‘Nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem’, diz governador do ES


Renato Casagrande entregou uma lista com sete propostas para o relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro

Por Mariana Carneiro
Atualização:
Foto: HELIO FILHO
Entrevista comRenato Casagrandegovernador do Espírito Santo

BRASÍLIA - O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), afirma estar preocupado com os efeitos de longo prazo da reforma tributária no desempenho de Estados menos desenvolvidos. Hoje, a principal política de estímulo e atração de investimentos na mão dos governadores é a oferta de benefícios tributários do ICMS, que deverão ser extintos com a nova tributação sobre o consumo.

“Ninguém está tão preocupado com receita, mas com a concentração de riqueza nos Estados maiores e consumidores”, afirma em entrevista ao Estadão.

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“O nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem. Então, nossa dúvida é se diversos Estados menores, em termos de consumo, se eles perderão atividade econômica, porque a política do destino acaba favorecendo muitos Estados que são grandes centros consumidores”.

Renato Casagrande, governador do Espírito Santo Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Casagrande entregou uma lista com sete propostas para o relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), em reunião em Vitória nesta segunda-feira, 19. Os Estados, que até então demonstravam adesão à proposta, apresentaram resistências nos últimos dias, que o relator tenta contornar.

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O capixaba diz acreditar, porém, que boa parte das negociações federativas só serão resolvidas no Senado, após a votação na Câmara, que ele prevê que ocorrerá por esforço do presidente, Arthur Lira (PP-AL).

“Será o caminho entre a Câmara e o Senado que vai nos dizer se a reforma tem chance. Que vai ser votada na Câmara, vai. Se ela vai ser concluída no Senado vai depender muito do que a Câmara produzir”, afirmou. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O Espírito Santo fez uma lista com sete propostas para a reforma tributária. Vocês estão contra a reforma?

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Nós não somos contra. Aguinaldo (Ribeiro) vai apresentar nesta semana ou na semana que vem o seu relatório. Mas, de qualquer maneira, nós temos preocupações com perda de atividade econômica, porque nós temos um porto, a gente tem incentivos fiscais e os incentivos estão previstos para serem extintos a partir de 2033.

Como ele deve tratar os incentivos?

Segundo ele, isso está preservado, e a forma de preservar pode ser o IBS (novo imposto que une o ISS e o ICMS) entrar com um percentual menor e ser mais rápido a partir de 2033. Porque aí mantém a possibilidade de o Estado usar o ICMS até 2032. Nós temos preocupações com a atividade econômica. Ele está dizendo que, no caso do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), ele está esperando uma posição do Conselho dos Secretários Estaduais de Fazenda para a distribuição do recurso.

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O sr. é favorável a dividir o fundo entre todos os Estados ou defende que seja apenas entre os Estados menos desenvolvidos?

Não dá para fazer um fundo deixando a região Sul e Sudeste de fora, não. Acho que num critério que favoreça mais os Estados menos desenvolvidos, mas que todos os Estados sejam contemplados. E acho que todos os Estados vão ser. Já definiram pelo menos que os recursos vão vir da receita da União, chegaram a um valor de R$ 50 bilhões, mas vamos tentar passar para R$ 60 bilhões.

Então eles já fecharam com o governo federal R$ 50 bilhões para o fundo?

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É o que eles disseram aqui, de que já tem a concordância do ministro da Fazenda de R$ 50 bilhões. E a receita vindo da União.

E como avalia este patamar? Os governadores devem aceitar?

Os Estados querem mais um pouco, acho que vai entrar num processo de negociação. Tem governador que falou em até R$ 100 bilhões, mas acho que vai ser um valor entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões, até porque vai ser um valor que vai dividir para todos os Estados do Brasil. Então é bom que a gente discuta com clareza o valor desse Fundo de Desenvolvimento Regional. Agora, algumas coisas vão ficar para a negociação no Senado também, porque não vai fechar tudo na Câmara.

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E quais as preocupações de vocês?

Temos preocupações com a atividade econômica, com os incentivos fiscais, com perda de receita, naturalmente. Mas como a transição é de longo prazo e vai haver a garantia de que a receita não será menor e corrigida pelo INPC, então isso protege a nossa receita. Então estamos conversando, na expectativa de ver e ler o relatório.

Há garantia de receita?

Ninguém está tão preocupado com receita, mas com a concentração de riqueza nos Estados maiores e consumidores. Esse é o problema da reforma, mas já seria também o problema a partir de 2032, com o fim dos incentivos. Veja o Espírito Santo: temos um complexo portuário, que é bastante movimentado também porque nós temos incentivos. As empresas que operam por aqui levam seus produtos para outros Estados do Brasil, Estados consumidores. Por que quando acabar esses incentivos a empresa operará por aqui e não vai operar por São Paulo ou Rio de Janeiro? Então, hoje o grande debate que se faz da reforma é esse modelo, com a dimensão que tem o nosso País, construir um bom sistema de desenvolvimento, uma boa política, que não concentre ainda mais a riqueza do Brasil em meia dúzia de Estados. Essa é a pergunta que fazemos hoje. O nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem. Então, nossa dúvida é se diversos Estados menores, em termos de consumo, se eles perderão atividade econômica, porque a política do destino acaba favorecendo muitos Estados que são grandes centros consumidores.

Entre as propostas do ES, está a sugestão de migrar para o IBS só a partir de 2033. Não seria atrasar demais a vigência da reforma?

Isso preservaria os incentivos até 2032 e evita que o governo tenha de colocar um outro fundo, que seria um fundo de compensação, para permitir que os Estados possam cumprir os contratos que têm assinados com as empresas. Nós temos diversos contratos de incentivos assinados com as empresas. E esses contatos vão até 2032, com renúncia de receita. Se o IBS for implantado a partir de janeiro de 2033, não tem nenhuma necessidade de aportar recursos para fazer o cumprimento desses contratos.

Mas não adia demais?

A gente coloca a proposta para mostrar um problema. Nós temos um problema. A alternativa é ter um fundo de compensação, além do Fundo de Desenvolvimento Regional. Se não tiver fundo de compensação, que seja usado o Fundo de Desenvolvimento Regional para fazer o cumprimento desses contratos.

Há governadores, como Ronaldo Caiado (União-GO), que estão preocupados com a autonomia dos Estados com o IBS. Como o sr. avalia isso?

Os governadores foram picados por cobra, então têm medo, né? A Lei Kandir foi um exemplo muito ruim, porque quando votaram a lei, disseram que iriam ressarcir os Estados (e isso só se resolveu após a derrota da União e acordo no STF). Mas, neste caso, não vai ter dúvida porque isso vai estar constitucionalizado. Essa gestão no comitê federativo, está constitucionalizado, vai ter representante dos Estados e dos municípios porque a arrecadação vai ser centralizada. Então, eu reconheço que você pode aparentemente ver uma redução da autonomia, porque você deixa de ter a gestão direta. Mas não tem risco, na minha avaliação, porque isso está no sistema automático eletrônico. E isso permite que a gente possa ter segurança na distribuição dos recursos.

Mas vocês sugerem cinco alíquotas diferenciadas de IBS, alegando preservação da autonomia dos Estados. Por quê?

Tem setores que já terão alíquotas diferenciadas. Vai ter a padronizada, mais uma alíquota seletiva mais alta e também mais baixa, vai ter alíquota zero, isenção… Então vai ter algumas alíquotas. As cinco faixas vão servir para incentivar alguns setores que você queira incentivar no seu Estado.

Isso não vai manter em alguma medida a guerra fiscal?

Vai ter um comitê federativo que vai definir essas coisas. Não vai ser uma decisão única de um governador, né? Hoje tem o Confaz, mas você vai ter um comitê que vai deliberar sobre essas decisões e verificar se, de fato, pode ser implementado ou não. A receita vai ter distribuição automática, mas as decisões de aplicação de alíquota para um setor ou outro, de percentuais diferenciados, como é o caso que estamos propondo, isso vai ser compartilhado.

Essas sugestões do ES foram compartilhadas com outros governadores?

Alguns Estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás têm uma visão muito semelhante, porque são os Estados que mais perdem. Amazonas é o que mais perde, se não resolver a Zona Franca (de Manaus). Mas nós somos Estados que efetivamente perdemos receita e estamos preocupados com as compensações necessárias.

Mas o sr. difere do Caiado, aparentemente. Ele já se posicionou contra a reforma.

Se tivesse o IBS vigente a partir de 2033, talvez ele pudesse se convencer. Mas ele adotou uma postura política com relação a esse tema, diferente de nós. Nós temos preocupações com a reforma, mas sabemos que votar uma reforma que moderniza o sistema tributário brasileiro é importante, desde que sejam preservadas as nossas as nossas particularidades locais. Acho que nenhum Estado pode perder com a reforma.

Acredita que é possível o calendário de Arthur Lira (PP-AL), de votá-la em julho?

O Aguinaldo foi para Brasília nesta segunda, 19, para definir essas coisas com o Arthur. Ele ia sugerir ao Arthur fazer uma reunião com os governadores, assim que fosse apresentado o relatório. O Arthur pegou a reforma tributária como uma bandeira e isso tem vantagens e desvantagens.

Quais são?

A vantagem é que ele está determinado em votar. A desvantagem é que a gente pode votar assuntos pendentes e que podem ficar para ajustar no Senado.

O sr. prevê que vai ficar muita coisa para se resolver no Senado?

É cedo para dizer. Todo mundo ainda está na expectativa de ver o filho nascer, né? Então, o filho não nasceu ainda, está em trabalho de parto. Mas eu acho que a estratégia adotada pelo governo e pelo Congresso está correta. Quem está conduzindo é o Congresso e tem um ambiente muito melhor para votar a reforma do que tínhamos no passado. Tem uma construção em que você usa o tempo para facilitar e desarmar as divergências. Mas eu acho que, depois de sair da Câmara, todo mundo vai fazer muita conta. Se sair alguma coisa palatável, que seja simpática e que agregue boa parte do Brasil, tem chance.

Vê ganho político para os governadores e para Lula com a reforma?

Os governadores, não. Mas acho que para o Lula é bom e para o Congresso é bom. Arthur Lira conseguiu trabalhar para que esse seja um assunto fora do debate “oposição ou governo” e acho que vai conseguir conduzir nessa dimensão superior, acima das disputas e da polarização.

O que está ouvindo de empresários capixabas? Crê que eles querem a reforma ou ainda têm resistência?

O setor privado do Espírito Santo está dividido, assim como em todo o Brasil. Tem gente animado com a reforma, tem gente desanimado, tem gente trabalhando contra. Há um ambiente favorável à votação, mas também há muitas dúvidas.

BRASÍLIA - O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), afirma estar preocupado com os efeitos de longo prazo da reforma tributária no desempenho de Estados menos desenvolvidos. Hoje, a principal política de estímulo e atração de investimentos na mão dos governadores é a oferta de benefícios tributários do ICMS, que deverão ser extintos com a nova tributação sobre o consumo.

“Ninguém está tão preocupado com receita, mas com a concentração de riqueza nos Estados maiores e consumidores”, afirma em entrevista ao Estadão.

“O nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem. Então, nossa dúvida é se diversos Estados menores, em termos de consumo, se eles perderão atividade econômica, porque a política do destino acaba favorecendo muitos Estados que são grandes centros consumidores”.

Renato Casagrande, governador do Espírito Santo Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Casagrande entregou uma lista com sete propostas para o relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), em reunião em Vitória nesta segunda-feira, 19. Os Estados, que até então demonstravam adesão à proposta, apresentaram resistências nos últimos dias, que o relator tenta contornar.

O capixaba diz acreditar, porém, que boa parte das negociações federativas só serão resolvidas no Senado, após a votação na Câmara, que ele prevê que ocorrerá por esforço do presidente, Arthur Lira (PP-AL).

“Será o caminho entre a Câmara e o Senado que vai nos dizer se a reforma tem chance. Que vai ser votada na Câmara, vai. Se ela vai ser concluída no Senado vai depender muito do que a Câmara produzir”, afirmou. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O Espírito Santo fez uma lista com sete propostas para a reforma tributária. Vocês estão contra a reforma?

Nós não somos contra. Aguinaldo (Ribeiro) vai apresentar nesta semana ou na semana que vem o seu relatório. Mas, de qualquer maneira, nós temos preocupações com perda de atividade econômica, porque nós temos um porto, a gente tem incentivos fiscais e os incentivos estão previstos para serem extintos a partir de 2033.

Como ele deve tratar os incentivos?

Segundo ele, isso está preservado, e a forma de preservar pode ser o IBS (novo imposto que une o ISS e o ICMS) entrar com um percentual menor e ser mais rápido a partir de 2033. Porque aí mantém a possibilidade de o Estado usar o ICMS até 2032. Nós temos preocupações com a atividade econômica. Ele está dizendo que, no caso do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), ele está esperando uma posição do Conselho dos Secretários Estaduais de Fazenda para a distribuição do recurso.

O sr. é favorável a dividir o fundo entre todos os Estados ou defende que seja apenas entre os Estados menos desenvolvidos?

Não dá para fazer um fundo deixando a região Sul e Sudeste de fora, não. Acho que num critério que favoreça mais os Estados menos desenvolvidos, mas que todos os Estados sejam contemplados. E acho que todos os Estados vão ser. Já definiram pelo menos que os recursos vão vir da receita da União, chegaram a um valor de R$ 50 bilhões, mas vamos tentar passar para R$ 60 bilhões.

Então eles já fecharam com o governo federal R$ 50 bilhões para o fundo?

É o que eles disseram aqui, de que já tem a concordância do ministro da Fazenda de R$ 50 bilhões. E a receita vindo da União.

E como avalia este patamar? Os governadores devem aceitar?

Os Estados querem mais um pouco, acho que vai entrar num processo de negociação. Tem governador que falou em até R$ 100 bilhões, mas acho que vai ser um valor entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões, até porque vai ser um valor que vai dividir para todos os Estados do Brasil. Então é bom que a gente discuta com clareza o valor desse Fundo de Desenvolvimento Regional. Agora, algumas coisas vão ficar para a negociação no Senado também, porque não vai fechar tudo na Câmara.

E quais as preocupações de vocês?

Temos preocupações com a atividade econômica, com os incentivos fiscais, com perda de receita, naturalmente. Mas como a transição é de longo prazo e vai haver a garantia de que a receita não será menor e corrigida pelo INPC, então isso protege a nossa receita. Então estamos conversando, na expectativa de ver e ler o relatório.

Há garantia de receita?

Ninguém está tão preocupado com receita, mas com a concentração de riqueza nos Estados maiores e consumidores. Esse é o problema da reforma, mas já seria também o problema a partir de 2032, com o fim dos incentivos. Veja o Espírito Santo: temos um complexo portuário, que é bastante movimentado também porque nós temos incentivos. As empresas que operam por aqui levam seus produtos para outros Estados do Brasil, Estados consumidores. Por que quando acabar esses incentivos a empresa operará por aqui e não vai operar por São Paulo ou Rio de Janeiro? Então, hoje o grande debate que se faz da reforma é esse modelo, com a dimensão que tem o nosso País, construir um bom sistema de desenvolvimento, uma boa política, que não concentre ainda mais a riqueza do Brasil em meia dúzia de Estados. Essa é a pergunta que fazemos hoje. O nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem. Então, nossa dúvida é se diversos Estados menores, em termos de consumo, se eles perderão atividade econômica, porque a política do destino acaba favorecendo muitos Estados que são grandes centros consumidores.

Entre as propostas do ES, está a sugestão de migrar para o IBS só a partir de 2033. Não seria atrasar demais a vigência da reforma?

Isso preservaria os incentivos até 2032 e evita que o governo tenha de colocar um outro fundo, que seria um fundo de compensação, para permitir que os Estados possam cumprir os contratos que têm assinados com as empresas. Nós temos diversos contratos de incentivos assinados com as empresas. E esses contatos vão até 2032, com renúncia de receita. Se o IBS for implantado a partir de janeiro de 2033, não tem nenhuma necessidade de aportar recursos para fazer o cumprimento desses contratos.

Mas não adia demais?

A gente coloca a proposta para mostrar um problema. Nós temos um problema. A alternativa é ter um fundo de compensação, além do Fundo de Desenvolvimento Regional. Se não tiver fundo de compensação, que seja usado o Fundo de Desenvolvimento Regional para fazer o cumprimento desses contratos.

Há governadores, como Ronaldo Caiado (União-GO), que estão preocupados com a autonomia dos Estados com o IBS. Como o sr. avalia isso?

Os governadores foram picados por cobra, então têm medo, né? A Lei Kandir foi um exemplo muito ruim, porque quando votaram a lei, disseram que iriam ressarcir os Estados (e isso só se resolveu após a derrota da União e acordo no STF). Mas, neste caso, não vai ter dúvida porque isso vai estar constitucionalizado. Essa gestão no comitê federativo, está constitucionalizado, vai ter representante dos Estados e dos municípios porque a arrecadação vai ser centralizada. Então, eu reconheço que você pode aparentemente ver uma redução da autonomia, porque você deixa de ter a gestão direta. Mas não tem risco, na minha avaliação, porque isso está no sistema automático eletrônico. E isso permite que a gente possa ter segurança na distribuição dos recursos.

Mas vocês sugerem cinco alíquotas diferenciadas de IBS, alegando preservação da autonomia dos Estados. Por quê?

Tem setores que já terão alíquotas diferenciadas. Vai ter a padronizada, mais uma alíquota seletiva mais alta e também mais baixa, vai ter alíquota zero, isenção… Então vai ter algumas alíquotas. As cinco faixas vão servir para incentivar alguns setores que você queira incentivar no seu Estado.

Isso não vai manter em alguma medida a guerra fiscal?

Vai ter um comitê federativo que vai definir essas coisas. Não vai ser uma decisão única de um governador, né? Hoje tem o Confaz, mas você vai ter um comitê que vai deliberar sobre essas decisões e verificar se, de fato, pode ser implementado ou não. A receita vai ter distribuição automática, mas as decisões de aplicação de alíquota para um setor ou outro, de percentuais diferenciados, como é o caso que estamos propondo, isso vai ser compartilhado.

Essas sugestões do ES foram compartilhadas com outros governadores?

Alguns Estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás têm uma visão muito semelhante, porque são os Estados que mais perdem. Amazonas é o que mais perde, se não resolver a Zona Franca (de Manaus). Mas nós somos Estados que efetivamente perdemos receita e estamos preocupados com as compensações necessárias.

Mas o sr. difere do Caiado, aparentemente. Ele já se posicionou contra a reforma.

Se tivesse o IBS vigente a partir de 2033, talvez ele pudesse se convencer. Mas ele adotou uma postura política com relação a esse tema, diferente de nós. Nós temos preocupações com a reforma, mas sabemos que votar uma reforma que moderniza o sistema tributário brasileiro é importante, desde que sejam preservadas as nossas as nossas particularidades locais. Acho que nenhum Estado pode perder com a reforma.

Acredita que é possível o calendário de Arthur Lira (PP-AL), de votá-la em julho?

O Aguinaldo foi para Brasília nesta segunda, 19, para definir essas coisas com o Arthur. Ele ia sugerir ao Arthur fazer uma reunião com os governadores, assim que fosse apresentado o relatório. O Arthur pegou a reforma tributária como uma bandeira e isso tem vantagens e desvantagens.

Quais são?

A vantagem é que ele está determinado em votar. A desvantagem é que a gente pode votar assuntos pendentes e que podem ficar para ajustar no Senado.

O sr. prevê que vai ficar muita coisa para se resolver no Senado?

É cedo para dizer. Todo mundo ainda está na expectativa de ver o filho nascer, né? Então, o filho não nasceu ainda, está em trabalho de parto. Mas eu acho que a estratégia adotada pelo governo e pelo Congresso está correta. Quem está conduzindo é o Congresso e tem um ambiente muito melhor para votar a reforma do que tínhamos no passado. Tem uma construção em que você usa o tempo para facilitar e desarmar as divergências. Mas eu acho que, depois de sair da Câmara, todo mundo vai fazer muita conta. Se sair alguma coisa palatável, que seja simpática e que agregue boa parte do Brasil, tem chance.

Vê ganho político para os governadores e para Lula com a reforma?

Os governadores, não. Mas acho que para o Lula é bom e para o Congresso é bom. Arthur Lira conseguiu trabalhar para que esse seja um assunto fora do debate “oposição ou governo” e acho que vai conseguir conduzir nessa dimensão superior, acima das disputas e da polarização.

O que está ouvindo de empresários capixabas? Crê que eles querem a reforma ou ainda têm resistência?

O setor privado do Espírito Santo está dividido, assim como em todo o Brasil. Tem gente animado com a reforma, tem gente desanimado, tem gente trabalhando contra. Há um ambiente favorável à votação, mas também há muitas dúvidas.

BRASÍLIA - O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), afirma estar preocupado com os efeitos de longo prazo da reforma tributária no desempenho de Estados menos desenvolvidos. Hoje, a principal política de estímulo e atração de investimentos na mão dos governadores é a oferta de benefícios tributários do ICMS, que deverão ser extintos com a nova tributação sobre o consumo.

“Ninguém está tão preocupado com receita, mas com a concentração de riqueza nos Estados maiores e consumidores”, afirma em entrevista ao Estadão.

“O nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem. Então, nossa dúvida é se diversos Estados menores, em termos de consumo, se eles perderão atividade econômica, porque a política do destino acaba favorecendo muitos Estados que são grandes centros consumidores”.

Renato Casagrande, governador do Espírito Santo Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Casagrande entregou uma lista com sete propostas para o relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), em reunião em Vitória nesta segunda-feira, 19. Os Estados, que até então demonstravam adesão à proposta, apresentaram resistências nos últimos dias, que o relator tenta contornar.

O capixaba diz acreditar, porém, que boa parte das negociações federativas só serão resolvidas no Senado, após a votação na Câmara, que ele prevê que ocorrerá por esforço do presidente, Arthur Lira (PP-AL).

“Será o caminho entre a Câmara e o Senado que vai nos dizer se a reforma tem chance. Que vai ser votada na Câmara, vai. Se ela vai ser concluída no Senado vai depender muito do que a Câmara produzir”, afirmou. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O Espírito Santo fez uma lista com sete propostas para a reforma tributária. Vocês estão contra a reforma?

Nós não somos contra. Aguinaldo (Ribeiro) vai apresentar nesta semana ou na semana que vem o seu relatório. Mas, de qualquer maneira, nós temos preocupações com perda de atividade econômica, porque nós temos um porto, a gente tem incentivos fiscais e os incentivos estão previstos para serem extintos a partir de 2033.

Como ele deve tratar os incentivos?

Segundo ele, isso está preservado, e a forma de preservar pode ser o IBS (novo imposto que une o ISS e o ICMS) entrar com um percentual menor e ser mais rápido a partir de 2033. Porque aí mantém a possibilidade de o Estado usar o ICMS até 2032. Nós temos preocupações com a atividade econômica. Ele está dizendo que, no caso do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), ele está esperando uma posição do Conselho dos Secretários Estaduais de Fazenda para a distribuição do recurso.

O sr. é favorável a dividir o fundo entre todos os Estados ou defende que seja apenas entre os Estados menos desenvolvidos?

Não dá para fazer um fundo deixando a região Sul e Sudeste de fora, não. Acho que num critério que favoreça mais os Estados menos desenvolvidos, mas que todos os Estados sejam contemplados. E acho que todos os Estados vão ser. Já definiram pelo menos que os recursos vão vir da receita da União, chegaram a um valor de R$ 50 bilhões, mas vamos tentar passar para R$ 60 bilhões.

Então eles já fecharam com o governo federal R$ 50 bilhões para o fundo?

É o que eles disseram aqui, de que já tem a concordância do ministro da Fazenda de R$ 50 bilhões. E a receita vindo da União.

E como avalia este patamar? Os governadores devem aceitar?

Os Estados querem mais um pouco, acho que vai entrar num processo de negociação. Tem governador que falou em até R$ 100 bilhões, mas acho que vai ser um valor entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões, até porque vai ser um valor que vai dividir para todos os Estados do Brasil. Então é bom que a gente discuta com clareza o valor desse Fundo de Desenvolvimento Regional. Agora, algumas coisas vão ficar para a negociação no Senado também, porque não vai fechar tudo na Câmara.

E quais as preocupações de vocês?

Temos preocupações com a atividade econômica, com os incentivos fiscais, com perda de receita, naturalmente. Mas como a transição é de longo prazo e vai haver a garantia de que a receita não será menor e corrigida pelo INPC, então isso protege a nossa receita. Então estamos conversando, na expectativa de ver e ler o relatório.

Há garantia de receita?

Ninguém está tão preocupado com receita, mas com a concentração de riqueza nos Estados maiores e consumidores. Esse é o problema da reforma, mas já seria também o problema a partir de 2032, com o fim dos incentivos. Veja o Espírito Santo: temos um complexo portuário, que é bastante movimentado também porque nós temos incentivos. As empresas que operam por aqui levam seus produtos para outros Estados do Brasil, Estados consumidores. Por que quando acabar esses incentivos a empresa operará por aqui e não vai operar por São Paulo ou Rio de Janeiro? Então, hoje o grande debate que se faz da reforma é esse modelo, com a dimensão que tem o nosso País, construir um bom sistema de desenvolvimento, uma boa política, que não concentre ainda mais a riqueza do Brasil em meia dúzia de Estados. Essa é a pergunta que fazemos hoje. O nosso problema é perder atividade econômica e nossos Estados empobrecerem. Então, nossa dúvida é se diversos Estados menores, em termos de consumo, se eles perderão atividade econômica, porque a política do destino acaba favorecendo muitos Estados que são grandes centros consumidores.

Entre as propostas do ES, está a sugestão de migrar para o IBS só a partir de 2033. Não seria atrasar demais a vigência da reforma?

Isso preservaria os incentivos até 2032 e evita que o governo tenha de colocar um outro fundo, que seria um fundo de compensação, para permitir que os Estados possam cumprir os contratos que têm assinados com as empresas. Nós temos diversos contratos de incentivos assinados com as empresas. E esses contatos vão até 2032, com renúncia de receita. Se o IBS for implantado a partir de janeiro de 2033, não tem nenhuma necessidade de aportar recursos para fazer o cumprimento desses contratos.

Mas não adia demais?

A gente coloca a proposta para mostrar um problema. Nós temos um problema. A alternativa é ter um fundo de compensação, além do Fundo de Desenvolvimento Regional. Se não tiver fundo de compensação, que seja usado o Fundo de Desenvolvimento Regional para fazer o cumprimento desses contratos.

Há governadores, como Ronaldo Caiado (União-GO), que estão preocupados com a autonomia dos Estados com o IBS. Como o sr. avalia isso?

Os governadores foram picados por cobra, então têm medo, né? A Lei Kandir foi um exemplo muito ruim, porque quando votaram a lei, disseram que iriam ressarcir os Estados (e isso só se resolveu após a derrota da União e acordo no STF). Mas, neste caso, não vai ter dúvida porque isso vai estar constitucionalizado. Essa gestão no comitê federativo, está constitucionalizado, vai ter representante dos Estados e dos municípios porque a arrecadação vai ser centralizada. Então, eu reconheço que você pode aparentemente ver uma redução da autonomia, porque você deixa de ter a gestão direta. Mas não tem risco, na minha avaliação, porque isso está no sistema automático eletrônico. E isso permite que a gente possa ter segurança na distribuição dos recursos.

Mas vocês sugerem cinco alíquotas diferenciadas de IBS, alegando preservação da autonomia dos Estados. Por quê?

Tem setores que já terão alíquotas diferenciadas. Vai ter a padronizada, mais uma alíquota seletiva mais alta e também mais baixa, vai ter alíquota zero, isenção… Então vai ter algumas alíquotas. As cinco faixas vão servir para incentivar alguns setores que você queira incentivar no seu Estado.

Isso não vai manter em alguma medida a guerra fiscal?

Vai ter um comitê federativo que vai definir essas coisas. Não vai ser uma decisão única de um governador, né? Hoje tem o Confaz, mas você vai ter um comitê que vai deliberar sobre essas decisões e verificar se, de fato, pode ser implementado ou não. A receita vai ter distribuição automática, mas as decisões de aplicação de alíquota para um setor ou outro, de percentuais diferenciados, como é o caso que estamos propondo, isso vai ser compartilhado.

Essas sugestões do ES foram compartilhadas com outros governadores?

Alguns Estados como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás têm uma visão muito semelhante, porque são os Estados que mais perdem. Amazonas é o que mais perde, se não resolver a Zona Franca (de Manaus). Mas nós somos Estados que efetivamente perdemos receita e estamos preocupados com as compensações necessárias.

Mas o sr. difere do Caiado, aparentemente. Ele já se posicionou contra a reforma.

Se tivesse o IBS vigente a partir de 2033, talvez ele pudesse se convencer. Mas ele adotou uma postura política com relação a esse tema, diferente de nós. Nós temos preocupações com a reforma, mas sabemos que votar uma reforma que moderniza o sistema tributário brasileiro é importante, desde que sejam preservadas as nossas as nossas particularidades locais. Acho que nenhum Estado pode perder com a reforma.

Acredita que é possível o calendário de Arthur Lira (PP-AL), de votá-la em julho?

O Aguinaldo foi para Brasília nesta segunda, 19, para definir essas coisas com o Arthur. Ele ia sugerir ao Arthur fazer uma reunião com os governadores, assim que fosse apresentado o relatório. O Arthur pegou a reforma tributária como uma bandeira e isso tem vantagens e desvantagens.

Quais são?

A vantagem é que ele está determinado em votar. A desvantagem é que a gente pode votar assuntos pendentes e que podem ficar para ajustar no Senado.

O sr. prevê que vai ficar muita coisa para se resolver no Senado?

É cedo para dizer. Todo mundo ainda está na expectativa de ver o filho nascer, né? Então, o filho não nasceu ainda, está em trabalho de parto. Mas eu acho que a estratégia adotada pelo governo e pelo Congresso está correta. Quem está conduzindo é o Congresso e tem um ambiente muito melhor para votar a reforma do que tínhamos no passado. Tem uma construção em que você usa o tempo para facilitar e desarmar as divergências. Mas eu acho que, depois de sair da Câmara, todo mundo vai fazer muita conta. Se sair alguma coisa palatável, que seja simpática e que agregue boa parte do Brasil, tem chance.

Vê ganho político para os governadores e para Lula com a reforma?

Os governadores, não. Mas acho que para o Lula é bom e para o Congresso é bom. Arthur Lira conseguiu trabalhar para que esse seja um assunto fora do debate “oposição ou governo” e acho que vai conseguir conduzir nessa dimensão superior, acima das disputas e da polarização.

O que está ouvindo de empresários capixabas? Crê que eles querem a reforma ou ainda têm resistência?

O setor privado do Espírito Santo está dividido, assim como em todo o Brasil. Tem gente animado com a reforma, tem gente desanimado, tem gente trabalhando contra. Há um ambiente favorável à votação, mas também há muitas dúvidas.

Entrevista por Mariana Carneiro

Repórter especial de Economia em Brasília. Foi editora da Coluna do Estadão. Graduada em comunicação social pela PUC-Rio, com MBA em mercado financeiro pela B3 e especialização em análise de conjuntura econômica pela UFRJ. Foi correspondente na Argentina (2015) pela Folha de S.Paulo e também trabalhou em O Globo, TV Globo, JB e Jornal do Commercio.

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