A elevação da nota de crédito do Brasil pela S&P Global, nesta terça-feira, “coroa” um ano no qual a percepção de risco sobre a agenda econômica do governo Lula foi reduzida, o crescimento econômico surpreendeu positivamente e a reforma tributária foi aprovada, mas a lição de casa a ser feita nos próximos anos ainda é dura. A avaliação é do economista e sócio da consultoria Tendências, Silvio Campos Neto.
“Daqui para frente há pontos que tornam difíceis os avanços de nota no curto e médio prazo. A recuperação de grau de investimento até o fim dessa década é improvável”, afirma o economista. “É uma tarefa talvez por todo o restante dessa década, de preservar a questão fiscal e de avançar em reformas estruturais”, diz ele.
A S&P elevou o rating de escala de longo prazo do Brasil de BB- para BB e manteve a perspectiva em estável. Em junho deste ano, a S&P Global já havia revisado a perspectiva da nota de crédito BB- do Brasil, de estável para positiva. A elevação, desta vez, foi motivada pela aprovação da reforma tributária, que marca um progresso na questão fiscal nacional, segundo a classificadora. Agora, o País está dois degraus abaixo do chamado grau de investimento.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
Qual a avaliação do sr. sobre o que levou a S&P a elevar a nota de crédito do País?
A decisão em si não surpreende, primeiro porque a própria S&P já tinha dado esse sinal quando deu outlook positivo e abriu essa margem de que a nota do Brasil estava desenquadrada. Ao longo deste ano, a percepção de risco foi reduzida em relação à questão da agenda econômica do governo. O setor exportador de commodities garantiu um resultado positivo e ao mesmo tempo tivemos sinais importantes da agenda econômica. Primeiro, com o arcabouço fiscal e diminuição da percepção de risco mais aguda do início do ano.
E tivemos ao longo do ano a atuação importante de mecanismos de controle: o Congresso evitou revisões de reformas feitas nos últimos anos e as próprias reações do mercado, quando surgiram situações preocupantes no cenário econômico, como quando o presidente defendeu mudança em teto de gastos, em meta de inflação. O mercado reagiu e o governo respondeu. Essa decisão coroa um ano no qual as coisas conseguiram se manter equilibradas apesar de um ruído no início de governo.
A agência também mencionou a importância da reforma tributária...
Sim, a aprovação da reforma tributária e o crescimento econômico deste ano, que surpreendeu novamente para cima, foram os fatores que deram tranquilidade para a S&P conceder esse upgrade. O crescimento econômico é o que dá a capacidade para o País honrar seus compromissos.
Olhando para frente, qual a perspectiva de novas elevações na nota de crédito?
Daqui para frente há pontos que tornam difíceis os avanços de nota no curto e médio prazo. A recuperação de grau de investimento até o fim dessa década é improvável. Primeiro, pela questão fiscal. Vira e mexe temos pressões por mais gastos, temos dúvidas sobre a capacidade do arcabouço de conseguir controlar esse ímpeto por novas despesas, incerteza da capacidade de aumento de arrecadação para colocar o primário na trajetória de queda.
Há um aumento contratado de dívida pelos próximos anos, um fator que também limita novos upgrades.
E tem a questão do crescimento. O Brasil ainda é um país que demonstra ritmo de crescimento potencial baixo. Para obter avanços nas notas é fundamental que se consiga um ritmo maior, sem desequilíbrios, indicando um ganho de PIB potencial.
É uma notícia positiva, mas que não necessariamente será repetida ao longo deste governo?
É positiva, mas olhando para a frente temos lição de casa muito dura e, por enquanto, sem qualquer tipo de expectativa de um, quanto mais dois upgrades. É uma tarefa talvez por todo o restante dessa década, de preservar a questão fiscal e de avançar em reformas estruturais.