Economia e políticas públicas

Opinião|PLs das estatais botam água no chope do anúncio de corte de gastos


Mercado já está cético em relação ao pacote de corte de gastos de Haddad e Tebet, por não atacar os maiores nós da fragilidade fiscal brasileira. PLs para tirar estatais do orçamento só aumentaram a desconfiança.

Por Fernando Dantas

Os dois projetos de lei (PL) do governo para tirar estatais ainda dependentes do orçamento atrapalharam qualquer impacto positivo que o anúncio pela Fazenda e pelo Planejamento da disposição de cortar de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões de gastos pudesse ter sobre os combalidos ativos brasileiros.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se empenhou no discurso 'não é nada disso que vocês estão pensando' sobre as estatais, mas não parece ter convencido boa parte do mercado.

Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, considera que o texto da legislação proposta é dúbio, com uma transição a ser regulamentada por Ato do Executivo, da qual não se conhece detalhes.

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Para o executivo, a possibilidade de tirar despesas das estatais do orçamento, mesmo que o volume não pareça grande de início, abre um precedente e vai na direção contrária da que o governo deveria sinalizar no momento.

"O governo deveria cortar, e não manobrar, gastos", diz o analista, acrescentando que o déficit das estatais vem aumentando. O economista assinala que historicamente a retirada de estatais do orçamento não foi um movimento de saneamento financeiro, e inclusive abriu espaço para triangulações para melhorar artificialmente resultados fiscais, como a ocorrida entre Petrobrás, BNDES-Par e Tesouro Nacional em 2010.

Barros nota que o gasto do governo "fora do regramento fiscal" está se ampliando, como no caso de fundos como o FGO-Pronampe, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) e o fundo para o programa Pé-de-Meia.

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O economista considera que o governo não pode perder mais tempo em apresentar uma solução estrutural na área fiscal, com o prazo da dívida pública se encurtando e a parcela da dívida bruta atrelada à Selic chegando a 55%, a maior desde 2006. Ele acrescenta que o déficit nominal em 12 meses está em torno de 10% do PIB e a dívida continua a subir.

Para Barros, o aumento de gastos em R$ 170 bilhões no primeiro ano de governo, combinado com um arcabouço "frouxo e não crível" e mais o crescimento das despesas fora do orçamento trazem "um cheiro de nova matriz econômica com roupagem diferente".

Em relação às medidas de corte de gastos ventiladas pela Fazenda e pelo Planejamento, mirando alvos como supersalários do setor público, seguro-desemprego e abono salarial, também há ceticismo no mercado financeiro.

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Um gestor, que preferiu falar em off, aponta que "você pode atacar um problema com poucas medidas de grande impacto ou muitas medidas de pequeno impacto, e o governo parece preferir essa segunda via".

As medidas de grande impacto, que ainda parecem vetadas por Lula, seriam desvincular o piso previdenciário e o BPC do salário mínimo ou mudar os mínimos constitucionais de saúde e educação, reatrelados à receita por iniciativa deste governo.

O problema de atacar o problema com muitas medidas de pequeno impacto, diz o gestor, é que a dispersão de iniciativas (e todas elas provocando resistência) torna menos crível que a solução seja suficiente.

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Um segundo ponto negativo, prossegue a fonte, é que o governo sinaliza que essa medidas visam cumprir o arcabouço até 2026. Porém, mesmo que esse objetivo fosse atingido, os resultados primários seriam muito abaixo do necessário para estabilizar a dívida pública e esta continuaria crescendo.

"É algo que talvez pudesse estancar a piora dos ativos, mas não vai reverter a insegurança sobre quando e em que nível a dívida vai ser estabilizada", diz o gestor. Dessa forma, o grande prêmio de risco nos ativos brasileiros deve permanecer.

Finalmente, há a dúvida sobre se Lula vai "topar" ou não as medidas a serem apresentadas por Haddad e Simone Tebet, ou sobre quais ele vai topar e quais não.

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O analista nota que o elevado prêmio de risco do Brasil se revela no câmbio perto dos piores níveis do ano, a bolsa em tendência de queda desde o final de agosto e juro real na ponta longa extremamente alto.

"Com esse prêmio de risco esticado, se o mercado percebesse que as medidas fiscais teriam de fato um grande impacto, haveria uma super-reação no preço dos ativos, e não é isso o que se vê", conclui o gestor.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

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Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/10/2024, quarta-feira.

Os dois projetos de lei (PL) do governo para tirar estatais ainda dependentes do orçamento atrapalharam qualquer impacto positivo que o anúncio pela Fazenda e pelo Planejamento da disposição de cortar de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões de gastos pudesse ter sobre os combalidos ativos brasileiros.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se empenhou no discurso 'não é nada disso que vocês estão pensando' sobre as estatais, mas não parece ter convencido boa parte do mercado.

Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, considera que o texto da legislação proposta é dúbio, com uma transição a ser regulamentada por Ato do Executivo, da qual não se conhece detalhes.

Para o executivo, a possibilidade de tirar despesas das estatais do orçamento, mesmo que o volume não pareça grande de início, abre um precedente e vai na direção contrária da que o governo deveria sinalizar no momento.

"O governo deveria cortar, e não manobrar, gastos", diz o analista, acrescentando que o déficit das estatais vem aumentando. O economista assinala que historicamente a retirada de estatais do orçamento não foi um movimento de saneamento financeiro, e inclusive abriu espaço para triangulações para melhorar artificialmente resultados fiscais, como a ocorrida entre Petrobrás, BNDES-Par e Tesouro Nacional em 2010.

Barros nota que o gasto do governo "fora do regramento fiscal" está se ampliando, como no caso de fundos como o FGO-Pronampe, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) e o fundo para o programa Pé-de-Meia.

O economista considera que o governo não pode perder mais tempo em apresentar uma solução estrutural na área fiscal, com o prazo da dívida pública se encurtando e a parcela da dívida bruta atrelada à Selic chegando a 55%, a maior desde 2006. Ele acrescenta que o déficit nominal em 12 meses está em torno de 10% do PIB e a dívida continua a subir.

Para Barros, o aumento de gastos em R$ 170 bilhões no primeiro ano de governo, combinado com um arcabouço "frouxo e não crível" e mais o crescimento das despesas fora do orçamento trazem "um cheiro de nova matriz econômica com roupagem diferente".

Em relação às medidas de corte de gastos ventiladas pela Fazenda e pelo Planejamento, mirando alvos como supersalários do setor público, seguro-desemprego e abono salarial, também há ceticismo no mercado financeiro.

Um gestor, que preferiu falar em off, aponta que "você pode atacar um problema com poucas medidas de grande impacto ou muitas medidas de pequeno impacto, e o governo parece preferir essa segunda via".

As medidas de grande impacto, que ainda parecem vetadas por Lula, seriam desvincular o piso previdenciário e o BPC do salário mínimo ou mudar os mínimos constitucionais de saúde e educação, reatrelados à receita por iniciativa deste governo.

O problema de atacar o problema com muitas medidas de pequeno impacto, diz o gestor, é que a dispersão de iniciativas (e todas elas provocando resistência) torna menos crível que a solução seja suficiente.

Um segundo ponto negativo, prossegue a fonte, é que o governo sinaliza que essa medidas visam cumprir o arcabouço até 2026. Porém, mesmo que esse objetivo fosse atingido, os resultados primários seriam muito abaixo do necessário para estabilizar a dívida pública e esta continuaria crescendo.

"É algo que talvez pudesse estancar a piora dos ativos, mas não vai reverter a insegurança sobre quando e em que nível a dívida vai ser estabilizada", diz o gestor. Dessa forma, o grande prêmio de risco nos ativos brasileiros deve permanecer.

Finalmente, há a dúvida sobre se Lula vai "topar" ou não as medidas a serem apresentadas por Haddad e Simone Tebet, ou sobre quais ele vai topar e quais não.

O analista nota que o elevado prêmio de risco do Brasil se revela no câmbio perto dos piores níveis do ano, a bolsa em tendência de queda desde o final de agosto e juro real na ponta longa extremamente alto.

"Com esse prêmio de risco esticado, se o mercado percebesse que as medidas fiscais teriam de fato um grande impacto, haveria uma super-reação no preço dos ativos, e não é isso o que se vê", conclui o gestor.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/10/2024, quarta-feira.

Os dois projetos de lei (PL) do governo para tirar estatais ainda dependentes do orçamento atrapalharam qualquer impacto positivo que o anúncio pela Fazenda e pelo Planejamento da disposição de cortar de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões de gastos pudesse ter sobre os combalidos ativos brasileiros.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se empenhou no discurso 'não é nada disso que vocês estão pensando' sobre as estatais, mas não parece ter convencido boa parte do mercado.

Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, considera que o texto da legislação proposta é dúbio, com uma transição a ser regulamentada por Ato do Executivo, da qual não se conhece detalhes.

Para o executivo, a possibilidade de tirar despesas das estatais do orçamento, mesmo que o volume não pareça grande de início, abre um precedente e vai na direção contrária da que o governo deveria sinalizar no momento.

"O governo deveria cortar, e não manobrar, gastos", diz o analista, acrescentando que o déficit das estatais vem aumentando. O economista assinala que historicamente a retirada de estatais do orçamento não foi um movimento de saneamento financeiro, e inclusive abriu espaço para triangulações para melhorar artificialmente resultados fiscais, como a ocorrida entre Petrobrás, BNDES-Par e Tesouro Nacional em 2010.

Barros nota que o gasto do governo "fora do regramento fiscal" está se ampliando, como no caso de fundos como o FGO-Pronampe, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) e o fundo para o programa Pé-de-Meia.

O economista considera que o governo não pode perder mais tempo em apresentar uma solução estrutural na área fiscal, com o prazo da dívida pública se encurtando e a parcela da dívida bruta atrelada à Selic chegando a 55%, a maior desde 2006. Ele acrescenta que o déficit nominal em 12 meses está em torno de 10% do PIB e a dívida continua a subir.

Para Barros, o aumento de gastos em R$ 170 bilhões no primeiro ano de governo, combinado com um arcabouço "frouxo e não crível" e mais o crescimento das despesas fora do orçamento trazem "um cheiro de nova matriz econômica com roupagem diferente".

Em relação às medidas de corte de gastos ventiladas pela Fazenda e pelo Planejamento, mirando alvos como supersalários do setor público, seguro-desemprego e abono salarial, também há ceticismo no mercado financeiro.

Um gestor, que preferiu falar em off, aponta que "você pode atacar um problema com poucas medidas de grande impacto ou muitas medidas de pequeno impacto, e o governo parece preferir essa segunda via".

As medidas de grande impacto, que ainda parecem vetadas por Lula, seriam desvincular o piso previdenciário e o BPC do salário mínimo ou mudar os mínimos constitucionais de saúde e educação, reatrelados à receita por iniciativa deste governo.

O problema de atacar o problema com muitas medidas de pequeno impacto, diz o gestor, é que a dispersão de iniciativas (e todas elas provocando resistência) torna menos crível que a solução seja suficiente.

Um segundo ponto negativo, prossegue a fonte, é que o governo sinaliza que essa medidas visam cumprir o arcabouço até 2026. Porém, mesmo que esse objetivo fosse atingido, os resultados primários seriam muito abaixo do necessário para estabilizar a dívida pública e esta continuaria crescendo.

"É algo que talvez pudesse estancar a piora dos ativos, mas não vai reverter a insegurança sobre quando e em que nível a dívida vai ser estabilizada", diz o gestor. Dessa forma, o grande prêmio de risco nos ativos brasileiros deve permanecer.

Finalmente, há a dúvida sobre se Lula vai "topar" ou não as medidas a serem apresentadas por Haddad e Simone Tebet, ou sobre quais ele vai topar e quais não.

O analista nota que o elevado prêmio de risco do Brasil se revela no câmbio perto dos piores níveis do ano, a bolsa em tendência de queda desde o final de agosto e juro real na ponta longa extremamente alto.

"Com esse prêmio de risco esticado, se o mercado percebesse que as medidas fiscais teriam de fato um grande impacto, haveria uma super-reação no preço dos ativos, e não é isso o que se vê", conclui o gestor.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/10/2024, quarta-feira.

Os dois projetos de lei (PL) do governo para tirar estatais ainda dependentes do orçamento atrapalharam qualquer impacto positivo que o anúncio pela Fazenda e pelo Planejamento da disposição de cortar de R$ 30 bilhões a R$ 50 bilhões de gastos pudesse ter sobre os combalidos ativos brasileiros.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se empenhou no discurso 'não é nada disso que vocês estão pensando' sobre as estatais, mas não parece ter convencido boa parte do mercado.

Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, considera que o texto da legislação proposta é dúbio, com uma transição a ser regulamentada por Ato do Executivo, da qual não se conhece detalhes.

Para o executivo, a possibilidade de tirar despesas das estatais do orçamento, mesmo que o volume não pareça grande de início, abre um precedente e vai na direção contrária da que o governo deveria sinalizar no momento.

"O governo deveria cortar, e não manobrar, gastos", diz o analista, acrescentando que o déficit das estatais vem aumentando. O economista assinala que historicamente a retirada de estatais do orçamento não foi um movimento de saneamento financeiro, e inclusive abriu espaço para triangulações para melhorar artificialmente resultados fiscais, como a ocorrida entre Petrobrás, BNDES-Par e Tesouro Nacional em 2010.

Barros nota que o gasto do governo "fora do regramento fiscal" está se ampliando, como no caso de fundos como o FGO-Pronampe, o Fundo Garantidor de Investimentos (FGI) e o fundo para o programa Pé-de-Meia.

O economista considera que o governo não pode perder mais tempo em apresentar uma solução estrutural na área fiscal, com o prazo da dívida pública se encurtando e a parcela da dívida bruta atrelada à Selic chegando a 55%, a maior desde 2006. Ele acrescenta que o déficit nominal em 12 meses está em torno de 10% do PIB e a dívida continua a subir.

Para Barros, o aumento de gastos em R$ 170 bilhões no primeiro ano de governo, combinado com um arcabouço "frouxo e não crível" e mais o crescimento das despesas fora do orçamento trazem "um cheiro de nova matriz econômica com roupagem diferente".

Em relação às medidas de corte de gastos ventiladas pela Fazenda e pelo Planejamento, mirando alvos como supersalários do setor público, seguro-desemprego e abono salarial, também há ceticismo no mercado financeiro.

Um gestor, que preferiu falar em off, aponta que "você pode atacar um problema com poucas medidas de grande impacto ou muitas medidas de pequeno impacto, e o governo parece preferir essa segunda via".

As medidas de grande impacto, que ainda parecem vetadas por Lula, seriam desvincular o piso previdenciário e o BPC do salário mínimo ou mudar os mínimos constitucionais de saúde e educação, reatrelados à receita por iniciativa deste governo.

O problema de atacar o problema com muitas medidas de pequeno impacto, diz o gestor, é que a dispersão de iniciativas (e todas elas provocando resistência) torna menos crível que a solução seja suficiente.

Um segundo ponto negativo, prossegue a fonte, é que o governo sinaliza que essa medidas visam cumprir o arcabouço até 2026. Porém, mesmo que esse objetivo fosse atingido, os resultados primários seriam muito abaixo do necessário para estabilizar a dívida pública e esta continuaria crescendo.

"É algo que talvez pudesse estancar a piora dos ativos, mas não vai reverter a insegurança sobre quando e em que nível a dívida vai ser estabilizada", diz o gestor. Dessa forma, o grande prêmio de risco nos ativos brasileiros deve permanecer.

Finalmente, há a dúvida sobre se Lula vai "topar" ou não as medidas a serem apresentadas por Haddad e Simone Tebet, ou sobre quais ele vai topar e quais não.

O analista nota que o elevado prêmio de risco do Brasil se revela no câmbio perto dos piores níveis do ano, a bolsa em tendência de queda desde o final de agosto e juro real na ponta longa extremamente alto.

"Com esse prêmio de risco esticado, se o mercado percebesse que as medidas fiscais teriam de fato um grande impacto, haveria uma super-reação no preço dos ativos, e não é isso o que se vê", conclui o gestor.

Fernando Dantas é colunista do Broadcast e escreve às terças, quartas e sextas-feiras (fojdantas@gmail.com)

Esta coluna foi publicada pelo Broadcast em 16/10/2024, quarta-feira.

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