‘O governo pode querer juros menores, mas o BC tem o direito de seguir seus cálculos’, diz Meirelles


Para ex-ministro da Fazenda, debate entre instituições é saudável e faz parte da democracia; ‘Seria errado se tivessem discutindo a mudança da lei de independência do Banco Central’, afirma

Por Francisco Carlos de Assis e Renata Pedini
Entrevista comHenrique MeirellesEx-presidente do Banco Central e ex-ministro da Fazenda

Com a experiência de quem já sentiu na pele os desafios de conduzir a política monetária do País entre 2003 e 2011, período em que presidiu o Banco Central (BC), o ex-ministro da Fazenda do governo Temer, Henrique Meirelles, entende que as críticas ao atual presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, fazem parte do debate em uma estrutura institucional de independência do BC. Mas pondera que o banco precisa fazer o que seus cálculos indicarem necessário.

Ao Estadão/Broadcast, ele considera prematuro dizer que haverá ou não uma queda da Selic e em qual reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) isso irá ocorrer.

“Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar.”

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Segundo ele, manter a meta de 3% na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), neste mês, é o mais adequado no momento.

Para o ex-ministro, a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P Global é “extremamente positiva”, consequência do bom funcionamento institucional do País.

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“De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento”, afirma.

Para Meirelles, melhora na perspectiva de nota de crédito do Brasil é 'extremamente positiva' e consequência do 'bom funcionamento institucional do País' no momento Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Leia os principais trechos da entrevista:

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Qual a avaliação do sr. sobre a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P?

É uma medida extremamente positiva e consequência do bom funcionamento institucional do País neste momento. De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento. Tem claramente uma tendência de queda a projeção de inflação neste ano. Paralelamente, a do PIB está crescendo. É um cenário favorável que levou a S&P a mudar a perspectiva.

O sr. também passou por isso, não foi?

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Sim. No passado, mantive contatos diretos com as agências de classificação de risco quando o Brasil se tornou investment grade (grau de investimento, espécie de selo de bom pagador, foi obtido pelo País em 2008). Então, basicamente é esse o critério. É um movimento altamente positivo, um acontecimento importante.

Para frente, o sr. vê o Brasil estabilizando a dívida em relação ao PIB?

O teto de gastos, no seu formato original, era bem mais rigoroso e não dependia do aumento da arrecadação. Agora existe de fato uma necessidade de se aumentar a arrecadação e o governo está tomando uma série de medidas e assumindo uma série de compromissos para que haja uma convergência da dívida para patamares menores.

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É possível um aumento de arrecadação sem aumento de impostos?

É possível, mas depende muito da aprovação desses projetos, do esforço arrecadatório do governo e de medidas para a eliminação de subsídios para setores industriais e econômicos e que são grandes. A reforma tributária pode ajudar nisso também. Em resumo, existe uma série de medidas em andamento que, caso sejam bem-sucedidas, elevarão a arrecadação e contribuirão para a convergência da dívida pública para patamares menores.

O sr. vê clima político neste momento para que o Congresso aprove cortes de subsídios?

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Não há dúvida de que a relação com o Congresso está difícil, mas os acordos estão encaminhados. Evidentemente que temos que acompanhar o relacionamento do governo com o presidente da Câmara, Arthur Lira, com os maiores partidos, e a questão da acomodação ministerial. Tudo isso faz parte do jogo político, com o governo visando aprovar seus projetos fundamentais. Agora, não é um projeto simples, envolve toda uma negociação.

Como o sr. vê o ministro Fernando Haddad no papel de negociador com o Congresso?

Olha, ele está indo bem. Tem dialogado com o Congresso e isso é fundamental. Evidentemente que isso tem que ser complementado com as demais medidas de ordem política do governo e que estão em andamento, conforme temos acompanhado com todas as notícias referentes às reuniões, aos acordos, e distribuições de cargos, etc. Tudo isso é que vai definir a possibilidade de termos aí a aprovação do arcabouço fiscal.

E a reforma tributária, é possível ser aprovada este ano?

Eu acho possível, mas é uma reforma que contraria os interesses de alguns setores, o que é normal, dado que a estrutura fiscal da economia é muito desequilibrada. Alguns setores pagam mais impostos do que outros. Com a unificação dos impostos no IVA dual (Imposto sobre Valor Agregado duplo), setores que hoje pagam menos impostos passarão a pagar de forma igual. Trata-se de um avanço, mas enfrentará dificuldades porque alguns setores vão querer negociar.

O sr. acha que é possível termos de volta o grau de investimento ainda neste mandato de Lula?

Estamos no início de um processo e, para chegar lá, tem muito mais. Eu acho que tem que aprovar o arcabouço fiscal e tomar as medidas que permitam uma trajetória de dívida cadente em relação ao produto (PIB). Para isso é necessária a manutenção do trabalho do BC convergindo as expectativas de inflação para as metas de 2024 e 2025 e a economia continuar crescendo e gerando empregos. Mas, como disse, estamos no começo de um processo.

O sr. enfrentou críticas quando presidiu o BC, mas tinha o apoio explícito de Lula. Como vê hoje o mesmo Lula criticando Roberto Campos Neto?

São duas coisas independentes. A situação institucional do Brasil hoje é muito diferente daquela época, quando tínhamos uma independência prática operacional. O BC agia de forma totalmente independente, mas não tinha a independência legal. Agora, existe uma independência legal do BC, o que é muito relevante e muito importante. Então, eu acho que as críticas fazem parte de um debate que passa ser positivo dentro de uma estrutura institucional de independência do BC.

Então é normal haver críticas...

Eu acho que é o debate. Se o ministro da Fazenda e o presidente acham que o BC poderia baixar mais o juro, é um direito deles falarem isso. Por outro lado, é um direito do Banco Central independente fazer aquilo que seus cálculos e seus modelos e projeções julguem mais adequados para levar à convergência da inflação para a meta rapidamente com a menor queda de crescimento possível. É saudável e faz parte da democracia o debate. Seria errado se tivessem discutindo a mudança da lei de independência do BC, o que não está acontecendo. É um debate entre duas instituições independentes: de um lado, o Executivo, e de outro, o BC.

Já há condições para o BC sinalizar corte de juro em agosto no Copom desta semana?

Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. Ele tem modelos bastante avançados e sofisticados. Inclusive ajudei muito a aperfeiçoar quando fui presidente do BC por oito anos. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar. Eu acho prematuro ainda dizer que vai haver ou não uma queda e em qual reunião.

No momento, o mais adequado é manter a meta de inflação ou cabe alguma alteração?

Na minha opinião, o mais adequado agora é manter a meta porque qualquer alteração vai gerar mais ruído, mais incerteza e aumentar as expectativas de inflação. Aumentar a meta pode, num primeiro momento, parecer que vai levar a uma queda de juros, mas, por outro lado, levaria a um aumento das expectativas podendo tornar mais difícil ainda atingir a meta, apesar de mais alta. As coisas estão indo bem, e como diz um ditado internacional, não se tenta consertar o que está indo bem.

O senhor teve a experiência de meta ajustada; uma mudança de meta calendário para contínua pode pesar mais ou menos?

Só se pode falar de meta contínua depois de atingir uma meta, que no caso do Brasil é de 3% e que é adequada para países emergentes. Então, temos que chegar lá primeiro, porque não se pode fazer uma meta contínua com a inflação acima da meta desejada. A partir daí é que se deve passar a trabalhar com uma estabilidade de meta. Eu não diria que é uma meta contínua. Diria que o ideal para o Brasil é a de 3%, mantida ano a ano, e que por este aspecto seria contínua, mas que o horizonte de planejamento com a medida do sucesso ou não do trabalho do BC seja feito anualmente.

Com a experiência de quem já sentiu na pele os desafios de conduzir a política monetária do País entre 2003 e 2011, período em que presidiu o Banco Central (BC), o ex-ministro da Fazenda do governo Temer, Henrique Meirelles, entende que as críticas ao atual presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, fazem parte do debate em uma estrutura institucional de independência do BC. Mas pondera que o banco precisa fazer o que seus cálculos indicarem necessário.

Ao Estadão/Broadcast, ele considera prematuro dizer que haverá ou não uma queda da Selic e em qual reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) isso irá ocorrer.

“Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar.”

Segundo ele, manter a meta de 3% na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), neste mês, é o mais adequado no momento.

Para o ex-ministro, a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P Global é “extremamente positiva”, consequência do bom funcionamento institucional do País.

“De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento”, afirma.

Para Meirelles, melhora na perspectiva de nota de crédito do Brasil é 'extremamente positiva' e consequência do 'bom funcionamento institucional do País' no momento Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Leia os principais trechos da entrevista:

Qual a avaliação do sr. sobre a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P?

É uma medida extremamente positiva e consequência do bom funcionamento institucional do País neste momento. De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento. Tem claramente uma tendência de queda a projeção de inflação neste ano. Paralelamente, a do PIB está crescendo. É um cenário favorável que levou a S&P a mudar a perspectiva.

O sr. também passou por isso, não foi?

Sim. No passado, mantive contatos diretos com as agências de classificação de risco quando o Brasil se tornou investment grade (grau de investimento, espécie de selo de bom pagador, foi obtido pelo País em 2008). Então, basicamente é esse o critério. É um movimento altamente positivo, um acontecimento importante.

Para frente, o sr. vê o Brasil estabilizando a dívida em relação ao PIB?

O teto de gastos, no seu formato original, era bem mais rigoroso e não dependia do aumento da arrecadação. Agora existe de fato uma necessidade de se aumentar a arrecadação e o governo está tomando uma série de medidas e assumindo uma série de compromissos para que haja uma convergência da dívida para patamares menores.

É possível um aumento de arrecadação sem aumento de impostos?

É possível, mas depende muito da aprovação desses projetos, do esforço arrecadatório do governo e de medidas para a eliminação de subsídios para setores industriais e econômicos e que são grandes. A reforma tributária pode ajudar nisso também. Em resumo, existe uma série de medidas em andamento que, caso sejam bem-sucedidas, elevarão a arrecadação e contribuirão para a convergência da dívida pública para patamares menores.

O sr. vê clima político neste momento para que o Congresso aprove cortes de subsídios?

Não há dúvida de que a relação com o Congresso está difícil, mas os acordos estão encaminhados. Evidentemente que temos que acompanhar o relacionamento do governo com o presidente da Câmara, Arthur Lira, com os maiores partidos, e a questão da acomodação ministerial. Tudo isso faz parte do jogo político, com o governo visando aprovar seus projetos fundamentais. Agora, não é um projeto simples, envolve toda uma negociação.

Como o sr. vê o ministro Fernando Haddad no papel de negociador com o Congresso?

Olha, ele está indo bem. Tem dialogado com o Congresso e isso é fundamental. Evidentemente que isso tem que ser complementado com as demais medidas de ordem política do governo e que estão em andamento, conforme temos acompanhado com todas as notícias referentes às reuniões, aos acordos, e distribuições de cargos, etc. Tudo isso é que vai definir a possibilidade de termos aí a aprovação do arcabouço fiscal.

E a reforma tributária, é possível ser aprovada este ano?

Eu acho possível, mas é uma reforma que contraria os interesses de alguns setores, o que é normal, dado que a estrutura fiscal da economia é muito desequilibrada. Alguns setores pagam mais impostos do que outros. Com a unificação dos impostos no IVA dual (Imposto sobre Valor Agregado duplo), setores que hoje pagam menos impostos passarão a pagar de forma igual. Trata-se de um avanço, mas enfrentará dificuldades porque alguns setores vão querer negociar.

O sr. acha que é possível termos de volta o grau de investimento ainda neste mandato de Lula?

Estamos no início de um processo e, para chegar lá, tem muito mais. Eu acho que tem que aprovar o arcabouço fiscal e tomar as medidas que permitam uma trajetória de dívida cadente em relação ao produto (PIB). Para isso é necessária a manutenção do trabalho do BC convergindo as expectativas de inflação para as metas de 2024 e 2025 e a economia continuar crescendo e gerando empregos. Mas, como disse, estamos no começo de um processo.

O sr. enfrentou críticas quando presidiu o BC, mas tinha o apoio explícito de Lula. Como vê hoje o mesmo Lula criticando Roberto Campos Neto?

São duas coisas independentes. A situação institucional do Brasil hoje é muito diferente daquela época, quando tínhamos uma independência prática operacional. O BC agia de forma totalmente independente, mas não tinha a independência legal. Agora, existe uma independência legal do BC, o que é muito relevante e muito importante. Então, eu acho que as críticas fazem parte de um debate que passa ser positivo dentro de uma estrutura institucional de independência do BC.

Então é normal haver críticas...

Eu acho que é o debate. Se o ministro da Fazenda e o presidente acham que o BC poderia baixar mais o juro, é um direito deles falarem isso. Por outro lado, é um direito do Banco Central independente fazer aquilo que seus cálculos e seus modelos e projeções julguem mais adequados para levar à convergência da inflação para a meta rapidamente com a menor queda de crescimento possível. É saudável e faz parte da democracia o debate. Seria errado se tivessem discutindo a mudança da lei de independência do BC, o que não está acontecendo. É um debate entre duas instituições independentes: de um lado, o Executivo, e de outro, o BC.

Já há condições para o BC sinalizar corte de juro em agosto no Copom desta semana?

Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. Ele tem modelos bastante avançados e sofisticados. Inclusive ajudei muito a aperfeiçoar quando fui presidente do BC por oito anos. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar. Eu acho prematuro ainda dizer que vai haver ou não uma queda e em qual reunião.

No momento, o mais adequado é manter a meta de inflação ou cabe alguma alteração?

Na minha opinião, o mais adequado agora é manter a meta porque qualquer alteração vai gerar mais ruído, mais incerteza e aumentar as expectativas de inflação. Aumentar a meta pode, num primeiro momento, parecer que vai levar a uma queda de juros, mas, por outro lado, levaria a um aumento das expectativas podendo tornar mais difícil ainda atingir a meta, apesar de mais alta. As coisas estão indo bem, e como diz um ditado internacional, não se tenta consertar o que está indo bem.

O senhor teve a experiência de meta ajustada; uma mudança de meta calendário para contínua pode pesar mais ou menos?

Só se pode falar de meta contínua depois de atingir uma meta, que no caso do Brasil é de 3% e que é adequada para países emergentes. Então, temos que chegar lá primeiro, porque não se pode fazer uma meta contínua com a inflação acima da meta desejada. A partir daí é que se deve passar a trabalhar com uma estabilidade de meta. Eu não diria que é uma meta contínua. Diria que o ideal para o Brasil é a de 3%, mantida ano a ano, e que por este aspecto seria contínua, mas que o horizonte de planejamento com a medida do sucesso ou não do trabalho do BC seja feito anualmente.

Com a experiência de quem já sentiu na pele os desafios de conduzir a política monetária do País entre 2003 e 2011, período em que presidiu o Banco Central (BC), o ex-ministro da Fazenda do governo Temer, Henrique Meirelles, entende que as críticas ao atual presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, fazem parte do debate em uma estrutura institucional de independência do BC. Mas pondera que o banco precisa fazer o que seus cálculos indicarem necessário.

Ao Estadão/Broadcast, ele considera prematuro dizer que haverá ou não uma queda da Selic e em qual reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) isso irá ocorrer.

“Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar.”

Segundo ele, manter a meta de 3% na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), neste mês, é o mais adequado no momento.

Para o ex-ministro, a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P Global é “extremamente positiva”, consequência do bom funcionamento institucional do País.

“De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento”, afirma.

Para Meirelles, melhora na perspectiva de nota de crédito do Brasil é 'extremamente positiva' e consequência do 'bom funcionamento institucional do País' no momento Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Leia os principais trechos da entrevista:

Qual a avaliação do sr. sobre a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P?

É uma medida extremamente positiva e consequência do bom funcionamento institucional do País neste momento. De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento. Tem claramente uma tendência de queda a projeção de inflação neste ano. Paralelamente, a do PIB está crescendo. É um cenário favorável que levou a S&P a mudar a perspectiva.

O sr. também passou por isso, não foi?

Sim. No passado, mantive contatos diretos com as agências de classificação de risco quando o Brasil se tornou investment grade (grau de investimento, espécie de selo de bom pagador, foi obtido pelo País em 2008). Então, basicamente é esse o critério. É um movimento altamente positivo, um acontecimento importante.

Para frente, o sr. vê o Brasil estabilizando a dívida em relação ao PIB?

O teto de gastos, no seu formato original, era bem mais rigoroso e não dependia do aumento da arrecadação. Agora existe de fato uma necessidade de se aumentar a arrecadação e o governo está tomando uma série de medidas e assumindo uma série de compromissos para que haja uma convergência da dívida para patamares menores.

É possível um aumento de arrecadação sem aumento de impostos?

É possível, mas depende muito da aprovação desses projetos, do esforço arrecadatório do governo e de medidas para a eliminação de subsídios para setores industriais e econômicos e que são grandes. A reforma tributária pode ajudar nisso também. Em resumo, existe uma série de medidas em andamento que, caso sejam bem-sucedidas, elevarão a arrecadação e contribuirão para a convergência da dívida pública para patamares menores.

O sr. vê clima político neste momento para que o Congresso aprove cortes de subsídios?

Não há dúvida de que a relação com o Congresso está difícil, mas os acordos estão encaminhados. Evidentemente que temos que acompanhar o relacionamento do governo com o presidente da Câmara, Arthur Lira, com os maiores partidos, e a questão da acomodação ministerial. Tudo isso faz parte do jogo político, com o governo visando aprovar seus projetos fundamentais. Agora, não é um projeto simples, envolve toda uma negociação.

Como o sr. vê o ministro Fernando Haddad no papel de negociador com o Congresso?

Olha, ele está indo bem. Tem dialogado com o Congresso e isso é fundamental. Evidentemente que isso tem que ser complementado com as demais medidas de ordem política do governo e que estão em andamento, conforme temos acompanhado com todas as notícias referentes às reuniões, aos acordos, e distribuições de cargos, etc. Tudo isso é que vai definir a possibilidade de termos aí a aprovação do arcabouço fiscal.

E a reforma tributária, é possível ser aprovada este ano?

Eu acho possível, mas é uma reforma que contraria os interesses de alguns setores, o que é normal, dado que a estrutura fiscal da economia é muito desequilibrada. Alguns setores pagam mais impostos do que outros. Com a unificação dos impostos no IVA dual (Imposto sobre Valor Agregado duplo), setores que hoje pagam menos impostos passarão a pagar de forma igual. Trata-se de um avanço, mas enfrentará dificuldades porque alguns setores vão querer negociar.

O sr. acha que é possível termos de volta o grau de investimento ainda neste mandato de Lula?

Estamos no início de um processo e, para chegar lá, tem muito mais. Eu acho que tem que aprovar o arcabouço fiscal e tomar as medidas que permitam uma trajetória de dívida cadente em relação ao produto (PIB). Para isso é necessária a manutenção do trabalho do BC convergindo as expectativas de inflação para as metas de 2024 e 2025 e a economia continuar crescendo e gerando empregos. Mas, como disse, estamos no começo de um processo.

O sr. enfrentou críticas quando presidiu o BC, mas tinha o apoio explícito de Lula. Como vê hoje o mesmo Lula criticando Roberto Campos Neto?

São duas coisas independentes. A situação institucional do Brasil hoje é muito diferente daquela época, quando tínhamos uma independência prática operacional. O BC agia de forma totalmente independente, mas não tinha a independência legal. Agora, existe uma independência legal do BC, o que é muito relevante e muito importante. Então, eu acho que as críticas fazem parte de um debate que passa ser positivo dentro de uma estrutura institucional de independência do BC.

Então é normal haver críticas...

Eu acho que é o debate. Se o ministro da Fazenda e o presidente acham que o BC poderia baixar mais o juro, é um direito deles falarem isso. Por outro lado, é um direito do Banco Central independente fazer aquilo que seus cálculos e seus modelos e projeções julguem mais adequados para levar à convergência da inflação para a meta rapidamente com a menor queda de crescimento possível. É saudável e faz parte da democracia o debate. Seria errado se tivessem discutindo a mudança da lei de independência do BC, o que não está acontecendo. É um debate entre duas instituições independentes: de um lado, o Executivo, e de outro, o BC.

Já há condições para o BC sinalizar corte de juro em agosto no Copom desta semana?

Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. Ele tem modelos bastante avançados e sofisticados. Inclusive ajudei muito a aperfeiçoar quando fui presidente do BC por oito anos. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar. Eu acho prematuro ainda dizer que vai haver ou não uma queda e em qual reunião.

No momento, o mais adequado é manter a meta de inflação ou cabe alguma alteração?

Na minha opinião, o mais adequado agora é manter a meta porque qualquer alteração vai gerar mais ruído, mais incerteza e aumentar as expectativas de inflação. Aumentar a meta pode, num primeiro momento, parecer que vai levar a uma queda de juros, mas, por outro lado, levaria a um aumento das expectativas podendo tornar mais difícil ainda atingir a meta, apesar de mais alta. As coisas estão indo bem, e como diz um ditado internacional, não se tenta consertar o que está indo bem.

O senhor teve a experiência de meta ajustada; uma mudança de meta calendário para contínua pode pesar mais ou menos?

Só se pode falar de meta contínua depois de atingir uma meta, que no caso do Brasil é de 3% e que é adequada para países emergentes. Então, temos que chegar lá primeiro, porque não se pode fazer uma meta contínua com a inflação acima da meta desejada. A partir daí é que se deve passar a trabalhar com uma estabilidade de meta. Eu não diria que é uma meta contínua. Diria que o ideal para o Brasil é a de 3%, mantida ano a ano, e que por este aspecto seria contínua, mas que o horizonte de planejamento com a medida do sucesso ou não do trabalho do BC seja feito anualmente.

Com a experiência de quem já sentiu na pele os desafios de conduzir a política monetária do País entre 2003 e 2011, período em que presidiu o Banco Central (BC), o ex-ministro da Fazenda do governo Temer, Henrique Meirelles, entende que as críticas ao atual presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, fazem parte do debate em uma estrutura institucional de independência do BC. Mas pondera que o banco precisa fazer o que seus cálculos indicarem necessário.

Ao Estadão/Broadcast, ele considera prematuro dizer que haverá ou não uma queda da Selic e em qual reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) isso irá ocorrer.

“Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar.”

Segundo ele, manter a meta de 3% na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), neste mês, é o mais adequado no momento.

Para o ex-ministro, a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P Global é “extremamente positiva”, consequência do bom funcionamento institucional do País.

“De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento”, afirma.

Para Meirelles, melhora na perspectiva de nota de crédito do Brasil é 'extremamente positiva' e consequência do 'bom funcionamento institucional do País' no momento Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Leia os principais trechos da entrevista:

Qual a avaliação do sr. sobre a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P?

É uma medida extremamente positiva e consequência do bom funcionamento institucional do País neste momento. De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento. Tem claramente uma tendência de queda a projeção de inflação neste ano. Paralelamente, a do PIB está crescendo. É um cenário favorável que levou a S&P a mudar a perspectiva.

O sr. também passou por isso, não foi?

Sim. No passado, mantive contatos diretos com as agências de classificação de risco quando o Brasil se tornou investment grade (grau de investimento, espécie de selo de bom pagador, foi obtido pelo País em 2008). Então, basicamente é esse o critério. É um movimento altamente positivo, um acontecimento importante.

Para frente, o sr. vê o Brasil estabilizando a dívida em relação ao PIB?

O teto de gastos, no seu formato original, era bem mais rigoroso e não dependia do aumento da arrecadação. Agora existe de fato uma necessidade de se aumentar a arrecadação e o governo está tomando uma série de medidas e assumindo uma série de compromissos para que haja uma convergência da dívida para patamares menores.

É possível um aumento de arrecadação sem aumento de impostos?

É possível, mas depende muito da aprovação desses projetos, do esforço arrecadatório do governo e de medidas para a eliminação de subsídios para setores industriais e econômicos e que são grandes. A reforma tributária pode ajudar nisso também. Em resumo, existe uma série de medidas em andamento que, caso sejam bem-sucedidas, elevarão a arrecadação e contribuirão para a convergência da dívida pública para patamares menores.

O sr. vê clima político neste momento para que o Congresso aprove cortes de subsídios?

Não há dúvida de que a relação com o Congresso está difícil, mas os acordos estão encaminhados. Evidentemente que temos que acompanhar o relacionamento do governo com o presidente da Câmara, Arthur Lira, com os maiores partidos, e a questão da acomodação ministerial. Tudo isso faz parte do jogo político, com o governo visando aprovar seus projetos fundamentais. Agora, não é um projeto simples, envolve toda uma negociação.

Como o sr. vê o ministro Fernando Haddad no papel de negociador com o Congresso?

Olha, ele está indo bem. Tem dialogado com o Congresso e isso é fundamental. Evidentemente que isso tem que ser complementado com as demais medidas de ordem política do governo e que estão em andamento, conforme temos acompanhado com todas as notícias referentes às reuniões, aos acordos, e distribuições de cargos, etc. Tudo isso é que vai definir a possibilidade de termos aí a aprovação do arcabouço fiscal.

E a reforma tributária, é possível ser aprovada este ano?

Eu acho possível, mas é uma reforma que contraria os interesses de alguns setores, o que é normal, dado que a estrutura fiscal da economia é muito desequilibrada. Alguns setores pagam mais impostos do que outros. Com a unificação dos impostos no IVA dual (Imposto sobre Valor Agregado duplo), setores que hoje pagam menos impostos passarão a pagar de forma igual. Trata-se de um avanço, mas enfrentará dificuldades porque alguns setores vão querer negociar.

O sr. acha que é possível termos de volta o grau de investimento ainda neste mandato de Lula?

Estamos no início de um processo e, para chegar lá, tem muito mais. Eu acho que tem que aprovar o arcabouço fiscal e tomar as medidas que permitam uma trajetória de dívida cadente em relação ao produto (PIB). Para isso é necessária a manutenção do trabalho do BC convergindo as expectativas de inflação para as metas de 2024 e 2025 e a economia continuar crescendo e gerando empregos. Mas, como disse, estamos no começo de um processo.

O sr. enfrentou críticas quando presidiu o BC, mas tinha o apoio explícito de Lula. Como vê hoje o mesmo Lula criticando Roberto Campos Neto?

São duas coisas independentes. A situação institucional do Brasil hoje é muito diferente daquela época, quando tínhamos uma independência prática operacional. O BC agia de forma totalmente independente, mas não tinha a independência legal. Agora, existe uma independência legal do BC, o que é muito relevante e muito importante. Então, eu acho que as críticas fazem parte de um debate que passa ser positivo dentro de uma estrutura institucional de independência do BC.

Então é normal haver críticas...

Eu acho que é o debate. Se o ministro da Fazenda e o presidente acham que o BC poderia baixar mais o juro, é um direito deles falarem isso. Por outro lado, é um direito do Banco Central independente fazer aquilo que seus cálculos e seus modelos e projeções julguem mais adequados para levar à convergência da inflação para a meta rapidamente com a menor queda de crescimento possível. É saudável e faz parte da democracia o debate. Seria errado se tivessem discutindo a mudança da lei de independência do BC, o que não está acontecendo. É um debate entre duas instituições independentes: de um lado, o Executivo, e de outro, o BC.

Já há condições para o BC sinalizar corte de juro em agosto no Copom desta semana?

Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. Ele tem modelos bastante avançados e sofisticados. Inclusive ajudei muito a aperfeiçoar quando fui presidente do BC por oito anos. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar. Eu acho prematuro ainda dizer que vai haver ou não uma queda e em qual reunião.

No momento, o mais adequado é manter a meta de inflação ou cabe alguma alteração?

Na minha opinião, o mais adequado agora é manter a meta porque qualquer alteração vai gerar mais ruído, mais incerteza e aumentar as expectativas de inflação. Aumentar a meta pode, num primeiro momento, parecer que vai levar a uma queda de juros, mas, por outro lado, levaria a um aumento das expectativas podendo tornar mais difícil ainda atingir a meta, apesar de mais alta. As coisas estão indo bem, e como diz um ditado internacional, não se tenta consertar o que está indo bem.

O senhor teve a experiência de meta ajustada; uma mudança de meta calendário para contínua pode pesar mais ou menos?

Só se pode falar de meta contínua depois de atingir uma meta, que no caso do Brasil é de 3% e que é adequada para países emergentes. Então, temos que chegar lá primeiro, porque não se pode fazer uma meta contínua com a inflação acima da meta desejada. A partir daí é que se deve passar a trabalhar com uma estabilidade de meta. Eu não diria que é uma meta contínua. Diria que o ideal para o Brasil é a de 3%, mantida ano a ano, e que por este aspecto seria contínua, mas que o horizonte de planejamento com a medida do sucesso ou não do trabalho do BC seja feito anualmente.

Com a experiência de quem já sentiu na pele os desafios de conduzir a política monetária do País entre 2003 e 2011, período em que presidiu o Banco Central (BC), o ex-ministro da Fazenda do governo Temer, Henrique Meirelles, entende que as críticas ao atual presidente da autarquia, Roberto Campos Neto, fazem parte do debate em uma estrutura institucional de independência do BC. Mas pondera que o banco precisa fazer o que seus cálculos indicarem necessário.

Ao Estadão/Broadcast, ele considera prematuro dizer que haverá ou não uma queda da Selic e em qual reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) isso irá ocorrer.

“Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar.”

Segundo ele, manter a meta de 3% na próxima reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN), neste mês, é o mais adequado no momento.

Para o ex-ministro, a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P Global é “extremamente positiva”, consequência do bom funcionamento institucional do País.

“De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento”, afirma.

Para Meirelles, melhora na perspectiva de nota de crédito do Brasil é 'extremamente positiva' e consequência do 'bom funcionamento institucional do País' no momento Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Leia os principais trechos da entrevista:

Qual a avaliação do sr. sobre a melhora da perspectiva de rating do Brasil pela S&P?

É uma medida extremamente positiva e consequência do bom funcionamento institucional do País neste momento. De um lado, o Poder Executivo envia ao Congresso Nacional a proposta de arcabouço fiscal, demonstrando uma intenção clara e um compromisso de controlar as despesas e, por outro lado, o BC mantém uma política monetária rigorosa que está derrubando a inflação corrente e as expectativas para este ano, sem prejudicar o crescimento. Tem claramente uma tendência de queda a projeção de inflação neste ano. Paralelamente, a do PIB está crescendo. É um cenário favorável que levou a S&P a mudar a perspectiva.

O sr. também passou por isso, não foi?

Sim. No passado, mantive contatos diretos com as agências de classificação de risco quando o Brasil se tornou investment grade (grau de investimento, espécie de selo de bom pagador, foi obtido pelo País em 2008). Então, basicamente é esse o critério. É um movimento altamente positivo, um acontecimento importante.

Para frente, o sr. vê o Brasil estabilizando a dívida em relação ao PIB?

O teto de gastos, no seu formato original, era bem mais rigoroso e não dependia do aumento da arrecadação. Agora existe de fato uma necessidade de se aumentar a arrecadação e o governo está tomando uma série de medidas e assumindo uma série de compromissos para que haja uma convergência da dívida para patamares menores.

É possível um aumento de arrecadação sem aumento de impostos?

É possível, mas depende muito da aprovação desses projetos, do esforço arrecadatório do governo e de medidas para a eliminação de subsídios para setores industriais e econômicos e que são grandes. A reforma tributária pode ajudar nisso também. Em resumo, existe uma série de medidas em andamento que, caso sejam bem-sucedidas, elevarão a arrecadação e contribuirão para a convergência da dívida pública para patamares menores.

O sr. vê clima político neste momento para que o Congresso aprove cortes de subsídios?

Não há dúvida de que a relação com o Congresso está difícil, mas os acordos estão encaminhados. Evidentemente que temos que acompanhar o relacionamento do governo com o presidente da Câmara, Arthur Lira, com os maiores partidos, e a questão da acomodação ministerial. Tudo isso faz parte do jogo político, com o governo visando aprovar seus projetos fundamentais. Agora, não é um projeto simples, envolve toda uma negociação.

Como o sr. vê o ministro Fernando Haddad no papel de negociador com o Congresso?

Olha, ele está indo bem. Tem dialogado com o Congresso e isso é fundamental. Evidentemente que isso tem que ser complementado com as demais medidas de ordem política do governo e que estão em andamento, conforme temos acompanhado com todas as notícias referentes às reuniões, aos acordos, e distribuições de cargos, etc. Tudo isso é que vai definir a possibilidade de termos aí a aprovação do arcabouço fiscal.

E a reforma tributária, é possível ser aprovada este ano?

Eu acho possível, mas é uma reforma que contraria os interesses de alguns setores, o que é normal, dado que a estrutura fiscal da economia é muito desequilibrada. Alguns setores pagam mais impostos do que outros. Com a unificação dos impostos no IVA dual (Imposto sobre Valor Agregado duplo), setores que hoje pagam menos impostos passarão a pagar de forma igual. Trata-se de um avanço, mas enfrentará dificuldades porque alguns setores vão querer negociar.

O sr. acha que é possível termos de volta o grau de investimento ainda neste mandato de Lula?

Estamos no início de um processo e, para chegar lá, tem muito mais. Eu acho que tem que aprovar o arcabouço fiscal e tomar as medidas que permitam uma trajetória de dívida cadente em relação ao produto (PIB). Para isso é necessária a manutenção do trabalho do BC convergindo as expectativas de inflação para as metas de 2024 e 2025 e a economia continuar crescendo e gerando empregos. Mas, como disse, estamos no começo de um processo.

O sr. enfrentou críticas quando presidiu o BC, mas tinha o apoio explícito de Lula. Como vê hoje o mesmo Lula criticando Roberto Campos Neto?

São duas coisas independentes. A situação institucional do Brasil hoje é muito diferente daquela época, quando tínhamos uma independência prática operacional. O BC agia de forma totalmente independente, mas não tinha a independência legal. Agora, existe uma independência legal do BC, o que é muito relevante e muito importante. Então, eu acho que as críticas fazem parte de um debate que passa ser positivo dentro de uma estrutura institucional de independência do BC.

Então é normal haver críticas...

Eu acho que é o debate. Se o ministro da Fazenda e o presidente acham que o BC poderia baixar mais o juro, é um direito deles falarem isso. Por outro lado, é um direito do Banco Central independente fazer aquilo que seus cálculos e seus modelos e projeções julguem mais adequados para levar à convergência da inflação para a meta rapidamente com a menor queda de crescimento possível. É saudável e faz parte da democracia o debate. Seria errado se tivessem discutindo a mudança da lei de independência do BC, o que não está acontecendo. É um debate entre duas instituições independentes: de um lado, o Executivo, e de outro, o BC.

Já há condições para o BC sinalizar corte de juro em agosto no Copom desta semana?

Isso será demonstrado pelas projeções que o próprio BC vai fazer. Ele tem modelos bastante avançados e sofisticados. Inclusive ajudei muito a aperfeiçoar quando fui presidente do BC por oito anos. O BC vai levar em conta todos os fatores e não só a inflação corrente, mas também os relacionados ao valor da moeda, fatores de risco e mesmo as expectativas de inflação, além da trajetória fiscal. Vamos aguardar. Eu acho prematuro ainda dizer que vai haver ou não uma queda e em qual reunião.

No momento, o mais adequado é manter a meta de inflação ou cabe alguma alteração?

Na minha opinião, o mais adequado agora é manter a meta porque qualquer alteração vai gerar mais ruído, mais incerteza e aumentar as expectativas de inflação. Aumentar a meta pode, num primeiro momento, parecer que vai levar a uma queda de juros, mas, por outro lado, levaria a um aumento das expectativas podendo tornar mais difícil ainda atingir a meta, apesar de mais alta. As coisas estão indo bem, e como diz um ditado internacional, não se tenta consertar o que está indo bem.

O senhor teve a experiência de meta ajustada; uma mudança de meta calendário para contínua pode pesar mais ou menos?

Só se pode falar de meta contínua depois de atingir uma meta, que no caso do Brasil é de 3% e que é adequada para países emergentes. Então, temos que chegar lá primeiro, porque não se pode fazer uma meta contínua com a inflação acima da meta desejada. A partir daí é que se deve passar a trabalhar com uma estabilidade de meta. Eu não diria que é uma meta contínua. Diria que o ideal para o Brasil é a de 3%, mantida ano a ano, e que por este aspecto seria contínua, mas que o horizonte de planejamento com a medida do sucesso ou não do trabalho do BC seja feito anualmente.

Entrevista por Francisco Carlos de Assis

Francisco Carlos de Assis é repórter

Renata Pedini

Renata Pedini é editora de Macroeconomia e Mercados do Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, e colunista da Rádio Eldorado. Foi produtora e chefe de reportagem na Rádio CBN. Formada pela PUC-SP, cursou o MBA em Derivativos e informações econômico-financeiras da FIA e o Master em Jornalismo Econômico IICS.

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