BRASÍLIA - Cobrado a deixar claro qual será a estratégia de política fiscal para compensar a alta de quase R$ 200 bilhões em despesas, o futuro ministro da Economia, Fernando Haddad, prometeu medidas no início de 2023 para fechar o rombo das contas públicas, mas ainda deu poucas dicas do que pretende fazer para garantir a sustentabilidade da dívida e a volta de superávits consistentes.
Na primeira semana após a indicação do seu nome para o cargo pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, Haddad colocou luz em temas que deverão pautar sua atuação no comando da economia no primeiro ano de governo: reforma tributária, antecipação do projeto de arcabouço fiscal, aumento do crédito e estímulo à ampliação das Parcerias Públicos Privadas (PPPs).
Haddad acabou ele próprio, porém, tocando num ponto que economistas já veem como sensível no futuro governo Lula 3: o risco da reedição de divergências na equipe econômica.
“É muito normal em um governo aparecerem pontos de vista diferentes; quando ministros têm pontos de vistas diferentes, o presidente arbitra. Como Bolsonaro não era dado a governar, Paulo Guedes (ministro da Economia do governo Bolsonaro) tocava o governo como imaginava”, disse Haddad em entrevista de quase duas horas que concedeu ao canal fechado GloboNews.
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Haddad admitiu que a recriação dos ministérios do Planejamento e da Indústria e Desenvolvimento pode levar a divergências entre os ministros das três pastas, mas que “não vê isso no horizonte”. Haverá ainda o ministério da Gestão, totalizando quatro pastas resultantes do desmembramento do atual “superministério” da Economia.
O “fogo amigo” marcou a relação dos ex-ministros Antônio Palocci (Fazenda) e José Dirceu (Casa Civil) no primeiro mandato do presidente Lula e tomou corpo em outros momentos dos governos do PT.
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Com Guido Mantega na Fazenda e Henrique Meirelles no Banco Central, nos governos Lula 1 e Lula 2, foi chumbo direto trocado o tempo todo. Mais tarde, no segundo governo Dilma Rousseff, os dois pólos de divergência foram entre os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento). No governo Fernando Henrique Cardoso, a oposição maior foi entre os ministros Pedro Malan (Fazenda) e José Serra (Planejamento).
Ministério da Fazenda do ‘B’
A nova equipe econômica de Lula terá um ministério da Indústria e Comércio “empoderado” por um novo BNDES bem mais forte sob o comando do coordenador de programa de governo, Aloizio Mercadante.
Ele quer montar um time econômico forte na diretoria do banco, que será central na política econômica por determinação de Lula. Como mostrou o Estadão, Mercadante poderá levar Nelson Barbosa, a ex-ministra Tereza Campello e quer atrair CEOs de empresas e outros nomes de peso, formando a sua própria “equipe econômica”.
Embora Haddad e Mercadante tenham viés desenvolvimentista e sejam do PT, a movimentação tem chamado atenção em Brasília de parlamentares, técnicos da área econômica do governo e até mesmo de aliados de Haddad no partido, segundo apurou o Estadão. Nos bastidores se fala num ministério da Fazenda do “B”, como ouviu a reportagem em círculos distintos em Brasília nos últimos dias. Eles vislumbram que cada grupo deverá fazer contraponto na definição dos temas econômicos, com arbitragem final de Lula.
Com esse cenário à vista, a posição mais repetida em Brasília entre integrantes da equipe de transição é a de que a política econômica de Lula será de “governo” e não de um novo “Posto Ipiranga” em referência a Paulo Guedes no governo Bolsonaro.
‘Santo bateu’
Em outra frente, Haddad terá de lidar com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Na nova equipe econômica, serão quatro ministros e mais dois presidentes de bancos.
Apesar do tom amigável do primeiro encontro de Campos Netto e Haddad, na terça-feira passada, quando assessores citaram que o “santo bateu” entre os dois, a realidade bateu dias depois quando o presidente do BC de Bolsonaro, de perfil liberal e que ficará no cargo por mais dois anos, fez vários alertas sobre o risco fiscal da alta de gastos para o combate da inflação, da volta de subsídios dos bancos públicos e de mudança na TLP, a taxa que baliza os empréstimos do BNDES.
Haddad, por outro lado, repetiu duas vezes que o ideal seria conseguir levar a taxa Selic ao nível de um dígito para que o País possa deslanchar. Sobre o BNDES, sugeriu que atuação do banco seja “tópica e precisa”, adiantando que o BNDES não será mais um banco que vai “atrás do sujeito para emprestar”.