‘Abrir demais as exceções pode pôr por terra ganhos da reforma tributária para o Brasil’, diz Tebet


Ministra do Planejamento prevê que setores serão mais ‘proativos’ do que governadores na tramitação do Senado e afirma que Haddad não vai antecipar envio da reforma da renda sem antes combinar com Lira e Pacheco

Por Adriana Fernandes, Mariana Carneiro e Bianca Lima
Foto: Sergio Lima/AFP
Entrevista comSimone Tebetministra do Planejamento e Orçamento

BRASÍLIA – A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, alerta que abrir demais o número de exceções na reforma tributária pode “pôr por terra” muitos dos benefícios diretos que a proposta gera para o Brasil.

Entre esses benefícios, Tebet cita um maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). “A PEC pura geraria um crescimento real do PIB brasileiro de 1% ao ano a partir de 2026″, diz a ministra, citando estudo do Instituto Nacional de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Com as exceções, haverá o aumento da alíquota geral, e esse ganho será reduzido para 0,5% ao ano, nos próximos cinco anos, a partir de 2026.

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Em entrevista ao Estadão, a ministra do MDB, que foi senadora pelo Mato Grosso do Sul, prevê que alguns setores de serviços, que dizem que terão aumento da carga tributária, serão mais “proativos” do que os próprios governadores durante a tramitação no Senado. Ela elogia o novo relator da reforma, Eduardo Braga (MDB-AM), que é do seu partido, e diz que ele terá capacidade de ouvir todos os setores.

“O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo – rever ou não exceção, avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social”, afirma.

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Para Tebet, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não vai antecipar o envio da reforma do Imposto de Renda sem antes combinar com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),  e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda”, avalia. A seguir, os principais trechos da entrevista.

'A política surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária', diz Tebet Foto: Wilton Júnior/Estadão

Depois de muito ceticismo, a aprovação da reforma tributária na Câmara criou um ambiente mais favorável ao tema. São poucos os que ainda apostam contra. Como a sra. vê esse momento?

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Imagina você lutar por 30 anos por uma reforma. Todos os governos tentaram e não conseguiram. E não ver essa reforma aprovada, e no centro da agenda legislativa e do governo, para que pudesse ser votada… Chega uma hora que até os mais crédulos se tornam céticos. Agora, por conta da capacidade de aglutinar duas reformas – que são a PEC 45 (Câmara) e a 110 (Senado) –, dando espaço para o diálogo e para recepcionar as demandas regionais, nunca vi um movimento tão propício para a aprovação. Precisou que o Brasil fosse para o fundo do poço institucionalmente, politicamente e economicamente para que todos dessem as mãos e construíssem um texto que pudesse, de alguma forma, abarcar e contemplar as diferentes realidades regionais do Brasil. Nesse processo, venceu a política. A política estava fazendo falta no Brasil. Ela surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária.

A sra. falou das demandas regionais, mas esse é justamente um ponto que pode ser problemático na votação do Senado – onde, diferentemente da Câmara, os Estados têm peso igual. Entre os deputados, não houve consenso sobre a divisão do fundo regional e a governança do Conselho Federativo, que vai centralizar a arrecadação do novo imposto. Não teme que a reforma possa ser paralisada?

É verdade. Os problemas da reforma no Senado, e eu participei por oito anos na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e na comissão especial da reforma tributária, eram dois: pelo lado dos Estados, há o eixo Sul-Sudeste, que consome, e o eixo Norte- Nordeste-Centro-Oeste, que mais produz do que consome. Então, essa conta não fechava nunca. Precisaria de duas compensações. A compensação de uma transição mais longa, em que nenhum Estado iria perder para os próximos 20 anos, criando um fundo. E também o Fundo de Desenvolvimento Regional. Isso foi construído no Senado e, agora, nessa PEC. Esse primeiro obstáculo nós já tiramos dentro do Senado, que pese alguns Estados ainda terem demandas específicas para resolver.

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Qual o segundo problema?

A outra pedra no caminho da reforma – essa, sim, ainda a depender de muita construção, audiência pública, diálogo e tudo mais –, é em relação a alguns setores dos serviços, que estão dizendo que teriam aumento da carga tributária. Nesse aspecto, os setores serão mais proativos do que os próprios governadores. De um modo geral, a maioria dos governadores se sentiu contemplada com a reforma que saiu da Câmara. Agora, os setores que não foram contemplados na exceção, esses, sim, talvez poderão ter uma atuação maior dentro do Senado – o que faz parte do processo legislativo. Nesse aspecto, a reforma não poderia estar em melhores mãos: o senador Eduardo Braga é um homem experiente, já está no Senado há algum tempo, participou da discussão, conhece e vem de uma grande bancada e vai ter, sem dúvida nenhuma, por meio das audiências públicas, a capacidade de ouvir todos os setores.

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Mas existe o problema de que as exceções podem levar ao aumento da alíquota padrão…

A única observação a fazer é que, quando a PEC 45 era pura, o estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que saiu agora, fresquinho – é o único estudo oficial que nós temos no Brasil –, mostra que, sem as exceções, a reforma geraria um crescimento real do PIB brasileiro, sozinha, de 1% ao ano a partir de 2026. Com as exceções – aí tem o aumento da alíquota geral para abarcar as exceções, legítimas, ninguém está dizendo que não –, reduz isso para 0,5% ao ano nos próximos cinco anos, a partir de 2026. Você diminui o crescimento do PIB, que é um dos pontos relevantes da reforma. Vamos lembrar que os efeitos diretos da reforma para a sociedade, para a economia, vão muito além do crescimento do PIB de médio e longo prazo. Nós estamos falando de uma reforma que vai gerar ganhos de produtividade que a gente não consegue avaliar.

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Que efeitos são esses?

Diminui a complexidade, reduz o custo Brasil e o custo de conformidade, que é a questão das horas gastas (para que as empresas prestem contas ao Fisco). Além disso, a reforma vai diminuir o contencioso tributário, então vai diminuir a sonegação, aumentando a arrecadação sem aumentar imposto. E ainda aumenta a capacidade de investimento. Por que eu falo que ela é a reforma da indústria? Porque faz com que o setor volte a ter – pela redução do curso de conformidade e pela redução do custo Brasil – condições de competir igualmente com muitos países asiáticos. E a reforma vai reduzir, inclusive, essa questão de guerra fiscal entre os Estados. Então, ela engorda o caixa dos governadores. E o mais importante: a reforma vai melhorar a distribuição de renda. A única questão que fica é: abrir demais as exceções poderia pôr por terra muitos desses benefícios diretos que a reforma tributária gerará para o Brasil.

Na avaliação da sra., seria possível reverter alguma das exceções criadas pela Câmara durante a votação no Senado?

Não é questão de reverter. É a liberdade que o Senado terá de ter, como Casa revisora, a Casa em que você tem muitos ex-governadores, portanto pessoas que têm experiência administrativa, experiência de Executivo, que têm a capacidade de ouvir a sociedade e avaliar: “nós vamos mudar ou não determinada exceção? Nós vamos incluir outra ou não?” O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo: cabe rever ou não exceção, cabe avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social.

O estudo do Ipea foi feito com uma alíquota de 28% para o IVA, que já é bastante alta…

Isso tudo vai ser pesado. O Ipea, os institutos e a sociedade serão ouvidos. Até porque o texto final da reforma ainda não chegou ao Senado. Não chegou nem na minha mão.

Como a sra. avalia a possibilidade que foi incluída na reforma de os Estados criarem contribuições sobre bens primários? Há muita preocupação por parte dos setores exportadores, como o mineral e o agronegócio, de serem sobretaxados – onerando as vendas externas.

Assim que acabou a votação da reforma na Câmara, eu estive com dois parlamentares que são protagonistas da frente do agronegócio – um deles é o deputado Sérgio Souza (MDB-PR). Posso dizer que eles estavam extremamente satisfeitos e não discutiram a questão do fundo, muito pelo contrário. Um dos primeiros fundos que foram criados é o do Mato Grosso do Sul, que é um fundo que, depois, é todo reinjetado em obras, inclusive de infraestrutura, para escoamento da produção. Então, por meio dele, o Estado faz rodovias, faz pontes de concreto no lugar de pontes de madeira. Ou seja, é obra na veia. Mas esse é o tipo de emenda que pode ser rediscutida, assim como qualquer emenda pode ser rediscutida dentro do Senado.

A sra. acha que o envio antecipado da reforma da renda, como disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode atrapalhar a tramitação da reforma do consumo?

Sob a ótica do governo, sob a ótica do País, o Brasil tem pressa. Então, sob esse aspecto, a fala do ministro Haddad é uma fala política: o Brasil tem pressa. Se depender do governo, ele manda a reforma da renda no segundo semestre. Mas ele não vai mandar sem combinar, sem conversar com o presidente (da Câmara) Lira e com o presidente (do Senado) Pacheco. Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda. Ele estava manifestando um desejo da equipe econômica de já mandar em agosto ou setembro a reforma da renda, e essa manifestação é importante ele fazer. Se o Brasil tem pressa, a gente sabe que tem demandas, que esta é a segunda reforma importante para o Brasil, ele tem que sinalizar.

E as conversas com Lira e Pacheco sobre isso?

Numa democracia, onde nós defendemos o Executivo e o Legislativo, é preciso combinar o jogo. É óbvio que o segundo passo do ministro é conversar tanto com Lira quanto com Pacheco para ver o momento certo de mandar. O que ele sinalizou para o Brasil, por meio dessa fala, foi o seguinte: nós já estamos gestando a reforma. Ela está praticamente pronta e nós temos condições de mandar em agosto. Se ele vai mandar em agosto ou não, aí é uma uma decisão política que ele não vai tomar sozinho, né? Ele sabe disso; ele tem sido um bom operador deste processo. Entendi muito mais a fala dele como um desejo: se dependesse dele, ele mandaria, mas ele não vai mandar sem falar com o Congresso. Se der ruído, ele vai aguardar.

A reforma tributária prevê a criação de três fundos bilionários com aporte do governo, diluído ao longo do tempo. Mas, tendo em vista o tamanho do desafio fiscal do País, eles não deixam ainda mais difícil a tarefa de reequilibrar as contas?

Não, e eu vou dizer por quê. Primeiro que a reforma, para qualquer efeito, começa a vigorar em 2026. Nos fundos de compensação, é só quando os Estados começarem a ter perdas. Como só em 2026 começaria a transição gradual dos Estados, nós estamos falando de desembolso do governo federal daqui a anos. Quando o IVA começar a operar, o País já vai ter tido um ganho de produtividade, crescimento do PIB, uma estabilidade, segurança jurídica e aquecimento da economia que vai fazer a receita do Brasil crescer enormemente. Então, além de tudo, eu vou diluir em 20 anos (os tributos atuais seriam totalmente extintos em 2033).

O avanço da reforma no Congresso já começou a mexer com as expectativas econômicas. Isso muda os parâmetros na confecção do Orçamento de 2024? A sra. vai levar isso em conta na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias?

Nem poderia. Caindo o teto de gastos para o ano que vem e começando a vigorar um novo arcabouço, eu terei de trabalhar em cima das receitas realizadas até esse ano, com o aumento da receita que está sendo estimado agora no meio do ano. Vou poder gastar os 70% do aumento dessa receita. Então, eu não trabalho com expectativas de receita, porque o arcabouço não foi construído dessa forma. O que eu estou fazendo é um Orçamento baseado em despesas condicionadas à inflação realizada até o final do ano (essa autorização foi incluída na tramitação do texto no Congresso). Com isso, nós vamos mandar em breve, em questão de dias, para os ministérios finalísticos, o valor cheio que cada um teria ou terá. A partir daí, vou aguardar, por parte deles, a programação por ações e tudo mais que será estabelecido nessa grade.

BRASÍLIA – A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, alerta que abrir demais o número de exceções na reforma tributária pode “pôr por terra” muitos dos benefícios diretos que a proposta gera para o Brasil.

Entre esses benefícios, Tebet cita um maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). “A PEC pura geraria um crescimento real do PIB brasileiro de 1% ao ano a partir de 2026″, diz a ministra, citando estudo do Instituto Nacional de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Com as exceções, haverá o aumento da alíquota geral, e esse ganho será reduzido para 0,5% ao ano, nos próximos cinco anos, a partir de 2026.

Em entrevista ao Estadão, a ministra do MDB, que foi senadora pelo Mato Grosso do Sul, prevê que alguns setores de serviços, que dizem que terão aumento da carga tributária, serão mais “proativos” do que os próprios governadores durante a tramitação no Senado. Ela elogia o novo relator da reforma, Eduardo Braga (MDB-AM), que é do seu partido, e diz que ele terá capacidade de ouvir todos os setores.

“O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo – rever ou não exceção, avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social”, afirma.

Para Tebet, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não vai antecipar o envio da reforma do Imposto de Renda sem antes combinar com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),  e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda”, avalia. A seguir, os principais trechos da entrevista.

'A política surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária', diz Tebet Foto: Wilton Júnior/Estadão

Depois de muito ceticismo, a aprovação da reforma tributária na Câmara criou um ambiente mais favorável ao tema. São poucos os que ainda apostam contra. Como a sra. vê esse momento?

Imagina você lutar por 30 anos por uma reforma. Todos os governos tentaram e não conseguiram. E não ver essa reforma aprovada, e no centro da agenda legislativa e do governo, para que pudesse ser votada… Chega uma hora que até os mais crédulos se tornam céticos. Agora, por conta da capacidade de aglutinar duas reformas – que são a PEC 45 (Câmara) e a 110 (Senado) –, dando espaço para o diálogo e para recepcionar as demandas regionais, nunca vi um movimento tão propício para a aprovação. Precisou que o Brasil fosse para o fundo do poço institucionalmente, politicamente e economicamente para que todos dessem as mãos e construíssem um texto que pudesse, de alguma forma, abarcar e contemplar as diferentes realidades regionais do Brasil. Nesse processo, venceu a política. A política estava fazendo falta no Brasil. Ela surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária.

A sra. falou das demandas regionais, mas esse é justamente um ponto que pode ser problemático na votação do Senado – onde, diferentemente da Câmara, os Estados têm peso igual. Entre os deputados, não houve consenso sobre a divisão do fundo regional e a governança do Conselho Federativo, que vai centralizar a arrecadação do novo imposto. Não teme que a reforma possa ser paralisada?

É verdade. Os problemas da reforma no Senado, e eu participei por oito anos na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e na comissão especial da reforma tributária, eram dois: pelo lado dos Estados, há o eixo Sul-Sudeste, que consome, e o eixo Norte- Nordeste-Centro-Oeste, que mais produz do que consome. Então, essa conta não fechava nunca. Precisaria de duas compensações. A compensação de uma transição mais longa, em que nenhum Estado iria perder para os próximos 20 anos, criando um fundo. E também o Fundo de Desenvolvimento Regional. Isso foi construído no Senado e, agora, nessa PEC. Esse primeiro obstáculo nós já tiramos dentro do Senado, que pese alguns Estados ainda terem demandas específicas para resolver.

Qual o segundo problema?

A outra pedra no caminho da reforma – essa, sim, ainda a depender de muita construção, audiência pública, diálogo e tudo mais –, é em relação a alguns setores dos serviços, que estão dizendo que teriam aumento da carga tributária. Nesse aspecto, os setores serão mais proativos do que os próprios governadores. De um modo geral, a maioria dos governadores se sentiu contemplada com a reforma que saiu da Câmara. Agora, os setores que não foram contemplados na exceção, esses, sim, talvez poderão ter uma atuação maior dentro do Senado – o que faz parte do processo legislativo. Nesse aspecto, a reforma não poderia estar em melhores mãos: o senador Eduardo Braga é um homem experiente, já está no Senado há algum tempo, participou da discussão, conhece e vem de uma grande bancada e vai ter, sem dúvida nenhuma, por meio das audiências públicas, a capacidade de ouvir todos os setores.

Mas existe o problema de que as exceções podem levar ao aumento da alíquota padrão…

A única observação a fazer é que, quando a PEC 45 era pura, o estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que saiu agora, fresquinho – é o único estudo oficial que nós temos no Brasil –, mostra que, sem as exceções, a reforma geraria um crescimento real do PIB brasileiro, sozinha, de 1% ao ano a partir de 2026. Com as exceções – aí tem o aumento da alíquota geral para abarcar as exceções, legítimas, ninguém está dizendo que não –, reduz isso para 0,5% ao ano nos próximos cinco anos, a partir de 2026. Você diminui o crescimento do PIB, que é um dos pontos relevantes da reforma. Vamos lembrar que os efeitos diretos da reforma para a sociedade, para a economia, vão muito além do crescimento do PIB de médio e longo prazo. Nós estamos falando de uma reforma que vai gerar ganhos de produtividade que a gente não consegue avaliar.

Que efeitos são esses?

Diminui a complexidade, reduz o custo Brasil e o custo de conformidade, que é a questão das horas gastas (para que as empresas prestem contas ao Fisco). Além disso, a reforma vai diminuir o contencioso tributário, então vai diminuir a sonegação, aumentando a arrecadação sem aumentar imposto. E ainda aumenta a capacidade de investimento. Por que eu falo que ela é a reforma da indústria? Porque faz com que o setor volte a ter – pela redução do curso de conformidade e pela redução do custo Brasil – condições de competir igualmente com muitos países asiáticos. E a reforma vai reduzir, inclusive, essa questão de guerra fiscal entre os Estados. Então, ela engorda o caixa dos governadores. E o mais importante: a reforma vai melhorar a distribuição de renda. A única questão que fica é: abrir demais as exceções poderia pôr por terra muitos desses benefícios diretos que a reforma tributária gerará para o Brasil.

Na avaliação da sra., seria possível reverter alguma das exceções criadas pela Câmara durante a votação no Senado?

Não é questão de reverter. É a liberdade que o Senado terá de ter, como Casa revisora, a Casa em que você tem muitos ex-governadores, portanto pessoas que têm experiência administrativa, experiência de Executivo, que têm a capacidade de ouvir a sociedade e avaliar: “nós vamos mudar ou não determinada exceção? Nós vamos incluir outra ou não?” O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo: cabe rever ou não exceção, cabe avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social.

O estudo do Ipea foi feito com uma alíquota de 28% para o IVA, que já é bastante alta…

Isso tudo vai ser pesado. O Ipea, os institutos e a sociedade serão ouvidos. Até porque o texto final da reforma ainda não chegou ao Senado. Não chegou nem na minha mão.

Como a sra. avalia a possibilidade que foi incluída na reforma de os Estados criarem contribuições sobre bens primários? Há muita preocupação por parte dos setores exportadores, como o mineral e o agronegócio, de serem sobretaxados – onerando as vendas externas.

Assim que acabou a votação da reforma na Câmara, eu estive com dois parlamentares que são protagonistas da frente do agronegócio – um deles é o deputado Sérgio Souza (MDB-PR). Posso dizer que eles estavam extremamente satisfeitos e não discutiram a questão do fundo, muito pelo contrário. Um dos primeiros fundos que foram criados é o do Mato Grosso do Sul, que é um fundo que, depois, é todo reinjetado em obras, inclusive de infraestrutura, para escoamento da produção. Então, por meio dele, o Estado faz rodovias, faz pontes de concreto no lugar de pontes de madeira. Ou seja, é obra na veia. Mas esse é o tipo de emenda que pode ser rediscutida, assim como qualquer emenda pode ser rediscutida dentro do Senado.

A sra. acha que o envio antecipado da reforma da renda, como disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode atrapalhar a tramitação da reforma do consumo?

Sob a ótica do governo, sob a ótica do País, o Brasil tem pressa. Então, sob esse aspecto, a fala do ministro Haddad é uma fala política: o Brasil tem pressa. Se depender do governo, ele manda a reforma da renda no segundo semestre. Mas ele não vai mandar sem combinar, sem conversar com o presidente (da Câmara) Lira e com o presidente (do Senado) Pacheco. Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda. Ele estava manifestando um desejo da equipe econômica de já mandar em agosto ou setembro a reforma da renda, e essa manifestação é importante ele fazer. Se o Brasil tem pressa, a gente sabe que tem demandas, que esta é a segunda reforma importante para o Brasil, ele tem que sinalizar.

E as conversas com Lira e Pacheco sobre isso?

Numa democracia, onde nós defendemos o Executivo e o Legislativo, é preciso combinar o jogo. É óbvio que o segundo passo do ministro é conversar tanto com Lira quanto com Pacheco para ver o momento certo de mandar. O que ele sinalizou para o Brasil, por meio dessa fala, foi o seguinte: nós já estamos gestando a reforma. Ela está praticamente pronta e nós temos condições de mandar em agosto. Se ele vai mandar em agosto ou não, aí é uma uma decisão política que ele não vai tomar sozinho, né? Ele sabe disso; ele tem sido um bom operador deste processo. Entendi muito mais a fala dele como um desejo: se dependesse dele, ele mandaria, mas ele não vai mandar sem falar com o Congresso. Se der ruído, ele vai aguardar.

A reforma tributária prevê a criação de três fundos bilionários com aporte do governo, diluído ao longo do tempo. Mas, tendo em vista o tamanho do desafio fiscal do País, eles não deixam ainda mais difícil a tarefa de reequilibrar as contas?

Não, e eu vou dizer por quê. Primeiro que a reforma, para qualquer efeito, começa a vigorar em 2026. Nos fundos de compensação, é só quando os Estados começarem a ter perdas. Como só em 2026 começaria a transição gradual dos Estados, nós estamos falando de desembolso do governo federal daqui a anos. Quando o IVA começar a operar, o País já vai ter tido um ganho de produtividade, crescimento do PIB, uma estabilidade, segurança jurídica e aquecimento da economia que vai fazer a receita do Brasil crescer enormemente. Então, além de tudo, eu vou diluir em 20 anos (os tributos atuais seriam totalmente extintos em 2033).

O avanço da reforma no Congresso já começou a mexer com as expectativas econômicas. Isso muda os parâmetros na confecção do Orçamento de 2024? A sra. vai levar isso em conta na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias?

Nem poderia. Caindo o teto de gastos para o ano que vem e começando a vigorar um novo arcabouço, eu terei de trabalhar em cima das receitas realizadas até esse ano, com o aumento da receita que está sendo estimado agora no meio do ano. Vou poder gastar os 70% do aumento dessa receita. Então, eu não trabalho com expectativas de receita, porque o arcabouço não foi construído dessa forma. O que eu estou fazendo é um Orçamento baseado em despesas condicionadas à inflação realizada até o final do ano (essa autorização foi incluída na tramitação do texto no Congresso). Com isso, nós vamos mandar em breve, em questão de dias, para os ministérios finalísticos, o valor cheio que cada um teria ou terá. A partir daí, vou aguardar, por parte deles, a programação por ações e tudo mais que será estabelecido nessa grade.

BRASÍLIA – A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, alerta que abrir demais o número de exceções na reforma tributária pode “pôr por terra” muitos dos benefícios diretos que a proposta gera para o Brasil.

Entre esses benefícios, Tebet cita um maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). “A PEC pura geraria um crescimento real do PIB brasileiro de 1% ao ano a partir de 2026″, diz a ministra, citando estudo do Instituto Nacional de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Com as exceções, haverá o aumento da alíquota geral, e esse ganho será reduzido para 0,5% ao ano, nos próximos cinco anos, a partir de 2026.

Em entrevista ao Estadão, a ministra do MDB, que foi senadora pelo Mato Grosso do Sul, prevê que alguns setores de serviços, que dizem que terão aumento da carga tributária, serão mais “proativos” do que os próprios governadores durante a tramitação no Senado. Ela elogia o novo relator da reforma, Eduardo Braga (MDB-AM), que é do seu partido, e diz que ele terá capacidade de ouvir todos os setores.

“O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo – rever ou não exceção, avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social”, afirma.

Para Tebet, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não vai antecipar o envio da reforma do Imposto de Renda sem antes combinar com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),  e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda”, avalia. A seguir, os principais trechos da entrevista.

'A política surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária', diz Tebet Foto: Wilton Júnior/Estadão

Depois de muito ceticismo, a aprovação da reforma tributária na Câmara criou um ambiente mais favorável ao tema. São poucos os que ainda apostam contra. Como a sra. vê esse momento?

Imagina você lutar por 30 anos por uma reforma. Todos os governos tentaram e não conseguiram. E não ver essa reforma aprovada, e no centro da agenda legislativa e do governo, para que pudesse ser votada… Chega uma hora que até os mais crédulos se tornam céticos. Agora, por conta da capacidade de aglutinar duas reformas – que são a PEC 45 (Câmara) e a 110 (Senado) –, dando espaço para o diálogo e para recepcionar as demandas regionais, nunca vi um movimento tão propício para a aprovação. Precisou que o Brasil fosse para o fundo do poço institucionalmente, politicamente e economicamente para que todos dessem as mãos e construíssem um texto que pudesse, de alguma forma, abarcar e contemplar as diferentes realidades regionais do Brasil. Nesse processo, venceu a política. A política estava fazendo falta no Brasil. Ela surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária.

A sra. falou das demandas regionais, mas esse é justamente um ponto que pode ser problemático na votação do Senado – onde, diferentemente da Câmara, os Estados têm peso igual. Entre os deputados, não houve consenso sobre a divisão do fundo regional e a governança do Conselho Federativo, que vai centralizar a arrecadação do novo imposto. Não teme que a reforma possa ser paralisada?

É verdade. Os problemas da reforma no Senado, e eu participei por oito anos na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e na comissão especial da reforma tributária, eram dois: pelo lado dos Estados, há o eixo Sul-Sudeste, que consome, e o eixo Norte- Nordeste-Centro-Oeste, que mais produz do que consome. Então, essa conta não fechava nunca. Precisaria de duas compensações. A compensação de uma transição mais longa, em que nenhum Estado iria perder para os próximos 20 anos, criando um fundo. E também o Fundo de Desenvolvimento Regional. Isso foi construído no Senado e, agora, nessa PEC. Esse primeiro obstáculo nós já tiramos dentro do Senado, que pese alguns Estados ainda terem demandas específicas para resolver.

Qual o segundo problema?

A outra pedra no caminho da reforma – essa, sim, ainda a depender de muita construção, audiência pública, diálogo e tudo mais –, é em relação a alguns setores dos serviços, que estão dizendo que teriam aumento da carga tributária. Nesse aspecto, os setores serão mais proativos do que os próprios governadores. De um modo geral, a maioria dos governadores se sentiu contemplada com a reforma que saiu da Câmara. Agora, os setores que não foram contemplados na exceção, esses, sim, talvez poderão ter uma atuação maior dentro do Senado – o que faz parte do processo legislativo. Nesse aspecto, a reforma não poderia estar em melhores mãos: o senador Eduardo Braga é um homem experiente, já está no Senado há algum tempo, participou da discussão, conhece e vem de uma grande bancada e vai ter, sem dúvida nenhuma, por meio das audiências públicas, a capacidade de ouvir todos os setores.

Mas existe o problema de que as exceções podem levar ao aumento da alíquota padrão…

A única observação a fazer é que, quando a PEC 45 era pura, o estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que saiu agora, fresquinho – é o único estudo oficial que nós temos no Brasil –, mostra que, sem as exceções, a reforma geraria um crescimento real do PIB brasileiro, sozinha, de 1% ao ano a partir de 2026. Com as exceções – aí tem o aumento da alíquota geral para abarcar as exceções, legítimas, ninguém está dizendo que não –, reduz isso para 0,5% ao ano nos próximos cinco anos, a partir de 2026. Você diminui o crescimento do PIB, que é um dos pontos relevantes da reforma. Vamos lembrar que os efeitos diretos da reforma para a sociedade, para a economia, vão muito além do crescimento do PIB de médio e longo prazo. Nós estamos falando de uma reforma que vai gerar ganhos de produtividade que a gente não consegue avaliar.

Que efeitos são esses?

Diminui a complexidade, reduz o custo Brasil e o custo de conformidade, que é a questão das horas gastas (para que as empresas prestem contas ao Fisco). Além disso, a reforma vai diminuir o contencioso tributário, então vai diminuir a sonegação, aumentando a arrecadação sem aumentar imposto. E ainda aumenta a capacidade de investimento. Por que eu falo que ela é a reforma da indústria? Porque faz com que o setor volte a ter – pela redução do curso de conformidade e pela redução do custo Brasil – condições de competir igualmente com muitos países asiáticos. E a reforma vai reduzir, inclusive, essa questão de guerra fiscal entre os Estados. Então, ela engorda o caixa dos governadores. E o mais importante: a reforma vai melhorar a distribuição de renda. A única questão que fica é: abrir demais as exceções poderia pôr por terra muitos desses benefícios diretos que a reforma tributária gerará para o Brasil.

Na avaliação da sra., seria possível reverter alguma das exceções criadas pela Câmara durante a votação no Senado?

Não é questão de reverter. É a liberdade que o Senado terá de ter, como Casa revisora, a Casa em que você tem muitos ex-governadores, portanto pessoas que têm experiência administrativa, experiência de Executivo, que têm a capacidade de ouvir a sociedade e avaliar: “nós vamos mudar ou não determinada exceção? Nós vamos incluir outra ou não?” O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo: cabe rever ou não exceção, cabe avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social.

O estudo do Ipea foi feito com uma alíquota de 28% para o IVA, que já é bastante alta…

Isso tudo vai ser pesado. O Ipea, os institutos e a sociedade serão ouvidos. Até porque o texto final da reforma ainda não chegou ao Senado. Não chegou nem na minha mão.

Como a sra. avalia a possibilidade que foi incluída na reforma de os Estados criarem contribuições sobre bens primários? Há muita preocupação por parte dos setores exportadores, como o mineral e o agronegócio, de serem sobretaxados – onerando as vendas externas.

Assim que acabou a votação da reforma na Câmara, eu estive com dois parlamentares que são protagonistas da frente do agronegócio – um deles é o deputado Sérgio Souza (MDB-PR). Posso dizer que eles estavam extremamente satisfeitos e não discutiram a questão do fundo, muito pelo contrário. Um dos primeiros fundos que foram criados é o do Mato Grosso do Sul, que é um fundo que, depois, é todo reinjetado em obras, inclusive de infraestrutura, para escoamento da produção. Então, por meio dele, o Estado faz rodovias, faz pontes de concreto no lugar de pontes de madeira. Ou seja, é obra na veia. Mas esse é o tipo de emenda que pode ser rediscutida, assim como qualquer emenda pode ser rediscutida dentro do Senado.

A sra. acha que o envio antecipado da reforma da renda, como disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode atrapalhar a tramitação da reforma do consumo?

Sob a ótica do governo, sob a ótica do País, o Brasil tem pressa. Então, sob esse aspecto, a fala do ministro Haddad é uma fala política: o Brasil tem pressa. Se depender do governo, ele manda a reforma da renda no segundo semestre. Mas ele não vai mandar sem combinar, sem conversar com o presidente (da Câmara) Lira e com o presidente (do Senado) Pacheco. Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda. Ele estava manifestando um desejo da equipe econômica de já mandar em agosto ou setembro a reforma da renda, e essa manifestação é importante ele fazer. Se o Brasil tem pressa, a gente sabe que tem demandas, que esta é a segunda reforma importante para o Brasil, ele tem que sinalizar.

E as conversas com Lira e Pacheco sobre isso?

Numa democracia, onde nós defendemos o Executivo e o Legislativo, é preciso combinar o jogo. É óbvio que o segundo passo do ministro é conversar tanto com Lira quanto com Pacheco para ver o momento certo de mandar. O que ele sinalizou para o Brasil, por meio dessa fala, foi o seguinte: nós já estamos gestando a reforma. Ela está praticamente pronta e nós temos condições de mandar em agosto. Se ele vai mandar em agosto ou não, aí é uma uma decisão política que ele não vai tomar sozinho, né? Ele sabe disso; ele tem sido um bom operador deste processo. Entendi muito mais a fala dele como um desejo: se dependesse dele, ele mandaria, mas ele não vai mandar sem falar com o Congresso. Se der ruído, ele vai aguardar.

A reforma tributária prevê a criação de três fundos bilionários com aporte do governo, diluído ao longo do tempo. Mas, tendo em vista o tamanho do desafio fiscal do País, eles não deixam ainda mais difícil a tarefa de reequilibrar as contas?

Não, e eu vou dizer por quê. Primeiro que a reforma, para qualquer efeito, começa a vigorar em 2026. Nos fundos de compensação, é só quando os Estados começarem a ter perdas. Como só em 2026 começaria a transição gradual dos Estados, nós estamos falando de desembolso do governo federal daqui a anos. Quando o IVA começar a operar, o País já vai ter tido um ganho de produtividade, crescimento do PIB, uma estabilidade, segurança jurídica e aquecimento da economia que vai fazer a receita do Brasil crescer enormemente. Então, além de tudo, eu vou diluir em 20 anos (os tributos atuais seriam totalmente extintos em 2033).

O avanço da reforma no Congresso já começou a mexer com as expectativas econômicas. Isso muda os parâmetros na confecção do Orçamento de 2024? A sra. vai levar isso em conta na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias?

Nem poderia. Caindo o teto de gastos para o ano que vem e começando a vigorar um novo arcabouço, eu terei de trabalhar em cima das receitas realizadas até esse ano, com o aumento da receita que está sendo estimado agora no meio do ano. Vou poder gastar os 70% do aumento dessa receita. Então, eu não trabalho com expectativas de receita, porque o arcabouço não foi construído dessa forma. O que eu estou fazendo é um Orçamento baseado em despesas condicionadas à inflação realizada até o final do ano (essa autorização foi incluída na tramitação do texto no Congresso). Com isso, nós vamos mandar em breve, em questão de dias, para os ministérios finalísticos, o valor cheio que cada um teria ou terá. A partir daí, vou aguardar, por parte deles, a programação por ações e tudo mais que será estabelecido nessa grade.

BRASÍLIA – A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, alerta que abrir demais o número de exceções na reforma tributária pode “pôr por terra” muitos dos benefícios diretos que a proposta gera para o Brasil.

Entre esses benefícios, Tebet cita um maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). “A PEC pura geraria um crescimento real do PIB brasileiro de 1% ao ano a partir de 2026″, diz a ministra, citando estudo do Instituto Nacional de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Com as exceções, haverá o aumento da alíquota geral, e esse ganho será reduzido para 0,5% ao ano, nos próximos cinco anos, a partir de 2026.

Em entrevista ao Estadão, a ministra do MDB, que foi senadora pelo Mato Grosso do Sul, prevê que alguns setores de serviços, que dizem que terão aumento da carga tributária, serão mais “proativos” do que os próprios governadores durante a tramitação no Senado. Ela elogia o novo relator da reforma, Eduardo Braga (MDB-AM), que é do seu partido, e diz que ele terá capacidade de ouvir todos os setores.

“O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo – rever ou não exceção, avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social”, afirma.

Para Tebet, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não vai antecipar o envio da reforma do Imposto de Renda sem antes combinar com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),  e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda”, avalia. A seguir, os principais trechos da entrevista.

'A política surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária', diz Tebet Foto: Wilton Júnior/Estadão

Depois de muito ceticismo, a aprovação da reforma tributária na Câmara criou um ambiente mais favorável ao tema. São poucos os que ainda apostam contra. Como a sra. vê esse momento?

Imagina você lutar por 30 anos por uma reforma. Todos os governos tentaram e não conseguiram. E não ver essa reforma aprovada, e no centro da agenda legislativa e do governo, para que pudesse ser votada… Chega uma hora que até os mais crédulos se tornam céticos. Agora, por conta da capacidade de aglutinar duas reformas – que são a PEC 45 (Câmara) e a 110 (Senado) –, dando espaço para o diálogo e para recepcionar as demandas regionais, nunca vi um movimento tão propício para a aprovação. Precisou que o Brasil fosse para o fundo do poço institucionalmente, politicamente e economicamente para que todos dessem as mãos e construíssem um texto que pudesse, de alguma forma, abarcar e contemplar as diferentes realidades regionais do Brasil. Nesse processo, venceu a política. A política estava fazendo falta no Brasil. Ela surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária.

A sra. falou das demandas regionais, mas esse é justamente um ponto que pode ser problemático na votação do Senado – onde, diferentemente da Câmara, os Estados têm peso igual. Entre os deputados, não houve consenso sobre a divisão do fundo regional e a governança do Conselho Federativo, que vai centralizar a arrecadação do novo imposto. Não teme que a reforma possa ser paralisada?

É verdade. Os problemas da reforma no Senado, e eu participei por oito anos na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e na comissão especial da reforma tributária, eram dois: pelo lado dos Estados, há o eixo Sul-Sudeste, que consome, e o eixo Norte- Nordeste-Centro-Oeste, que mais produz do que consome. Então, essa conta não fechava nunca. Precisaria de duas compensações. A compensação de uma transição mais longa, em que nenhum Estado iria perder para os próximos 20 anos, criando um fundo. E também o Fundo de Desenvolvimento Regional. Isso foi construído no Senado e, agora, nessa PEC. Esse primeiro obstáculo nós já tiramos dentro do Senado, que pese alguns Estados ainda terem demandas específicas para resolver.

Qual o segundo problema?

A outra pedra no caminho da reforma – essa, sim, ainda a depender de muita construção, audiência pública, diálogo e tudo mais –, é em relação a alguns setores dos serviços, que estão dizendo que teriam aumento da carga tributária. Nesse aspecto, os setores serão mais proativos do que os próprios governadores. De um modo geral, a maioria dos governadores se sentiu contemplada com a reforma que saiu da Câmara. Agora, os setores que não foram contemplados na exceção, esses, sim, talvez poderão ter uma atuação maior dentro do Senado – o que faz parte do processo legislativo. Nesse aspecto, a reforma não poderia estar em melhores mãos: o senador Eduardo Braga é um homem experiente, já está no Senado há algum tempo, participou da discussão, conhece e vem de uma grande bancada e vai ter, sem dúvida nenhuma, por meio das audiências públicas, a capacidade de ouvir todos os setores.

Mas existe o problema de que as exceções podem levar ao aumento da alíquota padrão…

A única observação a fazer é que, quando a PEC 45 era pura, o estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que saiu agora, fresquinho – é o único estudo oficial que nós temos no Brasil –, mostra que, sem as exceções, a reforma geraria um crescimento real do PIB brasileiro, sozinha, de 1% ao ano a partir de 2026. Com as exceções – aí tem o aumento da alíquota geral para abarcar as exceções, legítimas, ninguém está dizendo que não –, reduz isso para 0,5% ao ano nos próximos cinco anos, a partir de 2026. Você diminui o crescimento do PIB, que é um dos pontos relevantes da reforma. Vamos lembrar que os efeitos diretos da reforma para a sociedade, para a economia, vão muito além do crescimento do PIB de médio e longo prazo. Nós estamos falando de uma reforma que vai gerar ganhos de produtividade que a gente não consegue avaliar.

Que efeitos são esses?

Diminui a complexidade, reduz o custo Brasil e o custo de conformidade, que é a questão das horas gastas (para que as empresas prestem contas ao Fisco). Além disso, a reforma vai diminuir o contencioso tributário, então vai diminuir a sonegação, aumentando a arrecadação sem aumentar imposto. E ainda aumenta a capacidade de investimento. Por que eu falo que ela é a reforma da indústria? Porque faz com que o setor volte a ter – pela redução do curso de conformidade e pela redução do custo Brasil – condições de competir igualmente com muitos países asiáticos. E a reforma vai reduzir, inclusive, essa questão de guerra fiscal entre os Estados. Então, ela engorda o caixa dos governadores. E o mais importante: a reforma vai melhorar a distribuição de renda. A única questão que fica é: abrir demais as exceções poderia pôr por terra muitos desses benefícios diretos que a reforma tributária gerará para o Brasil.

Na avaliação da sra., seria possível reverter alguma das exceções criadas pela Câmara durante a votação no Senado?

Não é questão de reverter. É a liberdade que o Senado terá de ter, como Casa revisora, a Casa em que você tem muitos ex-governadores, portanto pessoas que têm experiência administrativa, experiência de Executivo, que têm a capacidade de ouvir a sociedade e avaliar: “nós vamos mudar ou não determinada exceção? Nós vamos incluir outra ou não?” O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo: cabe rever ou não exceção, cabe avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social.

O estudo do Ipea foi feito com uma alíquota de 28% para o IVA, que já é bastante alta…

Isso tudo vai ser pesado. O Ipea, os institutos e a sociedade serão ouvidos. Até porque o texto final da reforma ainda não chegou ao Senado. Não chegou nem na minha mão.

Como a sra. avalia a possibilidade que foi incluída na reforma de os Estados criarem contribuições sobre bens primários? Há muita preocupação por parte dos setores exportadores, como o mineral e o agronegócio, de serem sobretaxados – onerando as vendas externas.

Assim que acabou a votação da reforma na Câmara, eu estive com dois parlamentares que são protagonistas da frente do agronegócio – um deles é o deputado Sérgio Souza (MDB-PR). Posso dizer que eles estavam extremamente satisfeitos e não discutiram a questão do fundo, muito pelo contrário. Um dos primeiros fundos que foram criados é o do Mato Grosso do Sul, que é um fundo que, depois, é todo reinjetado em obras, inclusive de infraestrutura, para escoamento da produção. Então, por meio dele, o Estado faz rodovias, faz pontes de concreto no lugar de pontes de madeira. Ou seja, é obra na veia. Mas esse é o tipo de emenda que pode ser rediscutida, assim como qualquer emenda pode ser rediscutida dentro do Senado.

A sra. acha que o envio antecipado da reforma da renda, como disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode atrapalhar a tramitação da reforma do consumo?

Sob a ótica do governo, sob a ótica do País, o Brasil tem pressa. Então, sob esse aspecto, a fala do ministro Haddad é uma fala política: o Brasil tem pressa. Se depender do governo, ele manda a reforma da renda no segundo semestre. Mas ele não vai mandar sem combinar, sem conversar com o presidente (da Câmara) Lira e com o presidente (do Senado) Pacheco. Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda. Ele estava manifestando um desejo da equipe econômica de já mandar em agosto ou setembro a reforma da renda, e essa manifestação é importante ele fazer. Se o Brasil tem pressa, a gente sabe que tem demandas, que esta é a segunda reforma importante para o Brasil, ele tem que sinalizar.

E as conversas com Lira e Pacheco sobre isso?

Numa democracia, onde nós defendemos o Executivo e o Legislativo, é preciso combinar o jogo. É óbvio que o segundo passo do ministro é conversar tanto com Lira quanto com Pacheco para ver o momento certo de mandar. O que ele sinalizou para o Brasil, por meio dessa fala, foi o seguinte: nós já estamos gestando a reforma. Ela está praticamente pronta e nós temos condições de mandar em agosto. Se ele vai mandar em agosto ou não, aí é uma uma decisão política que ele não vai tomar sozinho, né? Ele sabe disso; ele tem sido um bom operador deste processo. Entendi muito mais a fala dele como um desejo: se dependesse dele, ele mandaria, mas ele não vai mandar sem falar com o Congresso. Se der ruído, ele vai aguardar.

A reforma tributária prevê a criação de três fundos bilionários com aporte do governo, diluído ao longo do tempo. Mas, tendo em vista o tamanho do desafio fiscal do País, eles não deixam ainda mais difícil a tarefa de reequilibrar as contas?

Não, e eu vou dizer por quê. Primeiro que a reforma, para qualquer efeito, começa a vigorar em 2026. Nos fundos de compensação, é só quando os Estados começarem a ter perdas. Como só em 2026 começaria a transição gradual dos Estados, nós estamos falando de desembolso do governo federal daqui a anos. Quando o IVA começar a operar, o País já vai ter tido um ganho de produtividade, crescimento do PIB, uma estabilidade, segurança jurídica e aquecimento da economia que vai fazer a receita do Brasil crescer enormemente. Então, além de tudo, eu vou diluir em 20 anos (os tributos atuais seriam totalmente extintos em 2033).

O avanço da reforma no Congresso já começou a mexer com as expectativas econômicas. Isso muda os parâmetros na confecção do Orçamento de 2024? A sra. vai levar isso em conta na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias?

Nem poderia. Caindo o teto de gastos para o ano que vem e começando a vigorar um novo arcabouço, eu terei de trabalhar em cima das receitas realizadas até esse ano, com o aumento da receita que está sendo estimado agora no meio do ano. Vou poder gastar os 70% do aumento dessa receita. Então, eu não trabalho com expectativas de receita, porque o arcabouço não foi construído dessa forma. O que eu estou fazendo é um Orçamento baseado em despesas condicionadas à inflação realizada até o final do ano (essa autorização foi incluída na tramitação do texto no Congresso). Com isso, nós vamos mandar em breve, em questão de dias, para os ministérios finalísticos, o valor cheio que cada um teria ou terá. A partir daí, vou aguardar, por parte deles, a programação por ações e tudo mais que será estabelecido nessa grade.

BRASÍLIA – A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, alerta que abrir demais o número de exceções na reforma tributária pode “pôr por terra” muitos dos benefícios diretos que a proposta gera para o Brasil.

Entre esses benefícios, Tebet cita um maior crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). “A PEC pura geraria um crescimento real do PIB brasileiro de 1% ao ano a partir de 2026″, diz a ministra, citando estudo do Instituto Nacional de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Com as exceções, haverá o aumento da alíquota geral, e esse ganho será reduzido para 0,5% ao ano, nos próximos cinco anos, a partir de 2026.

Em entrevista ao Estadão, a ministra do MDB, que foi senadora pelo Mato Grosso do Sul, prevê que alguns setores de serviços, que dizem que terão aumento da carga tributária, serão mais “proativos” do que os próprios governadores durante a tramitação no Senado. Ela elogia o novo relator da reforma, Eduardo Braga (MDB-AM), que é do seu partido, e diz que ele terá capacidade de ouvir todos os setores.

“O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo – rever ou não exceção, avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social”, afirma.

Para Tebet, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não vai antecipar o envio da reforma do Imposto de Renda sem antes combinar com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),  e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda”, avalia. A seguir, os principais trechos da entrevista.

'A política surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária', diz Tebet Foto: Wilton Júnior/Estadão

Depois de muito ceticismo, a aprovação da reforma tributária na Câmara criou um ambiente mais favorável ao tema. São poucos os que ainda apostam contra. Como a sra. vê esse momento?

Imagina você lutar por 30 anos por uma reforma. Todos os governos tentaram e não conseguiram. E não ver essa reforma aprovada, e no centro da agenda legislativa e do governo, para que pudesse ser votada… Chega uma hora que até os mais crédulos se tornam céticos. Agora, por conta da capacidade de aglutinar duas reformas – que são a PEC 45 (Câmara) e a 110 (Senado) –, dando espaço para o diálogo e para recepcionar as demandas regionais, nunca vi um movimento tão propício para a aprovação. Precisou que o Brasil fosse para o fundo do poço institucionalmente, politicamente e economicamente para que todos dessem as mãos e construíssem um texto que pudesse, de alguma forma, abarcar e contemplar as diferentes realidades regionais do Brasil. Nesse processo, venceu a política. A política estava fazendo falta no Brasil. Ela surgiu no momento que o País mais precisou. E com a pauta mais relevante, que é a reforma tributária.

A sra. falou das demandas regionais, mas esse é justamente um ponto que pode ser problemático na votação do Senado – onde, diferentemente da Câmara, os Estados têm peso igual. Entre os deputados, não houve consenso sobre a divisão do fundo regional e a governança do Conselho Federativo, que vai centralizar a arrecadação do novo imposto. Não teme que a reforma possa ser paralisada?

É verdade. Os problemas da reforma no Senado, e eu participei por oito anos na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e na comissão especial da reforma tributária, eram dois: pelo lado dos Estados, há o eixo Sul-Sudeste, que consome, e o eixo Norte- Nordeste-Centro-Oeste, que mais produz do que consome. Então, essa conta não fechava nunca. Precisaria de duas compensações. A compensação de uma transição mais longa, em que nenhum Estado iria perder para os próximos 20 anos, criando um fundo. E também o Fundo de Desenvolvimento Regional. Isso foi construído no Senado e, agora, nessa PEC. Esse primeiro obstáculo nós já tiramos dentro do Senado, que pese alguns Estados ainda terem demandas específicas para resolver.

Qual o segundo problema?

A outra pedra no caminho da reforma – essa, sim, ainda a depender de muita construção, audiência pública, diálogo e tudo mais –, é em relação a alguns setores dos serviços, que estão dizendo que teriam aumento da carga tributária. Nesse aspecto, os setores serão mais proativos do que os próprios governadores. De um modo geral, a maioria dos governadores se sentiu contemplada com a reforma que saiu da Câmara. Agora, os setores que não foram contemplados na exceção, esses, sim, talvez poderão ter uma atuação maior dentro do Senado – o que faz parte do processo legislativo. Nesse aspecto, a reforma não poderia estar em melhores mãos: o senador Eduardo Braga é um homem experiente, já está no Senado há algum tempo, participou da discussão, conhece e vem de uma grande bancada e vai ter, sem dúvida nenhuma, por meio das audiências públicas, a capacidade de ouvir todos os setores.

Mas existe o problema de que as exceções podem levar ao aumento da alíquota padrão…

A única observação a fazer é que, quando a PEC 45 era pura, o estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que saiu agora, fresquinho – é o único estudo oficial que nós temos no Brasil –, mostra que, sem as exceções, a reforma geraria um crescimento real do PIB brasileiro, sozinha, de 1% ao ano a partir de 2026. Com as exceções – aí tem o aumento da alíquota geral para abarcar as exceções, legítimas, ninguém está dizendo que não –, reduz isso para 0,5% ao ano nos próximos cinco anos, a partir de 2026. Você diminui o crescimento do PIB, que é um dos pontos relevantes da reforma. Vamos lembrar que os efeitos diretos da reforma para a sociedade, para a economia, vão muito além do crescimento do PIB de médio e longo prazo. Nós estamos falando de uma reforma que vai gerar ganhos de produtividade que a gente não consegue avaliar.

Que efeitos são esses?

Diminui a complexidade, reduz o custo Brasil e o custo de conformidade, que é a questão das horas gastas (para que as empresas prestem contas ao Fisco). Além disso, a reforma vai diminuir o contencioso tributário, então vai diminuir a sonegação, aumentando a arrecadação sem aumentar imposto. E ainda aumenta a capacidade de investimento. Por que eu falo que ela é a reforma da indústria? Porque faz com que o setor volte a ter – pela redução do curso de conformidade e pela redução do custo Brasil – condições de competir igualmente com muitos países asiáticos. E a reforma vai reduzir, inclusive, essa questão de guerra fiscal entre os Estados. Então, ela engorda o caixa dos governadores. E o mais importante: a reforma vai melhorar a distribuição de renda. A única questão que fica é: abrir demais as exceções poderia pôr por terra muitos desses benefícios diretos que a reforma tributária gerará para o Brasil.

Na avaliação da sra., seria possível reverter alguma das exceções criadas pela Câmara durante a votação no Senado?

Não é questão de reverter. É a liberdade que o Senado terá de ter, como Casa revisora, a Casa em que você tem muitos ex-governadores, portanto pessoas que têm experiência administrativa, experiência de Executivo, que têm a capacidade de ouvir a sociedade e avaliar: “nós vamos mudar ou não determinada exceção? Nós vamos incluir outra ou não?” O jogo vai começar a ser jogado no Senado a partir de agosto e aí cabe tudo: cabe rever ou não exceção, cabe avaliar se tira uma exceção e coloca outra, avaliar qual garante mais justiça social.

O estudo do Ipea foi feito com uma alíquota de 28% para o IVA, que já é bastante alta…

Isso tudo vai ser pesado. O Ipea, os institutos e a sociedade serão ouvidos. Até porque o texto final da reforma ainda não chegou ao Senado. Não chegou nem na minha mão.

Como a sra. avalia a possibilidade que foi incluída na reforma de os Estados criarem contribuições sobre bens primários? Há muita preocupação por parte dos setores exportadores, como o mineral e o agronegócio, de serem sobretaxados – onerando as vendas externas.

Assim que acabou a votação da reforma na Câmara, eu estive com dois parlamentares que são protagonistas da frente do agronegócio – um deles é o deputado Sérgio Souza (MDB-PR). Posso dizer que eles estavam extremamente satisfeitos e não discutiram a questão do fundo, muito pelo contrário. Um dos primeiros fundos que foram criados é o do Mato Grosso do Sul, que é um fundo que, depois, é todo reinjetado em obras, inclusive de infraestrutura, para escoamento da produção. Então, por meio dele, o Estado faz rodovias, faz pontes de concreto no lugar de pontes de madeira. Ou seja, é obra na veia. Mas esse é o tipo de emenda que pode ser rediscutida, assim como qualquer emenda pode ser rediscutida dentro do Senado.

A sra. acha que o envio antecipado da reforma da renda, como disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode atrapalhar a tramitação da reforma do consumo?

Sob a ótica do governo, sob a ótica do País, o Brasil tem pressa. Então, sob esse aspecto, a fala do ministro Haddad é uma fala política: o Brasil tem pressa. Se depender do governo, ele manda a reforma da renda no segundo semestre. Mas ele não vai mandar sem combinar, sem conversar com o presidente (da Câmara) Lira e com o presidente (do Senado) Pacheco. Se, porventura, ele sentir que isso vai atrapalhar a votação da reforma do consumo no Senado, ele aguarda. Ele estava manifestando um desejo da equipe econômica de já mandar em agosto ou setembro a reforma da renda, e essa manifestação é importante ele fazer. Se o Brasil tem pressa, a gente sabe que tem demandas, que esta é a segunda reforma importante para o Brasil, ele tem que sinalizar.

E as conversas com Lira e Pacheco sobre isso?

Numa democracia, onde nós defendemos o Executivo e o Legislativo, é preciso combinar o jogo. É óbvio que o segundo passo do ministro é conversar tanto com Lira quanto com Pacheco para ver o momento certo de mandar. O que ele sinalizou para o Brasil, por meio dessa fala, foi o seguinte: nós já estamos gestando a reforma. Ela está praticamente pronta e nós temos condições de mandar em agosto. Se ele vai mandar em agosto ou não, aí é uma uma decisão política que ele não vai tomar sozinho, né? Ele sabe disso; ele tem sido um bom operador deste processo. Entendi muito mais a fala dele como um desejo: se dependesse dele, ele mandaria, mas ele não vai mandar sem falar com o Congresso. Se der ruído, ele vai aguardar.

A reforma tributária prevê a criação de três fundos bilionários com aporte do governo, diluído ao longo do tempo. Mas, tendo em vista o tamanho do desafio fiscal do País, eles não deixam ainda mais difícil a tarefa de reequilibrar as contas?

Não, e eu vou dizer por quê. Primeiro que a reforma, para qualquer efeito, começa a vigorar em 2026. Nos fundos de compensação, é só quando os Estados começarem a ter perdas. Como só em 2026 começaria a transição gradual dos Estados, nós estamos falando de desembolso do governo federal daqui a anos. Quando o IVA começar a operar, o País já vai ter tido um ganho de produtividade, crescimento do PIB, uma estabilidade, segurança jurídica e aquecimento da economia que vai fazer a receita do Brasil crescer enormemente. Então, além de tudo, eu vou diluir em 20 anos (os tributos atuais seriam totalmente extintos em 2033).

O avanço da reforma no Congresso já começou a mexer com as expectativas econômicas. Isso muda os parâmetros na confecção do Orçamento de 2024? A sra. vai levar isso em conta na elaboração da Lei de Diretrizes Orçamentárias?

Nem poderia. Caindo o teto de gastos para o ano que vem e começando a vigorar um novo arcabouço, eu terei de trabalhar em cima das receitas realizadas até esse ano, com o aumento da receita que está sendo estimado agora no meio do ano. Vou poder gastar os 70% do aumento dessa receita. Então, eu não trabalho com expectativas de receita, porque o arcabouço não foi construído dessa forma. O que eu estou fazendo é um Orçamento baseado em despesas condicionadas à inflação realizada até o final do ano (essa autorização foi incluída na tramitação do texto no Congresso). Com isso, nós vamos mandar em breve, em questão de dias, para os ministérios finalísticos, o valor cheio que cada um teria ou terá. A partir daí, vou aguardar, por parte deles, a programação por ações e tudo mais que será estabelecido nessa grade.

Entrevista por Adriana Fernandes

Repórter especial de Economia em Brasília

Mariana Carneiro

Repórter especial de Economia em Brasília. Foi editora da Coluna do Estadão. Graduada em comunicação social pela PUC-Rio, com MBA em mercado financeiro pela B3 e especialização em análise de conjuntura econômica pela UFRJ. Foi correspondente na Argentina (2015) pela Folha de S.Paulo e também trabalhou em O Globo, TV Globo, JB e Jornal do Commercio.

Bianca Lima

Repórter especial do Estadão em Brasília, com experiência em macroeconomia, contas públicas e tributação. Foi repórter da GloboNews e do g1 e bolsista do International Center for Journalists (ICFJ), com sede em Washington. Tem MBA em economia e mercado financeiro pela B3. Vencedora dos prêmios CNH, Abecip, FNP e Estadão.

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