Reforma tributária: ‘Não queiram dizer a mim, eleito pelo voto, que eu viva de mesada’, diz Caiado


Governador de Goiás afirma que a proposta vai fazer com que os Estados percam autonomia: ‘eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro’

Por Adriana Fernandes
Atualização:
Foto: Ronaldo Caiado
Entrevista comRonaldo Caiadogovernador de Goiás

BRASÍLIA – Governador de Goiás desde 2019, Ronaldo Caiado (União Brasil), é um dos principais opositores da proposta de reforma tributária em tramitação na Câmara. Em entrevista ao Estadão, ele afirma que a proposta em discussão vai fazer com que os Estados percam autonomia sobre o seu tributo, o ICMS, e vivam de “mesada”. “Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver”, diz.

Caiado cobra do secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, e do relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que mostrem como será feita a compensação aos Estados, a distribuição de recursos, e o aporte do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR).

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Pela proposta, esse fundo será formado para compensar os Estados pelo fim dos incentivos fiscais, que levaram à chamada guerra fiscal. Segundo ele, Goiás sozinho concede R$ 14 bilhões de incentivo por ano, enquanto o governo quer fazer um fundo no valor total de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. “Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro”, diz.

Ronaldo Caiado, governador de Goiás, é um dos grandes opositores à reforma tributária. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O governador criticou o governo Luiz Inácio Lula da Silva.por ter anunciado incentivo para a indústria automobilística e querer acabar com a possibilidade de os Estados também fazerem esse tipo de política. “Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu”, afirma.

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Ela defende que a reforma comece pela Contribuição sobre Bens e Serviço (CBS), novo imposto que unifica os tributos do governo federal (PIS, Cofins e IPI) e ressuscita o lema do ex-ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, para a reforma: “Menos Brasília, mais Brasil”. Ele prevê com a aprovação da reforma uma onda de judicialização. “Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar”, antecipa.

Qual é a sua avaliação sobre a discussão da reforma tributária no Congresso e a possibilidade de a proposta ser levada rapidamente ao plenário?

O que todos estamos vendo é um processo de total falta de clareza por parte do relator (Aguinaldo Ribeiro) e do Bernard Appy (secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda) em relação às perguntas que são formuladas. Fala-se que o problema no Brasil é a carga tributária, que é muito pesada. Mas aí, faz uma reforma tributária na qual se mexe numa base em que 64,8% de impostos são ICMS e ISS, enquanto tem 35,2% de tributos da União. Existe um desnível muito grande. Da União só tem PIS/Cofins e IPI. O resto das contribuições e Imposto de Renda está tudo fora da reforma. O problema do Brasil não é mais a carga tributária. Passou a ser tributar consumo. Essa que é a meta.

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Mas o que se pretende com a reforma é mudar a forma de tributação dos impostos indiretos sobre consumo...

Mas a reforma não vincula outras áreas de tributação. Não tem tributação de dividendos, não mexe na parte do sistema financeiro, não mexe na seguradora, na parte de patrimônio. Nada disso.

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Essa parte está prometida para a segunda etapa da reforma tributária, que será enviada no segundo semestre...

É muito fácil. Você já viu contar no Congresso com a segunda fase que nunca aconteceu? A segunda fatia da reforma trabalhista seria exatamente fazer a reforma administrativa para conter as despesas. A discussão era: nós cortamos a parte de sindicatos, simplificamos, e agora vamos mexer na máquina do Estado, diminuir as despesas. Isso é história da carochinha. Mesmo a reforma da Previdência não teve a segunda etapa. Falar que depois vamos mexer na reforma tributária na parte de patrimônio é conversa.

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O sr. já era governador na legislatura passada e havia maior convergência nos Estados. Agora, Estados como Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo estão apresentando resistências. O que mudou?

Não misture os canais. Nunca na vida eu vi uma reforma tributária que, em nome dela, se coloca em risco a Federação. O Paulo Guedes queria fazer uma reforma tributária de PIS/Cofins e IPI.

Por que a reforma é prejudicial à Federação?

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Vem cá, meu Estado é um Estado em crescimento. Por que eu sou contra a reforma? Por uma coisa muito simples: ela transforma uma concentração de poderes de um colegiado. Não explica como é que vamos compensar as perdas e nem os programas de incentivos fiscais. Isso não está escrito. Dizem: “nós vamos escrever”. Me dá uma simulação? Qual é o texto? Qual é vantagem para um governante, seja ele prefeito ou governador, se ele vai receber uma mesada? Ele não terá nenhuma condição de estimular nada. Quando se fala em consumo, tem que entender que não tem nenhum país do mundo que tenha crescido porque foi para o IVA. Vem o Aguinaldo e diz: na Índia. O que faz o País crescer não é o IVA. O que faz o país crescer é que os indianos fizeram os jovens estudarem nos Estados Unidos, na Europa, e essas pessoas voltaram para a Índia e realmente avançaram. Se avança o país, é com educação. Nós não podemos embasar uma reforma em premissas que são falsas.

Mas há estudos importantes que mostram o potencial de crescimento e produtividade da reforma...

Eu mandei fazer (estudos) nos países que têm IVA. Modéstia parte, eu sou uma pessoa que gosta de estudar. O que está claro nessa reforma é que eles vão tributar exatamente a área de serviço em educação. Se em Goiás estou fazendo toda uma política voltada para educar os jovens, o cara vai dizer que, em nome da grande indústria brasileira, vamos penalizar educação, saúde, comércio, serviço, produtos da indústria alimentícia, farmacêuticos. Gosto de discutir com dados. O que estou lhe dizendo é que eles não sabem responder quem vai financiar o Fundo de Desenvolvimento Regional.

Não é a União?

A União não quer.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já não sinalizou apoio ao fundo?

Não. Até então, está pensando em participar com a pequena parcela. Qual é a projeção do fundo? De 3% a 5% (do Imposto sobre Bens e Serviços, que unificaria ICMS e ISS). Isso vai gerar em torno de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. Só em Goiás, eu dou R$ 14 bilhões por ano (de incentivos fiscais).

Quando seria necessário de aporte para o Fundo?

Eu não sei. Eu sei dizer do meu Estado. Se há uma previsão de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões para o Brasil todo e só em Goiás tem uma parcela de R$ 14 bilhões, como é que os outros Estados ficarão? Como eu vou devolver os créditos atuais do ICMS das indústrias de Goiás? Como elas têm créditos outorgados, eu tenho que passar, só de imediato, R$ 3,5 bilhões. Quais são os critérios da distribuição para cada Estado, cada município? Eu pergunto quem é esse iluminado que dá conta de prever o que pode ser repassado para 5.575 municípios e 27 Estados.

Qual é o risco?

É ter um maior número de judicialização de tudo. Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar. Se a base toda de tributação é sobre serviços, que é responsável por 84% da minha mão de obra em Goiás, na hora que mexer aqui, eu vou para o Supremo Tribunal Federal. Onde está autonomia dos Estados? A PEC não entra no detalhamento. Por que eu vou autorizar uma emenda constitucional se não conheço o texto que vai normatizar o fundo? Eu não estou aqui para governar o Estado para dizer amanhã que eu engessei uma região.

O sr. defende, então, que a reforma comece pelo plano do ex-ministro Paulo Guedes, com a Contribuição sobre Bens e Serviços, o IVA dos tributos do governo federal (PIS/Cofins e IPI)?

Lógico, pelo federal. Não são eles (o governo federal) que têm a maior carga tributária do País? Tem muito mais sentido começar pela União. Seria dar o exemplo, aquela tese “menos Brasília, mais Estados e municípios”. Outra coisa é importante que seja dita. Os municípios agora não aceitam o IVA dual (dois IVAs> o CBS e o IBS). Eu não tiro a razão deles não. Se os Estados não querem ser tutelados pela União, por que os municípios iriam querer ser tutelados pelos Estados? É uma reforma que não constrói apoio na área de serviços, educação, saúde, agricultura, pecuária; não tem consenso na maioria dos Estados e agora perdeu apoio dos municípios. Eu fui eleito com a meta de romper o ciclo da pobreza. Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver de mesada.

Por que o sr. acha que a reforma fará Goiás viver de mesada?

Todos os Estados da Federação vão receber mesada. Essa mesada vai ser contestada no Supremo. Vamos ver o maior nível de judicialização. Todos vão se sentir penalizados.

O governo de Goiás aderiu, no governo passado, o Regime de Recuperação Fiscal do governo federal para Estados com problemas graves e dificuldades financeiras. Como estão as contas do Estado?

Eu estou cumprindo à risca todas as exigências do regime de recuperação fiscal. Se não fossem as leis 192 e 194 (de desoneração do ICMS de combustíveis, energia, telecomunicações), aquela medida lá do Bolsonaro para diminuir o preço da gasolina, num jogada eleitoreira, que tirou 39% da minha arrecadação, eu ia encerrar o ano de 2022 com R$ 11,4 bilhões em caixa. Eu encerrei com R$ 9,2 bilhões aplicando corretamente o dinheiro.

Em Brasília, comenta-se que o sr. é o principal opositor da reforma porque quer mudar o regime.

Não tem nada a ver alguma coisa com a outra. São pautas distintas. Eu estaria pronto para sair do regime de recuperação fiscal em 2026. O que nós colocamos, os governadores dos Estados em regime de recuperação fiscal, foi: “ministro Haddad, já que o governo federal, nos cortou 39% de ICMS, ou vocês vão nos repor essa perda para todos os Estados ou alongar o prazo para sair do regime”. Quando eu fiz o acordo, eu tinha um x de arrecadação e despesas. Se cortam a arrecadação, como querem que eu cumpra o prazo? Isso não tem nada a ver com reforma tributária. Zero. A pessoa está misturando alhos com bugalhos.

Qual é o problema da reforma para os Estados?

Ela vai interferir na gestão do Estado, do município. Eu não terei mais o tributo estadual. Aí vem o governo federal, no meio de um reforma, e diz que vai incentivar a indústria de automóveis. Pera aí! E eu não posso incentivar a educação? Não posso incentivar a regionalização da saúde no interior? Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu.

Há uma negociação em curso. Os Estados que estão contra querem barrar a reforma?

Não é questão de barrar. Se você sai de premissa errada, se chega a conclusões erradas. Não se pode, ao defender uma reforma, rotular as pessoas que têm ideias, conteúdo e argumentos. Não, eu sou contra um texto da cabeça de apenas um homem que achou que pode mudar toda a tributação no Brasil numa hora só e concentrar tudo em Brasília. Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro. Eu posso ser muito solidário em busca de alternativas, mas não me peçam o meu suicídio político.

A reforma está prevista de ir ao plenário na primeira semana de julho. O sr. não acredita nessa possibilidade?

O Arthur Lira tem toda a razão. Ele é presidente. Presidente tem que coloca matéria em pauta. Não tem problema. Eu vivi naquela Casa seis mandatos. Quando está na presidência, se coloca matéria em pauta. É normal. É obrigação. Não quer dizer que vai colocar em pauta e ela tem que ganhar. Não se pode demonizar a figura de quem não concorda com esse texto como se fosse contra a reforma. A reforma de simplificação nós sempre apoiamos. Tem reforma por lei complementar simplificando, diminuindo a burocratização e fragmentação de ICMS e ISS, que está tramitando no Congresso.

Dá tempo para mudar a proposta?

Se não dá tempo, redige-se outra. Não se pode é, em nome de uma reforma de um iluminado, achar que todos os entes federados têm que ficar calados. Por que querer aniquilar o debate? Eu sou contra o texto. Esse texto não me convence.

BRASÍLIA – Governador de Goiás desde 2019, Ronaldo Caiado (União Brasil), é um dos principais opositores da proposta de reforma tributária em tramitação na Câmara. Em entrevista ao Estadão, ele afirma que a proposta em discussão vai fazer com que os Estados percam autonomia sobre o seu tributo, o ICMS, e vivam de “mesada”. “Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver”, diz.

Caiado cobra do secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, e do relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que mostrem como será feita a compensação aos Estados, a distribuição de recursos, e o aporte do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR).

Pela proposta, esse fundo será formado para compensar os Estados pelo fim dos incentivos fiscais, que levaram à chamada guerra fiscal. Segundo ele, Goiás sozinho concede R$ 14 bilhões de incentivo por ano, enquanto o governo quer fazer um fundo no valor total de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. “Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro”, diz.

Ronaldo Caiado, governador de Goiás, é um dos grandes opositores à reforma tributária. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O governador criticou o governo Luiz Inácio Lula da Silva.por ter anunciado incentivo para a indústria automobilística e querer acabar com a possibilidade de os Estados também fazerem esse tipo de política. “Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu”, afirma.

Ela defende que a reforma comece pela Contribuição sobre Bens e Serviço (CBS), novo imposto que unifica os tributos do governo federal (PIS, Cofins e IPI) e ressuscita o lema do ex-ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, para a reforma: “Menos Brasília, mais Brasil”. Ele prevê com a aprovação da reforma uma onda de judicialização. “Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar”, antecipa.

Qual é a sua avaliação sobre a discussão da reforma tributária no Congresso e a possibilidade de a proposta ser levada rapidamente ao plenário?

O que todos estamos vendo é um processo de total falta de clareza por parte do relator (Aguinaldo Ribeiro) e do Bernard Appy (secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda) em relação às perguntas que são formuladas. Fala-se que o problema no Brasil é a carga tributária, que é muito pesada. Mas aí, faz uma reforma tributária na qual se mexe numa base em que 64,8% de impostos são ICMS e ISS, enquanto tem 35,2% de tributos da União. Existe um desnível muito grande. Da União só tem PIS/Cofins e IPI. O resto das contribuições e Imposto de Renda está tudo fora da reforma. O problema do Brasil não é mais a carga tributária. Passou a ser tributar consumo. Essa que é a meta.

Mas o que se pretende com a reforma é mudar a forma de tributação dos impostos indiretos sobre consumo...

Mas a reforma não vincula outras áreas de tributação. Não tem tributação de dividendos, não mexe na parte do sistema financeiro, não mexe na seguradora, na parte de patrimônio. Nada disso.

Essa parte está prometida para a segunda etapa da reforma tributária, que será enviada no segundo semestre...

É muito fácil. Você já viu contar no Congresso com a segunda fase que nunca aconteceu? A segunda fatia da reforma trabalhista seria exatamente fazer a reforma administrativa para conter as despesas. A discussão era: nós cortamos a parte de sindicatos, simplificamos, e agora vamos mexer na máquina do Estado, diminuir as despesas. Isso é história da carochinha. Mesmo a reforma da Previdência não teve a segunda etapa. Falar que depois vamos mexer na reforma tributária na parte de patrimônio é conversa.

O sr. já era governador na legislatura passada e havia maior convergência nos Estados. Agora, Estados como Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo estão apresentando resistências. O que mudou?

Não misture os canais. Nunca na vida eu vi uma reforma tributária que, em nome dela, se coloca em risco a Federação. O Paulo Guedes queria fazer uma reforma tributária de PIS/Cofins e IPI.

Por que a reforma é prejudicial à Federação?

Vem cá, meu Estado é um Estado em crescimento. Por que eu sou contra a reforma? Por uma coisa muito simples: ela transforma uma concentração de poderes de um colegiado. Não explica como é que vamos compensar as perdas e nem os programas de incentivos fiscais. Isso não está escrito. Dizem: “nós vamos escrever”. Me dá uma simulação? Qual é o texto? Qual é vantagem para um governante, seja ele prefeito ou governador, se ele vai receber uma mesada? Ele não terá nenhuma condição de estimular nada. Quando se fala em consumo, tem que entender que não tem nenhum país do mundo que tenha crescido porque foi para o IVA. Vem o Aguinaldo e diz: na Índia. O que faz o País crescer não é o IVA. O que faz o país crescer é que os indianos fizeram os jovens estudarem nos Estados Unidos, na Europa, e essas pessoas voltaram para a Índia e realmente avançaram. Se avança o país, é com educação. Nós não podemos embasar uma reforma em premissas que são falsas.

Mas há estudos importantes que mostram o potencial de crescimento e produtividade da reforma...

Eu mandei fazer (estudos) nos países que têm IVA. Modéstia parte, eu sou uma pessoa que gosta de estudar. O que está claro nessa reforma é que eles vão tributar exatamente a área de serviço em educação. Se em Goiás estou fazendo toda uma política voltada para educar os jovens, o cara vai dizer que, em nome da grande indústria brasileira, vamos penalizar educação, saúde, comércio, serviço, produtos da indústria alimentícia, farmacêuticos. Gosto de discutir com dados. O que estou lhe dizendo é que eles não sabem responder quem vai financiar o Fundo de Desenvolvimento Regional.

Não é a União?

A União não quer.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já não sinalizou apoio ao fundo?

Não. Até então, está pensando em participar com a pequena parcela. Qual é a projeção do fundo? De 3% a 5% (do Imposto sobre Bens e Serviços, que unificaria ICMS e ISS). Isso vai gerar em torno de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. Só em Goiás, eu dou R$ 14 bilhões por ano (de incentivos fiscais).

Quando seria necessário de aporte para o Fundo?

Eu não sei. Eu sei dizer do meu Estado. Se há uma previsão de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões para o Brasil todo e só em Goiás tem uma parcela de R$ 14 bilhões, como é que os outros Estados ficarão? Como eu vou devolver os créditos atuais do ICMS das indústrias de Goiás? Como elas têm créditos outorgados, eu tenho que passar, só de imediato, R$ 3,5 bilhões. Quais são os critérios da distribuição para cada Estado, cada município? Eu pergunto quem é esse iluminado que dá conta de prever o que pode ser repassado para 5.575 municípios e 27 Estados.

Qual é o risco?

É ter um maior número de judicialização de tudo. Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar. Se a base toda de tributação é sobre serviços, que é responsável por 84% da minha mão de obra em Goiás, na hora que mexer aqui, eu vou para o Supremo Tribunal Federal. Onde está autonomia dos Estados? A PEC não entra no detalhamento. Por que eu vou autorizar uma emenda constitucional se não conheço o texto que vai normatizar o fundo? Eu não estou aqui para governar o Estado para dizer amanhã que eu engessei uma região.

O sr. defende, então, que a reforma comece pelo plano do ex-ministro Paulo Guedes, com a Contribuição sobre Bens e Serviços, o IVA dos tributos do governo federal (PIS/Cofins e IPI)?

Lógico, pelo federal. Não são eles (o governo federal) que têm a maior carga tributária do País? Tem muito mais sentido começar pela União. Seria dar o exemplo, aquela tese “menos Brasília, mais Estados e municípios”. Outra coisa é importante que seja dita. Os municípios agora não aceitam o IVA dual (dois IVAs> o CBS e o IBS). Eu não tiro a razão deles não. Se os Estados não querem ser tutelados pela União, por que os municípios iriam querer ser tutelados pelos Estados? É uma reforma que não constrói apoio na área de serviços, educação, saúde, agricultura, pecuária; não tem consenso na maioria dos Estados e agora perdeu apoio dos municípios. Eu fui eleito com a meta de romper o ciclo da pobreza. Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver de mesada.

Por que o sr. acha que a reforma fará Goiás viver de mesada?

Todos os Estados da Federação vão receber mesada. Essa mesada vai ser contestada no Supremo. Vamos ver o maior nível de judicialização. Todos vão se sentir penalizados.

O governo de Goiás aderiu, no governo passado, o Regime de Recuperação Fiscal do governo federal para Estados com problemas graves e dificuldades financeiras. Como estão as contas do Estado?

Eu estou cumprindo à risca todas as exigências do regime de recuperação fiscal. Se não fossem as leis 192 e 194 (de desoneração do ICMS de combustíveis, energia, telecomunicações), aquela medida lá do Bolsonaro para diminuir o preço da gasolina, num jogada eleitoreira, que tirou 39% da minha arrecadação, eu ia encerrar o ano de 2022 com R$ 11,4 bilhões em caixa. Eu encerrei com R$ 9,2 bilhões aplicando corretamente o dinheiro.

Em Brasília, comenta-se que o sr. é o principal opositor da reforma porque quer mudar o regime.

Não tem nada a ver alguma coisa com a outra. São pautas distintas. Eu estaria pronto para sair do regime de recuperação fiscal em 2026. O que nós colocamos, os governadores dos Estados em regime de recuperação fiscal, foi: “ministro Haddad, já que o governo federal, nos cortou 39% de ICMS, ou vocês vão nos repor essa perda para todos os Estados ou alongar o prazo para sair do regime”. Quando eu fiz o acordo, eu tinha um x de arrecadação e despesas. Se cortam a arrecadação, como querem que eu cumpra o prazo? Isso não tem nada a ver com reforma tributária. Zero. A pessoa está misturando alhos com bugalhos.

Qual é o problema da reforma para os Estados?

Ela vai interferir na gestão do Estado, do município. Eu não terei mais o tributo estadual. Aí vem o governo federal, no meio de um reforma, e diz que vai incentivar a indústria de automóveis. Pera aí! E eu não posso incentivar a educação? Não posso incentivar a regionalização da saúde no interior? Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu.

Há uma negociação em curso. Os Estados que estão contra querem barrar a reforma?

Não é questão de barrar. Se você sai de premissa errada, se chega a conclusões erradas. Não se pode, ao defender uma reforma, rotular as pessoas que têm ideias, conteúdo e argumentos. Não, eu sou contra um texto da cabeça de apenas um homem que achou que pode mudar toda a tributação no Brasil numa hora só e concentrar tudo em Brasília. Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro. Eu posso ser muito solidário em busca de alternativas, mas não me peçam o meu suicídio político.

A reforma está prevista de ir ao plenário na primeira semana de julho. O sr. não acredita nessa possibilidade?

O Arthur Lira tem toda a razão. Ele é presidente. Presidente tem que coloca matéria em pauta. Não tem problema. Eu vivi naquela Casa seis mandatos. Quando está na presidência, se coloca matéria em pauta. É normal. É obrigação. Não quer dizer que vai colocar em pauta e ela tem que ganhar. Não se pode demonizar a figura de quem não concorda com esse texto como se fosse contra a reforma. A reforma de simplificação nós sempre apoiamos. Tem reforma por lei complementar simplificando, diminuindo a burocratização e fragmentação de ICMS e ISS, que está tramitando no Congresso.

Dá tempo para mudar a proposta?

Se não dá tempo, redige-se outra. Não se pode é, em nome de uma reforma de um iluminado, achar que todos os entes federados têm que ficar calados. Por que querer aniquilar o debate? Eu sou contra o texto. Esse texto não me convence.

BRASÍLIA – Governador de Goiás desde 2019, Ronaldo Caiado (União Brasil), é um dos principais opositores da proposta de reforma tributária em tramitação na Câmara. Em entrevista ao Estadão, ele afirma que a proposta em discussão vai fazer com que os Estados percam autonomia sobre o seu tributo, o ICMS, e vivam de “mesada”. “Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver”, diz.

Caiado cobra do secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, e do relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que mostrem como será feita a compensação aos Estados, a distribuição de recursos, e o aporte do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR).

Pela proposta, esse fundo será formado para compensar os Estados pelo fim dos incentivos fiscais, que levaram à chamada guerra fiscal. Segundo ele, Goiás sozinho concede R$ 14 bilhões de incentivo por ano, enquanto o governo quer fazer um fundo no valor total de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. “Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro”, diz.

Ronaldo Caiado, governador de Goiás, é um dos grandes opositores à reforma tributária. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O governador criticou o governo Luiz Inácio Lula da Silva.por ter anunciado incentivo para a indústria automobilística e querer acabar com a possibilidade de os Estados também fazerem esse tipo de política. “Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu”, afirma.

Ela defende que a reforma comece pela Contribuição sobre Bens e Serviço (CBS), novo imposto que unifica os tributos do governo federal (PIS, Cofins e IPI) e ressuscita o lema do ex-ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, para a reforma: “Menos Brasília, mais Brasil”. Ele prevê com a aprovação da reforma uma onda de judicialização. “Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar”, antecipa.

Qual é a sua avaliação sobre a discussão da reforma tributária no Congresso e a possibilidade de a proposta ser levada rapidamente ao plenário?

O que todos estamos vendo é um processo de total falta de clareza por parte do relator (Aguinaldo Ribeiro) e do Bernard Appy (secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda) em relação às perguntas que são formuladas. Fala-se que o problema no Brasil é a carga tributária, que é muito pesada. Mas aí, faz uma reforma tributária na qual se mexe numa base em que 64,8% de impostos são ICMS e ISS, enquanto tem 35,2% de tributos da União. Existe um desnível muito grande. Da União só tem PIS/Cofins e IPI. O resto das contribuições e Imposto de Renda está tudo fora da reforma. O problema do Brasil não é mais a carga tributária. Passou a ser tributar consumo. Essa que é a meta.

Mas o que se pretende com a reforma é mudar a forma de tributação dos impostos indiretos sobre consumo...

Mas a reforma não vincula outras áreas de tributação. Não tem tributação de dividendos, não mexe na parte do sistema financeiro, não mexe na seguradora, na parte de patrimônio. Nada disso.

Essa parte está prometida para a segunda etapa da reforma tributária, que será enviada no segundo semestre...

É muito fácil. Você já viu contar no Congresso com a segunda fase que nunca aconteceu? A segunda fatia da reforma trabalhista seria exatamente fazer a reforma administrativa para conter as despesas. A discussão era: nós cortamos a parte de sindicatos, simplificamos, e agora vamos mexer na máquina do Estado, diminuir as despesas. Isso é história da carochinha. Mesmo a reforma da Previdência não teve a segunda etapa. Falar que depois vamos mexer na reforma tributária na parte de patrimônio é conversa.

O sr. já era governador na legislatura passada e havia maior convergência nos Estados. Agora, Estados como Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo estão apresentando resistências. O que mudou?

Não misture os canais. Nunca na vida eu vi uma reforma tributária que, em nome dela, se coloca em risco a Federação. O Paulo Guedes queria fazer uma reforma tributária de PIS/Cofins e IPI.

Por que a reforma é prejudicial à Federação?

Vem cá, meu Estado é um Estado em crescimento. Por que eu sou contra a reforma? Por uma coisa muito simples: ela transforma uma concentração de poderes de um colegiado. Não explica como é que vamos compensar as perdas e nem os programas de incentivos fiscais. Isso não está escrito. Dizem: “nós vamos escrever”. Me dá uma simulação? Qual é o texto? Qual é vantagem para um governante, seja ele prefeito ou governador, se ele vai receber uma mesada? Ele não terá nenhuma condição de estimular nada. Quando se fala em consumo, tem que entender que não tem nenhum país do mundo que tenha crescido porque foi para o IVA. Vem o Aguinaldo e diz: na Índia. O que faz o País crescer não é o IVA. O que faz o país crescer é que os indianos fizeram os jovens estudarem nos Estados Unidos, na Europa, e essas pessoas voltaram para a Índia e realmente avançaram. Se avança o país, é com educação. Nós não podemos embasar uma reforma em premissas que são falsas.

Mas há estudos importantes que mostram o potencial de crescimento e produtividade da reforma...

Eu mandei fazer (estudos) nos países que têm IVA. Modéstia parte, eu sou uma pessoa que gosta de estudar. O que está claro nessa reforma é que eles vão tributar exatamente a área de serviço em educação. Se em Goiás estou fazendo toda uma política voltada para educar os jovens, o cara vai dizer que, em nome da grande indústria brasileira, vamos penalizar educação, saúde, comércio, serviço, produtos da indústria alimentícia, farmacêuticos. Gosto de discutir com dados. O que estou lhe dizendo é que eles não sabem responder quem vai financiar o Fundo de Desenvolvimento Regional.

Não é a União?

A União não quer.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já não sinalizou apoio ao fundo?

Não. Até então, está pensando em participar com a pequena parcela. Qual é a projeção do fundo? De 3% a 5% (do Imposto sobre Bens e Serviços, que unificaria ICMS e ISS). Isso vai gerar em torno de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. Só em Goiás, eu dou R$ 14 bilhões por ano (de incentivos fiscais).

Quando seria necessário de aporte para o Fundo?

Eu não sei. Eu sei dizer do meu Estado. Se há uma previsão de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões para o Brasil todo e só em Goiás tem uma parcela de R$ 14 bilhões, como é que os outros Estados ficarão? Como eu vou devolver os créditos atuais do ICMS das indústrias de Goiás? Como elas têm créditos outorgados, eu tenho que passar, só de imediato, R$ 3,5 bilhões. Quais são os critérios da distribuição para cada Estado, cada município? Eu pergunto quem é esse iluminado que dá conta de prever o que pode ser repassado para 5.575 municípios e 27 Estados.

Qual é o risco?

É ter um maior número de judicialização de tudo. Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar. Se a base toda de tributação é sobre serviços, que é responsável por 84% da minha mão de obra em Goiás, na hora que mexer aqui, eu vou para o Supremo Tribunal Federal. Onde está autonomia dos Estados? A PEC não entra no detalhamento. Por que eu vou autorizar uma emenda constitucional se não conheço o texto que vai normatizar o fundo? Eu não estou aqui para governar o Estado para dizer amanhã que eu engessei uma região.

O sr. defende, então, que a reforma comece pelo plano do ex-ministro Paulo Guedes, com a Contribuição sobre Bens e Serviços, o IVA dos tributos do governo federal (PIS/Cofins e IPI)?

Lógico, pelo federal. Não são eles (o governo federal) que têm a maior carga tributária do País? Tem muito mais sentido começar pela União. Seria dar o exemplo, aquela tese “menos Brasília, mais Estados e municípios”. Outra coisa é importante que seja dita. Os municípios agora não aceitam o IVA dual (dois IVAs> o CBS e o IBS). Eu não tiro a razão deles não. Se os Estados não querem ser tutelados pela União, por que os municípios iriam querer ser tutelados pelos Estados? É uma reforma que não constrói apoio na área de serviços, educação, saúde, agricultura, pecuária; não tem consenso na maioria dos Estados e agora perdeu apoio dos municípios. Eu fui eleito com a meta de romper o ciclo da pobreza. Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver de mesada.

Por que o sr. acha que a reforma fará Goiás viver de mesada?

Todos os Estados da Federação vão receber mesada. Essa mesada vai ser contestada no Supremo. Vamos ver o maior nível de judicialização. Todos vão se sentir penalizados.

O governo de Goiás aderiu, no governo passado, o Regime de Recuperação Fiscal do governo federal para Estados com problemas graves e dificuldades financeiras. Como estão as contas do Estado?

Eu estou cumprindo à risca todas as exigências do regime de recuperação fiscal. Se não fossem as leis 192 e 194 (de desoneração do ICMS de combustíveis, energia, telecomunicações), aquela medida lá do Bolsonaro para diminuir o preço da gasolina, num jogada eleitoreira, que tirou 39% da minha arrecadação, eu ia encerrar o ano de 2022 com R$ 11,4 bilhões em caixa. Eu encerrei com R$ 9,2 bilhões aplicando corretamente o dinheiro.

Em Brasília, comenta-se que o sr. é o principal opositor da reforma porque quer mudar o regime.

Não tem nada a ver alguma coisa com a outra. São pautas distintas. Eu estaria pronto para sair do regime de recuperação fiscal em 2026. O que nós colocamos, os governadores dos Estados em regime de recuperação fiscal, foi: “ministro Haddad, já que o governo federal, nos cortou 39% de ICMS, ou vocês vão nos repor essa perda para todos os Estados ou alongar o prazo para sair do regime”. Quando eu fiz o acordo, eu tinha um x de arrecadação e despesas. Se cortam a arrecadação, como querem que eu cumpra o prazo? Isso não tem nada a ver com reforma tributária. Zero. A pessoa está misturando alhos com bugalhos.

Qual é o problema da reforma para os Estados?

Ela vai interferir na gestão do Estado, do município. Eu não terei mais o tributo estadual. Aí vem o governo federal, no meio de um reforma, e diz que vai incentivar a indústria de automóveis. Pera aí! E eu não posso incentivar a educação? Não posso incentivar a regionalização da saúde no interior? Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu.

Há uma negociação em curso. Os Estados que estão contra querem barrar a reforma?

Não é questão de barrar. Se você sai de premissa errada, se chega a conclusões erradas. Não se pode, ao defender uma reforma, rotular as pessoas que têm ideias, conteúdo e argumentos. Não, eu sou contra um texto da cabeça de apenas um homem que achou que pode mudar toda a tributação no Brasil numa hora só e concentrar tudo em Brasília. Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro. Eu posso ser muito solidário em busca de alternativas, mas não me peçam o meu suicídio político.

A reforma está prevista de ir ao plenário na primeira semana de julho. O sr. não acredita nessa possibilidade?

O Arthur Lira tem toda a razão. Ele é presidente. Presidente tem que coloca matéria em pauta. Não tem problema. Eu vivi naquela Casa seis mandatos. Quando está na presidência, se coloca matéria em pauta. É normal. É obrigação. Não quer dizer que vai colocar em pauta e ela tem que ganhar. Não se pode demonizar a figura de quem não concorda com esse texto como se fosse contra a reforma. A reforma de simplificação nós sempre apoiamos. Tem reforma por lei complementar simplificando, diminuindo a burocratização e fragmentação de ICMS e ISS, que está tramitando no Congresso.

Dá tempo para mudar a proposta?

Se não dá tempo, redige-se outra. Não se pode é, em nome de uma reforma de um iluminado, achar que todos os entes federados têm que ficar calados. Por que querer aniquilar o debate? Eu sou contra o texto. Esse texto não me convence.

BRASÍLIA – Governador de Goiás desde 2019, Ronaldo Caiado (União Brasil), é um dos principais opositores da proposta de reforma tributária em tramitação na Câmara. Em entrevista ao Estadão, ele afirma que a proposta em discussão vai fazer com que os Estados percam autonomia sobre o seu tributo, o ICMS, e vivam de “mesada”. “Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver”, diz.

Caiado cobra do secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, e do relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que mostrem como será feita a compensação aos Estados, a distribuição de recursos, e o aporte do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR).

Pela proposta, esse fundo será formado para compensar os Estados pelo fim dos incentivos fiscais, que levaram à chamada guerra fiscal. Segundo ele, Goiás sozinho concede R$ 14 bilhões de incentivo por ano, enquanto o governo quer fazer um fundo no valor total de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. “Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro”, diz.

Ronaldo Caiado, governador de Goiás, é um dos grandes opositores à reforma tributária. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O governador criticou o governo Luiz Inácio Lula da Silva.por ter anunciado incentivo para a indústria automobilística e querer acabar com a possibilidade de os Estados também fazerem esse tipo de política. “Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu”, afirma.

Ela defende que a reforma comece pela Contribuição sobre Bens e Serviço (CBS), novo imposto que unifica os tributos do governo federal (PIS, Cofins e IPI) e ressuscita o lema do ex-ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, para a reforma: “Menos Brasília, mais Brasil”. Ele prevê com a aprovação da reforma uma onda de judicialização. “Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar”, antecipa.

Qual é a sua avaliação sobre a discussão da reforma tributária no Congresso e a possibilidade de a proposta ser levada rapidamente ao plenário?

O que todos estamos vendo é um processo de total falta de clareza por parte do relator (Aguinaldo Ribeiro) e do Bernard Appy (secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda) em relação às perguntas que são formuladas. Fala-se que o problema no Brasil é a carga tributária, que é muito pesada. Mas aí, faz uma reforma tributária na qual se mexe numa base em que 64,8% de impostos são ICMS e ISS, enquanto tem 35,2% de tributos da União. Existe um desnível muito grande. Da União só tem PIS/Cofins e IPI. O resto das contribuições e Imposto de Renda está tudo fora da reforma. O problema do Brasil não é mais a carga tributária. Passou a ser tributar consumo. Essa que é a meta.

Mas o que se pretende com a reforma é mudar a forma de tributação dos impostos indiretos sobre consumo...

Mas a reforma não vincula outras áreas de tributação. Não tem tributação de dividendos, não mexe na parte do sistema financeiro, não mexe na seguradora, na parte de patrimônio. Nada disso.

Essa parte está prometida para a segunda etapa da reforma tributária, que será enviada no segundo semestre...

É muito fácil. Você já viu contar no Congresso com a segunda fase que nunca aconteceu? A segunda fatia da reforma trabalhista seria exatamente fazer a reforma administrativa para conter as despesas. A discussão era: nós cortamos a parte de sindicatos, simplificamos, e agora vamos mexer na máquina do Estado, diminuir as despesas. Isso é história da carochinha. Mesmo a reforma da Previdência não teve a segunda etapa. Falar que depois vamos mexer na reforma tributária na parte de patrimônio é conversa.

O sr. já era governador na legislatura passada e havia maior convergência nos Estados. Agora, Estados como Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo estão apresentando resistências. O que mudou?

Não misture os canais. Nunca na vida eu vi uma reforma tributária que, em nome dela, se coloca em risco a Federação. O Paulo Guedes queria fazer uma reforma tributária de PIS/Cofins e IPI.

Por que a reforma é prejudicial à Federação?

Vem cá, meu Estado é um Estado em crescimento. Por que eu sou contra a reforma? Por uma coisa muito simples: ela transforma uma concentração de poderes de um colegiado. Não explica como é que vamos compensar as perdas e nem os programas de incentivos fiscais. Isso não está escrito. Dizem: “nós vamos escrever”. Me dá uma simulação? Qual é o texto? Qual é vantagem para um governante, seja ele prefeito ou governador, se ele vai receber uma mesada? Ele não terá nenhuma condição de estimular nada. Quando se fala em consumo, tem que entender que não tem nenhum país do mundo que tenha crescido porque foi para o IVA. Vem o Aguinaldo e diz: na Índia. O que faz o País crescer não é o IVA. O que faz o país crescer é que os indianos fizeram os jovens estudarem nos Estados Unidos, na Europa, e essas pessoas voltaram para a Índia e realmente avançaram. Se avança o país, é com educação. Nós não podemos embasar uma reforma em premissas que são falsas.

Mas há estudos importantes que mostram o potencial de crescimento e produtividade da reforma...

Eu mandei fazer (estudos) nos países que têm IVA. Modéstia parte, eu sou uma pessoa que gosta de estudar. O que está claro nessa reforma é que eles vão tributar exatamente a área de serviço em educação. Se em Goiás estou fazendo toda uma política voltada para educar os jovens, o cara vai dizer que, em nome da grande indústria brasileira, vamos penalizar educação, saúde, comércio, serviço, produtos da indústria alimentícia, farmacêuticos. Gosto de discutir com dados. O que estou lhe dizendo é que eles não sabem responder quem vai financiar o Fundo de Desenvolvimento Regional.

Não é a União?

A União não quer.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já não sinalizou apoio ao fundo?

Não. Até então, está pensando em participar com a pequena parcela. Qual é a projeção do fundo? De 3% a 5% (do Imposto sobre Bens e Serviços, que unificaria ICMS e ISS). Isso vai gerar em torno de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. Só em Goiás, eu dou R$ 14 bilhões por ano (de incentivos fiscais).

Quando seria necessário de aporte para o Fundo?

Eu não sei. Eu sei dizer do meu Estado. Se há uma previsão de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões para o Brasil todo e só em Goiás tem uma parcela de R$ 14 bilhões, como é que os outros Estados ficarão? Como eu vou devolver os créditos atuais do ICMS das indústrias de Goiás? Como elas têm créditos outorgados, eu tenho que passar, só de imediato, R$ 3,5 bilhões. Quais são os critérios da distribuição para cada Estado, cada município? Eu pergunto quem é esse iluminado que dá conta de prever o que pode ser repassado para 5.575 municípios e 27 Estados.

Qual é o risco?

É ter um maior número de judicialização de tudo. Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar. Se a base toda de tributação é sobre serviços, que é responsável por 84% da minha mão de obra em Goiás, na hora que mexer aqui, eu vou para o Supremo Tribunal Federal. Onde está autonomia dos Estados? A PEC não entra no detalhamento. Por que eu vou autorizar uma emenda constitucional se não conheço o texto que vai normatizar o fundo? Eu não estou aqui para governar o Estado para dizer amanhã que eu engessei uma região.

O sr. defende, então, que a reforma comece pelo plano do ex-ministro Paulo Guedes, com a Contribuição sobre Bens e Serviços, o IVA dos tributos do governo federal (PIS/Cofins e IPI)?

Lógico, pelo federal. Não são eles (o governo federal) que têm a maior carga tributária do País? Tem muito mais sentido começar pela União. Seria dar o exemplo, aquela tese “menos Brasília, mais Estados e municípios”. Outra coisa é importante que seja dita. Os municípios agora não aceitam o IVA dual (dois IVAs> o CBS e o IBS). Eu não tiro a razão deles não. Se os Estados não querem ser tutelados pela União, por que os municípios iriam querer ser tutelados pelos Estados? É uma reforma que não constrói apoio na área de serviços, educação, saúde, agricultura, pecuária; não tem consenso na maioria dos Estados e agora perdeu apoio dos municípios. Eu fui eleito com a meta de romper o ciclo da pobreza. Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver de mesada.

Por que o sr. acha que a reforma fará Goiás viver de mesada?

Todos os Estados da Federação vão receber mesada. Essa mesada vai ser contestada no Supremo. Vamos ver o maior nível de judicialização. Todos vão se sentir penalizados.

O governo de Goiás aderiu, no governo passado, o Regime de Recuperação Fiscal do governo federal para Estados com problemas graves e dificuldades financeiras. Como estão as contas do Estado?

Eu estou cumprindo à risca todas as exigências do regime de recuperação fiscal. Se não fossem as leis 192 e 194 (de desoneração do ICMS de combustíveis, energia, telecomunicações), aquela medida lá do Bolsonaro para diminuir o preço da gasolina, num jogada eleitoreira, que tirou 39% da minha arrecadação, eu ia encerrar o ano de 2022 com R$ 11,4 bilhões em caixa. Eu encerrei com R$ 9,2 bilhões aplicando corretamente o dinheiro.

Em Brasília, comenta-se que o sr. é o principal opositor da reforma porque quer mudar o regime.

Não tem nada a ver alguma coisa com a outra. São pautas distintas. Eu estaria pronto para sair do regime de recuperação fiscal em 2026. O que nós colocamos, os governadores dos Estados em regime de recuperação fiscal, foi: “ministro Haddad, já que o governo federal, nos cortou 39% de ICMS, ou vocês vão nos repor essa perda para todos os Estados ou alongar o prazo para sair do regime”. Quando eu fiz o acordo, eu tinha um x de arrecadação e despesas. Se cortam a arrecadação, como querem que eu cumpra o prazo? Isso não tem nada a ver com reforma tributária. Zero. A pessoa está misturando alhos com bugalhos.

Qual é o problema da reforma para os Estados?

Ela vai interferir na gestão do Estado, do município. Eu não terei mais o tributo estadual. Aí vem o governo federal, no meio de um reforma, e diz que vai incentivar a indústria de automóveis. Pera aí! E eu não posso incentivar a educação? Não posso incentivar a regionalização da saúde no interior? Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu.

Há uma negociação em curso. Os Estados que estão contra querem barrar a reforma?

Não é questão de barrar. Se você sai de premissa errada, se chega a conclusões erradas. Não se pode, ao defender uma reforma, rotular as pessoas que têm ideias, conteúdo e argumentos. Não, eu sou contra um texto da cabeça de apenas um homem que achou que pode mudar toda a tributação no Brasil numa hora só e concentrar tudo em Brasília. Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro. Eu posso ser muito solidário em busca de alternativas, mas não me peçam o meu suicídio político.

A reforma está prevista de ir ao plenário na primeira semana de julho. O sr. não acredita nessa possibilidade?

O Arthur Lira tem toda a razão. Ele é presidente. Presidente tem que coloca matéria em pauta. Não tem problema. Eu vivi naquela Casa seis mandatos. Quando está na presidência, se coloca matéria em pauta. É normal. É obrigação. Não quer dizer que vai colocar em pauta e ela tem que ganhar. Não se pode demonizar a figura de quem não concorda com esse texto como se fosse contra a reforma. A reforma de simplificação nós sempre apoiamos. Tem reforma por lei complementar simplificando, diminuindo a burocratização e fragmentação de ICMS e ISS, que está tramitando no Congresso.

Dá tempo para mudar a proposta?

Se não dá tempo, redige-se outra. Não se pode é, em nome de uma reforma de um iluminado, achar que todos os entes federados têm que ficar calados. Por que querer aniquilar o debate? Eu sou contra o texto. Esse texto não me convence.

BRASÍLIA – Governador de Goiás desde 2019, Ronaldo Caiado (União Brasil), é um dos principais opositores da proposta de reforma tributária em tramitação na Câmara. Em entrevista ao Estadão, ele afirma que a proposta em discussão vai fazer com que os Estados percam autonomia sobre o seu tributo, o ICMS, e vivam de “mesada”. “Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver”, diz.

Caiado cobra do secretário extraordinário de reforma tributária, Bernard Appy, e do relator na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que mostrem como será feita a compensação aos Estados, a distribuição de recursos, e o aporte do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR).

Pela proposta, esse fundo será formado para compensar os Estados pelo fim dos incentivos fiscais, que levaram à chamada guerra fiscal. Segundo ele, Goiás sozinho concede R$ 14 bilhões de incentivo por ano, enquanto o governo quer fazer um fundo no valor total de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. “Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro”, diz.

Ronaldo Caiado, governador de Goiás, é um dos grandes opositores à reforma tributária. Foto: Dida Sampaio/Estadão

O governador criticou o governo Luiz Inácio Lula da Silva.por ter anunciado incentivo para a indústria automobilística e querer acabar com a possibilidade de os Estados também fazerem esse tipo de política. “Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu”, afirma.

Ela defende que a reforma comece pela Contribuição sobre Bens e Serviço (CBS), novo imposto que unifica os tributos do governo federal (PIS, Cofins e IPI) e ressuscita o lema do ex-ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, para a reforma: “Menos Brasília, mais Brasil”. Ele prevê com a aprovação da reforma uma onda de judicialização. “Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar”, antecipa.

Qual é a sua avaliação sobre a discussão da reforma tributária no Congresso e a possibilidade de a proposta ser levada rapidamente ao plenário?

O que todos estamos vendo é um processo de total falta de clareza por parte do relator (Aguinaldo Ribeiro) e do Bernard Appy (secretário de reforma tributária do Ministério da Fazenda) em relação às perguntas que são formuladas. Fala-se que o problema no Brasil é a carga tributária, que é muito pesada. Mas aí, faz uma reforma tributária na qual se mexe numa base em que 64,8% de impostos são ICMS e ISS, enquanto tem 35,2% de tributos da União. Existe um desnível muito grande. Da União só tem PIS/Cofins e IPI. O resto das contribuições e Imposto de Renda está tudo fora da reforma. O problema do Brasil não é mais a carga tributária. Passou a ser tributar consumo. Essa que é a meta.

Mas o que se pretende com a reforma é mudar a forma de tributação dos impostos indiretos sobre consumo...

Mas a reforma não vincula outras áreas de tributação. Não tem tributação de dividendos, não mexe na parte do sistema financeiro, não mexe na seguradora, na parte de patrimônio. Nada disso.

Essa parte está prometida para a segunda etapa da reforma tributária, que será enviada no segundo semestre...

É muito fácil. Você já viu contar no Congresso com a segunda fase que nunca aconteceu? A segunda fatia da reforma trabalhista seria exatamente fazer a reforma administrativa para conter as despesas. A discussão era: nós cortamos a parte de sindicatos, simplificamos, e agora vamos mexer na máquina do Estado, diminuir as despesas. Isso é história da carochinha. Mesmo a reforma da Previdência não teve a segunda etapa. Falar que depois vamos mexer na reforma tributária na parte de patrimônio é conversa.

O sr. já era governador na legislatura passada e havia maior convergência nos Estados. Agora, Estados como Goiás, Rio de Janeiro e São Paulo estão apresentando resistências. O que mudou?

Não misture os canais. Nunca na vida eu vi uma reforma tributária que, em nome dela, se coloca em risco a Federação. O Paulo Guedes queria fazer uma reforma tributária de PIS/Cofins e IPI.

Por que a reforma é prejudicial à Federação?

Vem cá, meu Estado é um Estado em crescimento. Por que eu sou contra a reforma? Por uma coisa muito simples: ela transforma uma concentração de poderes de um colegiado. Não explica como é que vamos compensar as perdas e nem os programas de incentivos fiscais. Isso não está escrito. Dizem: “nós vamos escrever”. Me dá uma simulação? Qual é o texto? Qual é vantagem para um governante, seja ele prefeito ou governador, se ele vai receber uma mesada? Ele não terá nenhuma condição de estimular nada. Quando se fala em consumo, tem que entender que não tem nenhum país do mundo que tenha crescido porque foi para o IVA. Vem o Aguinaldo e diz: na Índia. O que faz o País crescer não é o IVA. O que faz o país crescer é que os indianos fizeram os jovens estudarem nos Estados Unidos, na Europa, e essas pessoas voltaram para a Índia e realmente avançaram. Se avança o país, é com educação. Nós não podemos embasar uma reforma em premissas que são falsas.

Mas há estudos importantes que mostram o potencial de crescimento e produtividade da reforma...

Eu mandei fazer (estudos) nos países que têm IVA. Modéstia parte, eu sou uma pessoa que gosta de estudar. O que está claro nessa reforma é que eles vão tributar exatamente a área de serviço em educação. Se em Goiás estou fazendo toda uma política voltada para educar os jovens, o cara vai dizer que, em nome da grande indústria brasileira, vamos penalizar educação, saúde, comércio, serviço, produtos da indústria alimentícia, farmacêuticos. Gosto de discutir com dados. O que estou lhe dizendo é que eles não sabem responder quem vai financiar o Fundo de Desenvolvimento Regional.

Não é a União?

A União não quer.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já não sinalizou apoio ao fundo?

Não. Até então, está pensando em participar com a pequena parcela. Qual é a projeção do fundo? De 3% a 5% (do Imposto sobre Bens e Serviços, que unificaria ICMS e ISS). Isso vai gerar em torno de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões. Só em Goiás, eu dou R$ 14 bilhões por ano (de incentivos fiscais).

Quando seria necessário de aporte para o Fundo?

Eu não sei. Eu sei dizer do meu Estado. Se há uma previsão de R$ 40 bilhões a R$ 60 bilhões para o Brasil todo e só em Goiás tem uma parcela de R$ 14 bilhões, como é que os outros Estados ficarão? Como eu vou devolver os créditos atuais do ICMS das indústrias de Goiás? Como elas têm créditos outorgados, eu tenho que passar, só de imediato, R$ 3,5 bilhões. Quais são os critérios da distribuição para cada Estado, cada município? Eu pergunto quem é esse iluminado que dá conta de prever o que pode ser repassado para 5.575 municípios e 27 Estados.

Qual é o risco?

É ter um maior número de judicialização de tudo. Na hora que eu for perder uma empresa em Goiás, eu vou judicializar. Se a base toda de tributação é sobre serviços, que é responsável por 84% da minha mão de obra em Goiás, na hora que mexer aqui, eu vou para o Supremo Tribunal Federal. Onde está autonomia dos Estados? A PEC não entra no detalhamento. Por que eu vou autorizar uma emenda constitucional se não conheço o texto que vai normatizar o fundo? Eu não estou aqui para governar o Estado para dizer amanhã que eu engessei uma região.

O sr. defende, então, que a reforma comece pelo plano do ex-ministro Paulo Guedes, com a Contribuição sobre Bens e Serviços, o IVA dos tributos do governo federal (PIS/Cofins e IPI)?

Lógico, pelo federal. Não são eles (o governo federal) que têm a maior carga tributária do País? Tem muito mais sentido começar pela União. Seria dar o exemplo, aquela tese “menos Brasília, mais Estados e municípios”. Outra coisa é importante que seja dita. Os municípios agora não aceitam o IVA dual (dois IVAs> o CBS e o IBS). Eu não tiro a razão deles não. Se os Estados não querem ser tutelados pela União, por que os municípios iriam querer ser tutelados pelos Estados? É uma reforma que não constrói apoio na área de serviços, educação, saúde, agricultura, pecuária; não tem consenso na maioria dos Estados e agora perdeu apoio dos municípios. Eu fui eleito com a meta de romper o ciclo da pobreza. Não queiram dizer a mim, que fui eleito pelo voto, que eu viva de mesada. Não vou viver de mesada.

Por que o sr. acha que a reforma fará Goiás viver de mesada?

Todos os Estados da Federação vão receber mesada. Essa mesada vai ser contestada no Supremo. Vamos ver o maior nível de judicialização. Todos vão se sentir penalizados.

O governo de Goiás aderiu, no governo passado, o Regime de Recuperação Fiscal do governo federal para Estados com problemas graves e dificuldades financeiras. Como estão as contas do Estado?

Eu estou cumprindo à risca todas as exigências do regime de recuperação fiscal. Se não fossem as leis 192 e 194 (de desoneração do ICMS de combustíveis, energia, telecomunicações), aquela medida lá do Bolsonaro para diminuir o preço da gasolina, num jogada eleitoreira, que tirou 39% da minha arrecadação, eu ia encerrar o ano de 2022 com R$ 11,4 bilhões em caixa. Eu encerrei com R$ 9,2 bilhões aplicando corretamente o dinheiro.

Em Brasília, comenta-se que o sr. é o principal opositor da reforma porque quer mudar o regime.

Não tem nada a ver alguma coisa com a outra. São pautas distintas. Eu estaria pronto para sair do regime de recuperação fiscal em 2026. O que nós colocamos, os governadores dos Estados em regime de recuperação fiscal, foi: “ministro Haddad, já que o governo federal, nos cortou 39% de ICMS, ou vocês vão nos repor essa perda para todos os Estados ou alongar o prazo para sair do regime”. Quando eu fiz o acordo, eu tinha um x de arrecadação e despesas. Se cortam a arrecadação, como querem que eu cumpra o prazo? Isso não tem nada a ver com reforma tributária. Zero. A pessoa está misturando alhos com bugalhos.

Qual é o problema da reforma para os Estados?

Ela vai interferir na gestão do Estado, do município. Eu não terei mais o tributo estadual. Aí vem o governo federal, no meio de um reforma, e diz que vai incentivar a indústria de automóveis. Pera aí! E eu não posso incentivar a educação? Não posso incentivar a regionalização da saúde no interior? Quantos bilhões de incentivos tem o governo federal? O único que é leproso é o meu.

Há uma negociação em curso. Os Estados que estão contra querem barrar a reforma?

Não é questão de barrar. Se você sai de premissa errada, se chega a conclusões erradas. Não se pode, ao defender uma reforma, rotular as pessoas que têm ideias, conteúdo e argumentos. Não, eu sou contra um texto da cabeça de apenas um homem que achou que pode mudar toda a tributação no Brasil numa hora só e concentrar tudo em Brasília. Eu não tenho que ir para o caminho do abatedouro. Eu posso ser muito solidário em busca de alternativas, mas não me peçam o meu suicídio político.

A reforma está prevista de ir ao plenário na primeira semana de julho. O sr. não acredita nessa possibilidade?

O Arthur Lira tem toda a razão. Ele é presidente. Presidente tem que coloca matéria em pauta. Não tem problema. Eu vivi naquela Casa seis mandatos. Quando está na presidência, se coloca matéria em pauta. É normal. É obrigação. Não quer dizer que vai colocar em pauta e ela tem que ganhar. Não se pode demonizar a figura de quem não concorda com esse texto como se fosse contra a reforma. A reforma de simplificação nós sempre apoiamos. Tem reforma por lei complementar simplificando, diminuindo a burocratização e fragmentação de ICMS e ISS, que está tramitando no Congresso.

Dá tempo para mudar a proposta?

Se não dá tempo, redige-se outra. Não se pode é, em nome de uma reforma de um iluminado, achar que todos os entes federados têm que ficar calados. Por que querer aniquilar o debate? Eu sou contra o texto. Esse texto não me convence.

Entrevista por Adriana Fernandes

Repórter especial de Economia em Brasília

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