Economia e políticas públicas

Opinião|Conflito das emendas é uma oportunidade


Mais do que uma pura disputa de influência entre os Poderes, imbróglio envolvendo emendas impositivas inclui vários nós que atrapalham a governança da democracia brasileira.

Por Fernando Dantas

O conflito entre o Legislativo e o Judiciário sobre as emendas parlamentares, com o Supremo suspendendo a execução de emendas impositivas até que se cumpram critérios de transparência, pode ser uma dor de cabeça a mais para o trâmite de matérias do Executivo. Por outro lado, Lula recebe uma ajuda do Judiciário para tentar retomar controle sobre o Orçamento da União.

Essa é uma discussão complexa, envolvendo diversas tramas que se entrelaçam no confuso e disfuncional sistema atual no Brasil. Alguns cientistas políticos consideram que o poder do Executivo de liberar ou não as emendas é uma peça importante da barganha com o Legislativo no quadro de um presidencialismo de coalizão com um Congresso muito fragmentado como o brasileiro. À medida que as emendas foram se tornando impositivas, o presidente perdeu força política e tendeu a ficar refém do Congresso, um Poder que no Brasil não zela pela responsabilidade fiscal.

Na verdade, com o sigilo e falta de critérios do "orçamento secreto" e agora das "emendas pix", esse poder de barganha foi transferido para as lideranças do Congresso, tipicamente do Centrão, de uma forma em que o fisiologismo dos meios nem ao menos se presta ao fim nobre de aumentar a governabilidade.

continua após a publicidade

Um outro aspecto importante do debate sobre as emendas é o da qualidade das políticas públicas. Como diversos articulistas vêm apontando, em muitos países as emendas não superam 1% das despesas discricionárias, comparado a mais de 20% no Brasil. Isso leva, naturalmente, a uma dispersão de vultosa parcela dos recursos públicos para projetos paroquiais e desarticulados entre si, em prejuízo de um programa mais amplo e integrado de desenvolvimento do País - que, naturalmente, caberia ao Poder Executivo liderar.

O problema, por outro lado, como apontado por outra corrente de analistas, é que o Orçamento no Brasil é uma espécie de peça de ficção, com receitas sobre-estimadas para permitir a alocação de despesas com muito pouca restrição (que surge na fase de execução). O sistema, de certa forma, infantiliza o Congresso, que, em países mais maduros, participa de forma relevante da elaboração de um Orçamento crível. Essa interação entre Executivo e Legislativo para determinar a programação de gasto do dinheiro dos contribuintes é, com razão, considerada em diversas partes do mundo como um dos pilares mais nobres do sistema democrático.

Nesse sentido, é como se o volume cada vez maior de emendas impositivas fosse um resgate muito distorcido - e danoso, do ponto de vista da qualidade das políticas públicas - da participação do Legislativo no processo orçamentário.

continua após a publicidade

O atual imbróglio entre Judiciário e Legislativo sobre as emendas positivas de certa forma reflete todas essas questões mencionadas acima. O Executivo, claro, também está completamente envolvido nesse embate, pela via da governabilidade e da qualidade da política pública.

A saída, naturalmente, terá de ser pela negociação. Seria uma pena que as tratativas entre os Poderes sobre as emendas se transformassem em um jogo de soma zero, em que cada um deles apenas tenta expandir a sua influência. Na verdade, esta é uma situação em que o clichê de que crises são oportunidades é extremamente válido. Uma solução bem arquitetada para a atual disputa poderia ser também um avanço significativo em termos da governança do Estado brasileiro.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras.

continua após a publicidade

Esta coluna foi publicada em 20/8/2024, terça-feira.

O conflito entre o Legislativo e o Judiciário sobre as emendas parlamentares, com o Supremo suspendendo a execução de emendas impositivas até que se cumpram critérios de transparência, pode ser uma dor de cabeça a mais para o trâmite de matérias do Executivo. Por outro lado, Lula recebe uma ajuda do Judiciário para tentar retomar controle sobre o Orçamento da União.

Essa é uma discussão complexa, envolvendo diversas tramas que se entrelaçam no confuso e disfuncional sistema atual no Brasil. Alguns cientistas políticos consideram que o poder do Executivo de liberar ou não as emendas é uma peça importante da barganha com o Legislativo no quadro de um presidencialismo de coalizão com um Congresso muito fragmentado como o brasileiro. À medida que as emendas foram se tornando impositivas, o presidente perdeu força política e tendeu a ficar refém do Congresso, um Poder que no Brasil não zela pela responsabilidade fiscal.

Na verdade, com o sigilo e falta de critérios do "orçamento secreto" e agora das "emendas pix", esse poder de barganha foi transferido para as lideranças do Congresso, tipicamente do Centrão, de uma forma em que o fisiologismo dos meios nem ao menos se presta ao fim nobre de aumentar a governabilidade.

Um outro aspecto importante do debate sobre as emendas é o da qualidade das políticas públicas. Como diversos articulistas vêm apontando, em muitos países as emendas não superam 1% das despesas discricionárias, comparado a mais de 20% no Brasil. Isso leva, naturalmente, a uma dispersão de vultosa parcela dos recursos públicos para projetos paroquiais e desarticulados entre si, em prejuízo de um programa mais amplo e integrado de desenvolvimento do País - que, naturalmente, caberia ao Poder Executivo liderar.

O problema, por outro lado, como apontado por outra corrente de analistas, é que o Orçamento no Brasil é uma espécie de peça de ficção, com receitas sobre-estimadas para permitir a alocação de despesas com muito pouca restrição (que surge na fase de execução). O sistema, de certa forma, infantiliza o Congresso, que, em países mais maduros, participa de forma relevante da elaboração de um Orçamento crível. Essa interação entre Executivo e Legislativo para determinar a programação de gasto do dinheiro dos contribuintes é, com razão, considerada em diversas partes do mundo como um dos pilares mais nobres do sistema democrático.

Nesse sentido, é como se o volume cada vez maior de emendas impositivas fosse um resgate muito distorcido - e danoso, do ponto de vista da qualidade das políticas públicas - da participação do Legislativo no processo orçamentário.

O atual imbróglio entre Judiciário e Legislativo sobre as emendas positivas de certa forma reflete todas essas questões mencionadas acima. O Executivo, claro, também está completamente envolvido nesse embate, pela via da governabilidade e da qualidade da política pública.

A saída, naturalmente, terá de ser pela negociação. Seria uma pena que as tratativas entre os Poderes sobre as emendas se transformassem em um jogo de soma zero, em que cada um deles apenas tenta expandir a sua influência. Na verdade, esta é uma situação em que o clichê de que crises são oportunidades é extremamente válido. Uma solução bem arquitetada para a atual disputa poderia ser também um avanço significativo em termos da governança do Estado brasileiro.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras.

Esta coluna foi publicada em 20/8/2024, terça-feira.

O conflito entre o Legislativo e o Judiciário sobre as emendas parlamentares, com o Supremo suspendendo a execução de emendas impositivas até que se cumpram critérios de transparência, pode ser uma dor de cabeça a mais para o trâmite de matérias do Executivo. Por outro lado, Lula recebe uma ajuda do Judiciário para tentar retomar controle sobre o Orçamento da União.

Essa é uma discussão complexa, envolvendo diversas tramas que se entrelaçam no confuso e disfuncional sistema atual no Brasil. Alguns cientistas políticos consideram que o poder do Executivo de liberar ou não as emendas é uma peça importante da barganha com o Legislativo no quadro de um presidencialismo de coalizão com um Congresso muito fragmentado como o brasileiro. À medida que as emendas foram se tornando impositivas, o presidente perdeu força política e tendeu a ficar refém do Congresso, um Poder que no Brasil não zela pela responsabilidade fiscal.

Na verdade, com o sigilo e falta de critérios do "orçamento secreto" e agora das "emendas pix", esse poder de barganha foi transferido para as lideranças do Congresso, tipicamente do Centrão, de uma forma em que o fisiologismo dos meios nem ao menos se presta ao fim nobre de aumentar a governabilidade.

Um outro aspecto importante do debate sobre as emendas é o da qualidade das políticas públicas. Como diversos articulistas vêm apontando, em muitos países as emendas não superam 1% das despesas discricionárias, comparado a mais de 20% no Brasil. Isso leva, naturalmente, a uma dispersão de vultosa parcela dos recursos públicos para projetos paroquiais e desarticulados entre si, em prejuízo de um programa mais amplo e integrado de desenvolvimento do País - que, naturalmente, caberia ao Poder Executivo liderar.

O problema, por outro lado, como apontado por outra corrente de analistas, é que o Orçamento no Brasil é uma espécie de peça de ficção, com receitas sobre-estimadas para permitir a alocação de despesas com muito pouca restrição (que surge na fase de execução). O sistema, de certa forma, infantiliza o Congresso, que, em países mais maduros, participa de forma relevante da elaboração de um Orçamento crível. Essa interação entre Executivo e Legislativo para determinar a programação de gasto do dinheiro dos contribuintes é, com razão, considerada em diversas partes do mundo como um dos pilares mais nobres do sistema democrático.

Nesse sentido, é como se o volume cada vez maior de emendas impositivas fosse um resgate muito distorcido - e danoso, do ponto de vista da qualidade das políticas públicas - da participação do Legislativo no processo orçamentário.

O atual imbróglio entre Judiciário e Legislativo sobre as emendas positivas de certa forma reflete todas essas questões mencionadas acima. O Executivo, claro, também está completamente envolvido nesse embate, pela via da governabilidade e da qualidade da política pública.

A saída, naturalmente, terá de ser pela negociação. Seria uma pena que as tratativas entre os Poderes sobre as emendas se transformassem em um jogo de soma zero, em que cada um deles apenas tenta expandir a sua influência. Na verdade, esta é uma situação em que o clichê de que crises são oportunidades é extremamente válido. Uma solução bem arquitetada para a atual disputa poderia ser também um avanço significativo em termos da governança do Estado brasileiro.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras.

Esta coluna foi publicada em 20/8/2024, terça-feira.

O conflito entre o Legislativo e o Judiciário sobre as emendas parlamentares, com o Supremo suspendendo a execução de emendas impositivas até que se cumpram critérios de transparência, pode ser uma dor de cabeça a mais para o trâmite de matérias do Executivo. Por outro lado, Lula recebe uma ajuda do Judiciário para tentar retomar controle sobre o Orçamento da União.

Essa é uma discussão complexa, envolvendo diversas tramas que se entrelaçam no confuso e disfuncional sistema atual no Brasil. Alguns cientistas políticos consideram que o poder do Executivo de liberar ou não as emendas é uma peça importante da barganha com o Legislativo no quadro de um presidencialismo de coalizão com um Congresso muito fragmentado como o brasileiro. À medida que as emendas foram se tornando impositivas, o presidente perdeu força política e tendeu a ficar refém do Congresso, um Poder que no Brasil não zela pela responsabilidade fiscal.

Na verdade, com o sigilo e falta de critérios do "orçamento secreto" e agora das "emendas pix", esse poder de barganha foi transferido para as lideranças do Congresso, tipicamente do Centrão, de uma forma em que o fisiologismo dos meios nem ao menos se presta ao fim nobre de aumentar a governabilidade.

Um outro aspecto importante do debate sobre as emendas é o da qualidade das políticas públicas. Como diversos articulistas vêm apontando, em muitos países as emendas não superam 1% das despesas discricionárias, comparado a mais de 20% no Brasil. Isso leva, naturalmente, a uma dispersão de vultosa parcela dos recursos públicos para projetos paroquiais e desarticulados entre si, em prejuízo de um programa mais amplo e integrado de desenvolvimento do País - que, naturalmente, caberia ao Poder Executivo liderar.

O problema, por outro lado, como apontado por outra corrente de analistas, é que o Orçamento no Brasil é uma espécie de peça de ficção, com receitas sobre-estimadas para permitir a alocação de despesas com muito pouca restrição (que surge na fase de execução). O sistema, de certa forma, infantiliza o Congresso, que, em países mais maduros, participa de forma relevante da elaboração de um Orçamento crível. Essa interação entre Executivo e Legislativo para determinar a programação de gasto do dinheiro dos contribuintes é, com razão, considerada em diversas partes do mundo como um dos pilares mais nobres do sistema democrático.

Nesse sentido, é como se o volume cada vez maior de emendas impositivas fosse um resgate muito distorcido - e danoso, do ponto de vista da qualidade das políticas públicas - da participação do Legislativo no processo orçamentário.

O atual imbróglio entre Judiciário e Legislativo sobre as emendas positivas de certa forma reflete todas essas questões mencionadas acima. O Executivo, claro, também está completamente envolvido nesse embate, pela via da governabilidade e da qualidade da política pública.

A saída, naturalmente, terá de ser pela negociação. Seria uma pena que as tratativas entre os Poderes sobre as emendas se transformassem em um jogo de soma zero, em que cada um deles apenas tenta expandir a sua influência. Na verdade, esta é uma situação em que o clichê de que crises são oportunidades é extremamente válido. Uma solução bem arquitetada para a atual disputa poderia ser também um avanço significativo em termos da governança do Estado brasileiro.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras.

Esta coluna foi publicada em 20/8/2024, terça-feira.

Opinião por Fernando Dantas

Atualizamos nossa política de cookies

Ao utilizar nossos serviços, você aceita a política de monitoramento de cookies.