Fim da escala 6x1 não é o problema, mas sim a redução da jornada com mesmo salário, diz Pedro Nery


Economista entende que limitar dias trabalhados não traz tantos riscos para a economia, mas sim a redução de 44 para 36 horas de trabalho semanais sem perda salarial, o que pode aumentar custo da folha para as empresas em 15%

Por Alvaro Gribel
Atualização:
Foto: Cicero Bezerra
Entrevista comPedro NeryEconomista, professor do Instituto Brasileiro de Ensino e Desenvolvimento e Pesquisa (IDP)

BRASÍLIA – O economista Pedro Fernando Nery, professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e autor do livro “Extremos: Um mapa para entender as desigualdades no Brasil”, avalia que o fim da jornada de trabalho 6x1, proposto pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP), não apresenta tantos riscos. Essa limitação, diz, teria pouco impacto sobre a economia, que rapidamente poderia se adaptar a esta nova realidade.

O grande ponto, afirma Nery, é que a deputada sugere a redução da jornada de 44 horas para 36 horas com a manutenção da mesmo salário para os trabalhadores. Isso significaria, segundo ele, um aumento em torno de 15% da hora trabalhada – o que, na prática, aumentaria o custo para as empresas, podendo levar à interrupção de novas contratações, aumento da inflação de serviços e até mesmo a diminuição da força de trabalho.

Nery avalia o debate como positivo, ao lembrar que a Constituição de 1988 já reduziu a jornada de 48 horas semanais para 44 horas, mas pondera que qualquer mudança precisa acontecer de forma gradual. Em entrevista ao Estadão, ele explica como o mercado de trabalho funciona hoje e quais as implicações do projeto que deve começar a tramitar no Congresso, depois de ser impulsionado pelas redes sociais.

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Qual a sua avaliação sobre a PEC apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP)?

O fim da pandemia difundiu o teletrabalho. É natural que trabalhadores que só podem trabalhar presencialmente busquem condições melhores. Além do mais, o mercado de trabalho está forte, o desemprego está mais distante. Momentos assim são mais propícios para este tipo de discussão.

O que diz a lei hoje sobre a jornada de trabalho? Qual o grau de flexibilidade?

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A jornada máxima, desde 1988, é de 44 horas. Antes, eram 48. Mas categorias podem ter jornadas menores, seja por lei ou por negociação com o sindicato respectivo. A regra da lei são as 44 horas. Muitos setores distribuem em apenas cinco dias, mas alguns preferem distribuir em seis dias, porque precisam de operação contínua, como o comércio.

E o que determina o projeto da deputada?

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A PEC não é para ter uma jornada máxima em cinco dias, com o fim da escala 6 por 1. É, na verdade, bem mais ampla: para que todos os trabalhadores tenham redução da jornada semanal em oito horas, de 44 para 36 horas, em no máximo quatro dias. É a chamada semana de quatro dias, na verdade. Desde os anos 90, o Brasil já teve muitas outras propostas semelhantes, embora normalmente o foco seja na redução para 40 horas, como já costuma ser para servidores públicos. Campanhas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foram nesse sentido. Antigamente, era principalmente uma pauta para reduzir o desemprego, porque se entendia que existe uma produção fixa em cada empresa – e, com jornadas menores, as empresas se veriam obrigadas a contratar mais. Inclusive, eram propostas que proibiam hora extra, porque tinha essa ideia de que talvez existisse lucro sobrando e o efeito de reduzir a jornada seria desemprego menor.

O que muda agora?

O que é novo agora é que a campanha vem motivada não pela redução do desemprego, mas com foco mesmo na qualidade de vida do trabalhador. E, claro, são campanhas que não vêm mais de grupos organizados, mas das redes sociais – e com forte apelo.

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O que mais há em tramitação no Congresso sobre esse tema?

A oposição apresenta uma PEC alternativa para que o trabalhador possa ser contratado por hora, tentando contemplar essa demanda das redes, por mais tempo livre, sem criar riscos para o emprego formal. Seria algo como a constitucionalização do horista, o trabalhador intermitente da reforma trabalhista. Mas não está claro como ficariam os atuais contratos de 44 horas, se seriam migrados para esse novo modelo, um modelo inspirado nos Estados Unidos.

Existem países que já seguiram essa proposta da deputada Erika Hilton? Quais foram os resultados?

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Reduções da jornada acontecem em várias categorias e em vários países. O Brasil mesmo fez uma em 1988. A evidência é que não muda muito em relação ao nível de emprego. Talvez porque alguns setores se beneficiem, já que, com a redução da jornada, o trabalhador pode ter mais tempo para atividades diversas, como academia, cinema etc.

O Brasil já tem um porcentual grande de trabalhadores na informalidade. Essa medida poderia piorar esse quadro?

Depende de qual vai ser a medida discutida. Se for o fim da jornada 6 por 1, não tem tanto risco. Há algum custo operacional, mas o salário por hora não tende a mudar. O total de horas é o mesmo – impacto bem menor. O grande aumento de custo é com a redução de 44 para 36 horas, que é sem perda salarial. Ou seja, o salário não poderia mudar, mas as horas diminuiriam. O trabalhador receberia mais por cada hora de trabalho, e os empregadores pagariam mais. Com esse aumento de custo, podem evitar novas contratações, promover demissões, migrar a folha para a informalidade. Seria prudente pensar em uma transição gradual, aos poucos.

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Uma mudança abrupta de 44 para 36 horas por semana pode até inviabilizar pequenos negócios

Quais seriam os ganhos para a economia com a redução da jornada? Gastos com entretenimento, por exemplo?

Acho que ganha mais a economia do cuidado, os pais que ganham mais tempo para ficar com os filhos, a parte da economia que não é contabilizada no PIB. Mas uma parcela das pessoas pretende usar uma redução para estudar ou para fazer bicos também, segundo pesquisas.

Quais seriam as potenciais perdas?

A principal perda potencial da redução da jornada, principalmente se for ampla, é a redução do nível de ocupação. Uma mudança abrupta de 44 para 36 horas por semana pode até inviabilizar pequenos negócios, por exemplo.

Que setores poderiam se beneficiar e que setores seriam mais afetados?

Setores típicos do fim de semana poderiam se beneficiar, mas paradoxalmente também são alguns dos setores que usam mais a jornada 6 por 1, como shoppings. Já para outros, como saúde e indústria, só parece haver perda em um primeiro momento.

O desemprego está baixo, e há setores reclamando de falta de mão de obra. Isso pode pressionar a inflação de serviços, por exemplo?

Pode. Rigorosamente, o que a PEC faz é promover um aumento salarial de cerca de 15% na hora trabalhada. Se empregadores quiserem fechar a escala com horas extras, o trabalhador vai ganhar mais e pode ser que os preços se elevem. Mas é especulação neste momento em que sequer sabemos qual é o efetivo objetivo do movimento.

A medida pode afetar o caixa do governo, com menor arrecadação de contribuições sobre a folha de pagamentos?

Sempre que o nível de ocupação diminui, o governo perde arrecadação, até porque, no Brasil, a tributação sobre o emprego é muito alta. A contribuição dos empregadores sobre a folha salarial é o principal tributo da União, mais importante que o próprio Imposto de Renda. Não parece plausível, porém, que uma redução repentina de 44 para 36 horas prospere. De toda forma, já há alguma pressão pública para que o eventual fim da escala 6 por 1 traga compensações para os empregadores com desoneração da folha.

BRASÍLIA – O economista Pedro Fernando Nery, professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e autor do livro “Extremos: Um mapa para entender as desigualdades no Brasil”, avalia que o fim da jornada de trabalho 6x1, proposto pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP), não apresenta tantos riscos. Essa limitação, diz, teria pouco impacto sobre a economia, que rapidamente poderia se adaptar a esta nova realidade.

O grande ponto, afirma Nery, é que a deputada sugere a redução da jornada de 44 horas para 36 horas com a manutenção da mesmo salário para os trabalhadores. Isso significaria, segundo ele, um aumento em torno de 15% da hora trabalhada – o que, na prática, aumentaria o custo para as empresas, podendo levar à interrupção de novas contratações, aumento da inflação de serviços e até mesmo a diminuição da força de trabalho.

Nery avalia o debate como positivo, ao lembrar que a Constituição de 1988 já reduziu a jornada de 48 horas semanais para 44 horas, mas pondera que qualquer mudança precisa acontecer de forma gradual. Em entrevista ao Estadão, ele explica como o mercado de trabalho funciona hoje e quais as implicações do projeto que deve começar a tramitar no Congresso, depois de ser impulsionado pelas redes sociais.

Qual a sua avaliação sobre a PEC apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP)?

O fim da pandemia difundiu o teletrabalho. É natural que trabalhadores que só podem trabalhar presencialmente busquem condições melhores. Além do mais, o mercado de trabalho está forte, o desemprego está mais distante. Momentos assim são mais propícios para este tipo de discussão.

O que diz a lei hoje sobre a jornada de trabalho? Qual o grau de flexibilidade?

A jornada máxima, desde 1988, é de 44 horas. Antes, eram 48. Mas categorias podem ter jornadas menores, seja por lei ou por negociação com o sindicato respectivo. A regra da lei são as 44 horas. Muitos setores distribuem em apenas cinco dias, mas alguns preferem distribuir em seis dias, porque precisam de operação contínua, como o comércio.

E o que determina o projeto da deputada?

A PEC não é para ter uma jornada máxima em cinco dias, com o fim da escala 6 por 1. É, na verdade, bem mais ampla: para que todos os trabalhadores tenham redução da jornada semanal em oito horas, de 44 para 36 horas, em no máximo quatro dias. É a chamada semana de quatro dias, na verdade. Desde os anos 90, o Brasil já teve muitas outras propostas semelhantes, embora normalmente o foco seja na redução para 40 horas, como já costuma ser para servidores públicos. Campanhas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foram nesse sentido. Antigamente, era principalmente uma pauta para reduzir o desemprego, porque se entendia que existe uma produção fixa em cada empresa – e, com jornadas menores, as empresas se veriam obrigadas a contratar mais. Inclusive, eram propostas que proibiam hora extra, porque tinha essa ideia de que talvez existisse lucro sobrando e o efeito de reduzir a jornada seria desemprego menor.

O que muda agora?

O que é novo agora é que a campanha vem motivada não pela redução do desemprego, mas com foco mesmo na qualidade de vida do trabalhador. E, claro, são campanhas que não vêm mais de grupos organizados, mas das redes sociais – e com forte apelo.

O que mais há em tramitação no Congresso sobre esse tema?

A oposição apresenta uma PEC alternativa para que o trabalhador possa ser contratado por hora, tentando contemplar essa demanda das redes, por mais tempo livre, sem criar riscos para o emprego formal. Seria algo como a constitucionalização do horista, o trabalhador intermitente da reforma trabalhista. Mas não está claro como ficariam os atuais contratos de 44 horas, se seriam migrados para esse novo modelo, um modelo inspirado nos Estados Unidos.

Existem países que já seguiram essa proposta da deputada Erika Hilton? Quais foram os resultados?

Reduções da jornada acontecem em várias categorias e em vários países. O Brasil mesmo fez uma em 1988. A evidência é que não muda muito em relação ao nível de emprego. Talvez porque alguns setores se beneficiem, já que, com a redução da jornada, o trabalhador pode ter mais tempo para atividades diversas, como academia, cinema etc.

O Brasil já tem um porcentual grande de trabalhadores na informalidade. Essa medida poderia piorar esse quadro?

Depende de qual vai ser a medida discutida. Se for o fim da jornada 6 por 1, não tem tanto risco. Há algum custo operacional, mas o salário por hora não tende a mudar. O total de horas é o mesmo – impacto bem menor. O grande aumento de custo é com a redução de 44 para 36 horas, que é sem perda salarial. Ou seja, o salário não poderia mudar, mas as horas diminuiriam. O trabalhador receberia mais por cada hora de trabalho, e os empregadores pagariam mais. Com esse aumento de custo, podem evitar novas contratações, promover demissões, migrar a folha para a informalidade. Seria prudente pensar em uma transição gradual, aos poucos.

Uma mudança abrupta de 44 para 36 horas por semana pode até inviabilizar pequenos negócios

Quais seriam os ganhos para a economia com a redução da jornada? Gastos com entretenimento, por exemplo?

Acho que ganha mais a economia do cuidado, os pais que ganham mais tempo para ficar com os filhos, a parte da economia que não é contabilizada no PIB. Mas uma parcela das pessoas pretende usar uma redução para estudar ou para fazer bicos também, segundo pesquisas.

Quais seriam as potenciais perdas?

A principal perda potencial da redução da jornada, principalmente se for ampla, é a redução do nível de ocupação. Uma mudança abrupta de 44 para 36 horas por semana pode até inviabilizar pequenos negócios, por exemplo.

Que setores poderiam se beneficiar e que setores seriam mais afetados?

Setores típicos do fim de semana poderiam se beneficiar, mas paradoxalmente também são alguns dos setores que usam mais a jornada 6 por 1, como shoppings. Já para outros, como saúde e indústria, só parece haver perda em um primeiro momento.

O desemprego está baixo, e há setores reclamando de falta de mão de obra. Isso pode pressionar a inflação de serviços, por exemplo?

Pode. Rigorosamente, o que a PEC faz é promover um aumento salarial de cerca de 15% na hora trabalhada. Se empregadores quiserem fechar a escala com horas extras, o trabalhador vai ganhar mais e pode ser que os preços se elevem. Mas é especulação neste momento em que sequer sabemos qual é o efetivo objetivo do movimento.

A medida pode afetar o caixa do governo, com menor arrecadação de contribuições sobre a folha de pagamentos?

Sempre que o nível de ocupação diminui, o governo perde arrecadação, até porque, no Brasil, a tributação sobre o emprego é muito alta. A contribuição dos empregadores sobre a folha salarial é o principal tributo da União, mais importante que o próprio Imposto de Renda. Não parece plausível, porém, que uma redução repentina de 44 para 36 horas prospere. De toda forma, já há alguma pressão pública para que o eventual fim da escala 6 por 1 traga compensações para os empregadores com desoneração da folha.

BRASÍLIA – O economista Pedro Fernando Nery, professor do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e autor do livro “Extremos: Um mapa para entender as desigualdades no Brasil”, avalia que o fim da jornada de trabalho 6x1, proposto pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP), não apresenta tantos riscos. Essa limitação, diz, teria pouco impacto sobre a economia, que rapidamente poderia se adaptar a esta nova realidade.

O grande ponto, afirma Nery, é que a deputada sugere a redução da jornada de 44 horas para 36 horas com a manutenção da mesmo salário para os trabalhadores. Isso significaria, segundo ele, um aumento em torno de 15% da hora trabalhada – o que, na prática, aumentaria o custo para as empresas, podendo levar à interrupção de novas contratações, aumento da inflação de serviços e até mesmo a diminuição da força de trabalho.

Nery avalia o debate como positivo, ao lembrar que a Constituição de 1988 já reduziu a jornada de 48 horas semanais para 44 horas, mas pondera que qualquer mudança precisa acontecer de forma gradual. Em entrevista ao Estadão, ele explica como o mercado de trabalho funciona hoje e quais as implicações do projeto que deve começar a tramitar no Congresso, depois de ser impulsionado pelas redes sociais.

Qual a sua avaliação sobre a PEC apresentada pela deputada Erika Hilton (PSOL-SP)?

O fim da pandemia difundiu o teletrabalho. É natural que trabalhadores que só podem trabalhar presencialmente busquem condições melhores. Além do mais, o mercado de trabalho está forte, o desemprego está mais distante. Momentos assim são mais propícios para este tipo de discussão.

O que diz a lei hoje sobre a jornada de trabalho? Qual o grau de flexibilidade?

A jornada máxima, desde 1988, é de 44 horas. Antes, eram 48. Mas categorias podem ter jornadas menores, seja por lei ou por negociação com o sindicato respectivo. A regra da lei são as 44 horas. Muitos setores distribuem em apenas cinco dias, mas alguns preferem distribuir em seis dias, porque precisam de operação contínua, como o comércio.

E o que determina o projeto da deputada?

A PEC não é para ter uma jornada máxima em cinco dias, com o fim da escala 6 por 1. É, na verdade, bem mais ampla: para que todos os trabalhadores tenham redução da jornada semanal em oito horas, de 44 para 36 horas, em no máximo quatro dias. É a chamada semana de quatro dias, na verdade. Desde os anos 90, o Brasil já teve muitas outras propostas semelhantes, embora normalmente o foco seja na redução para 40 horas, como já costuma ser para servidores públicos. Campanhas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) foram nesse sentido. Antigamente, era principalmente uma pauta para reduzir o desemprego, porque se entendia que existe uma produção fixa em cada empresa – e, com jornadas menores, as empresas se veriam obrigadas a contratar mais. Inclusive, eram propostas que proibiam hora extra, porque tinha essa ideia de que talvez existisse lucro sobrando e o efeito de reduzir a jornada seria desemprego menor.

O que muda agora?

O que é novo agora é que a campanha vem motivada não pela redução do desemprego, mas com foco mesmo na qualidade de vida do trabalhador. E, claro, são campanhas que não vêm mais de grupos organizados, mas das redes sociais – e com forte apelo.

O que mais há em tramitação no Congresso sobre esse tema?

A oposição apresenta uma PEC alternativa para que o trabalhador possa ser contratado por hora, tentando contemplar essa demanda das redes, por mais tempo livre, sem criar riscos para o emprego formal. Seria algo como a constitucionalização do horista, o trabalhador intermitente da reforma trabalhista. Mas não está claro como ficariam os atuais contratos de 44 horas, se seriam migrados para esse novo modelo, um modelo inspirado nos Estados Unidos.

Existem países que já seguiram essa proposta da deputada Erika Hilton? Quais foram os resultados?

Reduções da jornada acontecem em várias categorias e em vários países. O Brasil mesmo fez uma em 1988. A evidência é que não muda muito em relação ao nível de emprego. Talvez porque alguns setores se beneficiem, já que, com a redução da jornada, o trabalhador pode ter mais tempo para atividades diversas, como academia, cinema etc.

O Brasil já tem um porcentual grande de trabalhadores na informalidade. Essa medida poderia piorar esse quadro?

Depende de qual vai ser a medida discutida. Se for o fim da jornada 6 por 1, não tem tanto risco. Há algum custo operacional, mas o salário por hora não tende a mudar. O total de horas é o mesmo – impacto bem menor. O grande aumento de custo é com a redução de 44 para 36 horas, que é sem perda salarial. Ou seja, o salário não poderia mudar, mas as horas diminuiriam. O trabalhador receberia mais por cada hora de trabalho, e os empregadores pagariam mais. Com esse aumento de custo, podem evitar novas contratações, promover demissões, migrar a folha para a informalidade. Seria prudente pensar em uma transição gradual, aos poucos.

Uma mudança abrupta de 44 para 36 horas por semana pode até inviabilizar pequenos negócios

Quais seriam os ganhos para a economia com a redução da jornada? Gastos com entretenimento, por exemplo?

Acho que ganha mais a economia do cuidado, os pais que ganham mais tempo para ficar com os filhos, a parte da economia que não é contabilizada no PIB. Mas uma parcela das pessoas pretende usar uma redução para estudar ou para fazer bicos também, segundo pesquisas.

Quais seriam as potenciais perdas?

A principal perda potencial da redução da jornada, principalmente se for ampla, é a redução do nível de ocupação. Uma mudança abrupta de 44 para 36 horas por semana pode até inviabilizar pequenos negócios, por exemplo.

Que setores poderiam se beneficiar e que setores seriam mais afetados?

Setores típicos do fim de semana poderiam se beneficiar, mas paradoxalmente também são alguns dos setores que usam mais a jornada 6 por 1, como shoppings. Já para outros, como saúde e indústria, só parece haver perda em um primeiro momento.

O desemprego está baixo, e há setores reclamando de falta de mão de obra. Isso pode pressionar a inflação de serviços, por exemplo?

Pode. Rigorosamente, o que a PEC faz é promover um aumento salarial de cerca de 15% na hora trabalhada. Se empregadores quiserem fechar a escala com horas extras, o trabalhador vai ganhar mais e pode ser que os preços se elevem. Mas é especulação neste momento em que sequer sabemos qual é o efetivo objetivo do movimento.

A medida pode afetar o caixa do governo, com menor arrecadação de contribuições sobre a folha de pagamentos?

Sempre que o nível de ocupação diminui, o governo perde arrecadação, até porque, no Brasil, a tributação sobre o emprego é muito alta. A contribuição dos empregadores sobre a folha salarial é o principal tributo da União, mais importante que o próprio Imposto de Renda. Não parece plausível, porém, que uma redução repentina de 44 para 36 horas prospere. De toda forma, já há alguma pressão pública para que o eventual fim da escala 6 por 1 traga compensações para os empregadores com desoneração da folha.

Entrevista por Alvaro Gribel

Repórter especial e colunista do Estadão em Brasília. Há mais de 15 anos acompanha os principais assuntos macroeconômicos no Brasil e no mundo. Foi colunista e coordenador de economia no Globo.

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