Opinião|Argentina: decadência do PIB explica raiva dos eleitores


Não é de estranhar que a juventude esteja frustrada e se volte a propostas radicais contra o ‘sistema’

Por Fabio Giambiagi
Atualização:

Este é o segundo de um conjunto de quatro artigos sobre a Argentina, destinados a explicar ao leitor o pano de fundo das eleições que ocorrerão no país em outubro. Hoje, vamos mostrar o que aconteceu com o PIB.

Há dois dados-chave para expor ao leitor a dimensão da decadência, já considerando o que deverá acontecer com a economia em 2023: i) no período de 1981 a 2023, o PIB argentino terá sofrido uma contração em 19 dos 43 anos, algo que deve ser um recorde mundial, próprio de uma nação em guerra; e ii), em 2023, a renda per capita argentina será em torno de 4% inferior à de 2007.

continua após a publicidade

Nos 12 anos de 2012 a 2023, o PIB brasileiro terá encolhido em três anos: 2015, 2016 e 2020. Na Argentina, isso terá acontecido nada menos que em sete! Por isso, o PIB argentino em 2023 será inclusive inferior ao de 2011.

Um argentino que tenha nascido em 1965 e feito 20 anos em meados da década de 1980 terá visto muitas coisas negativas, porém, mal ou bem, nesses altos e baixos do país terá tido depois a oportunidade de vivenciar o miniboom posterior ao Plano Austral dos anos 1980, a euforia dos anos 1990 com o Plano de Convertibilidade e o ciclo das commodities da década de 2000, assim como no Brasil. Já um jovem que tenha ingressado no mercado de trabalho vizinho no começo da década de 2010 só terá visto desgraças: o esgotamento das políticas populistas dos Kirchners, a queda do PIB em três dos quatro anos do governo Mauricio Macri e a experiência patética do atual governo, com uma inflação anual que anda pelos 110% – e contando…

Políticas econômicas do atual presidente argentino Alberto Fernández, e de seus antecessores Cristina Kirchner e Mauricio Macri, não conseguiram controlar a inflação Foto: Lenin Nolly / EFE
continua após a publicidade

Não é de estranhar, portanto, que a juventude esteja frustrada e se volte para propostas radicais contra o “sistema”. A demanda por outsiders nunca foi tão elevada no país. Há algumas semanas, numa confitería do centro porteño, conversando com um escritor local acerca da opção de voto de um parente jovem, um garçom cansado de guerra e com o olhar amargo comentava que “ele tem muita raiva; eu só tenho uma enorme tristeza”.

Hoje, como em 2001, o clima de revolta com a situação é generalizado, mas, ao contrário daquela ocasião, quando o sistema político, com a escolha de Eduardo Duhalde, foi capaz de engendrar a solução que permitiu ao país sair da crise e ter uma década de prosperidade, há dúvidas se nas atuais circunstâncias o corpo político do país terá a capacidade de se reinventar para possibilitar à Argentina sair de circunstâncias tão difíceis.

Voltaremos a tratar do assunto daqui a duas semanas.]

continua após a publicidade

Este é o segundo de um conjunto de quatro artigos sobre a Argentina, destinados a explicar ao leitor o pano de fundo das eleições que ocorrerão no país em outubro. Hoje, vamos mostrar o que aconteceu com o PIB.

Há dois dados-chave para expor ao leitor a dimensão da decadência, já considerando o que deverá acontecer com a economia em 2023: i) no período de 1981 a 2023, o PIB argentino terá sofrido uma contração em 19 dos 43 anos, algo que deve ser um recorde mundial, próprio de uma nação em guerra; e ii), em 2023, a renda per capita argentina será em torno de 4% inferior à de 2007.

Nos 12 anos de 2012 a 2023, o PIB brasileiro terá encolhido em três anos: 2015, 2016 e 2020. Na Argentina, isso terá acontecido nada menos que em sete! Por isso, o PIB argentino em 2023 será inclusive inferior ao de 2011.

Um argentino que tenha nascido em 1965 e feito 20 anos em meados da década de 1980 terá visto muitas coisas negativas, porém, mal ou bem, nesses altos e baixos do país terá tido depois a oportunidade de vivenciar o miniboom posterior ao Plano Austral dos anos 1980, a euforia dos anos 1990 com o Plano de Convertibilidade e o ciclo das commodities da década de 2000, assim como no Brasil. Já um jovem que tenha ingressado no mercado de trabalho vizinho no começo da década de 2010 só terá visto desgraças: o esgotamento das políticas populistas dos Kirchners, a queda do PIB em três dos quatro anos do governo Mauricio Macri e a experiência patética do atual governo, com uma inflação anual que anda pelos 110% – e contando…

Políticas econômicas do atual presidente argentino Alberto Fernández, e de seus antecessores Cristina Kirchner e Mauricio Macri, não conseguiram controlar a inflação Foto: Lenin Nolly / EFE

Não é de estranhar, portanto, que a juventude esteja frustrada e se volte para propostas radicais contra o “sistema”. A demanda por outsiders nunca foi tão elevada no país. Há algumas semanas, numa confitería do centro porteño, conversando com um escritor local acerca da opção de voto de um parente jovem, um garçom cansado de guerra e com o olhar amargo comentava que “ele tem muita raiva; eu só tenho uma enorme tristeza”.

Hoje, como em 2001, o clima de revolta com a situação é generalizado, mas, ao contrário daquela ocasião, quando o sistema político, com a escolha de Eduardo Duhalde, foi capaz de engendrar a solução que permitiu ao país sair da crise e ter uma década de prosperidade, há dúvidas se nas atuais circunstâncias o corpo político do país terá a capacidade de se reinventar para possibilitar à Argentina sair de circunstâncias tão difíceis.

Voltaremos a tratar do assunto daqui a duas semanas.]

Este é o segundo de um conjunto de quatro artigos sobre a Argentina, destinados a explicar ao leitor o pano de fundo das eleições que ocorrerão no país em outubro. Hoje, vamos mostrar o que aconteceu com o PIB.

Há dois dados-chave para expor ao leitor a dimensão da decadência, já considerando o que deverá acontecer com a economia em 2023: i) no período de 1981 a 2023, o PIB argentino terá sofrido uma contração em 19 dos 43 anos, algo que deve ser um recorde mundial, próprio de uma nação em guerra; e ii), em 2023, a renda per capita argentina será em torno de 4% inferior à de 2007.

Nos 12 anos de 2012 a 2023, o PIB brasileiro terá encolhido em três anos: 2015, 2016 e 2020. Na Argentina, isso terá acontecido nada menos que em sete! Por isso, o PIB argentino em 2023 será inclusive inferior ao de 2011.

Um argentino que tenha nascido em 1965 e feito 20 anos em meados da década de 1980 terá visto muitas coisas negativas, porém, mal ou bem, nesses altos e baixos do país terá tido depois a oportunidade de vivenciar o miniboom posterior ao Plano Austral dos anos 1980, a euforia dos anos 1990 com o Plano de Convertibilidade e o ciclo das commodities da década de 2000, assim como no Brasil. Já um jovem que tenha ingressado no mercado de trabalho vizinho no começo da década de 2010 só terá visto desgraças: o esgotamento das políticas populistas dos Kirchners, a queda do PIB em três dos quatro anos do governo Mauricio Macri e a experiência patética do atual governo, com uma inflação anual que anda pelos 110% – e contando…

Políticas econômicas do atual presidente argentino Alberto Fernández, e de seus antecessores Cristina Kirchner e Mauricio Macri, não conseguiram controlar a inflação Foto: Lenin Nolly / EFE

Não é de estranhar, portanto, que a juventude esteja frustrada e se volte para propostas radicais contra o “sistema”. A demanda por outsiders nunca foi tão elevada no país. Há algumas semanas, numa confitería do centro porteño, conversando com um escritor local acerca da opção de voto de um parente jovem, um garçom cansado de guerra e com o olhar amargo comentava que “ele tem muita raiva; eu só tenho uma enorme tristeza”.

Hoje, como em 2001, o clima de revolta com a situação é generalizado, mas, ao contrário daquela ocasião, quando o sistema político, com a escolha de Eduardo Duhalde, foi capaz de engendrar a solução que permitiu ao país sair da crise e ter uma década de prosperidade, há dúvidas se nas atuais circunstâncias o corpo político do país terá a capacidade de se reinventar para possibilitar à Argentina sair de circunstâncias tão difíceis.

Voltaremos a tratar do assunto daqui a duas semanas.]

Opinião por Fabio Giambiagi

Economista, formado pela FEA/UFRJ, com mestrado no Instituto de Economia Industrial da UFRJ

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.