BRASÍLIA - Apontado como “queridinho” dos parlamentares nas negociações com o Congresso Nacional, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, provocou um desgaste nesta segunda-feira, 14, com lideranças da Câmara dos Deputados após declarar que a Casa está com um “poder muito grande” e que não pode usá-lo para “humilhar o Senado e o Executivo”.
A declaração, em entrevista ao jornalista Reinaldo Azevedo, causou uma saia justa e um sentimento, nos líderes, de que Haddad teria sido “ingrato”, após todo o apoio dado com a aprovação de medidas econômicas importantes ao longo do primeiro semestre.
Um dos líderes, que falou ao Estadão sob a condição de anonimato, disse que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), “matou no peito o arcabouço e a reforma tributária”, dando apoio à agenda de Haddad - que levou a uma melhora da percepção de risco do Brasil, que tem sido faturada pelo governo.
O desgaste provocou o cancelamento da reunião marcada para esta noite, na casa de Lira, com parlamentares, para debater o texto e o calendário de votação do novo arcabouço fiscal, que está travado e é uma peça fundamental para viabilizar o Orçamento de 2024.
A relação do governo com a Câmara já estava desgastada por conta da pressão do Centrão por uma reforma ministerial, mas o que mais pesou na reação das lideranças foi o fato de a fala ter partido justamente de Haddad, que tem sido elogiado e recebido apoio nas votações.
Nos bastidores, lideranças do Congresso afirmam que as votações econômicas, como a reforma tributária e o arcabouço, exigiram compromissos políticos que não foram cumpridos até agora. Até mesmo a nomeação de Celso Sabino para o ministério do Turismo, acordada como “porteira fechada” - ou seja, com a liberdade para nomeações dentro da pasta -, ainda não foi atendida plenamente.
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Não se sabe o tamanho da “cicatriz” que essa fala pode deixar na relação entre Haddad e as lideranças da Câmara, incluindo o presidente Arthur Lira, mas o ministro sentiu a pressão e teve de dar explicações. “As minhas declarações foram tomadas como uma crítica. Eu estava falando sobre o fim do presidencialismo de coalisão”, disse Haddad. O ministro admitiu que Lira “sugeriu” que ele desse esclarecimentos para evitar ruídos.
Pressão
Além da pressão pela reforma ministerial, outros dois pontos têm desgastado a relação entre Congresso e o governo. Um deles é a estratégia dos parlamentares de aumentar o poder sobre o Orçamento, por meio da ampliação das emendas impositivas, de pagamento obrigatório, e com a criação de um cronograma para o pagamento desses montantes, como adiantou o Estadão. Isso iria, portanto, na contramão dos interesses do governo, que quer aumentar os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), inclusive usando os valores reservados para as emendas.
Outro ponto que já começa a causar atrito é o pacote de medidas arrecadatórias defendidas por Haddad, o qual vem sendo chamado de “Robin Hood”, por mirar a fatia mais rica da população. Como mostrou reportagem do Estadão, há resistências na Câmara para aumento de impostos e preocupação com a criação de narrativas, por parte do governo, de que o Parlamento estaria protegendo os mais ricos.