‘O risco é cruzar o ponto de não retorno na violência e afugentar investidores’, diz Maria Silvia


Executiva diz que sociedade precisa cobrar das autoridades um plano de longo prazo para combater a violência e a expansão do crime organizado; a falta de segurança, diz ela, afeta a qualidade de vida e o crescimento econômico

Por Carlos Eduardo Valim
Atualização:
Foto: Wilton Junior/ESTADÃO
Entrevista comMaria Silvia Bastos MarquesEx-presidente da CSN e BNDES

A executiva fluminense Maria Silvia Bastos Marques é uma pioneira na participação feminina no comando de grandes empresas e instituições do Brasil, desde a década de 1990. Com passagens pelo comando da Companhia Siderúrgica Nacional, BNDES e Goldman Sachs, além da secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro, ela se acostumou a liderar grandes equipes, negócios de grande impacto econômico e lidar com cenários complexos.

Nos últimos meses, a dedicação da executiva de 67 anos se moveu para um assunto diverso, mas com muitas implicações econômicas. Ela se dedicou a ler os textos clássicos do estudo de violência e a buscar formas de manter o tema em discussão, como forma de mobilizar a sociedade civil a pressionar as autoridades para enfrentar a questão.

continua após a publicidade

Ao lado da economista Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada e Segurança da FGV, ela tem estudado como a governança deve ser estruturada para enfrentar a violência. O objetivo é mobilizar a sociedade civil para trocar ideias, mantendo esse assunto em voga, e convencer os governos a perceberem a necessidade urgente da estruturação de um plano nacional baseado em evidências científicas, e de longo prazo, para diminuir a violência relacionada ao crime organizado.

O risco de não se fazer isso, segundo ela, serão perdas econômicas cada vez maiores, além de uma deterioração na qualidade de vida, e a aproximação de um ponto de não retorno, que afetaria decisivamente o futuro do País. Leia a entrevista concedida ao Estadão.

Maria Silvia diz que Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade Foto: MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO
continua após a publicidade

A violência se traduz em perdas econômicas?

O crime organizado existe no mundo inteiro. Mas não a violência atrelada ao crime organizado, e não necessariamente também à ocupação de territórios. O crime organizado, em facções e milícias, tem reverberado no Brasil não só nas periferias dos grandes centros urbanos. Mas agora também na Amazônia. Isso tem impacto não só para a qualidade de vida, que é um indicador importante para investimentos, como também sobre o crescimento econômico. Segundo um estudo recente do Fundo Monetário Internacional, se a criminalidade na América Latina caísse dos cerca de 33 mortos de forma violenta e intencional dentre 100 mil habitantes para o nível da média mundial, de em torno 10 mortos por 100 mil habitantes, o crescimento econômico aumentaria na região meio ponto porcentual, o que é realmente muita coisa.

Como se dá esse impacto?

continua após a publicidade

Como todo mundo que estuda economia sabe, investimentos dependem muito de percepção, o que nem sempre corresponde aos fatos. Não é só a realidade que pauta a percepção. Em economia, o comportamento dos agentes econômicos é pautado pela percepção. Então, um sentimento de violência afasta investimentos. E tudo aquilo que afeta o direito de ir e vir do cidadão, que afeta a educação, quando as pessoas não conseguem ir à escola estudar, isso afeta a qualidade da mão de obra, e o custo das empresas. Elas vão ter de proteger os seus funcionários, arcar com custos jurídicos, e outros não atrelados a suas atividades operacionais. De diversas formas, a violência que afeta a qualidade de vida e a ocupação de territórios por parte do crime organizado, compromete os investimentos e o crescimento econômico.

Esses efeitos diversos dificultam a elevação da produtividade?

Ao comprometer a boa alocação de recursos e trazer custos mais elevados, isso acaba reduzindo a produtividade. Nos últimos anos, exceto na agricultura, a taxa de crescimento da produtividade do Brasil é zero ou negativa. Então, aumentar a produtividade é fator determinante para o crescimento sustentável do País.

continua após a publicidade

E qual o impacto especial que tem o aumento da violência na Amazônia, apesar de esse território representar uma pequena população do País?

Sabemos que a Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade. Quando se vê a situação da Amazônia, o impacto internacional é muito preocupante para a atração de investimentos ao nosso País. Hoje temos evidências muito concretas da gravidade da situação e como isso está impactando a atividade econômica no País.

continua após a publicidade

A sociedade civil, empresários e empresas, precisam se engajar nisso?

Como parte da sociedade civil, vejo que nunca tivemos um plano de longo prazo de enfrentamento da violência e da expansão do crime organizado. Precisamos de um plano que tenha metas e métricas, e com reavaliação constante. Temos sido muito reativos às crises. Mas não no sentido de propormos um plano que integre as ações, com governos federais, Estaduais e municipais, e coordenado pela União. Como consequência disso, assistimos hoje a um crime que rompeu as fronteiras dos Estados e do próprio País.

Se não fizermos isso, corremos risco de infiltração do crime organizado no poder público?

continua após a publicidade

A gente assistiu isso acontecer em outros países. Corremos esse risco, se é que já não estamos lá, como foi dito pelo ministro (Ricardo Lewandowski, durante a cerimônia de posse como ministro da Justiça e Segurança Pública). Não podemos chegar ao ponto de não retorno. É importante prestarmos muita atenção a isso. Esse ponto chega quando menos se está esperando. Existe um ponto de virada, que se ultrapassado, a partir daí, ninguém acredita mais no País, ninguém investe mais, e as famílias começam a tirar os recursos do país. A Venezuela e a Argentina são bons exemplos das consequências disso, mas causada por outras razões. Na atividade econômica, quando se chega a um momento de não retorno, é muito grave. Nós temos uma economia muito sólida. Empresas muito comprometidas com o nosso País. Mas temos de nos mobilizar.

A executiva fluminense Maria Silvia Bastos Marques é uma pioneira na participação feminina no comando de grandes empresas e instituições do Brasil, desde a década de 1990. Com passagens pelo comando da Companhia Siderúrgica Nacional, BNDES e Goldman Sachs, além da secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro, ela se acostumou a liderar grandes equipes, negócios de grande impacto econômico e lidar com cenários complexos.

Nos últimos meses, a dedicação da executiva de 67 anos se moveu para um assunto diverso, mas com muitas implicações econômicas. Ela se dedicou a ler os textos clássicos do estudo de violência e a buscar formas de manter o tema em discussão, como forma de mobilizar a sociedade civil a pressionar as autoridades para enfrentar a questão.

Ao lado da economista Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada e Segurança da FGV, ela tem estudado como a governança deve ser estruturada para enfrentar a violência. O objetivo é mobilizar a sociedade civil para trocar ideias, mantendo esse assunto em voga, e convencer os governos a perceberem a necessidade urgente da estruturação de um plano nacional baseado em evidências científicas, e de longo prazo, para diminuir a violência relacionada ao crime organizado.

O risco de não se fazer isso, segundo ela, serão perdas econômicas cada vez maiores, além de uma deterioração na qualidade de vida, e a aproximação de um ponto de não retorno, que afetaria decisivamente o futuro do País. Leia a entrevista concedida ao Estadão.

Maria Silvia diz que Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade Foto: MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO

A violência se traduz em perdas econômicas?

O crime organizado existe no mundo inteiro. Mas não a violência atrelada ao crime organizado, e não necessariamente também à ocupação de territórios. O crime organizado, em facções e milícias, tem reverberado no Brasil não só nas periferias dos grandes centros urbanos. Mas agora também na Amazônia. Isso tem impacto não só para a qualidade de vida, que é um indicador importante para investimentos, como também sobre o crescimento econômico. Segundo um estudo recente do Fundo Monetário Internacional, se a criminalidade na América Latina caísse dos cerca de 33 mortos de forma violenta e intencional dentre 100 mil habitantes para o nível da média mundial, de em torno 10 mortos por 100 mil habitantes, o crescimento econômico aumentaria na região meio ponto porcentual, o que é realmente muita coisa.

Como se dá esse impacto?

Como todo mundo que estuda economia sabe, investimentos dependem muito de percepção, o que nem sempre corresponde aos fatos. Não é só a realidade que pauta a percepção. Em economia, o comportamento dos agentes econômicos é pautado pela percepção. Então, um sentimento de violência afasta investimentos. E tudo aquilo que afeta o direito de ir e vir do cidadão, que afeta a educação, quando as pessoas não conseguem ir à escola estudar, isso afeta a qualidade da mão de obra, e o custo das empresas. Elas vão ter de proteger os seus funcionários, arcar com custos jurídicos, e outros não atrelados a suas atividades operacionais. De diversas formas, a violência que afeta a qualidade de vida e a ocupação de territórios por parte do crime organizado, compromete os investimentos e o crescimento econômico.

Esses efeitos diversos dificultam a elevação da produtividade?

Ao comprometer a boa alocação de recursos e trazer custos mais elevados, isso acaba reduzindo a produtividade. Nos últimos anos, exceto na agricultura, a taxa de crescimento da produtividade do Brasil é zero ou negativa. Então, aumentar a produtividade é fator determinante para o crescimento sustentável do País.

E qual o impacto especial que tem o aumento da violência na Amazônia, apesar de esse território representar uma pequena população do País?

Sabemos que a Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade. Quando se vê a situação da Amazônia, o impacto internacional é muito preocupante para a atração de investimentos ao nosso País. Hoje temos evidências muito concretas da gravidade da situação e como isso está impactando a atividade econômica no País.

A sociedade civil, empresários e empresas, precisam se engajar nisso?

Como parte da sociedade civil, vejo que nunca tivemos um plano de longo prazo de enfrentamento da violência e da expansão do crime organizado. Precisamos de um plano que tenha metas e métricas, e com reavaliação constante. Temos sido muito reativos às crises. Mas não no sentido de propormos um plano que integre as ações, com governos federais, Estaduais e municipais, e coordenado pela União. Como consequência disso, assistimos hoje a um crime que rompeu as fronteiras dos Estados e do próprio País.

Se não fizermos isso, corremos risco de infiltração do crime organizado no poder público?

A gente assistiu isso acontecer em outros países. Corremos esse risco, se é que já não estamos lá, como foi dito pelo ministro (Ricardo Lewandowski, durante a cerimônia de posse como ministro da Justiça e Segurança Pública). Não podemos chegar ao ponto de não retorno. É importante prestarmos muita atenção a isso. Esse ponto chega quando menos se está esperando. Existe um ponto de virada, que se ultrapassado, a partir daí, ninguém acredita mais no País, ninguém investe mais, e as famílias começam a tirar os recursos do país. A Venezuela e a Argentina são bons exemplos das consequências disso, mas causada por outras razões. Na atividade econômica, quando se chega a um momento de não retorno, é muito grave. Nós temos uma economia muito sólida. Empresas muito comprometidas com o nosso País. Mas temos de nos mobilizar.

A executiva fluminense Maria Silvia Bastos Marques é uma pioneira na participação feminina no comando de grandes empresas e instituições do Brasil, desde a década de 1990. Com passagens pelo comando da Companhia Siderúrgica Nacional, BNDES e Goldman Sachs, além da secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro, ela se acostumou a liderar grandes equipes, negócios de grande impacto econômico e lidar com cenários complexos.

Nos últimos meses, a dedicação da executiva de 67 anos se moveu para um assunto diverso, mas com muitas implicações econômicas. Ela se dedicou a ler os textos clássicos do estudo de violência e a buscar formas de manter o tema em discussão, como forma de mobilizar a sociedade civil a pressionar as autoridades para enfrentar a questão.

Ao lado da economista Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada e Segurança da FGV, ela tem estudado como a governança deve ser estruturada para enfrentar a violência. O objetivo é mobilizar a sociedade civil para trocar ideias, mantendo esse assunto em voga, e convencer os governos a perceberem a necessidade urgente da estruturação de um plano nacional baseado em evidências científicas, e de longo prazo, para diminuir a violência relacionada ao crime organizado.

O risco de não se fazer isso, segundo ela, serão perdas econômicas cada vez maiores, além de uma deterioração na qualidade de vida, e a aproximação de um ponto de não retorno, que afetaria decisivamente o futuro do País. Leia a entrevista concedida ao Estadão.

Maria Silvia diz que Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade Foto: MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO

A violência se traduz em perdas econômicas?

O crime organizado existe no mundo inteiro. Mas não a violência atrelada ao crime organizado, e não necessariamente também à ocupação de territórios. O crime organizado, em facções e milícias, tem reverberado no Brasil não só nas periferias dos grandes centros urbanos. Mas agora também na Amazônia. Isso tem impacto não só para a qualidade de vida, que é um indicador importante para investimentos, como também sobre o crescimento econômico. Segundo um estudo recente do Fundo Monetário Internacional, se a criminalidade na América Latina caísse dos cerca de 33 mortos de forma violenta e intencional dentre 100 mil habitantes para o nível da média mundial, de em torno 10 mortos por 100 mil habitantes, o crescimento econômico aumentaria na região meio ponto porcentual, o que é realmente muita coisa.

Como se dá esse impacto?

Como todo mundo que estuda economia sabe, investimentos dependem muito de percepção, o que nem sempre corresponde aos fatos. Não é só a realidade que pauta a percepção. Em economia, o comportamento dos agentes econômicos é pautado pela percepção. Então, um sentimento de violência afasta investimentos. E tudo aquilo que afeta o direito de ir e vir do cidadão, que afeta a educação, quando as pessoas não conseguem ir à escola estudar, isso afeta a qualidade da mão de obra, e o custo das empresas. Elas vão ter de proteger os seus funcionários, arcar com custos jurídicos, e outros não atrelados a suas atividades operacionais. De diversas formas, a violência que afeta a qualidade de vida e a ocupação de territórios por parte do crime organizado, compromete os investimentos e o crescimento econômico.

Esses efeitos diversos dificultam a elevação da produtividade?

Ao comprometer a boa alocação de recursos e trazer custos mais elevados, isso acaba reduzindo a produtividade. Nos últimos anos, exceto na agricultura, a taxa de crescimento da produtividade do Brasil é zero ou negativa. Então, aumentar a produtividade é fator determinante para o crescimento sustentável do País.

E qual o impacto especial que tem o aumento da violência na Amazônia, apesar de esse território representar uma pequena população do País?

Sabemos que a Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade. Quando se vê a situação da Amazônia, o impacto internacional é muito preocupante para a atração de investimentos ao nosso País. Hoje temos evidências muito concretas da gravidade da situação e como isso está impactando a atividade econômica no País.

A sociedade civil, empresários e empresas, precisam se engajar nisso?

Como parte da sociedade civil, vejo que nunca tivemos um plano de longo prazo de enfrentamento da violência e da expansão do crime organizado. Precisamos de um plano que tenha metas e métricas, e com reavaliação constante. Temos sido muito reativos às crises. Mas não no sentido de propormos um plano que integre as ações, com governos federais, Estaduais e municipais, e coordenado pela União. Como consequência disso, assistimos hoje a um crime que rompeu as fronteiras dos Estados e do próprio País.

Se não fizermos isso, corremos risco de infiltração do crime organizado no poder público?

A gente assistiu isso acontecer em outros países. Corremos esse risco, se é que já não estamos lá, como foi dito pelo ministro (Ricardo Lewandowski, durante a cerimônia de posse como ministro da Justiça e Segurança Pública). Não podemos chegar ao ponto de não retorno. É importante prestarmos muita atenção a isso. Esse ponto chega quando menos se está esperando. Existe um ponto de virada, que se ultrapassado, a partir daí, ninguém acredita mais no País, ninguém investe mais, e as famílias começam a tirar os recursos do país. A Venezuela e a Argentina são bons exemplos das consequências disso, mas causada por outras razões. Na atividade econômica, quando se chega a um momento de não retorno, é muito grave. Nós temos uma economia muito sólida. Empresas muito comprometidas com o nosso País. Mas temos de nos mobilizar.

A executiva fluminense Maria Silvia Bastos Marques é uma pioneira na participação feminina no comando de grandes empresas e instituições do Brasil, desde a década de 1990. Com passagens pelo comando da Companhia Siderúrgica Nacional, BNDES e Goldman Sachs, além da secretária de Fazenda da cidade do Rio de Janeiro, ela se acostumou a liderar grandes equipes, negócios de grande impacto econômico e lidar com cenários complexos.

Nos últimos meses, a dedicação da executiva de 67 anos se moveu para um assunto diverso, mas com muitas implicações econômicas. Ela se dedicou a ler os textos clássicos do estudo de violência e a buscar formas de manter o tema em discussão, como forma de mobilizar a sociedade civil a pressionar as autoridades para enfrentar a questão.

Ao lado da economista Joana Monteiro, coordenadora do Centro de Ciência Aplicada e Segurança da FGV, ela tem estudado como a governança deve ser estruturada para enfrentar a violência. O objetivo é mobilizar a sociedade civil para trocar ideias, mantendo esse assunto em voga, e convencer os governos a perceberem a necessidade urgente da estruturação de um plano nacional baseado em evidências científicas, e de longo prazo, para diminuir a violência relacionada ao crime organizado.

O risco de não se fazer isso, segundo ela, serão perdas econômicas cada vez maiores, além de uma deterioração na qualidade de vida, e a aproximação de um ponto de não retorno, que afetaria decisivamente o futuro do País. Leia a entrevista concedida ao Estadão.

Maria Silvia diz que Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade Foto: MARCOS ARCOVERDE/ESTADÃO

A violência se traduz em perdas econômicas?

O crime organizado existe no mundo inteiro. Mas não a violência atrelada ao crime organizado, e não necessariamente também à ocupação de territórios. O crime organizado, em facções e milícias, tem reverberado no Brasil não só nas periferias dos grandes centros urbanos. Mas agora também na Amazônia. Isso tem impacto não só para a qualidade de vida, que é um indicador importante para investimentos, como também sobre o crescimento econômico. Segundo um estudo recente do Fundo Monetário Internacional, se a criminalidade na América Latina caísse dos cerca de 33 mortos de forma violenta e intencional dentre 100 mil habitantes para o nível da média mundial, de em torno 10 mortos por 100 mil habitantes, o crescimento econômico aumentaria na região meio ponto porcentual, o que é realmente muita coisa.

Como se dá esse impacto?

Como todo mundo que estuda economia sabe, investimentos dependem muito de percepção, o que nem sempre corresponde aos fatos. Não é só a realidade que pauta a percepção. Em economia, o comportamento dos agentes econômicos é pautado pela percepção. Então, um sentimento de violência afasta investimentos. E tudo aquilo que afeta o direito de ir e vir do cidadão, que afeta a educação, quando as pessoas não conseguem ir à escola estudar, isso afeta a qualidade da mão de obra, e o custo das empresas. Elas vão ter de proteger os seus funcionários, arcar com custos jurídicos, e outros não atrelados a suas atividades operacionais. De diversas formas, a violência que afeta a qualidade de vida e a ocupação de territórios por parte do crime organizado, compromete os investimentos e o crescimento econômico.

Esses efeitos diversos dificultam a elevação da produtividade?

Ao comprometer a boa alocação de recursos e trazer custos mais elevados, isso acaba reduzindo a produtividade. Nos últimos anos, exceto na agricultura, a taxa de crescimento da produtividade do Brasil é zero ou negativa. Então, aumentar a produtividade é fator determinante para o crescimento sustentável do País.

E qual o impacto especial que tem o aumento da violência na Amazônia, apesar de esse território representar uma pequena população do País?

Sabemos que a Amazônia é um fator importante para a transição energética, para abrir a economia, e para a atração de investimentos relacionados à sustentabilidade. Quando se vê a situação da Amazônia, o impacto internacional é muito preocupante para a atração de investimentos ao nosso País. Hoje temos evidências muito concretas da gravidade da situação e como isso está impactando a atividade econômica no País.

A sociedade civil, empresários e empresas, precisam se engajar nisso?

Como parte da sociedade civil, vejo que nunca tivemos um plano de longo prazo de enfrentamento da violência e da expansão do crime organizado. Precisamos de um plano que tenha metas e métricas, e com reavaliação constante. Temos sido muito reativos às crises. Mas não no sentido de propormos um plano que integre as ações, com governos federais, Estaduais e municipais, e coordenado pela União. Como consequência disso, assistimos hoje a um crime que rompeu as fronteiras dos Estados e do próprio País.

Se não fizermos isso, corremos risco de infiltração do crime organizado no poder público?

A gente assistiu isso acontecer em outros países. Corremos esse risco, se é que já não estamos lá, como foi dito pelo ministro (Ricardo Lewandowski, durante a cerimônia de posse como ministro da Justiça e Segurança Pública). Não podemos chegar ao ponto de não retorno. É importante prestarmos muita atenção a isso. Esse ponto chega quando menos se está esperando. Existe um ponto de virada, que se ultrapassado, a partir daí, ninguém acredita mais no País, ninguém investe mais, e as famílias começam a tirar os recursos do país. A Venezuela e a Argentina são bons exemplos das consequências disso, mas causada por outras razões. Na atividade econômica, quando se chega a um momento de não retorno, é muito grave. Nós temos uma economia muito sólida. Empresas muito comprometidas com o nosso País. Mas temos de nos mobilizar.

Entrevista por Carlos Eduardo Valim

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.