Governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás, diz Edmar Almeida


Pesquisador do setor de energia da PUC-Rio afirma que decreto do gás pode prejudicar momento atual de expansão de investimentos no setor de óleo e gás e sugere cautela na implementação

Por Mariana Carneiro
Atualização:
Foto: Instituto ECOA PUC-RIO via Youtu
Entrevista comEdmar Almeidapesquisador da PUC-Rio e especialista no setor de energia

BRASÍLIA – O especialista no setor de óleo e gás Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-Rio, afirma que o governo Lula deve ter cautela na hora de implementar as regras ditadas no decreto do gás, editado na última segunda-feira, 26.

O governo estabelece que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) poderá determinar o aumento da produção de gás natural mesmo para campos de exploração onde já existem planos de desenvolvimento aprovados.

“O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás”, afirma Almeida em entrevista ao Estadão. “O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim.”

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O especialista diz que está em jogo mais do que os investimentos na produção de gás, mas de todo o setor de petróleo, que vive hoje um momento de planos de expansão.

“A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual a sua avaliação do pacote anunciado pelo governo Lula para aumentar a oferta de gás?

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O pacote misturou problemas que são muito diferentes, e isso dificulta a percepção geral. Toda essa questão da transição energética foi colocada junto com o decreto do gás, que tem mais a ver com a questão da competitividade do gás brasileiro. Sobre como resolver uma demanda da indústria. É um ponto muito mais específico do que a transição energética. Tem que separar os temas para debater melhor.

Os grandes consumidores alegam que o gás no Brasil é caro, e que as petroleiras preferem extrair o óleo, que é mais rentável, do que o gás. O governo deve induzir as empresas a produzir gás?

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É verdade que o gás brasileiro é caro, e isso está associado ao fato de que nós precisamos importar gás para atender o mercado. A parcela do transporte e distribuição, além dos impostos, também é muito alta. Então, não é só a molécula do gás: as outras etapas da cadeia produtiva também estão acima do custo médio de outros países. Isso tem a ver com questões regulatórias, com o fato de os investimentos não estarem ainda amortizados e com o imposto sobre o gás no Brasil ser de 25% – o que é raro nos outros países. Além disso, o gás no Brasil é mais de 80% associado ao petróleo em águas ultraprofundas. Isso faz com que, do ponto de vista técnico e econômico, esse gás tenha um custo muito alto. Não impede que o governo tente buscar tudo o que seja possível para aumentar a oferta de gás. Este é o dever da ANP (Agência Nacional do Petróleo), sempre foi, o de olhar tudo o que seja tecnicamente viável no processo de aprovação dos planos de desenvolvimento (dos campos de produção) e exigir que isso seja produzido.

Por que a Lei do Gás, de 2021, vendida como uma medida que poderia derrubar o preço, não deu o resultado esperado?

O que estava errado era alardear que, de uma hora para outra, o preço iria cair e resolveria todos os problemas da indústria. Os problemas são complexos e vão demorar a ser resolvidos, e a redução de preço é uma questão que vai levar tempo. Com a Lei do Gás, nós fizemos uma abertura de mercado da indústria do gás que foi bem-sucedida. Temos várias empresas, não só a Petrobras, vendendo gás. Onde há maior competição, como no Nordeste, o gás é mais barato do que nos locais onde a Petrobras tem pouca competição. Mas o processo de regulamentação desse mercado, pela ANP, está indo muito devagar – e isso gerou uma frustração. Os consumidores estão certos em pressionar, mas é importante entender que são questões técnicas. Se elegemos o caminho do mercado, temos que ter paciência. A alternativa é o governo tabelar o preço, o que eu acho que é pior ainda; que pode funcionar no curto prazo, mas é um desastre no longo prazo.

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O sr. identificou problemas no decreto do gás?

É importante que o governo tenha cuidado na implementação do decreto para não gerar incertezas na indústria, porque pode paralisar o bom momento que estamos vivendo. A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… Tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza.

Como assim?

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O que me preocupa muito é a ideia de criar um plano para a indústria do gás determinativo, ou seja, os investimentos da indústria vão se dar a partir de um plano elaborado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética), que vai determinar o que vai entrar nesse plano: quais serão os novos gasodutos, sistemas de escoamento, unidades de processamento, qual a oferta e a demanda esperadas… esse tipo de plano é muito desafiador do ponto de vista técnico. Além disso, os atores que têm interesse nos projetos vão pressionar o governo para que os projetos deles estejam no plano. Isso pode atrasar o processo. E como os investimentos agora vão ficar esperando esse plano, isso pode atrasar os investimentos e criar uma paralisia. Já caímos nessa armadilha em 2009. É importante não deixar parar o processo de investimento, porque isso vai ser pior para a oferta. E todo o plano está sendo feito com a ideia de que vamos trazer mais gás – e com mais gás, o preço cai. Se não tem mais oferta, o preço não cai.

Há risco de judicialização?

Não é interesse do governo nem das empresas judicializar. Tem muita coisa em jogo. O decreto apontou as diretrizes e colocou o que é o interesse público, mas a implementação é muito importante. O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás. O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim. No decreto, existem mecanismos para evitar isso, ter oitiva das empresas, respeitar o aspecto técnico-econômico. Porque os planos de desenvolvimento foram ditados com algumas premissas. Se, de repente, essas premissas são mudadas de forma arbitrária, isso pode criar uma incerteza sobre o investimento – e isso afeta a atratividade do Brasil no setor. O que está em jogo é a atratividade do País para além da produção de gás.

BRASÍLIA – O especialista no setor de óleo e gás Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-Rio, afirma que o governo Lula deve ter cautela na hora de implementar as regras ditadas no decreto do gás, editado na última segunda-feira, 26.

O governo estabelece que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) poderá determinar o aumento da produção de gás natural mesmo para campos de exploração onde já existem planos de desenvolvimento aprovados.

“O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás”, afirma Almeida em entrevista ao Estadão. “O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim.”

O especialista diz que está em jogo mais do que os investimentos na produção de gás, mas de todo o setor de petróleo, que vive hoje um momento de planos de expansão.

“A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual a sua avaliação do pacote anunciado pelo governo Lula para aumentar a oferta de gás?

O pacote misturou problemas que são muito diferentes, e isso dificulta a percepção geral. Toda essa questão da transição energética foi colocada junto com o decreto do gás, que tem mais a ver com a questão da competitividade do gás brasileiro. Sobre como resolver uma demanda da indústria. É um ponto muito mais específico do que a transição energética. Tem que separar os temas para debater melhor.

Os grandes consumidores alegam que o gás no Brasil é caro, e que as petroleiras preferem extrair o óleo, que é mais rentável, do que o gás. O governo deve induzir as empresas a produzir gás?

É verdade que o gás brasileiro é caro, e isso está associado ao fato de que nós precisamos importar gás para atender o mercado. A parcela do transporte e distribuição, além dos impostos, também é muito alta. Então, não é só a molécula do gás: as outras etapas da cadeia produtiva também estão acima do custo médio de outros países. Isso tem a ver com questões regulatórias, com o fato de os investimentos não estarem ainda amortizados e com o imposto sobre o gás no Brasil ser de 25% – o que é raro nos outros países. Além disso, o gás no Brasil é mais de 80% associado ao petróleo em águas ultraprofundas. Isso faz com que, do ponto de vista técnico e econômico, esse gás tenha um custo muito alto. Não impede que o governo tente buscar tudo o que seja possível para aumentar a oferta de gás. Este é o dever da ANP (Agência Nacional do Petróleo), sempre foi, o de olhar tudo o que seja tecnicamente viável no processo de aprovação dos planos de desenvolvimento (dos campos de produção) e exigir que isso seja produzido.

Por que a Lei do Gás, de 2021, vendida como uma medida que poderia derrubar o preço, não deu o resultado esperado?

O que estava errado era alardear que, de uma hora para outra, o preço iria cair e resolveria todos os problemas da indústria. Os problemas são complexos e vão demorar a ser resolvidos, e a redução de preço é uma questão que vai levar tempo. Com a Lei do Gás, nós fizemos uma abertura de mercado da indústria do gás que foi bem-sucedida. Temos várias empresas, não só a Petrobras, vendendo gás. Onde há maior competição, como no Nordeste, o gás é mais barato do que nos locais onde a Petrobras tem pouca competição. Mas o processo de regulamentação desse mercado, pela ANP, está indo muito devagar – e isso gerou uma frustração. Os consumidores estão certos em pressionar, mas é importante entender que são questões técnicas. Se elegemos o caminho do mercado, temos que ter paciência. A alternativa é o governo tabelar o preço, o que eu acho que é pior ainda; que pode funcionar no curto prazo, mas é um desastre no longo prazo.

O sr. identificou problemas no decreto do gás?

É importante que o governo tenha cuidado na implementação do decreto para não gerar incertezas na indústria, porque pode paralisar o bom momento que estamos vivendo. A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… Tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza.

Como assim?

O que me preocupa muito é a ideia de criar um plano para a indústria do gás determinativo, ou seja, os investimentos da indústria vão se dar a partir de um plano elaborado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética), que vai determinar o que vai entrar nesse plano: quais serão os novos gasodutos, sistemas de escoamento, unidades de processamento, qual a oferta e a demanda esperadas… esse tipo de plano é muito desafiador do ponto de vista técnico. Além disso, os atores que têm interesse nos projetos vão pressionar o governo para que os projetos deles estejam no plano. Isso pode atrasar o processo. E como os investimentos agora vão ficar esperando esse plano, isso pode atrasar os investimentos e criar uma paralisia. Já caímos nessa armadilha em 2009. É importante não deixar parar o processo de investimento, porque isso vai ser pior para a oferta. E todo o plano está sendo feito com a ideia de que vamos trazer mais gás – e com mais gás, o preço cai. Se não tem mais oferta, o preço não cai.

Há risco de judicialização?

Não é interesse do governo nem das empresas judicializar. Tem muita coisa em jogo. O decreto apontou as diretrizes e colocou o que é o interesse público, mas a implementação é muito importante. O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás. O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim. No decreto, existem mecanismos para evitar isso, ter oitiva das empresas, respeitar o aspecto técnico-econômico. Porque os planos de desenvolvimento foram ditados com algumas premissas. Se, de repente, essas premissas são mudadas de forma arbitrária, isso pode criar uma incerteza sobre o investimento – e isso afeta a atratividade do Brasil no setor. O que está em jogo é a atratividade do País para além da produção de gás.

BRASÍLIA – O especialista no setor de óleo e gás Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-Rio, afirma que o governo Lula deve ter cautela na hora de implementar as regras ditadas no decreto do gás, editado na última segunda-feira, 26.

O governo estabelece que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) poderá determinar o aumento da produção de gás natural mesmo para campos de exploração onde já existem planos de desenvolvimento aprovados.

“O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás”, afirma Almeida em entrevista ao Estadão. “O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim.”

O especialista diz que está em jogo mais do que os investimentos na produção de gás, mas de todo o setor de petróleo, que vive hoje um momento de planos de expansão.

“A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual a sua avaliação do pacote anunciado pelo governo Lula para aumentar a oferta de gás?

O pacote misturou problemas que são muito diferentes, e isso dificulta a percepção geral. Toda essa questão da transição energética foi colocada junto com o decreto do gás, que tem mais a ver com a questão da competitividade do gás brasileiro. Sobre como resolver uma demanda da indústria. É um ponto muito mais específico do que a transição energética. Tem que separar os temas para debater melhor.

Os grandes consumidores alegam que o gás no Brasil é caro, e que as petroleiras preferem extrair o óleo, que é mais rentável, do que o gás. O governo deve induzir as empresas a produzir gás?

É verdade que o gás brasileiro é caro, e isso está associado ao fato de que nós precisamos importar gás para atender o mercado. A parcela do transporte e distribuição, além dos impostos, também é muito alta. Então, não é só a molécula do gás: as outras etapas da cadeia produtiva também estão acima do custo médio de outros países. Isso tem a ver com questões regulatórias, com o fato de os investimentos não estarem ainda amortizados e com o imposto sobre o gás no Brasil ser de 25% – o que é raro nos outros países. Além disso, o gás no Brasil é mais de 80% associado ao petróleo em águas ultraprofundas. Isso faz com que, do ponto de vista técnico e econômico, esse gás tenha um custo muito alto. Não impede que o governo tente buscar tudo o que seja possível para aumentar a oferta de gás. Este é o dever da ANP (Agência Nacional do Petróleo), sempre foi, o de olhar tudo o que seja tecnicamente viável no processo de aprovação dos planos de desenvolvimento (dos campos de produção) e exigir que isso seja produzido.

Por que a Lei do Gás, de 2021, vendida como uma medida que poderia derrubar o preço, não deu o resultado esperado?

O que estava errado era alardear que, de uma hora para outra, o preço iria cair e resolveria todos os problemas da indústria. Os problemas são complexos e vão demorar a ser resolvidos, e a redução de preço é uma questão que vai levar tempo. Com a Lei do Gás, nós fizemos uma abertura de mercado da indústria do gás que foi bem-sucedida. Temos várias empresas, não só a Petrobras, vendendo gás. Onde há maior competição, como no Nordeste, o gás é mais barato do que nos locais onde a Petrobras tem pouca competição. Mas o processo de regulamentação desse mercado, pela ANP, está indo muito devagar – e isso gerou uma frustração. Os consumidores estão certos em pressionar, mas é importante entender que são questões técnicas. Se elegemos o caminho do mercado, temos que ter paciência. A alternativa é o governo tabelar o preço, o que eu acho que é pior ainda; que pode funcionar no curto prazo, mas é um desastre no longo prazo.

O sr. identificou problemas no decreto do gás?

É importante que o governo tenha cuidado na implementação do decreto para não gerar incertezas na indústria, porque pode paralisar o bom momento que estamos vivendo. A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… Tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza.

Como assim?

O que me preocupa muito é a ideia de criar um plano para a indústria do gás determinativo, ou seja, os investimentos da indústria vão se dar a partir de um plano elaborado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética), que vai determinar o que vai entrar nesse plano: quais serão os novos gasodutos, sistemas de escoamento, unidades de processamento, qual a oferta e a demanda esperadas… esse tipo de plano é muito desafiador do ponto de vista técnico. Além disso, os atores que têm interesse nos projetos vão pressionar o governo para que os projetos deles estejam no plano. Isso pode atrasar o processo. E como os investimentos agora vão ficar esperando esse plano, isso pode atrasar os investimentos e criar uma paralisia. Já caímos nessa armadilha em 2009. É importante não deixar parar o processo de investimento, porque isso vai ser pior para a oferta. E todo o plano está sendo feito com a ideia de que vamos trazer mais gás – e com mais gás, o preço cai. Se não tem mais oferta, o preço não cai.

Há risco de judicialização?

Não é interesse do governo nem das empresas judicializar. Tem muita coisa em jogo. O decreto apontou as diretrizes e colocou o que é o interesse público, mas a implementação é muito importante. O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás. O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim. No decreto, existem mecanismos para evitar isso, ter oitiva das empresas, respeitar o aspecto técnico-econômico. Porque os planos de desenvolvimento foram ditados com algumas premissas. Se, de repente, essas premissas são mudadas de forma arbitrária, isso pode criar uma incerteza sobre o investimento – e isso afeta a atratividade do Brasil no setor. O que está em jogo é a atratividade do País para além da produção de gás.

BRASÍLIA – O especialista no setor de óleo e gás Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-Rio, afirma que o governo Lula deve ter cautela na hora de implementar as regras ditadas no decreto do gás, editado na última segunda-feira, 26.

O governo estabelece que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) poderá determinar o aumento da produção de gás natural mesmo para campos de exploração onde já existem planos de desenvolvimento aprovados.

“O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás”, afirma Almeida em entrevista ao Estadão. “O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim.”

O especialista diz que está em jogo mais do que os investimentos na produção de gás, mas de todo o setor de petróleo, que vive hoje um momento de planos de expansão.

“A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual a sua avaliação do pacote anunciado pelo governo Lula para aumentar a oferta de gás?

O pacote misturou problemas que são muito diferentes, e isso dificulta a percepção geral. Toda essa questão da transição energética foi colocada junto com o decreto do gás, que tem mais a ver com a questão da competitividade do gás brasileiro. Sobre como resolver uma demanda da indústria. É um ponto muito mais específico do que a transição energética. Tem que separar os temas para debater melhor.

Os grandes consumidores alegam que o gás no Brasil é caro, e que as petroleiras preferem extrair o óleo, que é mais rentável, do que o gás. O governo deve induzir as empresas a produzir gás?

É verdade que o gás brasileiro é caro, e isso está associado ao fato de que nós precisamos importar gás para atender o mercado. A parcela do transporte e distribuição, além dos impostos, também é muito alta. Então, não é só a molécula do gás: as outras etapas da cadeia produtiva também estão acima do custo médio de outros países. Isso tem a ver com questões regulatórias, com o fato de os investimentos não estarem ainda amortizados e com o imposto sobre o gás no Brasil ser de 25% – o que é raro nos outros países. Além disso, o gás no Brasil é mais de 80% associado ao petróleo em águas ultraprofundas. Isso faz com que, do ponto de vista técnico e econômico, esse gás tenha um custo muito alto. Não impede que o governo tente buscar tudo o que seja possível para aumentar a oferta de gás. Este é o dever da ANP (Agência Nacional do Petróleo), sempre foi, o de olhar tudo o que seja tecnicamente viável no processo de aprovação dos planos de desenvolvimento (dos campos de produção) e exigir que isso seja produzido.

Por que a Lei do Gás, de 2021, vendida como uma medida que poderia derrubar o preço, não deu o resultado esperado?

O que estava errado era alardear que, de uma hora para outra, o preço iria cair e resolveria todos os problemas da indústria. Os problemas são complexos e vão demorar a ser resolvidos, e a redução de preço é uma questão que vai levar tempo. Com a Lei do Gás, nós fizemos uma abertura de mercado da indústria do gás que foi bem-sucedida. Temos várias empresas, não só a Petrobras, vendendo gás. Onde há maior competição, como no Nordeste, o gás é mais barato do que nos locais onde a Petrobras tem pouca competição. Mas o processo de regulamentação desse mercado, pela ANP, está indo muito devagar – e isso gerou uma frustração. Os consumidores estão certos em pressionar, mas é importante entender que são questões técnicas. Se elegemos o caminho do mercado, temos que ter paciência. A alternativa é o governo tabelar o preço, o que eu acho que é pior ainda; que pode funcionar no curto prazo, mas é um desastre no longo prazo.

O sr. identificou problemas no decreto do gás?

É importante que o governo tenha cuidado na implementação do decreto para não gerar incertezas na indústria, porque pode paralisar o bom momento que estamos vivendo. A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… Tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza.

Como assim?

O que me preocupa muito é a ideia de criar um plano para a indústria do gás determinativo, ou seja, os investimentos da indústria vão se dar a partir de um plano elaborado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética), que vai determinar o que vai entrar nesse plano: quais serão os novos gasodutos, sistemas de escoamento, unidades de processamento, qual a oferta e a demanda esperadas… esse tipo de plano é muito desafiador do ponto de vista técnico. Além disso, os atores que têm interesse nos projetos vão pressionar o governo para que os projetos deles estejam no plano. Isso pode atrasar o processo. E como os investimentos agora vão ficar esperando esse plano, isso pode atrasar os investimentos e criar uma paralisia. Já caímos nessa armadilha em 2009. É importante não deixar parar o processo de investimento, porque isso vai ser pior para a oferta. E todo o plano está sendo feito com a ideia de que vamos trazer mais gás – e com mais gás, o preço cai. Se não tem mais oferta, o preço não cai.

Há risco de judicialização?

Não é interesse do governo nem das empresas judicializar. Tem muita coisa em jogo. O decreto apontou as diretrizes e colocou o que é o interesse público, mas a implementação é muito importante. O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás. O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim. No decreto, existem mecanismos para evitar isso, ter oitiva das empresas, respeitar o aspecto técnico-econômico. Porque os planos de desenvolvimento foram ditados com algumas premissas. Se, de repente, essas premissas são mudadas de forma arbitrária, isso pode criar uma incerteza sobre o investimento – e isso afeta a atratividade do Brasil no setor. O que está em jogo é a atratividade do País para além da produção de gás.

BRASÍLIA – O especialista no setor de óleo e gás Edmar Almeida, pesquisador do Instituto de Energia da PUC-Rio, afirma que o governo Lula deve ter cautela na hora de implementar as regras ditadas no decreto do gás, editado na última segunda-feira, 26.

O governo estabelece que a Agência Nacional do Petróleo (ANP) poderá determinar o aumento da produção de gás natural mesmo para campos de exploração onde já existem planos de desenvolvimento aprovados.

“O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás”, afirma Almeida em entrevista ao Estadão. “O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim.”

O especialista diz que está em jogo mais do que os investimentos na produção de gás, mas de todo o setor de petróleo, que vive hoje um momento de planos de expansão.

“A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza”, disse. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Qual a sua avaliação do pacote anunciado pelo governo Lula para aumentar a oferta de gás?

O pacote misturou problemas que são muito diferentes, e isso dificulta a percepção geral. Toda essa questão da transição energética foi colocada junto com o decreto do gás, que tem mais a ver com a questão da competitividade do gás brasileiro. Sobre como resolver uma demanda da indústria. É um ponto muito mais específico do que a transição energética. Tem que separar os temas para debater melhor.

Os grandes consumidores alegam que o gás no Brasil é caro, e que as petroleiras preferem extrair o óleo, que é mais rentável, do que o gás. O governo deve induzir as empresas a produzir gás?

É verdade que o gás brasileiro é caro, e isso está associado ao fato de que nós precisamos importar gás para atender o mercado. A parcela do transporte e distribuição, além dos impostos, também é muito alta. Então, não é só a molécula do gás: as outras etapas da cadeia produtiva também estão acima do custo médio de outros países. Isso tem a ver com questões regulatórias, com o fato de os investimentos não estarem ainda amortizados e com o imposto sobre o gás no Brasil ser de 25% – o que é raro nos outros países. Além disso, o gás no Brasil é mais de 80% associado ao petróleo em águas ultraprofundas. Isso faz com que, do ponto de vista técnico e econômico, esse gás tenha um custo muito alto. Não impede que o governo tente buscar tudo o que seja possível para aumentar a oferta de gás. Este é o dever da ANP (Agência Nacional do Petróleo), sempre foi, o de olhar tudo o que seja tecnicamente viável no processo de aprovação dos planos de desenvolvimento (dos campos de produção) e exigir que isso seja produzido.

Por que a Lei do Gás, de 2021, vendida como uma medida que poderia derrubar o preço, não deu o resultado esperado?

O que estava errado era alardear que, de uma hora para outra, o preço iria cair e resolveria todos os problemas da indústria. Os problemas são complexos e vão demorar a ser resolvidos, e a redução de preço é uma questão que vai levar tempo. Com a Lei do Gás, nós fizemos uma abertura de mercado da indústria do gás que foi bem-sucedida. Temos várias empresas, não só a Petrobras, vendendo gás. Onde há maior competição, como no Nordeste, o gás é mais barato do que nos locais onde a Petrobras tem pouca competição. Mas o processo de regulamentação desse mercado, pela ANP, está indo muito devagar – e isso gerou uma frustração. Os consumidores estão certos em pressionar, mas é importante entender que são questões técnicas. Se elegemos o caminho do mercado, temos que ter paciência. A alternativa é o governo tabelar o preço, o que eu acho que é pior ainda; que pode funcionar no curto prazo, mas é um desastre no longo prazo.

O sr. identificou problemas no decreto do gás?

É importante que o governo tenha cuidado na implementação do decreto para não gerar incertezas na indústria, porque pode paralisar o bom momento que estamos vivendo. A fase é de expansão de investimentos no transporte de gás, na importação de GNL (gás natural liquefeito), querem trazer gás da Argentina… Tem muita coisa acontecendo e é importante que os mecanismos criados não gerem conflito e incerteza.

Como assim?

O que me preocupa muito é a ideia de criar um plano para a indústria do gás determinativo, ou seja, os investimentos da indústria vão se dar a partir de um plano elaborado pela EPE (Empresa de Pesquisa Energética), que vai determinar o que vai entrar nesse plano: quais serão os novos gasodutos, sistemas de escoamento, unidades de processamento, qual a oferta e a demanda esperadas… esse tipo de plano é muito desafiador do ponto de vista técnico. Além disso, os atores que têm interesse nos projetos vão pressionar o governo para que os projetos deles estejam no plano. Isso pode atrasar o processo. E como os investimentos agora vão ficar esperando esse plano, isso pode atrasar os investimentos e criar uma paralisia. Já caímos nessa armadilha em 2009. É importante não deixar parar o processo de investimento, porque isso vai ser pior para a oferta. E todo o plano está sendo feito com a ideia de que vamos trazer mais gás – e com mais gás, o preço cai. Se não tem mais oferta, o preço não cai.

Há risco de judicialização?

Não é interesse do governo nem das empresas judicializar. Tem muita coisa em jogo. O decreto apontou as diretrizes e colocou o que é o interesse público, mas a implementação é muito importante. O governo tem espaço para trabalhar sem provocar um desastre no setor de óleo e gás. O processo de revisão dos planos de desenvolvimento pela ANP não pode criar incertezas que gerem paralisia ou criem dificuldades para atrair investimentos para novos campos de petróleo. Isso pode gerar um ambiente de negócios muito ruim. No decreto, existem mecanismos para evitar isso, ter oitiva das empresas, respeitar o aspecto técnico-econômico. Porque os planos de desenvolvimento foram ditados com algumas premissas. Se, de repente, essas premissas são mudadas de forma arbitrária, isso pode criar uma incerteza sobre o investimento – e isso afeta a atratividade do Brasil no setor. O que está em jogo é a atratividade do País para além da produção de gás.

Entrevista por Mariana Carneiro

Repórter especial de Economia em Brasília. Foi editora da Coluna do Estadão. Graduada em comunicação social pela PUC-Rio, com MBA em mercado financeiro pela B3 e especialização em análise de conjuntura econômica pela UFRJ. Foi correspondente na Argentina (2015) pela Folha de S.Paulo e também trabalhou em O Globo, TV Globo, JB e Jornal do Commercio.

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