Um dos principais gatilhos no curtíssimo prazo para os preços dos ativos brasileiros, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que autorizará despesas sociais fora do teto de gastos em 2023 já causou bastante ruído no mercado, mas não está claro se a percepção dos investidores sobre o risco fiscal no Brasil ainda pode piorar quando o documento for apresentado pelo governo de transição, provavelmente hoje.
Até agora, as notícias envolvendo a chamada PEC de Transição e a fala do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva só surpreenderam negativamente os investidores. Não à toa, a Bolsa de Valores encerrou a semana passada com perda de 5%, e o dólar disparou 5,36%.
Todavia, muitos analistas começam a desconfiar de que, não somente quanto ao teor da PEC, como também ao nome do novo ministro da Fazenda, outro gatilho crucial aos preços dos ativos no curto prazo, a maior probabilidade é de o governo Lula decepcionar e não surpreender positivamente.
Em relação à PEC, o primeiro choque de realidade do mercado foi com os relatos de que o valor do “waiver”, ou a licença para gastar fora do teto, poderá ser, ao menos, de R$ 175 bilhões, caso seja retirada toda a despesa com o benefício de R$ 600 do Auxílio Brasil mais um adicional de R$ 150 reais por criança de até seis anos de idade.
Diante da especulação de que as despesas com esse programa podem ficar de fora do teto permanentemente, fica a dúvida se o humor do mercado poderá até melhorar caso o prazo dessa exclusão seja limitado a quatro anos, o que foi aventado pela equipe de transição.
Quer seja permanente ou por apenas quatro anos, a retirada do teto das despesas desse programa é negativa e seu impacto somente seria neutralizado se o governo Lula anunciasse um novo regime fiscal que sinalizasse uma trajetória sustentável para a dívida pública. Além disso, um “waiver” de R$ 175 bilhões é considerado excessivo pelo mercado.
O economista para Brasil do banco Barclays, Roberto Secemski, observa que, ao retirar as despesas com esse programa do teto de gastos, a PEC poderia remover, na prática, limites para futuros aumentos do valor do benefício, permitindo, por exemplo, que ele seja indexado à inflação.
Já em relação ao novo ministro da Fazenda, o temor é de que o escolhido reforce a percepção de uma política econômica menos compromissada com uma postura fiscal conservadora. Com base nos nomes que integram a equipe de transição, como os dos ex-ministros Nelson Barbosa e Guido Mantega, o mercado poderá ter mais com que se lamentar à frente.