Gargalos no Porto de Santos provocam perdas de mais de US$ 21 bi em comércio exterior, aponta estudo


Para o Centronave, dos armadores de contêineres, há um esgotamento do porto santista, que não consegue receber navios de grande porte; Autoridade Portuária refuta as críticas

Por Ivo Ribeiro
Atualização:

O sistema portuário brasileiro enfrenta uma série de gargalos para embarques e desembarques de cargas, e os problemas são mais evidentes no Porto de Santos, o maior da América Latina e responsável por 40% do volume movimentado do País. É o que apontam armadores (como são chamadas as pessoas ou empresas responsáveis pelo transporte marítimo) afiliados ao Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave) e donos de cargas de café reunidos no Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). A Autoridade Portuária de Santos (APS) refuta as críticas.

Os executivos das duas entidades veem um esgotamento da capacidade portuária brasileira, em grande parte no porto santista. Estimativas do Centronave indicam uma perda anual superior a US$ 21 bilhões com o comércio exterior, em especial por exportações não efetivadas. Um dos motivos, dizem, é por não poderem atracar, em Santos, de forma regular, embarcações de contêineres de grande porte, os navios de última geração. Por exemplo, navios com 366 metros de comprimento, aptos a transportar de 13 mil a 16 mil TEUs (unidade de medida do contêiner, equivalente a 20 pés, ou 6,1 metros de comprimento).

Segundo entidades, limitações de estrutura em Santos prejudicam o comércio exterior brasileiro Foto: Tiago Queiroz/Estadão
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Dos 17 portos com operações de contêineres do País, só seis são homologados para esse tipo de navio, mas nenhum deles consegue carregar a embarcação à plena capacidade por conta de restrições de calado operacional, que resultam em déficits de carregamento entre 4% (Sepetiba-RJ) e 23% em (Paranaguá-PR), de acordo com o Centronave. Mas a entidade ressalta que a maior parte da carga nacional não está nesses seis portos, e sim em Santos, que enfrenta limitações de calado. Realizou apenas algumas escalas desse navios neste amo. O máximo que Santos pode garantir de calado, em operação comum, é 14,5 metros, insuficiente para os grandes navios de contêineres.

As embarcações de grande porte lançadas a partir de 2014 — quatro novas classes de navios, de 16 mil, 19 mil, 23 mil e 24 mil TEUs — não entram no Brasil. Apenas as da classe de 14 mil TEUs, construídos de 2008 a 2012. E, mesmo assim, enfrentam restrições em vários portos brasileiros, entre eles o de Santos, afirmam executivos de companhias do setor de navegação.

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta as críticas ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres pelo menos até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto, entre outros, não teria condições para atracar essas embarcações (leia mais abaixo).

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Carga no chão

”Estamos ficando com carga no chão, sem poder embarcar”, diz Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé, em entrevista ao Estadão. Segundo o executivo, em pesquisa com 30 exportadores de café, que respondem por 77% dos embarques nacionais, constatou-se piora na exportação do grão pelo porto santista. “No mês passado em relação a maio, a carga que deixou de ser embarcada aumentou 68%, atingindo 725.501 sacas (volume equivalente a 2.198 contêineres), contra as 510 mil do mês anterior”, afirmou.

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Pelas contas da entidade, o volume não embarcado em junho corresponde a uma perda de US$ 173 milhões (cerca de R$ 950 milhões pela cotação atual do dólar). Além disso, diz que as empresas que não conseguiram embarcar tiveram perdas de R$ 4,7 milhões no mês com custos de armazenagens adicionais, enquanto aguardavam nova janela de embarque (“pré-stacking”) e outras despesas cobradas. O prejuízo pode passar de R$ 41 milhões se forem computado volumes não embarcados desde outubro de 2023, quando foram verificados problemas de atrasos (média de 80%) e alterações de movimentação. No período, o Brasil exportou a média de 4,1 milhões de sacas de café por mês. O executivo do Cecafé diz que a situação pode piorar neste semestre, quando crescem embarques de cargas de algodão, açúcar e também de café no porto.

Segundo o Cecafé, em 2023 a exportação de café (a quinta maior carga do agronegócio brasileiro) foi realizada por 288 empresas. Até 2021/2022, cerca de 80% do café vendido ao exterior saía pelo porto santista. “Certamente, quase todas essas empresas tiveram o mesmo entrave em seus negócios”, disse o diretor. Na sua avaliação, esse e outros problemas mostram que a situação no Porto de Santos é crítica pela falta de espaços e que pode entrar em colapso por volta de 2027/2028, se nada for feito.

Para Heron, isso mostra que Santos tem de ampliar sua capacidade, resgatando o projeto de um novo terminal. O que atenderia com mais competitividade é a versão original do STS10, projeto de terminal com aprovação paralisada desde 2022, em discussões internas na Autoridade Portuária. Segundo o Centronave, os cálculos apontam uma capacidade adicional de 500 mil contêineres/ano que deixa de ser ofertada hoje a exportadores brasileiros.

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A infraestrutura instalada atual é insuficiente, aponta a entidade, lembrando que há mais de uma década não são instalados novos terminais portuários de contêineres em Santos. Os mais recentes — BTP e DPW — entraram em operação em 2013. É a primeira vez que donos da carga e armadores se sentam na mesma mesa para expor, juntos, os problemas enfrentados por ambos, afirma Heron.

Cláudio Loureiro, diretor executivo do Centronave, destaca as dificuldades de calado em Santos para navios de grande porte. “É um dos limitadores mais relevantes, e por isso o Brasil está defasado na atracação regular dessas embarcações”. Para ele, há falta de muita coisa — de capacidade de atracação a berços”. Lembra que somente navios fabricados até 2012 conseguem ter uma operação normal no porto, com capacidade ocupada “quase plena” (têm de reduzir o volume de carga para evitar o encalhe).

O problema, diz ele, está também na retroárea portuária. “Antes, o navio esperava a carga; agora é o inverso, principalmente de contêiner”. Ele lembra que a situação se agrava porque a maior parte da carga chega por caminhões ao porto, sendo necessária uma área maior para colocação das cargas.

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Segundo o diretor, o armador já vem enfrentando aumento no tempo de espera dos navios. De oito horas em 2019, o tempo saltou para 20 horas em 2023. “Mas há casos de associados nossos com espera de mais de 40 horas”.

Caminhões levando carga para o Porto de Santos Foto: Fernanda Luz/Estadão

Conforme dizem, os terminais em portos do País estão operando com mais de 80% da capacidade, bem acima do índice recomendado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para operação dos berços de atracação, que é de 65%. Para movimentação nos pátios, o índice é de 70%. A explicação é que, quando se passa desse porcentual, começam a se formar filas de navios. “Santos já superou 85%”, afirma Loureiro. “Não podemos ser ineficientes na logística portuária. Isso afeta sensivelmente nosso comércio exterior.”

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Para a APS, a questão dos gargalos no porto é pontual. Atribui o fato à avaria ocorrida em janeiro em um berço de atração do terminal BTP, que já retomou as operações, e à reforma do terminal da Portonave, em Navegantes (SC). O Centronave contesta e diz que se trata de um problema estrutural e que, caso não tivessem ultrapassado os limites estabelecidos pela OCDE (nos berços de atracação e nos pátios), essas contingências operacionais não estariam ocorrendo.

A novela do STS10

Para operadores e donos de cargas, o cenário é de exaustão da capacidade operacional. A constatação, dizem, já leva em conta os anúncios de aumento de capacidade do terminais da Santos Brasil, a partir deste ano; do BTP (a partir de 2026) e da DPW (2030 em diante). Isso, até mesmo considerando a potencial construção do STS10. “Não há um plano real de ampliação da capacidade, nem aquaviária nem de terminais de contêineres. O programa de leilões, que tinha um cronograma claro, inclusive com a previsão de data para o STS10, ficou parado em 2022″, afirmam.

O terminal, cujo projeto se encontra em revisão após consulta pública, foi desenhado para instalação na região portuária Saboó, na margem direita do Porto de Santos. Dedicado ao armazenamento e à movimentação de contêineres, ocuparia área de 423 mil metros quadrados, com 1,3 km de cais, conforme dados do governo federal. Foi selecionado como área prioritária em programa do governo federal lançado em 2013.

O mais recente estudo do terminal, com data-base de setembro de 2021, previa contrato de arrendamento de 25 anos e definia início das operações em 2023. Isso, porém, não saiu do papel, e o STS10 continua envolvido em discussões sobre sua licitação pela Autoridade Portuária de Santos. No projeto original estava prevista capacidade instalada de 2,4 milhão de TEUs por ano.

O STS10 sofreu idas e vindas por parte das autoridades portuárias. Cogitou-se até mudar o local do terminal, levando-o para a Vila dos Criadores, região que fica no fundo do canal do porto e, segundo avaliação de pessoas do setor, sem condições de abrigar um empreendimento dessa dimensão. Entre os problemas, está a alocação de mais mil famílias (5 mil pessoas) da localidade, passivo fundiário e ambiental desconhecidos.

Para Heron, do Cecafé, é fundamental que Santos dê urgência à definição e licitação do STS10, pois entre o início da obra e o de operação demanda um tempo de três a cinco anos. “A carga conteinerizada em Santos não para de crescer. Não sei como será daqui a cinco anos. O STS10 será um suspiro”. O fato é que o processo do terminal foi estancado pelo governo, que propõe uma solução compartilhada da área com um terminal de passageiros e o Ecoporto (terminal de contêiner de pequeno porte existente no local, que tinha autorização para operar até meados de 2023, conforme o estudo federal).

No mês passado, nos dias 13 e 14, foram feitas três audiências públicas pela APS, para discutir a alteração da via poligonal, o reposicionamento do terminal e a mudança de local do Ecoporto, segundo Loureiro, do Centronave. Para ele, a solução é priorizar o projeto no local definido. “É de interesse do comércio exterior do País”, diz o diretor. “Há um projeto pronto, já aprovado pela Antaq (agência reguladora), TCU (Tribunal de Contas da União) e também no programa estratégico da APS. “É uma solução madura e que ajuda a resolver o gargalo portuário em Santos, que tende a se agravar nos próximos anos se nada for feito. Isso nos preocupa muito e não vejo senso de urgência.”

O que diz a autoridade portuária

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta quase todas as críticas do setor ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto não teria condições para atracar essas embarcações. Também nega um colapso futuro no porto santista, pois há investimentos para ampliar a capacidade.

A APS acrescenta que, além da dragagem ininterrupta de manutenção dos 15 metros de calado do canal e da dragagem dos berços de atracação, “o porto também prepara uma PPP para concessão, por 20 anos, da dragagem de aprofundamento do seu canal de navegação para 16 metros, e depois 17 metros de calado, para melhor atender os grandes navios de contêineres.

Informa ainda que “o café que chega ao Porto é embarcado”, em relação à informação do Cecafé que mais de 725 mil sacas, em junho, deixaram de ser embarcadas. Atribui o maior gargalo enfrentado em terra à falta de uma nova ligação Planalto-Baixada, uma vez que a Via Anchieta, inaugurada há 77 anos, quando o porto operava 4 milhões de toneladas ao ano, ainda é a única opção de descida da serra para caminhões, quando Santos já movimenta 174 milhões de toneladas anuais.

De acordo com a APS, o Porto de Santos movimentou volume recorde de contêineres — cerca de 5 milhões de TEUs em 2022 e 4,8 milhões de TEUs no ano passado. “A capacidade do complexo é estimada em 5,9 milhões de TEUs, o que indica que o Porto não atingiu o limite de sua capacidade” em seus quatro terminais — Santos Brasil (2 milhões de TEUs), BTP (1,8 milhão), TUP DP World Santos (1,2 milhão) e Ecoporto Santos (300 mil). E que esses terminais podem ampliar suas capacidades até a 7,5 milhões de TEUs até 2030, o suficiente para atender a demanda projetada até 2035.

A respeito do STS10, informou que propõe o adensamento (expansão) desse terminal, sem qualquer transferência para outro local, descartando a ideia de levar o projeto para a Vila dos Criadores. Em relação a um novo terminal de passageiros no mesmo local, disse que “uma das possibilidades aventadas seria a utilização de uma parte do terminal da Ecoporto e que foi também cogitada a construção de um píer próprio”.

Por fim, critica a gestão anterior da APS, dizendo que foram investidos apenas R$ 74 milhões em infraestrutura no período 2019-2022: “Nos próximos cinco anos estão programados R$ 10 bilhões em recursos públicos, sem falar dos privados”. No entanto, não explicou se nesse valor projetado está o investimento superior a R$ 6 bilhões no túnel para ligar as cidades de Santos e Guarujá.

O sistema portuário brasileiro enfrenta uma série de gargalos para embarques e desembarques de cargas, e os problemas são mais evidentes no Porto de Santos, o maior da América Latina e responsável por 40% do volume movimentado do País. É o que apontam armadores (como são chamadas as pessoas ou empresas responsáveis pelo transporte marítimo) afiliados ao Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave) e donos de cargas de café reunidos no Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). A Autoridade Portuária de Santos (APS) refuta as críticas.

Os executivos das duas entidades veem um esgotamento da capacidade portuária brasileira, em grande parte no porto santista. Estimativas do Centronave indicam uma perda anual superior a US$ 21 bilhões com o comércio exterior, em especial por exportações não efetivadas. Um dos motivos, dizem, é por não poderem atracar, em Santos, de forma regular, embarcações de contêineres de grande porte, os navios de última geração. Por exemplo, navios com 366 metros de comprimento, aptos a transportar de 13 mil a 16 mil TEUs (unidade de medida do contêiner, equivalente a 20 pés, ou 6,1 metros de comprimento).

Segundo entidades, limitações de estrutura em Santos prejudicam o comércio exterior brasileiro Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Dos 17 portos com operações de contêineres do País, só seis são homologados para esse tipo de navio, mas nenhum deles consegue carregar a embarcação à plena capacidade por conta de restrições de calado operacional, que resultam em déficits de carregamento entre 4% (Sepetiba-RJ) e 23% em (Paranaguá-PR), de acordo com o Centronave. Mas a entidade ressalta que a maior parte da carga nacional não está nesses seis portos, e sim em Santos, que enfrenta limitações de calado. Realizou apenas algumas escalas desse navios neste amo. O máximo que Santos pode garantir de calado, em operação comum, é 14,5 metros, insuficiente para os grandes navios de contêineres.

As embarcações de grande porte lançadas a partir de 2014 — quatro novas classes de navios, de 16 mil, 19 mil, 23 mil e 24 mil TEUs — não entram no Brasil. Apenas as da classe de 14 mil TEUs, construídos de 2008 a 2012. E, mesmo assim, enfrentam restrições em vários portos brasileiros, entre eles o de Santos, afirmam executivos de companhias do setor de navegação.

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta as críticas ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres pelo menos até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto, entre outros, não teria condições para atracar essas embarcações (leia mais abaixo).

Carga no chão

”Estamos ficando com carga no chão, sem poder embarcar”, diz Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé, em entrevista ao Estadão. Segundo o executivo, em pesquisa com 30 exportadores de café, que respondem por 77% dos embarques nacionais, constatou-se piora na exportação do grão pelo porto santista. “No mês passado em relação a maio, a carga que deixou de ser embarcada aumentou 68%, atingindo 725.501 sacas (volume equivalente a 2.198 contêineres), contra as 510 mil do mês anterior”, afirmou.

Pelas contas da entidade, o volume não embarcado em junho corresponde a uma perda de US$ 173 milhões (cerca de R$ 950 milhões pela cotação atual do dólar). Além disso, diz que as empresas que não conseguiram embarcar tiveram perdas de R$ 4,7 milhões no mês com custos de armazenagens adicionais, enquanto aguardavam nova janela de embarque (“pré-stacking”) e outras despesas cobradas. O prejuízo pode passar de R$ 41 milhões se forem computado volumes não embarcados desde outubro de 2023, quando foram verificados problemas de atrasos (média de 80%) e alterações de movimentação. No período, o Brasil exportou a média de 4,1 milhões de sacas de café por mês. O executivo do Cecafé diz que a situação pode piorar neste semestre, quando crescem embarques de cargas de algodão, açúcar e também de café no porto.

Segundo o Cecafé, em 2023 a exportação de café (a quinta maior carga do agronegócio brasileiro) foi realizada por 288 empresas. Até 2021/2022, cerca de 80% do café vendido ao exterior saía pelo porto santista. “Certamente, quase todas essas empresas tiveram o mesmo entrave em seus negócios”, disse o diretor. Na sua avaliação, esse e outros problemas mostram que a situação no Porto de Santos é crítica pela falta de espaços e que pode entrar em colapso por volta de 2027/2028, se nada for feito.

Para Heron, isso mostra que Santos tem de ampliar sua capacidade, resgatando o projeto de um novo terminal. O que atenderia com mais competitividade é a versão original do STS10, projeto de terminal com aprovação paralisada desde 2022, em discussões internas na Autoridade Portuária. Segundo o Centronave, os cálculos apontam uma capacidade adicional de 500 mil contêineres/ano que deixa de ser ofertada hoje a exportadores brasileiros.

A infraestrutura instalada atual é insuficiente, aponta a entidade, lembrando que há mais de uma década não são instalados novos terminais portuários de contêineres em Santos. Os mais recentes — BTP e DPW — entraram em operação em 2013. É a primeira vez que donos da carga e armadores se sentam na mesma mesa para expor, juntos, os problemas enfrentados por ambos, afirma Heron.

Cláudio Loureiro, diretor executivo do Centronave, destaca as dificuldades de calado em Santos para navios de grande porte. “É um dos limitadores mais relevantes, e por isso o Brasil está defasado na atracação regular dessas embarcações”. Para ele, há falta de muita coisa — de capacidade de atracação a berços”. Lembra que somente navios fabricados até 2012 conseguem ter uma operação normal no porto, com capacidade ocupada “quase plena” (têm de reduzir o volume de carga para evitar o encalhe).

O problema, diz ele, está também na retroárea portuária. “Antes, o navio esperava a carga; agora é o inverso, principalmente de contêiner”. Ele lembra que a situação se agrava porque a maior parte da carga chega por caminhões ao porto, sendo necessária uma área maior para colocação das cargas.

Segundo o diretor, o armador já vem enfrentando aumento no tempo de espera dos navios. De oito horas em 2019, o tempo saltou para 20 horas em 2023. “Mas há casos de associados nossos com espera de mais de 40 horas”.

Caminhões levando carga para o Porto de Santos Foto: Fernanda Luz/Estadão

Conforme dizem, os terminais em portos do País estão operando com mais de 80% da capacidade, bem acima do índice recomendado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para operação dos berços de atracação, que é de 65%. Para movimentação nos pátios, o índice é de 70%. A explicação é que, quando se passa desse porcentual, começam a se formar filas de navios. “Santos já superou 85%”, afirma Loureiro. “Não podemos ser ineficientes na logística portuária. Isso afeta sensivelmente nosso comércio exterior.”

Para a APS, a questão dos gargalos no porto é pontual. Atribui o fato à avaria ocorrida em janeiro em um berço de atração do terminal BTP, que já retomou as operações, e à reforma do terminal da Portonave, em Navegantes (SC). O Centronave contesta e diz que se trata de um problema estrutural e que, caso não tivessem ultrapassado os limites estabelecidos pela OCDE (nos berços de atracação e nos pátios), essas contingências operacionais não estariam ocorrendo.

A novela do STS10

Para operadores e donos de cargas, o cenário é de exaustão da capacidade operacional. A constatação, dizem, já leva em conta os anúncios de aumento de capacidade do terminais da Santos Brasil, a partir deste ano; do BTP (a partir de 2026) e da DPW (2030 em diante). Isso, até mesmo considerando a potencial construção do STS10. “Não há um plano real de ampliação da capacidade, nem aquaviária nem de terminais de contêineres. O programa de leilões, que tinha um cronograma claro, inclusive com a previsão de data para o STS10, ficou parado em 2022″, afirmam.

O terminal, cujo projeto se encontra em revisão após consulta pública, foi desenhado para instalação na região portuária Saboó, na margem direita do Porto de Santos. Dedicado ao armazenamento e à movimentação de contêineres, ocuparia área de 423 mil metros quadrados, com 1,3 km de cais, conforme dados do governo federal. Foi selecionado como área prioritária em programa do governo federal lançado em 2013.

O mais recente estudo do terminal, com data-base de setembro de 2021, previa contrato de arrendamento de 25 anos e definia início das operações em 2023. Isso, porém, não saiu do papel, e o STS10 continua envolvido em discussões sobre sua licitação pela Autoridade Portuária de Santos. No projeto original estava prevista capacidade instalada de 2,4 milhão de TEUs por ano.

O STS10 sofreu idas e vindas por parte das autoridades portuárias. Cogitou-se até mudar o local do terminal, levando-o para a Vila dos Criadores, região que fica no fundo do canal do porto e, segundo avaliação de pessoas do setor, sem condições de abrigar um empreendimento dessa dimensão. Entre os problemas, está a alocação de mais mil famílias (5 mil pessoas) da localidade, passivo fundiário e ambiental desconhecidos.

Para Heron, do Cecafé, é fundamental que Santos dê urgência à definição e licitação do STS10, pois entre o início da obra e o de operação demanda um tempo de três a cinco anos. “A carga conteinerizada em Santos não para de crescer. Não sei como será daqui a cinco anos. O STS10 será um suspiro”. O fato é que o processo do terminal foi estancado pelo governo, que propõe uma solução compartilhada da área com um terminal de passageiros e o Ecoporto (terminal de contêiner de pequeno porte existente no local, que tinha autorização para operar até meados de 2023, conforme o estudo federal).

No mês passado, nos dias 13 e 14, foram feitas três audiências públicas pela APS, para discutir a alteração da via poligonal, o reposicionamento do terminal e a mudança de local do Ecoporto, segundo Loureiro, do Centronave. Para ele, a solução é priorizar o projeto no local definido. “É de interesse do comércio exterior do País”, diz o diretor. “Há um projeto pronto, já aprovado pela Antaq (agência reguladora), TCU (Tribunal de Contas da União) e também no programa estratégico da APS. “É uma solução madura e que ajuda a resolver o gargalo portuário em Santos, que tende a se agravar nos próximos anos se nada for feito. Isso nos preocupa muito e não vejo senso de urgência.”

O que diz a autoridade portuária

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta quase todas as críticas do setor ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto não teria condições para atracar essas embarcações. Também nega um colapso futuro no porto santista, pois há investimentos para ampliar a capacidade.

A APS acrescenta que, além da dragagem ininterrupta de manutenção dos 15 metros de calado do canal e da dragagem dos berços de atracação, “o porto também prepara uma PPP para concessão, por 20 anos, da dragagem de aprofundamento do seu canal de navegação para 16 metros, e depois 17 metros de calado, para melhor atender os grandes navios de contêineres.

Informa ainda que “o café que chega ao Porto é embarcado”, em relação à informação do Cecafé que mais de 725 mil sacas, em junho, deixaram de ser embarcadas. Atribui o maior gargalo enfrentado em terra à falta de uma nova ligação Planalto-Baixada, uma vez que a Via Anchieta, inaugurada há 77 anos, quando o porto operava 4 milhões de toneladas ao ano, ainda é a única opção de descida da serra para caminhões, quando Santos já movimenta 174 milhões de toneladas anuais.

De acordo com a APS, o Porto de Santos movimentou volume recorde de contêineres — cerca de 5 milhões de TEUs em 2022 e 4,8 milhões de TEUs no ano passado. “A capacidade do complexo é estimada em 5,9 milhões de TEUs, o que indica que o Porto não atingiu o limite de sua capacidade” em seus quatro terminais — Santos Brasil (2 milhões de TEUs), BTP (1,8 milhão), TUP DP World Santos (1,2 milhão) e Ecoporto Santos (300 mil). E que esses terminais podem ampliar suas capacidades até a 7,5 milhões de TEUs até 2030, o suficiente para atender a demanda projetada até 2035.

A respeito do STS10, informou que propõe o adensamento (expansão) desse terminal, sem qualquer transferência para outro local, descartando a ideia de levar o projeto para a Vila dos Criadores. Em relação a um novo terminal de passageiros no mesmo local, disse que “uma das possibilidades aventadas seria a utilização de uma parte do terminal da Ecoporto e que foi também cogitada a construção de um píer próprio”.

Por fim, critica a gestão anterior da APS, dizendo que foram investidos apenas R$ 74 milhões em infraestrutura no período 2019-2022: “Nos próximos cinco anos estão programados R$ 10 bilhões em recursos públicos, sem falar dos privados”. No entanto, não explicou se nesse valor projetado está o investimento superior a R$ 6 bilhões no túnel para ligar as cidades de Santos e Guarujá.

O sistema portuário brasileiro enfrenta uma série de gargalos para embarques e desembarques de cargas, e os problemas são mais evidentes no Porto de Santos, o maior da América Latina e responsável por 40% do volume movimentado do País. É o que apontam armadores (como são chamadas as pessoas ou empresas responsáveis pelo transporte marítimo) afiliados ao Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave) e donos de cargas de café reunidos no Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). A Autoridade Portuária de Santos (APS) refuta as críticas.

Os executivos das duas entidades veem um esgotamento da capacidade portuária brasileira, em grande parte no porto santista. Estimativas do Centronave indicam uma perda anual superior a US$ 21 bilhões com o comércio exterior, em especial por exportações não efetivadas. Um dos motivos, dizem, é por não poderem atracar, em Santos, de forma regular, embarcações de contêineres de grande porte, os navios de última geração. Por exemplo, navios com 366 metros de comprimento, aptos a transportar de 13 mil a 16 mil TEUs (unidade de medida do contêiner, equivalente a 20 pés, ou 6,1 metros de comprimento).

Segundo entidades, limitações de estrutura em Santos prejudicam o comércio exterior brasileiro Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Dos 17 portos com operações de contêineres do País, só seis são homologados para esse tipo de navio, mas nenhum deles consegue carregar a embarcação à plena capacidade por conta de restrições de calado operacional, que resultam em déficits de carregamento entre 4% (Sepetiba-RJ) e 23% em (Paranaguá-PR), de acordo com o Centronave. Mas a entidade ressalta que a maior parte da carga nacional não está nesses seis portos, e sim em Santos, que enfrenta limitações de calado. Realizou apenas algumas escalas desse navios neste amo. O máximo que Santos pode garantir de calado, em operação comum, é 14,5 metros, insuficiente para os grandes navios de contêineres.

As embarcações de grande porte lançadas a partir de 2014 — quatro novas classes de navios, de 16 mil, 19 mil, 23 mil e 24 mil TEUs — não entram no Brasil. Apenas as da classe de 14 mil TEUs, construídos de 2008 a 2012. E, mesmo assim, enfrentam restrições em vários portos brasileiros, entre eles o de Santos, afirmam executivos de companhias do setor de navegação.

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta as críticas ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres pelo menos até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto, entre outros, não teria condições para atracar essas embarcações (leia mais abaixo).

Carga no chão

”Estamos ficando com carga no chão, sem poder embarcar”, diz Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé, em entrevista ao Estadão. Segundo o executivo, em pesquisa com 30 exportadores de café, que respondem por 77% dos embarques nacionais, constatou-se piora na exportação do grão pelo porto santista. “No mês passado em relação a maio, a carga que deixou de ser embarcada aumentou 68%, atingindo 725.501 sacas (volume equivalente a 2.198 contêineres), contra as 510 mil do mês anterior”, afirmou.

Pelas contas da entidade, o volume não embarcado em junho corresponde a uma perda de US$ 173 milhões (cerca de R$ 950 milhões pela cotação atual do dólar). Além disso, diz que as empresas que não conseguiram embarcar tiveram perdas de R$ 4,7 milhões no mês com custos de armazenagens adicionais, enquanto aguardavam nova janela de embarque (“pré-stacking”) e outras despesas cobradas. O prejuízo pode passar de R$ 41 milhões se forem computado volumes não embarcados desde outubro de 2023, quando foram verificados problemas de atrasos (média de 80%) e alterações de movimentação. No período, o Brasil exportou a média de 4,1 milhões de sacas de café por mês. O executivo do Cecafé diz que a situação pode piorar neste semestre, quando crescem embarques de cargas de algodão, açúcar e também de café no porto.

Segundo o Cecafé, em 2023 a exportação de café (a quinta maior carga do agronegócio brasileiro) foi realizada por 288 empresas. Até 2021/2022, cerca de 80% do café vendido ao exterior saía pelo porto santista. “Certamente, quase todas essas empresas tiveram o mesmo entrave em seus negócios”, disse o diretor. Na sua avaliação, esse e outros problemas mostram que a situação no Porto de Santos é crítica pela falta de espaços e que pode entrar em colapso por volta de 2027/2028, se nada for feito.

Para Heron, isso mostra que Santos tem de ampliar sua capacidade, resgatando o projeto de um novo terminal. O que atenderia com mais competitividade é a versão original do STS10, projeto de terminal com aprovação paralisada desde 2022, em discussões internas na Autoridade Portuária. Segundo o Centronave, os cálculos apontam uma capacidade adicional de 500 mil contêineres/ano que deixa de ser ofertada hoje a exportadores brasileiros.

A infraestrutura instalada atual é insuficiente, aponta a entidade, lembrando que há mais de uma década não são instalados novos terminais portuários de contêineres em Santos. Os mais recentes — BTP e DPW — entraram em operação em 2013. É a primeira vez que donos da carga e armadores se sentam na mesma mesa para expor, juntos, os problemas enfrentados por ambos, afirma Heron.

Cláudio Loureiro, diretor executivo do Centronave, destaca as dificuldades de calado em Santos para navios de grande porte. “É um dos limitadores mais relevantes, e por isso o Brasil está defasado na atracação regular dessas embarcações”. Para ele, há falta de muita coisa — de capacidade de atracação a berços”. Lembra que somente navios fabricados até 2012 conseguem ter uma operação normal no porto, com capacidade ocupada “quase plena” (têm de reduzir o volume de carga para evitar o encalhe).

O problema, diz ele, está também na retroárea portuária. “Antes, o navio esperava a carga; agora é o inverso, principalmente de contêiner”. Ele lembra que a situação se agrava porque a maior parte da carga chega por caminhões ao porto, sendo necessária uma área maior para colocação das cargas.

Segundo o diretor, o armador já vem enfrentando aumento no tempo de espera dos navios. De oito horas em 2019, o tempo saltou para 20 horas em 2023. “Mas há casos de associados nossos com espera de mais de 40 horas”.

Caminhões levando carga para o Porto de Santos Foto: Fernanda Luz/Estadão

Conforme dizem, os terminais em portos do País estão operando com mais de 80% da capacidade, bem acima do índice recomendado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para operação dos berços de atracação, que é de 65%. Para movimentação nos pátios, o índice é de 70%. A explicação é que, quando se passa desse porcentual, começam a se formar filas de navios. “Santos já superou 85%”, afirma Loureiro. “Não podemos ser ineficientes na logística portuária. Isso afeta sensivelmente nosso comércio exterior.”

Para a APS, a questão dos gargalos no porto é pontual. Atribui o fato à avaria ocorrida em janeiro em um berço de atração do terminal BTP, que já retomou as operações, e à reforma do terminal da Portonave, em Navegantes (SC). O Centronave contesta e diz que se trata de um problema estrutural e que, caso não tivessem ultrapassado os limites estabelecidos pela OCDE (nos berços de atracação e nos pátios), essas contingências operacionais não estariam ocorrendo.

A novela do STS10

Para operadores e donos de cargas, o cenário é de exaustão da capacidade operacional. A constatação, dizem, já leva em conta os anúncios de aumento de capacidade do terminais da Santos Brasil, a partir deste ano; do BTP (a partir de 2026) e da DPW (2030 em diante). Isso, até mesmo considerando a potencial construção do STS10. “Não há um plano real de ampliação da capacidade, nem aquaviária nem de terminais de contêineres. O programa de leilões, que tinha um cronograma claro, inclusive com a previsão de data para o STS10, ficou parado em 2022″, afirmam.

O terminal, cujo projeto se encontra em revisão após consulta pública, foi desenhado para instalação na região portuária Saboó, na margem direita do Porto de Santos. Dedicado ao armazenamento e à movimentação de contêineres, ocuparia área de 423 mil metros quadrados, com 1,3 km de cais, conforme dados do governo federal. Foi selecionado como área prioritária em programa do governo federal lançado em 2013.

O mais recente estudo do terminal, com data-base de setembro de 2021, previa contrato de arrendamento de 25 anos e definia início das operações em 2023. Isso, porém, não saiu do papel, e o STS10 continua envolvido em discussões sobre sua licitação pela Autoridade Portuária de Santos. No projeto original estava prevista capacidade instalada de 2,4 milhão de TEUs por ano.

O STS10 sofreu idas e vindas por parte das autoridades portuárias. Cogitou-se até mudar o local do terminal, levando-o para a Vila dos Criadores, região que fica no fundo do canal do porto e, segundo avaliação de pessoas do setor, sem condições de abrigar um empreendimento dessa dimensão. Entre os problemas, está a alocação de mais mil famílias (5 mil pessoas) da localidade, passivo fundiário e ambiental desconhecidos.

Para Heron, do Cecafé, é fundamental que Santos dê urgência à definição e licitação do STS10, pois entre o início da obra e o de operação demanda um tempo de três a cinco anos. “A carga conteinerizada em Santos não para de crescer. Não sei como será daqui a cinco anos. O STS10 será um suspiro”. O fato é que o processo do terminal foi estancado pelo governo, que propõe uma solução compartilhada da área com um terminal de passageiros e o Ecoporto (terminal de contêiner de pequeno porte existente no local, que tinha autorização para operar até meados de 2023, conforme o estudo federal).

No mês passado, nos dias 13 e 14, foram feitas três audiências públicas pela APS, para discutir a alteração da via poligonal, o reposicionamento do terminal e a mudança de local do Ecoporto, segundo Loureiro, do Centronave. Para ele, a solução é priorizar o projeto no local definido. “É de interesse do comércio exterior do País”, diz o diretor. “Há um projeto pronto, já aprovado pela Antaq (agência reguladora), TCU (Tribunal de Contas da União) e também no programa estratégico da APS. “É uma solução madura e que ajuda a resolver o gargalo portuário em Santos, que tende a se agravar nos próximos anos se nada for feito. Isso nos preocupa muito e não vejo senso de urgência.”

O que diz a autoridade portuária

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta quase todas as críticas do setor ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto não teria condições para atracar essas embarcações. Também nega um colapso futuro no porto santista, pois há investimentos para ampliar a capacidade.

A APS acrescenta que, além da dragagem ininterrupta de manutenção dos 15 metros de calado do canal e da dragagem dos berços de atracação, “o porto também prepara uma PPP para concessão, por 20 anos, da dragagem de aprofundamento do seu canal de navegação para 16 metros, e depois 17 metros de calado, para melhor atender os grandes navios de contêineres.

Informa ainda que “o café que chega ao Porto é embarcado”, em relação à informação do Cecafé que mais de 725 mil sacas, em junho, deixaram de ser embarcadas. Atribui o maior gargalo enfrentado em terra à falta de uma nova ligação Planalto-Baixada, uma vez que a Via Anchieta, inaugurada há 77 anos, quando o porto operava 4 milhões de toneladas ao ano, ainda é a única opção de descida da serra para caminhões, quando Santos já movimenta 174 milhões de toneladas anuais.

De acordo com a APS, o Porto de Santos movimentou volume recorde de contêineres — cerca de 5 milhões de TEUs em 2022 e 4,8 milhões de TEUs no ano passado. “A capacidade do complexo é estimada em 5,9 milhões de TEUs, o que indica que o Porto não atingiu o limite de sua capacidade” em seus quatro terminais — Santos Brasil (2 milhões de TEUs), BTP (1,8 milhão), TUP DP World Santos (1,2 milhão) e Ecoporto Santos (300 mil). E que esses terminais podem ampliar suas capacidades até a 7,5 milhões de TEUs até 2030, o suficiente para atender a demanda projetada até 2035.

A respeito do STS10, informou que propõe o adensamento (expansão) desse terminal, sem qualquer transferência para outro local, descartando a ideia de levar o projeto para a Vila dos Criadores. Em relação a um novo terminal de passageiros no mesmo local, disse que “uma das possibilidades aventadas seria a utilização de uma parte do terminal da Ecoporto e que foi também cogitada a construção de um píer próprio”.

Por fim, critica a gestão anterior da APS, dizendo que foram investidos apenas R$ 74 milhões em infraestrutura no período 2019-2022: “Nos próximos cinco anos estão programados R$ 10 bilhões em recursos públicos, sem falar dos privados”. No entanto, não explicou se nesse valor projetado está o investimento superior a R$ 6 bilhões no túnel para ligar as cidades de Santos e Guarujá.

O sistema portuário brasileiro enfrenta uma série de gargalos para embarques e desembarques de cargas, e os problemas são mais evidentes no Porto de Santos, o maior da América Latina e responsável por 40% do volume movimentado do País. É o que apontam armadores (como são chamadas as pessoas ou empresas responsáveis pelo transporte marítimo) afiliados ao Centro Nacional de Navegação Transatlântica (Centronave) e donos de cargas de café reunidos no Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). A Autoridade Portuária de Santos (APS) refuta as críticas.

Os executivos das duas entidades veem um esgotamento da capacidade portuária brasileira, em grande parte no porto santista. Estimativas do Centronave indicam uma perda anual superior a US$ 21 bilhões com o comércio exterior, em especial por exportações não efetivadas. Um dos motivos, dizem, é por não poderem atracar, em Santos, de forma regular, embarcações de contêineres de grande porte, os navios de última geração. Por exemplo, navios com 366 metros de comprimento, aptos a transportar de 13 mil a 16 mil TEUs (unidade de medida do contêiner, equivalente a 20 pés, ou 6,1 metros de comprimento).

Segundo entidades, limitações de estrutura em Santos prejudicam o comércio exterior brasileiro Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Dos 17 portos com operações de contêineres do País, só seis são homologados para esse tipo de navio, mas nenhum deles consegue carregar a embarcação à plena capacidade por conta de restrições de calado operacional, que resultam em déficits de carregamento entre 4% (Sepetiba-RJ) e 23% em (Paranaguá-PR), de acordo com o Centronave. Mas a entidade ressalta que a maior parte da carga nacional não está nesses seis portos, e sim em Santos, que enfrenta limitações de calado. Realizou apenas algumas escalas desse navios neste amo. O máximo que Santos pode garantir de calado, em operação comum, é 14,5 metros, insuficiente para os grandes navios de contêineres.

As embarcações de grande porte lançadas a partir de 2014 — quatro novas classes de navios, de 16 mil, 19 mil, 23 mil e 24 mil TEUs — não entram no Brasil. Apenas as da classe de 14 mil TEUs, construídos de 2008 a 2012. E, mesmo assim, enfrentam restrições em vários portos brasileiros, entre eles o de Santos, afirmam executivos de companhias do setor de navegação.

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta as críticas ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres pelo menos até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto, entre outros, não teria condições para atracar essas embarcações (leia mais abaixo).

Carga no chão

”Estamos ficando com carga no chão, sem poder embarcar”, diz Eduardo Heron, diretor técnico do Cecafé, em entrevista ao Estadão. Segundo o executivo, em pesquisa com 30 exportadores de café, que respondem por 77% dos embarques nacionais, constatou-se piora na exportação do grão pelo porto santista. “No mês passado em relação a maio, a carga que deixou de ser embarcada aumentou 68%, atingindo 725.501 sacas (volume equivalente a 2.198 contêineres), contra as 510 mil do mês anterior”, afirmou.

Pelas contas da entidade, o volume não embarcado em junho corresponde a uma perda de US$ 173 milhões (cerca de R$ 950 milhões pela cotação atual do dólar). Além disso, diz que as empresas que não conseguiram embarcar tiveram perdas de R$ 4,7 milhões no mês com custos de armazenagens adicionais, enquanto aguardavam nova janela de embarque (“pré-stacking”) e outras despesas cobradas. O prejuízo pode passar de R$ 41 milhões se forem computado volumes não embarcados desde outubro de 2023, quando foram verificados problemas de atrasos (média de 80%) e alterações de movimentação. No período, o Brasil exportou a média de 4,1 milhões de sacas de café por mês. O executivo do Cecafé diz que a situação pode piorar neste semestre, quando crescem embarques de cargas de algodão, açúcar e também de café no porto.

Segundo o Cecafé, em 2023 a exportação de café (a quinta maior carga do agronegócio brasileiro) foi realizada por 288 empresas. Até 2021/2022, cerca de 80% do café vendido ao exterior saía pelo porto santista. “Certamente, quase todas essas empresas tiveram o mesmo entrave em seus negócios”, disse o diretor. Na sua avaliação, esse e outros problemas mostram que a situação no Porto de Santos é crítica pela falta de espaços e que pode entrar em colapso por volta de 2027/2028, se nada for feito.

Para Heron, isso mostra que Santos tem de ampliar sua capacidade, resgatando o projeto de um novo terminal. O que atenderia com mais competitividade é a versão original do STS10, projeto de terminal com aprovação paralisada desde 2022, em discussões internas na Autoridade Portuária. Segundo o Centronave, os cálculos apontam uma capacidade adicional de 500 mil contêineres/ano que deixa de ser ofertada hoje a exportadores brasileiros.

A infraestrutura instalada atual é insuficiente, aponta a entidade, lembrando que há mais de uma década não são instalados novos terminais portuários de contêineres em Santos. Os mais recentes — BTP e DPW — entraram em operação em 2013. É a primeira vez que donos da carga e armadores se sentam na mesma mesa para expor, juntos, os problemas enfrentados por ambos, afirma Heron.

Cláudio Loureiro, diretor executivo do Centronave, destaca as dificuldades de calado em Santos para navios de grande porte. “É um dos limitadores mais relevantes, e por isso o Brasil está defasado na atracação regular dessas embarcações”. Para ele, há falta de muita coisa — de capacidade de atracação a berços”. Lembra que somente navios fabricados até 2012 conseguem ter uma operação normal no porto, com capacidade ocupada “quase plena” (têm de reduzir o volume de carga para evitar o encalhe).

O problema, diz ele, está também na retroárea portuária. “Antes, o navio esperava a carga; agora é o inverso, principalmente de contêiner”. Ele lembra que a situação se agrava porque a maior parte da carga chega por caminhões ao porto, sendo necessária uma área maior para colocação das cargas.

Segundo o diretor, o armador já vem enfrentando aumento no tempo de espera dos navios. De oito horas em 2019, o tempo saltou para 20 horas em 2023. “Mas há casos de associados nossos com espera de mais de 40 horas”.

Caminhões levando carga para o Porto de Santos Foto: Fernanda Luz/Estadão

Conforme dizem, os terminais em portos do País estão operando com mais de 80% da capacidade, bem acima do índice recomendado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para operação dos berços de atracação, que é de 65%. Para movimentação nos pátios, o índice é de 70%. A explicação é que, quando se passa desse porcentual, começam a se formar filas de navios. “Santos já superou 85%”, afirma Loureiro. “Não podemos ser ineficientes na logística portuária. Isso afeta sensivelmente nosso comércio exterior.”

Para a APS, a questão dos gargalos no porto é pontual. Atribui o fato à avaria ocorrida em janeiro em um berço de atração do terminal BTP, que já retomou as operações, e à reforma do terminal da Portonave, em Navegantes (SC). O Centronave contesta e diz que se trata de um problema estrutural e que, caso não tivessem ultrapassado os limites estabelecidos pela OCDE (nos berços de atracação e nos pátios), essas contingências operacionais não estariam ocorrendo.

A novela do STS10

Para operadores e donos de cargas, o cenário é de exaustão da capacidade operacional. A constatação, dizem, já leva em conta os anúncios de aumento de capacidade do terminais da Santos Brasil, a partir deste ano; do BTP (a partir de 2026) e da DPW (2030 em diante). Isso, até mesmo considerando a potencial construção do STS10. “Não há um plano real de ampliação da capacidade, nem aquaviária nem de terminais de contêineres. O programa de leilões, que tinha um cronograma claro, inclusive com a previsão de data para o STS10, ficou parado em 2022″, afirmam.

O terminal, cujo projeto se encontra em revisão após consulta pública, foi desenhado para instalação na região portuária Saboó, na margem direita do Porto de Santos. Dedicado ao armazenamento e à movimentação de contêineres, ocuparia área de 423 mil metros quadrados, com 1,3 km de cais, conforme dados do governo federal. Foi selecionado como área prioritária em programa do governo federal lançado em 2013.

O mais recente estudo do terminal, com data-base de setembro de 2021, previa contrato de arrendamento de 25 anos e definia início das operações em 2023. Isso, porém, não saiu do papel, e o STS10 continua envolvido em discussões sobre sua licitação pela Autoridade Portuária de Santos. No projeto original estava prevista capacidade instalada de 2,4 milhão de TEUs por ano.

O STS10 sofreu idas e vindas por parte das autoridades portuárias. Cogitou-se até mudar o local do terminal, levando-o para a Vila dos Criadores, região que fica no fundo do canal do porto e, segundo avaliação de pessoas do setor, sem condições de abrigar um empreendimento dessa dimensão. Entre os problemas, está a alocação de mais mil famílias (5 mil pessoas) da localidade, passivo fundiário e ambiental desconhecidos.

Para Heron, do Cecafé, é fundamental que Santos dê urgência à definição e licitação do STS10, pois entre o início da obra e o de operação demanda um tempo de três a cinco anos. “A carga conteinerizada em Santos não para de crescer. Não sei como será daqui a cinco anos. O STS10 será um suspiro”. O fato é que o processo do terminal foi estancado pelo governo, que propõe uma solução compartilhada da área com um terminal de passageiros e o Ecoporto (terminal de contêiner de pequeno porte existente no local, que tinha autorização para operar até meados de 2023, conforme o estudo federal).

No mês passado, nos dias 13 e 14, foram feitas três audiências públicas pela APS, para discutir a alteração da via poligonal, o reposicionamento do terminal e a mudança de local do Ecoporto, segundo Loureiro, do Centronave. Para ele, a solução é priorizar o projeto no local definido. “É de interesse do comércio exterior do País”, diz o diretor. “Há um projeto pronto, já aprovado pela Antaq (agência reguladora), TCU (Tribunal de Contas da União) e também no programa estratégico da APS. “É uma solução madura e que ajuda a resolver o gargalo portuário em Santos, que tende a se agravar nos próximos anos se nada for feito. Isso nos preocupa muito e não vejo senso de urgência.”

O que diz a autoridade portuária

Em nota, a Autoridade Portuária de Santos refuta quase todas as críticas do setor ao porto. Informa que Santos tem plena capacidade de atender a movimentação de contêineres até 2030 com os terminais atuais, que movimentam 5 milhões de contêineres em média por ano. Sobre os navios de 366 metros, diz que neste ano recebeu dois. E qualifica de narrativa dos grandes armadores que o porto não teria condições para atracar essas embarcações. Também nega um colapso futuro no porto santista, pois há investimentos para ampliar a capacidade.

A APS acrescenta que, além da dragagem ininterrupta de manutenção dos 15 metros de calado do canal e da dragagem dos berços de atracação, “o porto também prepara uma PPP para concessão, por 20 anos, da dragagem de aprofundamento do seu canal de navegação para 16 metros, e depois 17 metros de calado, para melhor atender os grandes navios de contêineres.

Informa ainda que “o café que chega ao Porto é embarcado”, em relação à informação do Cecafé que mais de 725 mil sacas, em junho, deixaram de ser embarcadas. Atribui o maior gargalo enfrentado em terra à falta de uma nova ligação Planalto-Baixada, uma vez que a Via Anchieta, inaugurada há 77 anos, quando o porto operava 4 milhões de toneladas ao ano, ainda é a única opção de descida da serra para caminhões, quando Santos já movimenta 174 milhões de toneladas anuais.

De acordo com a APS, o Porto de Santos movimentou volume recorde de contêineres — cerca de 5 milhões de TEUs em 2022 e 4,8 milhões de TEUs no ano passado. “A capacidade do complexo é estimada em 5,9 milhões de TEUs, o que indica que o Porto não atingiu o limite de sua capacidade” em seus quatro terminais — Santos Brasil (2 milhões de TEUs), BTP (1,8 milhão), TUP DP World Santos (1,2 milhão) e Ecoporto Santos (300 mil). E que esses terminais podem ampliar suas capacidades até a 7,5 milhões de TEUs até 2030, o suficiente para atender a demanda projetada até 2035.

A respeito do STS10, informou que propõe o adensamento (expansão) desse terminal, sem qualquer transferência para outro local, descartando a ideia de levar o projeto para a Vila dos Criadores. Em relação a um novo terminal de passageiros no mesmo local, disse que “uma das possibilidades aventadas seria a utilização de uma parte do terminal da Ecoporto e que foi também cogitada a construção de um píer próprio”.

Por fim, critica a gestão anterior da APS, dizendo que foram investidos apenas R$ 74 milhões em infraestrutura no período 2019-2022: “Nos próximos cinco anos estão programados R$ 10 bilhões em recursos públicos, sem falar dos privados”. No entanto, não explicou se nesse valor projetado está o investimento superior a R$ 6 bilhões no túnel para ligar as cidades de Santos e Guarujá.

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