Economia e políticas públicas

Opinião|O que se pode cobrar do mercado?


Não é razoável esperar que o mercado financeiro reaja moralmente a fatos como o vídeo de inspiração nazista do ex-secretário da Cultura, Roberto Alvim. E isto não quer dizer que a sociedade brasileira e suas instituições não devam combater com toda a energia as escandalosas tendências antidemocráticas dentro do governo de Jair Bolsonaro.

Por Fernando Dantas

No dia 17 de janeiro, quando o ex-secretário Especial de Cultura, Roberto Alvim, fez o seu infame discurso parafraseando Joseph Goebbels, o mercado financeiro no Brasil teve um bom dia. A bolsa subiu, o dólar caiu e os juros recuaram em vencimentos importantes do mercado futuro.

O contraste entre a felicidade do mercado e o estado de choque e escândalo da sociedade civil, com o episódio Alvim, levou diversos analistas a afirmarem que o "mercado" é amoral e só pensa nos lucros, indiferente a riscos autoritários e mesmo fascistas que pairam sobre a sociedade brasileira.

O "mercado" está entre aspas porque, apesar de informalmente ser muito comum (o próprio colunista faz isto) dizer que "o mercado acha isso", ou o "mercado teme aquilo", há uma grande diferença entre mercado e outras organizações da sociedade.

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Uma pessoa, o governo de um país ou uma empresa podem de fato ter posições sobre determinados assuntos. Em todos os casos, há um indivíduo ou uma organização de indivíduos com comando unificado que podem deliberar e tomar posicionamentos.

Já o que se chama de mercado é a interação entre pessoas e instituições (financeiras e não financeiras) comprando e vendendo ativos financeiros. A percepção de mundo dos participantes do mercado informa suas decisões. Se uma maioria consistente vê um fato novo como prejudicial à economia, é possível que a bolsa caia.

Quando se diz que o "mercado teme a guerra comercial entre China e Estados Unidos", não se quer dizer que uma assembleia formal dos investidores e operadores concluiu isto. Na verdade, o sentido é que esse sentimento é tão forte e predominante entre os participantes do mercado que tem poder para influenciar a cotação dos ativos.

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A diferença pode parecer sutil para alguns, mas é um primeiro nó a ser desatado na espinhosa discussão sobre mercado e moralidade.

Um segundo fato é que o objetivo principal dos participantes do mercado é fazer operações lucrativas, com diferentes horizontes de retorno. Querer que os ativos brasileiros tenham um mau desempenho no dia do discurso de Alvim significa escolher entre duas alternativas.

A primeira é que há uma cegueira do mercado quanto aos potenciais impactos negativos que o risco autoritário (ou até fascista) representado pelo governo Bolsonaro pode ter na economia brasileira.

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A segunda é a de que os participantes do mercado deveriam "repudiar" o episódio Alvim, tomando decisões que não fossem as que lhes parecessem mais lucrativas. Por exemplo, um gestor deixar de comprar ações, mesmo achando que elas vão subir. Parece absurdo, e é, mas há mais coisa aí, e volto ao assunto mais adiante na coluna.

Em relação à primeira alternativa, é uma crítica cabível. É possível achar que o mercado (isto é, a visão predominante entre operadores investidores) se equivoca, o que não significa que seja fácil ir lá e ganhar dinheiro com esta percepção.

Há uma questão de timing. Uma bolha de ativos com fundamentos frágeis dará muito dinheiro ao investidor que pular fora logo antes de que estoure. O economista acadêmico que detectou a inconsistência pode sair cedo ou tarde demais, e possivelmente não vai operar melhor do que o participante de mercado mais tarimbado.

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Isso não impede economistas ou qualquer analista de criticarem o comportamento de manada do mercado. Não há dúvida de que predominam no mercado financeiro nacional pessoas com uma visão de mundo e de economia mais próxima de Paulo Guedes do que dos economistas heterodoxos do PT. E, na felicidade de verem suas ideias como plano de governo, uma corrente majoritária do mercado pode estar subestimando o risco político que pesa sobre a economia.

No entanto, essa não é uma crítica moral, mas econômica. Se isso for de fato verdade, a corrente majoritária do mercado vai dar com os burros n'água quando os efeitos ruins da política bolsonarista finalmente fazerem ruir a economia. Como sempre, os mais espertos pularão fora na hora certa, mas com o mercado reprecificando para baixo todos os ativos, haverá muito mais gente chorando do que celebrando.

Resta ver, porém, se essa hipótese é verdadeira. Os críticos da "amoralidade" do mercado nunca deixam muito claro se a crítica é moral ou econômica. E se, apesar do que ocorrer na política, a economia continuar forte, justificar a valorização dos ativos e gerar lucros para quem apostou na alta? Os críticos da amoralidade do mercado vão reconhecer que este estava "certo"?

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Investimento ético

Provavelmente, não. O que nos remete para a segunda alternativa mencionada acima: a de que os participantes do mercado repudiassem os arroubos autoritários e fascistas do governo Bolsonaro, tomando decisões de compra e venda que não fossem as que considerassem mais lucrativas.

Em princípio, parece absurdo. Ninguém gostaria de saber que o gestor do seu fundo de pensão perdeu dinheiro de propósito, ou deixou de ganhar, no "Alvim Day".

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Existe, entretanto, todo um histórico concreto, e um imenso debate, sobre o "investimento ético", que levou a criação de siglas como ESG (environmental, social and governance) e SRI (socially responsible investing). É um tema gigantesco e que já faz parte da vida dos grandes investidores institucionais e fundos de investimento.

De fato, a postura de Bolsonaro em temas como meio-ambiente (principalmente) e direitos humanos já está prejudicando o Brasil em termos de fluxos de capitais internacionais. Episódios como o discurso de Alvim certamente não ajudam.

Mas isso é muito diferente de querer que o mercado caia num dia específico em que algo ruim aconteceu no cenário político. Os preços de ativos são influenciados por um número incomensurável de fatores econômicos e políticos, nacionais e internacionais. O resultado das cotações no final do dia é uma interação de forças, com notícias ruins sendo compensadas por outras boas e vice-versa.

E mesmo os protocolos do investimento ético são baseados em regras e rotinas, e não em operadores decidindo subitamente manifestar repúdio a algum fato determinado num dia qualquer por meio das suas operações no mercado.

Portanto, não, o mercado não é nazista. Quem tem que repudiar um discurso aviltante como o de Alvim é a sociedade civil, o sistema político e os Poderes da República. E assim foi feito, forçando a demissão do ex-secretário da Cultura.

Mas provavelmente foi pouco. Há, dentro da chamada "ala ideológica" do governo Bolsonaro, uma vertente escandalosamente antidemocrática. A pressão contra essas pessoas e suas ideias têm que prosseguir. Mas não peçam para o mercado conduzi-la, pois não é esta a sua função.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 21/1/20, terça-feira.

No dia 17 de janeiro, quando o ex-secretário Especial de Cultura, Roberto Alvim, fez o seu infame discurso parafraseando Joseph Goebbels, o mercado financeiro no Brasil teve um bom dia. A bolsa subiu, o dólar caiu e os juros recuaram em vencimentos importantes do mercado futuro.

O contraste entre a felicidade do mercado e o estado de choque e escândalo da sociedade civil, com o episódio Alvim, levou diversos analistas a afirmarem que o "mercado" é amoral e só pensa nos lucros, indiferente a riscos autoritários e mesmo fascistas que pairam sobre a sociedade brasileira.

O "mercado" está entre aspas porque, apesar de informalmente ser muito comum (o próprio colunista faz isto) dizer que "o mercado acha isso", ou o "mercado teme aquilo", há uma grande diferença entre mercado e outras organizações da sociedade.

Uma pessoa, o governo de um país ou uma empresa podem de fato ter posições sobre determinados assuntos. Em todos os casos, há um indivíduo ou uma organização de indivíduos com comando unificado que podem deliberar e tomar posicionamentos.

Já o que se chama de mercado é a interação entre pessoas e instituições (financeiras e não financeiras) comprando e vendendo ativos financeiros. A percepção de mundo dos participantes do mercado informa suas decisões. Se uma maioria consistente vê um fato novo como prejudicial à economia, é possível que a bolsa caia.

Quando se diz que o "mercado teme a guerra comercial entre China e Estados Unidos", não se quer dizer que uma assembleia formal dos investidores e operadores concluiu isto. Na verdade, o sentido é que esse sentimento é tão forte e predominante entre os participantes do mercado que tem poder para influenciar a cotação dos ativos.

A diferença pode parecer sutil para alguns, mas é um primeiro nó a ser desatado na espinhosa discussão sobre mercado e moralidade.

Um segundo fato é que o objetivo principal dos participantes do mercado é fazer operações lucrativas, com diferentes horizontes de retorno. Querer que os ativos brasileiros tenham um mau desempenho no dia do discurso de Alvim significa escolher entre duas alternativas.

A primeira é que há uma cegueira do mercado quanto aos potenciais impactos negativos que o risco autoritário (ou até fascista) representado pelo governo Bolsonaro pode ter na economia brasileira.

A segunda é a de que os participantes do mercado deveriam "repudiar" o episódio Alvim, tomando decisões que não fossem as que lhes parecessem mais lucrativas. Por exemplo, um gestor deixar de comprar ações, mesmo achando que elas vão subir. Parece absurdo, e é, mas há mais coisa aí, e volto ao assunto mais adiante na coluna.

Em relação à primeira alternativa, é uma crítica cabível. É possível achar que o mercado (isto é, a visão predominante entre operadores investidores) se equivoca, o que não significa que seja fácil ir lá e ganhar dinheiro com esta percepção.

Há uma questão de timing. Uma bolha de ativos com fundamentos frágeis dará muito dinheiro ao investidor que pular fora logo antes de que estoure. O economista acadêmico que detectou a inconsistência pode sair cedo ou tarde demais, e possivelmente não vai operar melhor do que o participante de mercado mais tarimbado.

Isso não impede economistas ou qualquer analista de criticarem o comportamento de manada do mercado. Não há dúvida de que predominam no mercado financeiro nacional pessoas com uma visão de mundo e de economia mais próxima de Paulo Guedes do que dos economistas heterodoxos do PT. E, na felicidade de verem suas ideias como plano de governo, uma corrente majoritária do mercado pode estar subestimando o risco político que pesa sobre a economia.

No entanto, essa não é uma crítica moral, mas econômica. Se isso for de fato verdade, a corrente majoritária do mercado vai dar com os burros n'água quando os efeitos ruins da política bolsonarista finalmente fazerem ruir a economia. Como sempre, os mais espertos pularão fora na hora certa, mas com o mercado reprecificando para baixo todos os ativos, haverá muito mais gente chorando do que celebrando.

Resta ver, porém, se essa hipótese é verdadeira. Os críticos da "amoralidade" do mercado nunca deixam muito claro se a crítica é moral ou econômica. E se, apesar do que ocorrer na política, a economia continuar forte, justificar a valorização dos ativos e gerar lucros para quem apostou na alta? Os críticos da amoralidade do mercado vão reconhecer que este estava "certo"?

Investimento ético

Provavelmente, não. O que nos remete para a segunda alternativa mencionada acima: a de que os participantes do mercado repudiassem os arroubos autoritários e fascistas do governo Bolsonaro, tomando decisões de compra e venda que não fossem as que considerassem mais lucrativas.

Em princípio, parece absurdo. Ninguém gostaria de saber que o gestor do seu fundo de pensão perdeu dinheiro de propósito, ou deixou de ganhar, no "Alvim Day".

Existe, entretanto, todo um histórico concreto, e um imenso debate, sobre o "investimento ético", que levou a criação de siglas como ESG (environmental, social and governance) e SRI (socially responsible investing). É um tema gigantesco e que já faz parte da vida dos grandes investidores institucionais e fundos de investimento.

De fato, a postura de Bolsonaro em temas como meio-ambiente (principalmente) e direitos humanos já está prejudicando o Brasil em termos de fluxos de capitais internacionais. Episódios como o discurso de Alvim certamente não ajudam.

Mas isso é muito diferente de querer que o mercado caia num dia específico em que algo ruim aconteceu no cenário político. Os preços de ativos são influenciados por um número incomensurável de fatores econômicos e políticos, nacionais e internacionais. O resultado das cotações no final do dia é uma interação de forças, com notícias ruins sendo compensadas por outras boas e vice-versa.

E mesmo os protocolos do investimento ético são baseados em regras e rotinas, e não em operadores decidindo subitamente manifestar repúdio a algum fato determinado num dia qualquer por meio das suas operações no mercado.

Portanto, não, o mercado não é nazista. Quem tem que repudiar um discurso aviltante como o de Alvim é a sociedade civil, o sistema político e os Poderes da República. E assim foi feito, forçando a demissão do ex-secretário da Cultura.

Mas provavelmente foi pouco. Há, dentro da chamada "ala ideológica" do governo Bolsonaro, uma vertente escandalosamente antidemocrática. A pressão contra essas pessoas e suas ideias têm que prosseguir. Mas não peçam para o mercado conduzi-la, pois não é esta a sua função.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 21/1/20, terça-feira.

No dia 17 de janeiro, quando o ex-secretário Especial de Cultura, Roberto Alvim, fez o seu infame discurso parafraseando Joseph Goebbels, o mercado financeiro no Brasil teve um bom dia. A bolsa subiu, o dólar caiu e os juros recuaram em vencimentos importantes do mercado futuro.

O contraste entre a felicidade do mercado e o estado de choque e escândalo da sociedade civil, com o episódio Alvim, levou diversos analistas a afirmarem que o "mercado" é amoral e só pensa nos lucros, indiferente a riscos autoritários e mesmo fascistas que pairam sobre a sociedade brasileira.

O "mercado" está entre aspas porque, apesar de informalmente ser muito comum (o próprio colunista faz isto) dizer que "o mercado acha isso", ou o "mercado teme aquilo", há uma grande diferença entre mercado e outras organizações da sociedade.

Uma pessoa, o governo de um país ou uma empresa podem de fato ter posições sobre determinados assuntos. Em todos os casos, há um indivíduo ou uma organização de indivíduos com comando unificado que podem deliberar e tomar posicionamentos.

Já o que se chama de mercado é a interação entre pessoas e instituições (financeiras e não financeiras) comprando e vendendo ativos financeiros. A percepção de mundo dos participantes do mercado informa suas decisões. Se uma maioria consistente vê um fato novo como prejudicial à economia, é possível que a bolsa caia.

Quando se diz que o "mercado teme a guerra comercial entre China e Estados Unidos", não se quer dizer que uma assembleia formal dos investidores e operadores concluiu isto. Na verdade, o sentido é que esse sentimento é tão forte e predominante entre os participantes do mercado que tem poder para influenciar a cotação dos ativos.

A diferença pode parecer sutil para alguns, mas é um primeiro nó a ser desatado na espinhosa discussão sobre mercado e moralidade.

Um segundo fato é que o objetivo principal dos participantes do mercado é fazer operações lucrativas, com diferentes horizontes de retorno. Querer que os ativos brasileiros tenham um mau desempenho no dia do discurso de Alvim significa escolher entre duas alternativas.

A primeira é que há uma cegueira do mercado quanto aos potenciais impactos negativos que o risco autoritário (ou até fascista) representado pelo governo Bolsonaro pode ter na economia brasileira.

A segunda é a de que os participantes do mercado deveriam "repudiar" o episódio Alvim, tomando decisões que não fossem as que lhes parecessem mais lucrativas. Por exemplo, um gestor deixar de comprar ações, mesmo achando que elas vão subir. Parece absurdo, e é, mas há mais coisa aí, e volto ao assunto mais adiante na coluna.

Em relação à primeira alternativa, é uma crítica cabível. É possível achar que o mercado (isto é, a visão predominante entre operadores investidores) se equivoca, o que não significa que seja fácil ir lá e ganhar dinheiro com esta percepção.

Há uma questão de timing. Uma bolha de ativos com fundamentos frágeis dará muito dinheiro ao investidor que pular fora logo antes de que estoure. O economista acadêmico que detectou a inconsistência pode sair cedo ou tarde demais, e possivelmente não vai operar melhor do que o participante de mercado mais tarimbado.

Isso não impede economistas ou qualquer analista de criticarem o comportamento de manada do mercado. Não há dúvida de que predominam no mercado financeiro nacional pessoas com uma visão de mundo e de economia mais próxima de Paulo Guedes do que dos economistas heterodoxos do PT. E, na felicidade de verem suas ideias como plano de governo, uma corrente majoritária do mercado pode estar subestimando o risco político que pesa sobre a economia.

No entanto, essa não é uma crítica moral, mas econômica. Se isso for de fato verdade, a corrente majoritária do mercado vai dar com os burros n'água quando os efeitos ruins da política bolsonarista finalmente fazerem ruir a economia. Como sempre, os mais espertos pularão fora na hora certa, mas com o mercado reprecificando para baixo todos os ativos, haverá muito mais gente chorando do que celebrando.

Resta ver, porém, se essa hipótese é verdadeira. Os críticos da "amoralidade" do mercado nunca deixam muito claro se a crítica é moral ou econômica. E se, apesar do que ocorrer na política, a economia continuar forte, justificar a valorização dos ativos e gerar lucros para quem apostou na alta? Os críticos da amoralidade do mercado vão reconhecer que este estava "certo"?

Investimento ético

Provavelmente, não. O que nos remete para a segunda alternativa mencionada acima: a de que os participantes do mercado repudiassem os arroubos autoritários e fascistas do governo Bolsonaro, tomando decisões de compra e venda que não fossem as que considerassem mais lucrativas.

Em princípio, parece absurdo. Ninguém gostaria de saber que o gestor do seu fundo de pensão perdeu dinheiro de propósito, ou deixou de ganhar, no "Alvim Day".

Existe, entretanto, todo um histórico concreto, e um imenso debate, sobre o "investimento ético", que levou a criação de siglas como ESG (environmental, social and governance) e SRI (socially responsible investing). É um tema gigantesco e que já faz parte da vida dos grandes investidores institucionais e fundos de investimento.

De fato, a postura de Bolsonaro em temas como meio-ambiente (principalmente) e direitos humanos já está prejudicando o Brasil em termos de fluxos de capitais internacionais. Episódios como o discurso de Alvim certamente não ajudam.

Mas isso é muito diferente de querer que o mercado caia num dia específico em que algo ruim aconteceu no cenário político. Os preços de ativos são influenciados por um número incomensurável de fatores econômicos e políticos, nacionais e internacionais. O resultado das cotações no final do dia é uma interação de forças, com notícias ruins sendo compensadas por outras boas e vice-versa.

E mesmo os protocolos do investimento ético são baseados em regras e rotinas, e não em operadores decidindo subitamente manifestar repúdio a algum fato determinado num dia qualquer por meio das suas operações no mercado.

Portanto, não, o mercado não é nazista. Quem tem que repudiar um discurso aviltante como o de Alvim é a sociedade civil, o sistema político e os Poderes da República. E assim foi feito, forçando a demissão do ex-secretário da Cultura.

Mas provavelmente foi pouco. Há, dentro da chamada "ala ideológica" do governo Bolsonaro, uma vertente escandalosamente antidemocrática. A pressão contra essas pessoas e suas ideias têm que prosseguir. Mas não peçam para o mercado conduzi-la, pois não é esta a sua função.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast (fernando.dantas@estadao.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 21/1/20, terça-feira.

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