp?

Acho que robustece o debate. Eventos como esse, numa concessão de 30 anos, vão acontecer. E como é que você trata isso? Com uma regulação bem construída. O debate sobre por que aconteceu aqui e não vai acontecer lá enriquece a tomada de decisão e permite que o governo, a empresa, a agência reguladora se coloquem exatamente para separar e dizer “no nosso caso, isso não é aplicável”.

O modelo da Sabesp é mais sólido do que do que o contrato de concessão da Enel, como sugere o governador Tarcísio?

Tem o aspecto do tipo de infraestrutura, do relacionamento com o poder concedente e regulador e da regulação. Então, pelo tipo de infraestrutura são coisas diferentes. Não é melhor ou pior, mas a nossa infraestrutura é enterrada. Os efeitos de eventos climáticos atípicos nos afetam, mas de um jeito diferente. Tivemos a crise hídrica. Foi um tremendo trabalho de mobilização para repensar o que é resiliência hídrica dentro da região metropolitana de São Paulo. Precisamos pensar a longo prazo, acrescentando essa mudança que está acontecendo no mundo todo, de eventos extremos climáticos, no nosso planejamento estratégico. Isso já estamos fazendo. Anunciamos, no contexto do processo de desestatização, o projeto de resiliência hídrica também para o litoral, por exemplo.

Além disso, o ente regulador, no nosso caso, é uma agência estadual muito mais próxima (do que o ente regulador da Enel) e acompanha o dia a dia com muito mais proximidade da Sabesp; e nos cobra. E o poder concedente, diferentemente da distribuidora de energia, ele é municipal ou compartilhado entre o município e o Estado. O dono da concessão é o município. Nosso cliente é o prefeito. E essa relação (com os prefeitos) é uma relação muito importante, de garantir que o plano de investimento está sendo executado, que há transparência na prestação de contas, que as demandas associadas ao saneamento do município, expansão, crescimento de áreas são contempladas pela empresa.

Tem vários aspectos que nos diferenciam. O fato de a nossa infraestrutura ser enterrada também ajuda, porque exige mais investimento para botar tudo debaixo da terra, mas ao mesmo tempo é mais sólida e resistente ao tipo de intempérie temporal.

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que trabalha pela aprovação do projeto para privatizar a Sabesp. Foto: Marcelo S. Camargo/Governo do Estado de SP

Isso falando das questões estruturais, mas e sobre o desenho dessa privatização?

Há pontos positivos: existem investimentos adicionais ao nosso plano de investimento para garantir um aumento da área atendida pela Sabesp. Hoje temos três tipos de contratos: os que envolvem somente regiões metropolitanas, tem contratos que desenham a área que atendemos e outros que não falam especificamente. Uma das propostas da privatização é expandir o escopo do contrato, para que seja o município inteiro. Isso nos ajuda a garantir que aqueles que estavam fora do escopo anterior irão ter seu esgoto coletado e tratado. Isso nos ajuda a melhorar a qualidade dos mananciais.

Sem a privatização, seria possível fazer isso? Qual seria o outro cenário?

A privatização permite que isso seja feito. A análise de se poderia ser feito de outro jeito, eu não sei te responder. No contexto do marco do saneamento, há um dispositivo que determina que em um processo de venda de controle a partir do Estado, há a possibilidade de alteração contratual, de escopo, prazo, objeto. E, dentro desse contexto, está sendo colocado como uma vantagem o atendimento pela Sabesp integral do município, incluindo zonas rurais e zonas urbanas informais consolidadas. Estamos falando de um milhão de pessoas que hoje consomem água de algum lugar e produzem esgoto residencial. Além disso, há um conjunto de investimentos que envolvem dessalinização, um tratamento melhor adicional da água que hoje é tratada nas estações de tratamento de esgoto. Esses investimentos adicionais somam R$ 10 bilhões.

Quando se fala em privatização, o receio de parte da população é de que haja uma diminuição de investimento ou uma precarização do serviço e/ou um aumento na tarifa cobrada do usuário, para gerar mais lucro para o investidor. O que o sr. diria para o cidadão, para a população, para assegurar que não é isso que irá acontecer?

Eventualmente a gente põe uma temática de desestatização como um grande marco. Mas pega a história da Sabesp: em 1994, ela abriu o capital junto à CVM. Em 1997, ela fez o IPO, ou seja, atraiu o capital privado. Em 2002, ela fez uma nova oferta, listou no novo mercado da B3, a antiga Bovespa, e em Nova York. Ela vem se privatizando ao longo do tempo. O processo de atração de capital privado para o capital da companhia já existe.

E por que ele existe? Por que empresas do setor conseguem atrair capital privado para a venda de ações? Porque é um negócio regulado com uma previsibilidade de retorno aos investimentos feitos. A Sabesp já tem hoje na sua regulação, assim como todas as outras empresas que atuam no mesmo formato de regulação, um retorno que chama de WACC regulatório (taxa de retorno mínima), que é o retorno que a agência estabelece com base em métricas de mercado. A Aneel também tem essa lógica e as agências estaduais também têm essa lógica. A capacidade econômica e financeira da Sabesp para concluir a universalização em São Paulo está associada a um retorno desse investimento que está sendo feito. A nossa taxa de retorno hoje, estabelecida pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), é 8,1%. Todo investimento que a empresa faz é remunerado nessa taxa de retorno, que baliza a tarifa que é estabelecida no começo do ciclo.

SAO PAULO SP 10/11/2023 ECONOMIA - RETRATO/ PRESIDENTE DA SABESP/ ANDRE SALCEDO - O presidente da SABESP, Andre Salcedo, durante entrevista para o Estadao, na sede da empresa em Sao Paulo. FOTO TABA BENEDICTO / ESTADAO Foto: TABA BENEDICTO

No início do ciclo, a Arsesp diz: você tem de investir tantos bilhões de reais para avançar do nível de cobertura que tem hoje para o nível de cobertura que queremos. Esse volume de investimento vai demandar tanto de capital. Esse capital tem de ser remunerado desse jeito. Você tem de ter uma receita mínima para que pague suas despesas e retorne o dinheiro para os investidores e você consiga fazer esses investimentos.

O retorno já existe, já é disciplinado. O que está sendo estudado é o que pode ser melhorado nesse modelo de regulação. Tem alguma forma que esse modelo possa ser ajustado e melhore a perspectiva de ganho de eficiência em comparação com uma empresa pública? Ela (empresa pública) tem restrições com relação a como ela pode gerir, contratar obras, serviços de terceiros e mesmo funcionários de uma empresa privada? Uma empresa privada tem mais flexibilidade, pode ser mais eficiente. Como o modelo de regulação pode capturar isso de um jeito a incentivar o player privado a ser mais eficiente, capturar parte desse ganho e partir para tarifa? Esse é o debate que está acontecendo hoje. Como melhoramos o modelo regulatório para que ele incentive ganhos de eficiência e essa eficiência seja compartilhada também com a tarifa?

Então, se nada for feito, temos uma curva tarifária que tende a aumentar, porque os investimentos vão aumentar. Temos hoje uma necessidade de investimento R$ 56 bilhões para universalização (do saneamento).

Em quanto tempo?

Até 2033. A nossa base de ativos hoje está na ordem de R$ 60, 70 bilhões. Vai crescer muito. Esse processo, naturalmente, vai demandar uma recomposição tarifária. A tarifa tende a aumentar nesse período para remunerar esse investimento. Há as melhorias que estão sendo desenhadas exatamente para conseguir capturar e acelerar o processo de ganho de eficiência na companhia após desestatização e essa grande eficiência, junto com uma melhoria na regulação, trazer essa curva (de aumento da tarifa) para um patamar menor. Ou seja, a evolução tarifária seria menor no cenário de desestatização do que se nada fosse feito.

Estação de água da Sabesp. Foto: Google Streetview

Na Alesp, uma das coisas que se falou é que não há elementos suficientes para deliberar sobre a privatização. Os srs. têm mantido diálogo com os deputados?

O governador é o grande garoto-propaganda do projeto. Ele acredita muito e eu acredito, da mesma forma que ele, num projeto que tem um potencial gigantesco de melhorar a vida de todas as pessoas na nossa área de concessão, habilita a Sabesp a expandir territorialmente não só em São Paulo, mas no Brasil, levando essa tecnologia, essa inteligência operacional que a empresa tem para outros rincões do País, que não tem acesso à água ou coleta tratamento de esgoto. Por que faz sentido? Para além de tudo isso, tem o potencial gigantesco de levar qualidade de vida para lugares que a gente hoje não opera.

O nosso papel é de dar todo o subsídio para o governo do Estado, para tomada de decisão, para analisar cenários, para contribuir na melhoria regulatória, na definição de investimentos para o município. Esse detalhamento técnico, a gente faz. A coordenação política e a interação com o processo de tomada de decisão na Alesp fica a cargo do governo.

Qual o estado da empresa hoje? O sr. assumiu em janeiro, foi feito um programa para enxugar o quadro de funcionários.

A Sabesp é uma empresa impressionante do ponto de vista de qualidade das pessoas, da história. Ao longo do tempo construiu uma estrutura física, uma estrutura de tomada de decisão que foi muito eficiente em um determinado momento, mas deixou de ser. Vimos muitas oportunidades de melhorar a eficiência da companhia. Transformar a empresa numa empresa mais moderna, mais próxima dos clientes, com alinhamento de visão, de disciplina regulatória.

Identificamos uma oportunidade de otimização do número de posições. Nós tínhamos, até a metade do ano, 12.500 pessoas, e a nossa percepção é que poderíamos reduzir o quadro fixo da empresa em 2.000 pessoas. Essa era uma demanda inclusive dos próprios sindicatos, que queriam incentivo para o pessoal mais velho sair e dar espaço para o pessoal mais novo ascender na carreira.

O governo do Estado entendeu que era pertinente. Aprovamos. No âmbito estadual, iniciamos o processo de adesão ao programa (de desligamento) em junho. Nosso foco eram duas mil pessoas e 1.862 aderiram, 93% do foco.

Outro destaque positivo: é a primeira vez que investimos, nos nove meses do ano, de janeiro a setembro, R$ 3,9 bilhões. Então, é o maior investimento em nove meses que a companhia já fez na sua história. Conseguimos acelerar o investimento e antecipar a universalização na nossa área de atuação. Conseguimos antecipar esses investimentos por conta dos ganhos de eficiência que capturamos neste ano.

E com relação ao lucro? (O lucro da Sabesp caiu 21,7% no terceiro trimestre de 2023, em comparação com igual período do ano passado)

O lucro está caminhando dentro do que a gente planeja, sim. Temos o componente que a gente controla bem, que é o desempenho operacional. O desempenho financeiro depende de taxas de juros, etc. Do ano passado para este, teve uma variação, mas que está dentro das expectativas. Então, o lucro final foi melhor do que alguns analistas esperavam, mas em grande parte em linha com a média de mercado nas expectativas dos analistas.

O cenário ideal, na leitura do sr., para a Sabesp, em termos de prazos para privatização e valores, qual é?

O nosso cenário base é que a desestatização vai acontecer no meio do ano que vem. Trabalhamos todos os dias com esse cenário, mas a companhia, hoje, não é desestatizada. Então, seguimos com todos os ritos típicos de uma empresa estatal. No nosso planejamento de curto prazo, mensal, trimestral, jogamos com a realidade que temos. Novas obras estão todas sendo feitas, licitadas, com rito que já existe, que a empresa tem de seguir. Nós temos uma expectativa no meio do ano que vem, de que isso vai mudar.

Vou dar um exemplo. Nosso ciclo de contratação para grandes obras, obras mais estruturantes, demora mais de 180 dias desde a concepção do projeto até a assinatura do contrato. Se der tudo certo, seis meses. Deu errado? Alguém impugnou? O negócio pode se arrastar mais alguns meses e aí você passa às vezes um ano contratando uma obra que não se implementa por causa do regime de contratação. Numa empresa que não tem esse fluxo, isso leva 60 dias. Conseguiremos acelerar bastante o processo de investimento.

Queremos ser a melhor empresa de saneamento do Brasil e possivelmente do mundo. O que faz brilhar os olhos de todo mundo que trabalha aqui nesse projeto é conseguir transformar essa empresa em algo muito maior do que ela já é, que possa atender a população, não só nas áreas que está hoje, com qualidade, com com presteza, com eficiência e dentro de um tempo adequado, mas também expandir para outros lugares. O Tarcísio diz que vai virar uma multinacional de saneamento. E vai mesmo.

Diretor-presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), André Salcedo nega que o apagão no fornecimento de energia elétrica da última semana e as críticas à Enel atrapalhem o processo de privatização da empresa de saneamento paulista. “Robustece o debate”, diz Salcedo, em entrevista ao Estadão. Entusiasta da privatização da Sabesp, que tem como principal garoto-propaganda o governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Salcedo afirma que o caso da Sabesp é diferente do da Enel.

Ao Estadao, ele também diz que o aumento de investimentos necessário para universalizar o tratamento de água no Estado de São Paulo fará a tarifa subir. A privatização, segundo ele, pode segurar esse aumento, através da melhora de eficiência da empresa.

Presidente da Sabesp, Andre Salcedo Foto: TABA BENEDICTO

Tarcísio enviou no dia 17 de outubro à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, projeto de lei de privatização da Sabesp. Atualmente, o governo detém 50,3% das ações da empresa. A intenção do Estado é ter sua participação reduzida a algo entre 15% e 30%.

Leia abaixo a entrevista:

O apagão da última semana e as críticas sobre a Enel atrapalham o processo de privatização da Sabesp?

Acho que robustece o debate. Eventos como esse, numa concessão de 30 anos, vão acontecer. E como é que você trata isso? Com uma regulação bem construída. O debate sobre por que aconteceu aqui e não vai acontecer lá enriquece a tomada de decisão e permite que o governo, a empresa, a agência reguladora se coloquem exatamente para separar e dizer “no nosso caso, isso não é aplicável”.

O modelo da Sabesp é mais sólido do que do que o contrato de concessão da Enel, como sugere o governador Tarcísio?

Tem o aspecto do tipo de infraestrutura, do relacionamento com o poder concedente e regulador e da regulação. Então, pelo tipo de infraestrutura são coisas diferentes. Não é melhor ou pior, mas a nossa infraestrutura é enterrada. Os efeitos de eventos climáticos atípicos nos afetam, mas de um jeito diferente. Tivemos a crise hídrica. Foi um tremendo trabalho de mobilização para repensar o que é resiliência hídrica dentro da região metropolitana de São Paulo. Precisamos pensar a longo prazo, acrescentando essa mudança que está acontecendo no mundo todo, de eventos extremos climáticos, no nosso planejamento estratégico. Isso já estamos fazendo. Anunciamos, no contexto do processo de desestatização, o projeto de resiliência hídrica também para o litoral, por exemplo.

Além disso, o ente regulador, no nosso caso, é uma agência estadual muito mais próxima (do que o ente regulador da Enel) e acompanha o dia a dia com muito mais proximidade da Sabesp; e nos cobra. E o poder concedente, diferentemente da distribuidora de energia, ele é municipal ou compartilhado entre o município e o Estado. O dono da concessão é o município. Nosso cliente é o prefeito. E essa relação (com os prefeitos) é uma relação muito importante, de garantir que o plano de investimento está sendo executado, que há transparência na prestação de contas, que as demandas associadas ao saneamento do município, expansão, crescimento de áreas são contempladas pela empresa.

Tem vários aspectos que nos diferenciam. O fato de a nossa infraestrutura ser enterrada também ajuda, porque exige mais investimento para botar tudo debaixo da terra, mas ao mesmo tempo é mais sólida e resistente ao tipo de intempérie temporal.

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que trabalha pela aprovação do projeto para privatizar a Sabesp. Foto: Marcelo S. Camargo/Governo do Estado de SP

Isso falando das questões estruturais, mas e sobre o desenho dessa privatização?

Há pontos positivos: existem investimentos adicionais ao nosso plano de investimento para garantir um aumento da área atendida pela Sabesp. Hoje temos três tipos de contratos: os que envolvem somente regiões metropolitanas, tem contratos que desenham a área que atendemos e outros que não falam especificamente. Uma das propostas da privatização é expandir o escopo do contrato, para que seja o município inteiro. Isso nos ajuda a garantir que aqueles que estavam fora do escopo anterior irão ter seu esgoto coletado e tratado. Isso nos ajuda a melhorar a qualidade dos mananciais.

Sem a privatização, seria possível fazer isso? Qual seria o outro cenário?

A privatização permite que isso seja feito. A análise de se poderia ser feito de outro jeito, eu não sei te responder. No contexto do marco do saneamento, há um dispositivo que determina que em um processo de venda de controle a partir do Estado, há a possibilidade de alteração contratual, de escopo, prazo, objeto. E, dentro desse contexto, está sendo colocado como uma vantagem o atendimento pela Sabesp integral do município, incluindo zonas rurais e zonas urbanas informais consolidadas. Estamos falando de um milhão de pessoas que hoje consomem água de algum lugar e produzem esgoto residencial. Além disso, há um conjunto de investimentos que envolvem dessalinização, um tratamento melhor adicional da água que hoje é tratada nas estações de tratamento de esgoto. Esses investimentos adicionais somam R$ 10 bilhões.

Quando se fala em privatização, o receio de parte da população é de que haja uma diminuição de investimento ou uma precarização do serviço e/ou um aumento na tarifa cobrada do usuário, para gerar mais lucro para o investidor. O que o sr. diria para o cidadão, para a população, para assegurar que não é isso que irá acontecer?

Eventualmente a gente põe uma temática de desestatização como um grande marco. Mas pega a história da Sabesp: em 1994, ela abriu o capital junto à CVM. Em 1997, ela fez o IPO, ou seja, atraiu o capital privado. Em 2002, ela fez uma nova oferta, listou no novo mercado da B3, a antiga Bovespa, e em Nova York. Ela vem se privatizando ao longo do tempo. O processo de atração de capital privado para o capital da companhia já existe.

E por que ele existe? Por que empresas do setor conseguem atrair capital privado para a venda de ações? Porque é um negócio regulado com uma previsibilidade de retorno aos investimentos feitos. A Sabesp já tem hoje na sua regulação, assim como todas as outras empresas que atuam no mesmo formato de regulação, um retorno que chama de WACC regulatório (taxa de retorno mínima), que é o retorno que a agência estabelece com base em métricas de mercado. A Aneel também tem essa lógica e as agências estaduais também têm essa lógica. A capacidade econômica e financeira da Sabesp para concluir a universalização em São Paulo está associada a um retorno desse investimento que está sendo feito. A nossa taxa de retorno hoje, estabelecida pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), é 8,1%. Todo investimento que a empresa faz é remunerado nessa taxa de retorno, que baliza a tarifa que é estabelecida no começo do ciclo.

SAO PAULO SP 10/11/2023 ECONOMIA - RETRATO/ PRESIDENTE DA SABESP/ ANDRE SALCEDO - O presidente da SABESP, Andre Salcedo, durante entrevista para o Estadao, na sede da empresa em Sao Paulo. FOTO TABA BENEDICTO / ESTADAO Foto: TABA BENEDICTO

No início do ciclo, a Arsesp diz: você tem de investir tantos bilhões de reais para avançar do nível de cobertura que tem hoje para o nível de cobertura que queremos. Esse volume de investimento vai demandar tanto de capital. Esse capital tem de ser remunerado desse jeito. Você tem de ter uma receita mínima para que pague suas despesas e retorne o dinheiro para os investidores e você consiga fazer esses investimentos.

O retorno já existe, já é disciplinado. O que está sendo estudado é o que pode ser melhorado nesse modelo de regulação. Tem alguma forma que esse modelo possa ser ajustado e melhore a perspectiva de ganho de eficiência em comparação com uma empresa pública? Ela (empresa pública) tem restrições com relação a como ela pode gerir, contratar obras, serviços de terceiros e mesmo funcionários de uma empresa privada? Uma empresa privada tem mais flexibilidade, pode ser mais eficiente. Como o modelo de regulação pode capturar isso de um jeito a incentivar o player privado a ser mais eficiente, capturar parte desse ganho e partir para tarifa? Esse é o debate que está acontecendo hoje. Como melhoramos o modelo regulatório para que ele incentive ganhos de eficiência e essa eficiência seja compartilhada também com a tarifa?

Então, se nada for feito, temos uma curva tarifária que tende a aumentar, porque os investimentos vão aumentar. Temos hoje uma necessidade de investimento R$ 56 bilhões para universalização (do saneamento).

Em quanto tempo?

Até 2033. A nossa base de ativos hoje está na ordem de R$ 60, 70 bilhões. Vai crescer muito. Esse processo, naturalmente, vai demandar uma recomposição tarifária. A tarifa tende a aumentar nesse período para remunerar esse investimento. Há as melhorias que estão sendo desenhadas exatamente para conseguir capturar e acelerar o processo de ganho de eficiência na companhia após desestatização e essa grande eficiência, junto com uma melhoria na regulação, trazer essa curva (de aumento da tarifa) para um patamar menor. Ou seja, a evolução tarifária seria menor no cenário de desestatização do que se nada fosse feito.

Estação de água da Sabesp. Foto: Google Streetview

Na Alesp, uma das coisas que se falou é que não há elementos suficientes para deliberar sobre a privatização. Os srs. têm mantido diálogo com os deputados?

O governador é o grande garoto-propaganda do projeto. Ele acredita muito e eu acredito, da mesma forma que ele, num projeto que tem um potencial gigantesco de melhorar a vida de todas as pessoas na nossa área de concessão, habilita a Sabesp a expandir territorialmente não só em São Paulo, mas no Brasil, levando essa tecnologia, essa inteligência operacional que a empresa tem para outros rincões do País, que não tem acesso à água ou coleta tratamento de esgoto. Por que faz sentido? Para além de tudo isso, tem o potencial gigantesco de levar qualidade de vida para lugares que a gente hoje não opera.

O nosso papel é de dar todo o subsídio para o governo do Estado, para tomada de decisão, para analisar cenários, para contribuir na melhoria regulatória, na definição de investimentos para o município. Esse detalhamento técnico, a gente faz. A coordenação política e a interação com o processo de tomada de decisão na Alesp fica a cargo do governo.

Qual o estado da empresa hoje? O sr. assumiu em janeiro, foi feito um programa para enxugar o quadro de funcionários.

A Sabesp é uma empresa impressionante do ponto de vista de qualidade das pessoas, da história. Ao longo do tempo construiu uma estrutura física, uma estrutura de tomada de decisão que foi muito eficiente em um determinado momento, mas deixou de ser. Vimos muitas oportunidades de melhorar a eficiência da companhia. Transformar a empresa numa empresa mais moderna, mais próxima dos clientes, com alinhamento de visão, de disciplina regulatória.

Identificamos uma oportunidade de otimização do número de posições. Nós tínhamos, até a metade do ano, 12.500 pessoas, e a nossa percepção é que poderíamos reduzir o quadro fixo da empresa em 2.000 pessoas. Essa era uma demanda inclusive dos próprios sindicatos, que queriam incentivo para o pessoal mais velho sair e dar espaço para o pessoal mais novo ascender na carreira.

O governo do Estado entendeu que era pertinente. Aprovamos. No âmbito estadual, iniciamos o processo de adesão ao programa (de desligamento) em junho. Nosso foco eram duas mil pessoas e 1.862 aderiram, 93% do foco.

Outro destaque positivo: é a primeira vez que investimos, nos nove meses do ano, de janeiro a setembro, R$ 3,9 bilhões. Então, é o maior investimento em nove meses que a companhia já fez na sua história. Conseguimos acelerar o investimento e antecipar a universalização na nossa área de atuação. Conseguimos antecipar esses investimentos por conta dos ganhos de eficiência que capturamos neste ano.

E com relação ao lucro? (O lucro da Sabesp caiu 21,7% no terceiro trimestre de 2023, em comparação com igual período do ano passado)

O lucro está caminhando dentro do que a gente planeja, sim. Temos o componente que a gente controla bem, que é o desempenho operacional. O desempenho financeiro depende de taxas de juros, etc. Do ano passado para este, teve uma variação, mas que está dentro das expectativas. Então, o lucro final foi melhor do que alguns analistas esperavam, mas em grande parte em linha com a média de mercado nas expectativas dos analistas.

O cenário ideal, na leitura do sr., para a Sabesp, em termos de prazos para privatização e valores, qual é?

O nosso cenário base é que a desestatização vai acontecer no meio do ano que vem. Trabalhamos todos os dias com esse cenário, mas a companhia, hoje, não é desestatizada. Então, seguimos com todos os ritos típicos de uma empresa estatal. No nosso planejamento de curto prazo, mensal, trimestral, jogamos com a realidade que temos. Novas obras estão todas sendo feitas, licitadas, com rito que já existe, que a empresa tem de seguir. Nós temos uma expectativa no meio do ano que vem, de que isso vai mudar.

Vou dar um exemplo. Nosso ciclo de contratação para grandes obras, obras mais estruturantes, demora mais de 180 dias desde a concepção do projeto até a assinatura do contrato. Se der tudo certo, seis meses. Deu errado? Alguém impugnou? O negócio pode se arrastar mais alguns meses e aí você passa às vezes um ano contratando uma obra que não se implementa por causa do regime de contratação. Numa empresa que não tem esse fluxo, isso leva 60 dias. Conseguiremos acelerar bastante o processo de investimento.

Queremos ser a melhor empresa de saneamento do Brasil e possivelmente do mundo. O que faz brilhar os olhos de todo mundo que trabalha aqui nesse projeto é conseguir transformar essa empresa em algo muito maior do que ela já é, que possa atender a população, não só nas áreas que está hoje, com qualidade, com com presteza, com eficiência e dentro de um tempo adequado, mas também expandir para outros lugares. O Tarcísio diz que vai virar uma multinacional de saneamento. E vai mesmo.

Diretor-presidente da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), André Salcedo nega que o apagão no fornecimento de energia elétrica da última semana e as críticas à Enel atrapalhem o processo de privatização da empresa de saneamento paulista. “Robustece o debate”, diz Salcedo, em entrevista ao Estadão. Entusiasta da privatização da Sabesp, que tem como principal garoto-propaganda o governador do Estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), Salcedo afirma que o caso da Sabesp é diferente do da Enel.

Ao Estadao, ele também diz que o aumento de investimentos necessário para universalizar o tratamento de água no Estado de São Paulo fará a tarifa subir. A privatização, segundo ele, pode segurar esse aumento, através da melhora de eficiência da empresa.

Presidente da Sabesp, Andre Salcedo Foto: TABA BENEDICTO

Tarcísio enviou no dia 17 de outubro à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, projeto de lei de privatização da Sabesp. Atualmente, o governo detém 50,3% das ações da empresa. A intenção do Estado é ter sua participação reduzida a algo entre 15% e 30%.

Leia abaixo a entrevista:

O apagão da última semana e as críticas sobre a Enel atrapalham o processo de privatização da Sabesp?

Acho que robustece o debate. Eventos como esse, numa concessão de 30 anos, vão acontecer. E como é que você trata isso? Com uma regulação bem construída. O debate sobre por que aconteceu aqui e não vai acontecer lá enriquece a tomada de decisão e permite que o governo, a empresa, a agência reguladora se coloquem exatamente para separar e dizer “no nosso caso, isso não é aplicável”.

O modelo da Sabesp é mais sólido do que do que o contrato de concessão da Enel, como sugere o governador Tarcísio?

Tem o aspecto do tipo de infraestrutura, do relacionamento com o poder concedente e regulador e da regulação. Então, pelo tipo de infraestrutura são coisas diferentes. Não é melhor ou pior, mas a nossa infraestrutura é enterrada. Os efeitos de eventos climáticos atípicos nos afetam, mas de um jeito diferente. Tivemos a crise hídrica. Foi um tremendo trabalho de mobilização para repensar o que é resiliência hídrica dentro da região metropolitana de São Paulo. Precisamos pensar a longo prazo, acrescentando essa mudança que está acontecendo no mundo todo, de eventos extremos climáticos, no nosso planejamento estratégico. Isso já estamos fazendo. Anunciamos, no contexto do processo de desestatização, o projeto de resiliência hídrica também para o litoral, por exemplo.

Além disso, o ente regulador, no nosso caso, é uma agência estadual muito mais próxima (do que o ente regulador da Enel) e acompanha o dia a dia com muito mais proximidade da Sabesp; e nos cobra. E o poder concedente, diferentemente da distribuidora de energia, ele é municipal ou compartilhado entre o município e o Estado. O dono da concessão é o município. Nosso cliente é o prefeito. E essa relação (com os prefeitos) é uma relação muito importante, de garantir que o plano de investimento está sendo executado, que há transparência na prestação de contas, que as demandas associadas ao saneamento do município, expansão, crescimento de áreas são contempladas pela empresa.

Tem vários aspectos que nos diferenciam. O fato de a nossa infraestrutura ser enterrada também ajuda, porque exige mais investimento para botar tudo debaixo da terra, mas ao mesmo tempo é mais sólida e resistente ao tipo de intempérie temporal.

O governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que trabalha pela aprovação do projeto para privatizar a Sabesp. Foto: Marcelo S. Camargo/Governo do Estado de SP

Isso falando das questões estruturais, mas e sobre o desenho dessa privatização?

Há pontos positivos: existem investimentos adicionais ao nosso plano de investimento para garantir um aumento da área atendida pela Sabesp. Hoje temos três tipos de contratos: os que envolvem somente regiões metropolitanas, tem contratos que desenham a área que atendemos e outros que não falam especificamente. Uma das propostas da privatização é expandir o escopo do contrato, para que seja o município inteiro. Isso nos ajuda a garantir que aqueles que estavam fora do escopo anterior irão ter seu esgoto coletado e tratado. Isso nos ajuda a melhorar a qualidade dos mananciais.

Sem a privatização, seria possível fazer isso? Qual seria o outro cenário?

A privatização permite que isso seja feito. A análise de se poderia ser feito de outro jeito, eu não sei te responder. No contexto do marco do saneamento, há um dispositivo que determina que em um processo de venda de controle a partir do Estado, há a possibilidade de alteração contratual, de escopo, prazo, objeto. E, dentro desse contexto, está sendo colocado como uma vantagem o atendimento pela Sabesp integral do município, incluindo zonas rurais e zonas urbanas informais consolidadas. Estamos falando de um milhão de pessoas que hoje consomem água de algum lugar e produzem esgoto residencial. Além disso, há um conjunto de investimentos que envolvem dessalinização, um tratamento melhor adicional da água que hoje é tratada nas estações de tratamento de esgoto. Esses investimentos adicionais somam R$ 10 bilhões.

Quando se fala em privatização, o receio de parte da população é de que haja uma diminuição de investimento ou uma precarização do serviço e/ou um aumento na tarifa cobrada do usuário, para gerar mais lucro para o investidor. O que o sr. diria para o cidadão, para a população, para assegurar que não é isso que irá acontecer?

Eventualmente a gente põe uma temática de desestatização como um grande marco. Mas pega a história da Sabesp: em 1994, ela abriu o capital junto à CVM. Em 1997, ela fez o IPO, ou seja, atraiu o capital privado. Em 2002, ela fez uma nova oferta, listou no novo mercado da B3, a antiga Bovespa, e em Nova York. Ela vem se privatizando ao longo do tempo. O processo de atração de capital privado para o capital da companhia já existe.

E por que ele existe? Por que empresas do setor conseguem atrair capital privado para a venda de ações? Porque é um negócio regulado com uma previsibilidade de retorno aos investimentos feitos. A Sabesp já tem hoje na sua regulação, assim como todas as outras empresas que atuam no mesmo formato de regulação, um retorno que chama de WACC regulatório (taxa de retorno mínima), que é o retorno que a agência estabelece com base em métricas de mercado. A Aneel também tem essa lógica e as agências estaduais também têm essa lógica. A capacidade econômica e financeira da Sabesp para concluir a universalização em São Paulo está associada a um retorno desse investimento que está sendo feito. A nossa taxa de retorno hoje, estabelecida pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp), é 8,1%. Todo investimento que a empresa faz é remunerado nessa taxa de retorno, que baliza a tarifa que é estabelecida no começo do ciclo.

SAO PAULO SP 10/11/2023 ECONOMIA - RETRATO/ PRESIDENTE DA SABESP/ ANDRE SALCEDO - O presidente da SABESP, Andre Salcedo, durante entrevista para o Estadao, na sede da empresa em Sao Paulo. FOTO TABA BENEDICTO / ESTADAO Foto: TABA BENEDICTO

No início do ciclo, a Arsesp diz: você tem de investir tantos bilhões de reais para avançar do nível de cobertura que tem hoje para o nível de cobertura que queremos. Esse volume de investimento vai demandar tanto de capital. Esse capital tem de ser remunerado desse jeito. Você tem de ter uma receita mínima para que pague suas despesas e retorne o dinheiro para os investidores e você consiga fazer esses investimentos.

O retorno já existe, já é disciplinado. O que está sendo estudado é o que pode ser melhorado nesse modelo de regulação. Tem alguma forma que esse modelo possa ser ajustado e melhore a perspectiva de ganho de eficiência em comparação com uma empresa pública? Ela (empresa pública) tem restrições com relação a como ela pode gerir, contratar obras, serviços de terceiros e mesmo funcionários de uma empresa privada? Uma empresa privada tem mais flexibilidade, pode ser mais eficiente. Como o modelo de regulação pode capturar isso de um jeito a incentivar o player privado a ser mais eficiente, capturar parte desse ganho e partir para tarifa? Esse é o debate que está acontecendo hoje. Como melhoramos o modelo regulatório para que ele incentive ganhos de eficiência e essa eficiência seja compartilhada também com a tarifa?

Então, se nada for feito, temos uma curva tarifária que tende a aumentar, porque os investimentos vão aumentar. Temos hoje uma necessidade de investimento R$ 56 bilhões para universalização (do saneamento).

Em quanto tempo?

Até 2033. A nossa base de ativos hoje está na ordem de R$ 60, 70 bilhões. Vai crescer muito. Esse processo, naturalmente, vai demandar uma recomposição tarifária. A tarifa tende a aumentar nesse período para remunerar esse investimento. Há as melhorias que estão sendo desenhadas exatamente para conseguir capturar e acelerar o processo de ganho de eficiência na companhia após desestatização e essa grande eficiência, junto com uma melhoria na regulação, trazer essa curva (de aumento da tarifa) para um patamar menor. Ou seja, a evolução tarifária seria menor no cenário de desestatização do que se nada fosse feito.

Estação de água da Sabesp. Foto: Google Streetview

Na Alesp, uma das coisas que se falou é que não há elementos suficientes para deliberar sobre a privatização. Os srs. têm mantido diálogo com os deputados?

O governador é o grande garoto-propaganda do projeto. Ele acredita muito e eu acredito, da mesma forma que ele, num projeto que tem um potencial gigantesco de melhorar a vida de todas as pessoas na nossa área de concessão, habilita a Sabesp a expandir territorialmente não só em São Paulo, mas no Brasil, levando essa tecnologia, essa inteligência operacional que a empresa tem para outros rincões do País, que não tem acesso à água ou coleta tratamento de esgoto. Por que faz sentido? Para além de tudo isso, tem o potencial gigantesco de levar qualidade de vida para lugares que a gente hoje não opera.

O nosso papel é de dar todo o subsídio para o governo do Estado, para tomada de decisão, para analisar cenários, para contribuir na melhoria regulatória, na definição de investimentos para o município. Esse detalhamento técnico, a gente faz. A coordenação política e a interação com o processo de tomada de decisão na Alesp fica a cargo do governo.

Qual o estado da empresa hoje? O sr. assumiu em janeiro, foi feito um programa para enxugar o quadro de funcionários.

A Sabesp é uma empresa impressionante do ponto de vista de qualidade das pessoas, da história. Ao longo do tempo construiu uma estrutura física, uma estrutura de tomada de decisão que foi muito eficiente em um determinado momento, mas deixou de ser. Vimos muitas oportunidades de melhorar a eficiência da companhia. Transformar a empresa numa empresa mais moderna, mais próxima dos clientes, com alinhamento de visão, de disciplina regulatória.

Identificamos uma oportunidade de otimização do número de posições. Nós tínhamos, até a metade do ano, 12.500 pessoas, e a nossa percepção é que poderíamos reduzir o quadro fixo da empresa em 2.000 pessoas. Essa era uma demanda inclusive dos próprios sindicatos, que queriam incentivo para o pessoal mais velho sair e dar espaço para o pessoal mais novo ascender na carreira.

O governo do Estado entendeu que era pertinente. Aprovamos. No âmbito estadual, iniciamos o processo de adesão ao programa (de desligamento) em junho. Nosso foco eram duas mil pessoas e 1.862 aderiram, 93% do foco.

Outro destaque positivo: é a primeira vez que investimos, nos nove meses do ano, de janeiro a setembro, R$ 3,9 bilhões. Então, é o maior investimento em nove meses que a companhia já fez na sua história. Conseguimos acelerar o investimento e antecipar a universalização na nossa área de atuação. Conseguimos antecipar esses investimentos por conta dos ganhos de eficiência que capturamos neste ano.

E com relação ao lucro? (O lucro da Sabesp caiu 21,7% no terceiro trimestre de 2023, em comparação com igual período do ano passado)

O lucro está caminhando dentro do que a gente planeja, sim. Temos o componente que a gente controla bem, que é o desempenho operacional. O desempenho financeiro depende de taxas de juros, etc. Do ano passado para este, teve uma variação, mas que está dentro das expectativas. Então, o lucro final foi melhor do que alguns analistas esperavam, mas em grande parte em linha com a média de mercado nas expectativas dos analistas.

O cenário ideal, na leitura do sr., para a Sabesp, em termos de prazos para privatização e valores, qual é?

O nosso cenário base é que a desestatização vai acontecer no meio do ano que vem. Trabalhamos todos os dias com esse cenário, mas a companhia, hoje, não é desestatizada. Então, seguimos com todos os ritos típicos de uma empresa estatal. No nosso planejamento de curto prazo, mensal, trimestral, jogamos com a realidade que temos. Novas obras estão todas sendo feitas, licitadas, com rito que já existe, que a empresa tem de seguir. Nós temos uma expectativa no meio do ano que vem, de que isso vai mudar.

Vou dar um exemplo. Nosso ciclo de contratação para grandes obras, obras mais estruturantes, demora mais de 180 dias desde a concepção do projeto até a assinatura do contrato. Se der tudo certo, seis meses. Deu errado? Alguém impugnou? O negócio pode se arrastar mais alguns meses e aí você passa às vezes um ano contratando uma obra que não se implementa por causa do regime de contratação. Numa empresa que não tem esse fluxo, isso leva 60 dias. Conseguiremos acelerar bastante o processo de investimento.

Queremos ser a melhor empresa de saneamento do Brasil e possivelmente do mundo. O que faz brilhar os olhos de todo mundo que trabalha aqui nesse projeto é conseguir transformar essa empresa em algo muito maior do que ela já é, que possa atender a população, não só nas áreas que está hoje, com qualidade, com com presteza, com eficiência e dentro de um tempo adequado, mas também expandir para outros lugares. O Tarcísio diz que vai virar uma multinacional de saneamento. E vai mesmo.

Entrevista por Beatriz Bulla

Repórter que cobre o poder -- economia, política e internacional. Trabalha hoje em São Paulo. Já passou por Brasília e foi correspondente em Washington (EUA). Formada em jornalismo e em direito, foi também pesquisadora visitante na Universidade Columbia, em Nova York.

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.