ANÁPOLIS (GO) E BRASÍLIA - O diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse nesta terça-feira, 16, que questões domésticas de política econômica contribuíram para um pior desempenho do real se comparado aos seus pares. Ele participou de um fórum organizado pelo Sicredi em Anápolis (GO).
De acordo com o diretor, o quadro do Brasil teve um pior desempenho pelo fato de ter vivenciado um processo de elevação da taxa de juros de curto e longo prazo no momento em que assistiu um agravamento na desancoragem das expectativas de inflação.
O cenário, segundo Galípolo, elevou a preocupação do Banco Central e exigiu com que a autoridade monetária adotasse uma recomendação de maior cautela. “A função do Banco Central é ser mais cuidadoso porque são indícios de uma economia aquecida e significa desinflação mais lenta”, avaliou.
O diretor disse ainda que a reprecificação dos juros nos Estados Unidos, registrada este ano, sinaliza uma taxa terminal mais alta em países emergentes como o Brasil. Ele relembrou, no entanto, que já tem sido discutido cortes na taxa americana em meio aos dados positivos recentes. “Emagreceu a possibilidade de desaceleração mais acentuada dos Estados Unidos”, disse.
Galípolo avaliou que o Brasil tem um dos mercados de câmbio mais líquidos e, muitas vezes, o real é a porta mais “larga de saída” e, por isso, sofre mais com a maior volatilidade do mercado.
Segundo ele, a economia brasileira tem semelhanças com o quadro norte-americano no que diz respeito à surpresa quanto a pujança da atividade econômica. Ela afirmou que os juros mais elevados no Brasil não provocaram a desaceleração econômica esperada.
Galípolo reforçou que o mandato do Banco Central brasileiro é de combate à inflação e garantiu cautela com atividade pujante e mercado de trabalho aquecido. Segundo o diretor, a inflação corrente tem sido mais benigna recentemente, mas ponderou que permanecem preocupações sobre inflação de serviços, especialmente em mão de obra. Ele citou que o desemprego permanece baixo, enquanto a renda segue crescendo.
Apesar do mercado de trabalho dinâmico, ele disse que ainda não foi identificado esse repasse para inflação, mas ponderou que esse cenário acaba refletindo em uma desinflação mais lenta.
O diretor do BC evitou oferecer pistas sobre a visão da autoridade monetária para os juros no futuro. Ele afirmou que o aumento da incerteza e da adversidade exige que não haja um forward guidance.
“A gente passou a retirar esse guidance e ficar totalmente com todas as alternativas em aberto justamente porque a incerteza aumentou, a adversidade aumentou”, disse. “Isso passou a nos colocar nessa situação em que estamos mais dependentes de dados, não oferecendo nenhum tipo de sinalização sobre o futuro.”
Galípolo disse que houve aumento do endividamento dos países avançados e que a alta global dos juros aumenta o custo de financiamento dessas nações. O juro longo mais alto, segundo ele, se dá pelo fato de que os países estão rolando dívidas mais volumosas com custo maior.
Apesar do juro elevado, ele disse que não vê enfraquecimento das economias globais. O diretor afirmou ainda que a desinflação surpreendeu positivamente ao longo de 2023, mas ponderou que agora está mais lenta do que se imaginava.
Durante o evento, Galípolo analisou os efeitos gerados pela pandemia da covid-19 no cenário macroeconômico global. Ele comentou que, por anos, foram registradas taxas de juros globais muito baixas, inclusive negativas. Esse cenário, somado à transferência de renda às famílias mais pobres ao longo da covid-19, impulsionam a demanda nos países, inclusive no Brasil. O Banco Central, segundo ele, respondeu rapidamente aos reflexos inflacionários.
Convergência de expectativas
Galípolo garantiu que a convergência das expectativas para o centro da meta, de 3%, é uma “prioridade” da autoridade monetária. Segundo ele, o BC vê no Focus um subsídio de “relevância enorme” para a sua tomada de decisão. “É uma prioridade, e não só nesse momento”, disse Galípolo.
Ele explicou que, mesmo nessa fase anterior, o BC já tinha dificuldade de avaliar as causas por trás da desancoragem. Segundo o diretor, havia a percepção de que, se os números de inflação corrente melhorassem, as projeções do mercado poderiam acompanhar. “Na verdade, a dissonância aumentou”, disse.
Galípolo relatou ter ouvido críticas de que o BC dá muito ou pouco peso ao Focus, mas afirmou que a autoridade monetária tem uma institucionalidade que “sabe consumir” as informações do relatório. E afirmou que o fato de o Copom mencionar mais vocalmente um assunto não necessariamente significa que esse tema tem mais peso na sua análise.
“Nós estamos simplesmente tentando ser transparentes e comunicar aos agentes o que está nos preocupando mais neste momento e o que está nos chamando mais atenção”, disse.