Podemos aumentar investimentos e preservar a Amazônia com títulos verdes, diz Ilan Goldfajn


Em entrevista ao Estadão, presidente do BID defende ser possível ‘mudar o patamar’ de dinheiro destinado à região através de novos mecanismos financeiros

Por Beatriz Bulla
Atualização:
Foto: Dida Sampaio/Estadão
Entrevista comIlan GoldfajnPresidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)

Em busca de mais financiamento para a preservação e ações sustentáveis na Amazônia, o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, defende ser possível “mudar o patamar” de dinheiro destinado à região. Para alcançar investidores, ele defende que se discuta a possibilidade de criar green bonds amazônicos, títulos verdes que seriam emitidos pelos países da região e vinculados a metas de preservação.

“Se mostrar credibilidade, dá para mudar o patamar com esses instrumentos financeiros. Um deles são bonds amazônicos, ligados a indicador regional”, afirma Goldfajn. Ele falou ao Estadão durante passagem pelo Brasil para participar da Cúpula da Amazônia, realizada em 8 e 9 de agosto.

O assunto, segundo ele, pode ser debatido em setembro em um encontro que deve reunir países doadores (como europeus e EUA) e países da região amazônica. A reunião ocorrerá em Santiago de Compostela, na Espanha.

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Goldfajn diz haver um contexto político favorável à entrada de investimentos em projetos na reunião. Ele coloca o BID como o grande articulador de uma agenda concreta para desenvolvimento econômico e social aliado à preservação ambiental. Leia, a seguir, a entrevista.

O presidente do BID, Ilan Goldfajn 
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Qual o papel do BID na discussão de projetos sustentáveis para a Amazônia? Estamos vendo discussão sobre doações de países ricos, investidores interessados. Como o BID entra nesse ecossistema?

O que o BID pode fazer é basicamente ser um instrumento de ações concretas. Esse é o momento no qual temos uma inflexão política, e isso leva a uma nova oportunidade. O BID já está na região há muito tempo. Temos conhecimento da região e temos projetos no chão e ações concretas que podemos fazer. De um lado, podemos trabalhar e coordenar vários e diferentes atores e, de outro lado, fazer com esses atores implementem claramente os objetivos.

O Amazônia Sempre é um projeto guarda-chuva (do BID). E por que guarda-chuva? Porque você tem iniciativas de determinados países, determinadas organizações, determinados fundos, cada um tem o seu projeto preferido. São instrumentos de fundo amazônico. A Colômbia tem o seu, são as suas iniciativas, as ONGs tem sua preferência, enfim, tem de tudo. Mas alguém tem que ser o implementador. Alguém tem que oferecer ações concretas.

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O segundo aspecto é a nossa capacidade de agregar, de juntar. Temos um mandato para a região. O Brasil é um líder importante, o BNDES é um banco de peso com uma importância relevante, mas o BID que traz os 19 bancos conosco e ainda há uma coordenação de mídia regional. Então, essa capacidade de juntar e ter o mandato dos países, dos Estados e cidades, os bancos públicos e o outro lado estão conseguindo concretude, ações concretas e do outro lado, a capacidade de trazer tudo.

Qual o próximo movimento do BID para agregar, juntar esses atores, que pode resultar em novidades e financiamento na região?

Vamos reunir os ministros da Fazenda, do Planejamento, da região e do resto do mundo, os doadores, e sentar juntos em setembro, em Santiago de Compostela. E vamos falar como financiaremos os novos projetos e como criaremos uma rede na qual eles vão se falar para organizar os diferentes projetos.

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Qual ambição o sr. tem para esse encontro na Espanha com países doadores?

Precisamos mudar o patamar de recursos para a região. Se mostrar credibilidade, dá para mudar o patamar com esses instrumentos financeiros. Um deles são bonds amazônicos, ligados a indicador regional. Dá para organizar isso. É preciso também ter escritórios de projetos na região e gerar redes de cooperação.

Por exemplo: trabalhamos um ano e pouco para desenhar uma emissão com o Uruguai. São os bonds sustentáveis ligados a indicadores. No caso do Uruguai, você tem dois indicadores: o indicador de desmatamento e o de emissão de carbono. Parece fácil falar isso, mas (é preciso definir) qual o indicador? Como é que você monitora? Então você tem que desenhar isso. Por que esses indicadores são importantes? Porque quando você emite um indicador bem concreto, isso dá uma reputação e uma percepção de que você está incentivando um investidor preocupado com ESG, mas está preocupado com o clima e que quer contribuir. Está o BID por trás dizendo: esse indicador é bom.

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Os presidentes da Colômbia, Gustavo Petro, do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Bolívia, Luis Arce, durante a Cúpula da Amazônia Foto: Antonio Lacerda/Efe

Alguns ambientalistas disseram que a declaração que resultou da Cúpula da Amazônia poderia ter sido mais ambiciosa. Isso é um empecilho para sentar com esses doadores?

Não, porque nós vamos ajudar a definir os projetos, quais são indicadores que dá para ver, financiar a criação de indicadores. Temos nossas metas, metas do BID, porque a gente quer avançar. A gente tem esse lado, o que a gente traz de reputação.

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Temos uma conjunção de fatores que nos leva a essa nova ambição. De um lado, a nova realidade política da região, onde você vê agora, em Belém (na Cúpula da Amazônia), o resultado dessa nova ambição, a nova realidade política. Existe uma percepção global da necessidade da urgência. Então, isso existe e está claro.

O quarto fator é que a gente está em um mandato, em uma energia nova, com a cabeça na região, uma nova energia de olhar o clima como prioridade, numa visão regional e com a cabeça de impacto de ações concretas. Vamos implementar.

Quando o sr. menciona a nova realidade política da região, está falando do Brasil e de onde mais?

Tem um novo governo aqui, tem um novo governo na Colômbia, tem os países da região, olhando essa questão, com uma nova energia.

Falando de uma forma geral, não só da região amazônica, há uma nova visão para América Latina, que já tem uma matriz energética mais limpa que o resto do mundo e há investimento em renováveis, em solar, eólica. E esses investimentos estão vindo com uma força enorme. Eu estive na Alemanha agora, com investidor privado, e as perguntas são bem específicas. Esses investimentos vão vir.

E o que o sr. respondeu?

Que eu vejo os governos comprometidos com os renováveis. Acho que isso aqui está dando retorno. Acho que os países perceberam que eles têm uma vantagem comparativa de algo que o mundo está precisando. Nós vamos exportar energia limpa. Exportar minerais, lítio, na Bolívia, Chile, Argentina.

A América Latina corre risco de não estar avançando na velocidade necessária para assumir esse papel de protagonismo na agenda de transição energética?

Nós temos uma oportunidade hoje, única, de aproveitar as vantagens comparativas que a gente tem em benefício da região e do mundo. Mas é uma oportunidade. A gente tem que ter infraestrutura, regulação. Nós já perdemos oportunidades no passado, então nada está garantido. Mas o que a gente tem que fazer é perceber o momento único, preparar o que precisa fazer, ter planos de sustentabilidade. Os Estados têm que está pensando nisso como estão mesmo.

O governador Tarcísio, ainda no governo federal, chegou a falar de green bonds. No governo estadual ele voltou a falar, e em parceria com o BID. Isso está sendo discutido com o governo federal também?

Não entramos em detalhes de empréstimos que ainda não estão prontos. Mas o que eu posso dizer é que temos discussões em vários aspectos sobre instrumentos financeiros. Temos trabalhado em outros países com inovações que tem funcionado.

Então, não vou te responder especificamente, mas em todas as minhas conversas bilaterais discutimos como podemos usar os instrumentos para captar mais, e a segunda parte da conversa é o que vai ser feito com o dinheiro. Porque precisa ter dinheiro, mas eu preciso do outro lado, eu preciso do projeto.

O Brasil tem feito um bom trabalho para passar credibilidade na agenda econômica, de responsabilidade fiscal, para atrair o investimento do BID, dos países doadores?

A sustentabilidade econômica está diretamente ligada à sustentabilidade ambiental e social. As coisas andam juntas. Então, se você olha um país seriamente comprometido com a sustentabilidade ambiental, o recurso vem. Se o dinheiro vem, facilita a questão fiscal também. A mesma coisa a questão social. Nunca se viu tanto interesse em Belém, empresas vindo, pequenas e médias empresas. Será que alguma coisa vai virar crescimento? Pode ser, porque o PIB de alguns Estados vem de pequenas e médias empresas mesmo.

Quando falamos: temos R$ 4,5 bilhões para a região, tem uma boa chance daquilo lá virar um crescimento econômico. É certo? Não. É uma oportunidade, temos que trabalhar. Mas a sustentabilidade econômica e a sustentabilidade ambiental andam juntas. Se você mostrar esforço nesse lado, vai entrar dinheiro.

Essa questão do Uruguai, por exemplo, pode entrar dinheiro se o país atingir a meta, que são recursos concessionais, não reembolsáveis. Isso dá para a gente fazer com os fundos. Então, se você tiver essa visão, você consegue mais recursos e esses recursos também incentivam mais a economia.

Em busca de mais financiamento para a preservação e ações sustentáveis na Amazônia, o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, defende ser possível “mudar o patamar” de dinheiro destinado à região. Para alcançar investidores, ele defende que se discuta a possibilidade de criar green bonds amazônicos, títulos verdes que seriam emitidos pelos países da região e vinculados a metas de preservação.

“Se mostrar credibilidade, dá para mudar o patamar com esses instrumentos financeiros. Um deles são bonds amazônicos, ligados a indicador regional”, afirma Goldfajn. Ele falou ao Estadão durante passagem pelo Brasil para participar da Cúpula da Amazônia, realizada em 8 e 9 de agosto.

O assunto, segundo ele, pode ser debatido em setembro em um encontro que deve reunir países doadores (como europeus e EUA) e países da região amazônica. A reunião ocorrerá em Santiago de Compostela, na Espanha.

Goldfajn diz haver um contexto político favorável à entrada de investimentos em projetos na reunião. Ele coloca o BID como o grande articulador de uma agenda concreta para desenvolvimento econômico e social aliado à preservação ambiental. Leia, a seguir, a entrevista.

O presidente do BID, Ilan Goldfajn 

Qual o papel do BID na discussão de projetos sustentáveis para a Amazônia? Estamos vendo discussão sobre doações de países ricos, investidores interessados. Como o BID entra nesse ecossistema?

O que o BID pode fazer é basicamente ser um instrumento de ações concretas. Esse é o momento no qual temos uma inflexão política, e isso leva a uma nova oportunidade. O BID já está na região há muito tempo. Temos conhecimento da região e temos projetos no chão e ações concretas que podemos fazer. De um lado, podemos trabalhar e coordenar vários e diferentes atores e, de outro lado, fazer com esses atores implementem claramente os objetivos.

O Amazônia Sempre é um projeto guarda-chuva (do BID). E por que guarda-chuva? Porque você tem iniciativas de determinados países, determinadas organizações, determinados fundos, cada um tem o seu projeto preferido. São instrumentos de fundo amazônico. A Colômbia tem o seu, são as suas iniciativas, as ONGs tem sua preferência, enfim, tem de tudo. Mas alguém tem que ser o implementador. Alguém tem que oferecer ações concretas.

O segundo aspecto é a nossa capacidade de agregar, de juntar. Temos um mandato para a região. O Brasil é um líder importante, o BNDES é um banco de peso com uma importância relevante, mas o BID que traz os 19 bancos conosco e ainda há uma coordenação de mídia regional. Então, essa capacidade de juntar e ter o mandato dos países, dos Estados e cidades, os bancos públicos e o outro lado estão conseguindo concretude, ações concretas e do outro lado, a capacidade de trazer tudo.

Qual o próximo movimento do BID para agregar, juntar esses atores, que pode resultar em novidades e financiamento na região?

Vamos reunir os ministros da Fazenda, do Planejamento, da região e do resto do mundo, os doadores, e sentar juntos em setembro, em Santiago de Compostela. E vamos falar como financiaremos os novos projetos e como criaremos uma rede na qual eles vão se falar para organizar os diferentes projetos.

Qual ambição o sr. tem para esse encontro na Espanha com países doadores?

Precisamos mudar o patamar de recursos para a região. Se mostrar credibilidade, dá para mudar o patamar com esses instrumentos financeiros. Um deles são bonds amazônicos, ligados a indicador regional. Dá para organizar isso. É preciso também ter escritórios de projetos na região e gerar redes de cooperação.

Por exemplo: trabalhamos um ano e pouco para desenhar uma emissão com o Uruguai. São os bonds sustentáveis ligados a indicadores. No caso do Uruguai, você tem dois indicadores: o indicador de desmatamento e o de emissão de carbono. Parece fácil falar isso, mas (é preciso definir) qual o indicador? Como é que você monitora? Então você tem que desenhar isso. Por que esses indicadores são importantes? Porque quando você emite um indicador bem concreto, isso dá uma reputação e uma percepção de que você está incentivando um investidor preocupado com ESG, mas está preocupado com o clima e que quer contribuir. Está o BID por trás dizendo: esse indicador é bom.

Os presidentes da Colômbia, Gustavo Petro, do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Bolívia, Luis Arce, durante a Cúpula da Amazônia Foto: Antonio Lacerda/Efe

Alguns ambientalistas disseram que a declaração que resultou da Cúpula da Amazônia poderia ter sido mais ambiciosa. Isso é um empecilho para sentar com esses doadores?

Não, porque nós vamos ajudar a definir os projetos, quais são indicadores que dá para ver, financiar a criação de indicadores. Temos nossas metas, metas do BID, porque a gente quer avançar. A gente tem esse lado, o que a gente traz de reputação.

Temos uma conjunção de fatores que nos leva a essa nova ambição. De um lado, a nova realidade política da região, onde você vê agora, em Belém (na Cúpula da Amazônia), o resultado dessa nova ambição, a nova realidade política. Existe uma percepção global da necessidade da urgência. Então, isso existe e está claro.

O quarto fator é que a gente está em um mandato, em uma energia nova, com a cabeça na região, uma nova energia de olhar o clima como prioridade, numa visão regional e com a cabeça de impacto de ações concretas. Vamos implementar.

Quando o sr. menciona a nova realidade política da região, está falando do Brasil e de onde mais?

Tem um novo governo aqui, tem um novo governo na Colômbia, tem os países da região, olhando essa questão, com uma nova energia.

Falando de uma forma geral, não só da região amazônica, há uma nova visão para América Latina, que já tem uma matriz energética mais limpa que o resto do mundo e há investimento em renováveis, em solar, eólica. E esses investimentos estão vindo com uma força enorme. Eu estive na Alemanha agora, com investidor privado, e as perguntas são bem específicas. Esses investimentos vão vir.

E o que o sr. respondeu?

Que eu vejo os governos comprometidos com os renováveis. Acho que isso aqui está dando retorno. Acho que os países perceberam que eles têm uma vantagem comparativa de algo que o mundo está precisando. Nós vamos exportar energia limpa. Exportar minerais, lítio, na Bolívia, Chile, Argentina.

A América Latina corre risco de não estar avançando na velocidade necessária para assumir esse papel de protagonismo na agenda de transição energética?

Nós temos uma oportunidade hoje, única, de aproveitar as vantagens comparativas que a gente tem em benefício da região e do mundo. Mas é uma oportunidade. A gente tem que ter infraestrutura, regulação. Nós já perdemos oportunidades no passado, então nada está garantido. Mas o que a gente tem que fazer é perceber o momento único, preparar o que precisa fazer, ter planos de sustentabilidade. Os Estados têm que está pensando nisso como estão mesmo.

O governador Tarcísio, ainda no governo federal, chegou a falar de green bonds. No governo estadual ele voltou a falar, e em parceria com o BID. Isso está sendo discutido com o governo federal também?

Não entramos em detalhes de empréstimos que ainda não estão prontos. Mas o que eu posso dizer é que temos discussões em vários aspectos sobre instrumentos financeiros. Temos trabalhado em outros países com inovações que tem funcionado.

Então, não vou te responder especificamente, mas em todas as minhas conversas bilaterais discutimos como podemos usar os instrumentos para captar mais, e a segunda parte da conversa é o que vai ser feito com o dinheiro. Porque precisa ter dinheiro, mas eu preciso do outro lado, eu preciso do projeto.

O Brasil tem feito um bom trabalho para passar credibilidade na agenda econômica, de responsabilidade fiscal, para atrair o investimento do BID, dos países doadores?

A sustentabilidade econômica está diretamente ligada à sustentabilidade ambiental e social. As coisas andam juntas. Então, se você olha um país seriamente comprometido com a sustentabilidade ambiental, o recurso vem. Se o dinheiro vem, facilita a questão fiscal também. A mesma coisa a questão social. Nunca se viu tanto interesse em Belém, empresas vindo, pequenas e médias empresas. Será que alguma coisa vai virar crescimento? Pode ser, porque o PIB de alguns Estados vem de pequenas e médias empresas mesmo.

Quando falamos: temos R$ 4,5 bilhões para a região, tem uma boa chance daquilo lá virar um crescimento econômico. É certo? Não. É uma oportunidade, temos que trabalhar. Mas a sustentabilidade econômica e a sustentabilidade ambiental andam juntas. Se você mostrar esforço nesse lado, vai entrar dinheiro.

Essa questão do Uruguai, por exemplo, pode entrar dinheiro se o país atingir a meta, que são recursos concessionais, não reembolsáveis. Isso dá para a gente fazer com os fundos. Então, se você tiver essa visão, você consegue mais recursos e esses recursos também incentivam mais a economia.

Em busca de mais financiamento para a preservação e ações sustentáveis na Amazônia, o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, defende ser possível “mudar o patamar” de dinheiro destinado à região. Para alcançar investidores, ele defende que se discuta a possibilidade de criar green bonds amazônicos, títulos verdes que seriam emitidos pelos países da região e vinculados a metas de preservação.

“Se mostrar credibilidade, dá para mudar o patamar com esses instrumentos financeiros. Um deles são bonds amazônicos, ligados a indicador regional”, afirma Goldfajn. Ele falou ao Estadão durante passagem pelo Brasil para participar da Cúpula da Amazônia, realizada em 8 e 9 de agosto.

O assunto, segundo ele, pode ser debatido em setembro em um encontro que deve reunir países doadores (como europeus e EUA) e países da região amazônica. A reunião ocorrerá em Santiago de Compostela, na Espanha.

Goldfajn diz haver um contexto político favorável à entrada de investimentos em projetos na reunião. Ele coloca o BID como o grande articulador de uma agenda concreta para desenvolvimento econômico e social aliado à preservação ambiental. Leia, a seguir, a entrevista.

O presidente do BID, Ilan Goldfajn 

Qual o papel do BID na discussão de projetos sustentáveis para a Amazônia? Estamos vendo discussão sobre doações de países ricos, investidores interessados. Como o BID entra nesse ecossistema?

O que o BID pode fazer é basicamente ser um instrumento de ações concretas. Esse é o momento no qual temos uma inflexão política, e isso leva a uma nova oportunidade. O BID já está na região há muito tempo. Temos conhecimento da região e temos projetos no chão e ações concretas que podemos fazer. De um lado, podemos trabalhar e coordenar vários e diferentes atores e, de outro lado, fazer com esses atores implementem claramente os objetivos.

O Amazônia Sempre é um projeto guarda-chuva (do BID). E por que guarda-chuva? Porque você tem iniciativas de determinados países, determinadas organizações, determinados fundos, cada um tem o seu projeto preferido. São instrumentos de fundo amazônico. A Colômbia tem o seu, são as suas iniciativas, as ONGs tem sua preferência, enfim, tem de tudo. Mas alguém tem que ser o implementador. Alguém tem que oferecer ações concretas.

O segundo aspecto é a nossa capacidade de agregar, de juntar. Temos um mandato para a região. O Brasil é um líder importante, o BNDES é um banco de peso com uma importância relevante, mas o BID que traz os 19 bancos conosco e ainda há uma coordenação de mídia regional. Então, essa capacidade de juntar e ter o mandato dos países, dos Estados e cidades, os bancos públicos e o outro lado estão conseguindo concretude, ações concretas e do outro lado, a capacidade de trazer tudo.

Qual o próximo movimento do BID para agregar, juntar esses atores, que pode resultar em novidades e financiamento na região?

Vamos reunir os ministros da Fazenda, do Planejamento, da região e do resto do mundo, os doadores, e sentar juntos em setembro, em Santiago de Compostela. E vamos falar como financiaremos os novos projetos e como criaremos uma rede na qual eles vão se falar para organizar os diferentes projetos.

Qual ambição o sr. tem para esse encontro na Espanha com países doadores?

Precisamos mudar o patamar de recursos para a região. Se mostrar credibilidade, dá para mudar o patamar com esses instrumentos financeiros. Um deles são bonds amazônicos, ligados a indicador regional. Dá para organizar isso. É preciso também ter escritórios de projetos na região e gerar redes de cooperação.

Por exemplo: trabalhamos um ano e pouco para desenhar uma emissão com o Uruguai. São os bonds sustentáveis ligados a indicadores. No caso do Uruguai, você tem dois indicadores: o indicador de desmatamento e o de emissão de carbono. Parece fácil falar isso, mas (é preciso definir) qual o indicador? Como é que você monitora? Então você tem que desenhar isso. Por que esses indicadores são importantes? Porque quando você emite um indicador bem concreto, isso dá uma reputação e uma percepção de que você está incentivando um investidor preocupado com ESG, mas está preocupado com o clima e que quer contribuir. Está o BID por trás dizendo: esse indicador é bom.

Os presidentes da Colômbia, Gustavo Petro, do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Bolívia, Luis Arce, durante a Cúpula da Amazônia Foto: Antonio Lacerda/Efe

Alguns ambientalistas disseram que a declaração que resultou da Cúpula da Amazônia poderia ter sido mais ambiciosa. Isso é um empecilho para sentar com esses doadores?

Não, porque nós vamos ajudar a definir os projetos, quais são indicadores que dá para ver, financiar a criação de indicadores. Temos nossas metas, metas do BID, porque a gente quer avançar. A gente tem esse lado, o que a gente traz de reputação.

Temos uma conjunção de fatores que nos leva a essa nova ambição. De um lado, a nova realidade política da região, onde você vê agora, em Belém (na Cúpula da Amazônia), o resultado dessa nova ambição, a nova realidade política. Existe uma percepção global da necessidade da urgência. Então, isso existe e está claro.

O quarto fator é que a gente está em um mandato, em uma energia nova, com a cabeça na região, uma nova energia de olhar o clima como prioridade, numa visão regional e com a cabeça de impacto de ações concretas. Vamos implementar.

Quando o sr. menciona a nova realidade política da região, está falando do Brasil e de onde mais?

Tem um novo governo aqui, tem um novo governo na Colômbia, tem os países da região, olhando essa questão, com uma nova energia.

Falando de uma forma geral, não só da região amazônica, há uma nova visão para América Latina, que já tem uma matriz energética mais limpa que o resto do mundo e há investimento em renováveis, em solar, eólica. E esses investimentos estão vindo com uma força enorme. Eu estive na Alemanha agora, com investidor privado, e as perguntas são bem específicas. Esses investimentos vão vir.

E o que o sr. respondeu?

Que eu vejo os governos comprometidos com os renováveis. Acho que isso aqui está dando retorno. Acho que os países perceberam que eles têm uma vantagem comparativa de algo que o mundo está precisando. Nós vamos exportar energia limpa. Exportar minerais, lítio, na Bolívia, Chile, Argentina.

A América Latina corre risco de não estar avançando na velocidade necessária para assumir esse papel de protagonismo na agenda de transição energética?

Nós temos uma oportunidade hoje, única, de aproveitar as vantagens comparativas que a gente tem em benefício da região e do mundo. Mas é uma oportunidade. A gente tem que ter infraestrutura, regulação. Nós já perdemos oportunidades no passado, então nada está garantido. Mas o que a gente tem que fazer é perceber o momento único, preparar o que precisa fazer, ter planos de sustentabilidade. Os Estados têm que está pensando nisso como estão mesmo.

O governador Tarcísio, ainda no governo federal, chegou a falar de green bonds. No governo estadual ele voltou a falar, e em parceria com o BID. Isso está sendo discutido com o governo federal também?

Não entramos em detalhes de empréstimos que ainda não estão prontos. Mas o que eu posso dizer é que temos discussões em vários aspectos sobre instrumentos financeiros. Temos trabalhado em outros países com inovações que tem funcionado.

Então, não vou te responder especificamente, mas em todas as minhas conversas bilaterais discutimos como podemos usar os instrumentos para captar mais, e a segunda parte da conversa é o que vai ser feito com o dinheiro. Porque precisa ter dinheiro, mas eu preciso do outro lado, eu preciso do projeto.

O Brasil tem feito um bom trabalho para passar credibilidade na agenda econômica, de responsabilidade fiscal, para atrair o investimento do BID, dos países doadores?

A sustentabilidade econômica está diretamente ligada à sustentabilidade ambiental e social. As coisas andam juntas. Então, se você olha um país seriamente comprometido com a sustentabilidade ambiental, o recurso vem. Se o dinheiro vem, facilita a questão fiscal também. A mesma coisa a questão social. Nunca se viu tanto interesse em Belém, empresas vindo, pequenas e médias empresas. Será que alguma coisa vai virar crescimento? Pode ser, porque o PIB de alguns Estados vem de pequenas e médias empresas mesmo.

Quando falamos: temos R$ 4,5 bilhões para a região, tem uma boa chance daquilo lá virar um crescimento econômico. É certo? Não. É uma oportunidade, temos que trabalhar. Mas a sustentabilidade econômica e a sustentabilidade ambiental andam juntas. Se você mostrar esforço nesse lado, vai entrar dinheiro.

Essa questão do Uruguai, por exemplo, pode entrar dinheiro se o país atingir a meta, que são recursos concessionais, não reembolsáveis. Isso dá para a gente fazer com os fundos. Então, se você tiver essa visão, você consegue mais recursos e esses recursos também incentivam mais a economia.

Entrevista por Beatriz Bulla

Repórter que cobre o poder -- economia, política e internacional. Trabalha hoje em São Paulo. Já passou por Brasília e foi correspondente em Washington (EUA). Formada em jornalismo e em direito, foi também pesquisadora visitante na Universidade Columbia, em Nova York.

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