Nas horas que antecederam a exoneração de Gustavo Bebianno do comando da Secretaria-Geral do governo, a grande preocupação dos investidores era aferir como se daria a saída dele, se o agora ex-ministro sairia atirando contra o presidente Jair Bolsonaro e se a crise política teria fim com a sua demissão ou prejudicaria a tramitação da reforma da Previdência.
Salvo alguma reviravolta na postura do ex-ministro, a avaliação do mercado é que Bebianno não será para a proposta de reforma da Previdência de Bolsonaro o que Joesley Batista foi para o projeto do governo Michel Temer.
Após o “Joesley Day”, no dia 17 de maio de 2017, quando veio à tona a denúncia do dono da JBS contra Temer – sobre o seu aval para a compra do silêncio do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha –, o projeto de reforma da Previdência ficou travado.
Saberia Bebianno algum segredo constrangedor ou mais explosivo sobre o presidente Bolsonaro e o PSL, seu partido, que pudesse tirar dos trilhos a reforma da Previdência antes mesmo de chegar ao Congresso?
“O mercado ficou assustado com a falta de habilidade da família Bolsonaro e do presidente em lidar com uma situação quase banal de crise”, diz o diretor executivo de uma grande administradora de recursos em São Paulo. “Mas o ex-ministro não tem envergadura para causar uma crise no governo e, claramente, foi feito um acordo para um pacto de silêncio.”
Para o economista-chefe de uma conhecida corretora de valores, o caso Bebianno não é um evento desarticulador, embora possa dificultar o diálogo formal do presidente com o Congresso. “Houve uma quebra de regra (gravar e publicar diálogos) e de protocolo, mas não destrói pontes”, diz.
O economista acima ressalta que o consenso em torno da reforma é muito grande. “Resta ao governo dar contorno a ela no Congresso, o que continua sendo a principal questão”, afirma.
Todavia ao longo do dia de ontem, o ex-ministro deu sinais de irritação, vazando áudios do presidente Bolsonaro, deixando o mercado preocupado. Diante disso, o mercado vai focar a partir de hoje, quando Bolsonaro entregar pessoalmente ao Congresso a sua proposta de reforma da Previdência, na capacidade de articulação do governo para arregimentar os 308 votos necessários para aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC).
Até o momento, o mercado ainda espera algum sinal mais concreto de que o governo está formando uma base sólida no Congresso e que permita aos investidores terem um pouco mais de segurança de que Bolsonaro já tenha a seu favor um número suficiente de deputados dispostos a apoiar a reforma.
Talvez pronunciamentos de líderes de partidos dando apoio mais explícito à proposta que será entregue hoje por Bolsonaro possam injetar uma dose maior de confiança nos investidores, os quais estão ainda ressabiados com a crise envolvendo Bebianno.
A expectativa do mercado é que a proposta elaborada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, resulte numa economia de R$ 1,1 trilhão em dez anos. Por enquanto, só se sabe que o presidente aprovou uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, com um período de transição de 12 anos.
Os analistas estão otimistas de que, ao longo da sua tramitação no Congresso, a proposta de Guedes não será tão desidratada. As estimativas vão de uma versão final da PEC que resulte em economia de R$ 500 bilhões a R$ 900 bilhões em dez anos com gastos previdenciários. O projeto de Temer, que esteve prestes a ser votado, geraria uma economia de R$ 480 bilhões em dez anos.
É pouco provável que a simples entrega da proposta ao Congresso por Bolsonaro venha turbinar uma alta mais forte na Bolsa e nos outros ativos brasileiros, a não ser que haja uma surpresa positiva em termos de abrangência das mudanças.
Mas um rali mais sustentável da Bolsa, por exemplo, somente com a volta dos recursos de estrangeiros. E esses vão querer ver a aprovação da reforma antes de ir às compras no Brasil.
*COLUNISTA DO BROADCAST