É indiscutível que o sistema tributário brasileiro tem muitos problemas, agravados, aliás, por incompreensíveis decisões judiciais e pela mora legislativa em relação a leis complementares, previstas na Constituição de 1988 e jamais editadas. Esse quadro propicia a construção de falácias, saltos lógicos e desinformações de todos os gêneros.
Aponta-se, como evidência da complexidade do sistema tributário, a existência de alíquotas distintas de IPI para produtos de perfumaria. Se isso fosse um problema era algo que seria resolvido com um modesto decreto.
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Outra evidência, inclusive utilizada em peça veiculada na internet, é o caso dos sapatos Crocs. Afirma-se que mudanças na classificação desses sapatos resultou em autuações fiscais. Erro palmar. A questão não era tributária. Tratava-se da aplicação pela Câmara de Comércio Exterior (Camex) de direitos antidumping em importações de calçado da China. Além disso, a classificação já tinha gerado controvérsias no âmbito internacional, tendo demandado deliberação específica na Organização Mundial de Aduanas, em Bruxelas.
A pesquisa Doing Business, do Banco Mundial, é recorrentemente citada para justificar projetos de reforma tributária, sob a inverossímil alegação de que o pagamento de impostos no Brasil exigia mais de 2 mil horas anuais. Afora ser matéria relacionada com o burocratismo e não com a natureza dos tributos, cerca de 97% dos contribuintes são optantes do Simples e do lucro presumido que cumprem suas obrigações com muita facilidade, graças à simplicidade dos regimes e aos eficientes aplicativos disponíveis.
De resto, a pesquisa foi “descontinuada” pelo banco, em 2021, em virtude de fraudes e inconsistências detectadas por auditoria independente.
Fala-se, também, em aumentar a arrecadação mediante revogação de benefícios fiscais. Essa pretensão, contudo, encerra várias armadilhas: não é claro o conceito de renúncia fiscal, que muitas vezes inclui situações que decorrem de preceito constitucional de observância obrigatória, como a tributação das micro e pequenas empresas; a extinção de um benefício fiscal pode implicar o encerramento do negócio beneficiado, sem proveito para a arrecadação; o Código Tributário Nacional veda o cancelamento de benefício dado por prazo certo e sob condições.
Vence esse torneio de desinformações o anúncio de que uma reforma tributária, cujo escopo a rigor se desconhece, promoverá um crescimento de 10% no PIB brasileiro, em 15 anos. Há, também, quem acredite em duendes.