Gasolina mais cara, juros e fuga de capital: os impactos econômicos do ataque do Irã a Israel


Ritmo de queda da taxa de juros nos EUA e no Brasil também pode ser afetado pela aversão ao risco

Por Wesley Gonsalves e Matheus Piovesana
Atualização:

Diante dos ataques do Irã a Israel e a escalada de tensão no Oriente Médio, realizados neste sábado, 14, o mercado internacional começa a se movimentar para precificar os impactos econômicos do impasse geopolítico, o que pode trazer possíveis prejuízos para a economia brasileira, conforme avaliam os especialistas ouvidos pelo Estadão.

Para analistas do mercado financeiro e economistas, o recente ataque iraniano pode trazer novas pressões inflacionárias a setores como o de petróleo, atrasar o ritmo de queda dos juros nos Estados Unidos e até impactar a trajetória de queda da Selic no Brasil.

O economista Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre), lembra que o incidente entre os dois países já era algo aventado pelo mercado, o que impactou diretamente o preço do barril de petróleo e também no aumento à aversão ao risco por parte do investidor internacional. Ele explica que a situação afeta diretamente as economias emergentes, como no caso do Brasil, uma vez que os investimentos estrangeiros acabam migrando para ativos de maior segurança, como os títulos de divida norte-americana.

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O especialista comenta que a expectativa é de que sem novos ataques e com o arrefecer da tensão entre as duas nações, a pressão inflacionária vista nos últimos dias tende a cair no curto prazo. “A experiência sugere que se a tensão for controlada, essa pressão deve ser controlada, deva ser um efeito transitório, como já aconteceu no passado recente”, avalia.

O pesquisador da FGV Ibre, Armando Castelar vê uma 'pressão inflacionária transitória' caso o incidente geopolítico seja controlado, mas que pode impactar o ritmo de queda dos juros no Brasil  Foto: Fábio Motta/Estadão

Ainda segundo pondera Castelar, o ambiente externo incerto é mais um ingrediente para que o Banco Central Brasileiro seja cauteloso nas futuras reduções da Selic no País.

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Tensão no Oriente Médio

Assim como o pesquisador da FGV Ibre, o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, também acredita que o cenário de tensão no Oriente Médio após os ataques do Irã a Israel neste fim de semana pode levar a uma redução no ritmo de cortes da taxa Selic.

De acordo com ele, a escalada dos conflitos na região tem impacto direto sobre os preços do petróleo, o que gera mais pressões inflacionárias nos Estados Unidos e pode atrasar ainda mais a queda dos juros americanos, com impactos sobre as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom). “Se junta o cenário americano com este cenário novo, recente, da guerra do Oriente Médio, está montado o discurso para talvez o Banco Central desacelerar a queda de juros depois da próxima reunião”, afirmou.

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Segundo Vale, abre-se a possibilidade de o Copom cortar os juros em 0,5% ponto porcentual na reunião de 8 de maio, mas sinalizar uma redução do ritmo de cortes para 0,25% a partir da reunião de junho. A Selic atualmente está em 10,75% ao ano.

O economista destaca que a inflação americana tem caído de forma lenta mesmo com o aperto monetário por parte do Federal Reserve (o Banco Central americano). Exemplo disso foi a inflação ao consumidor nos EUA em março, que veio acima do esperado e fez o mercado apostar que os cortes dos juros americanos só devem acontecer no final deste ano.

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De olho no impasse

Matheus Spiess, economista da Empiricus Research, pondera que é necessário acompanhar o desenrolar do impasse ente os dois países, que já acontecia há alguns meses, desde outubro de 2023. “Ainda há muito ruído. Precisamos ter sobriedade e serenidade para avaliar o que acontece”, afirma. Ele acredita que o mercado ainda precisará acompanhar se a tensão deve escalonar para uma possível guerra, o que no curto prazo não é o que vem se desenhando.

Contudo, Spiess pondera que, caso a tensão volte a escalonar, uma guerra entre as duas nações poderia impactar diretamente na tentativa de reeleição de Joe Biden à Casa Branca, nos Estados Unidos, o que abria caminho para um segundo mandato de Donald Trump e traria novos impactos econômicos na economia global. “Nós teríamos desdobramentos de política econômica para os próximos anos”, diz.

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Fuga do capital

Na avaliação do economista da Gauss Capital, Darwin Dib, com o ataque do Irã a Israel, a aversão ao risco acaba sendo precificada pelo mercado global, que afeta diretamente o custo de captação de dinheiro estrangeiro para países como o Brasil, que dependem da poupança internacional como investimento.

Dib destaca que essa situação pode gerar uma fuga de capital do investidor internacional, que deixa o País para buscar ativos vistos como de menor risco, a exemplo dos títulos de dívida dos Estados Unidos e também o ouro. “Assim, em um situação como essa, um País que precisa de poupança externa, como o Brasil, fica prejudicada, pois o custo desta operação fica mais cara”, diz. “O mercado financeiro antecipa muito os eventos, ainda mais neste caso, que foi antecipado pelo próprio Irã.”

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Em relação à Selic, no entanto, o especialista acredita que apesar do impacto negativo do ataque iraniano, o incidente não deve alterar o patamar final de Selic e a trajetória de queda dos juros no País. Dib justifica que o mercado de câmbio brasileiro tem reagido bem às pressões internacionais, o que deve dar fôlego ao País em relação aos problemas causados na economia pelo incidente geopolítico. “A boa notícia, é que o mercado de câmbio brasileiro está muito resiliente”, afirma.

Para os especialistas ouvidos pela reportagem, mercado financeiro já 'precificou' atentado que vinha seno anunciado; drones foram interceptados pelas forças armadas de Israel  Foto: Tomer Neuberg/AP

Selic

O presidente do Banco Central brasileiro, Roberto Campos Neto, vinha destacando essas incertezas em discursos recentes. “Eu acho que é mais um elemento em um cenário que estava bastante nebuloso para você ter um Banco Central ainda mais cauteloso”, afirma Vale, da MB Associados.

Para Campos Neto, embora os ataques do Irã a Israel não tenham causado danos ou vítimas e o país persa tenha sinalizado de que não pretende lançar novas ofensivas em um primeiro momento, os preços do petróleo devem subir, dado que os países alinhados ao Irã no conflito têm forte peso na produção mundial da commodity.

“O preço do petróleo provavelmente vai subir, chegar à casa dos US$ 100, e vai ter um peso inflacionário, em especial para a inflação americana”, afirmou. Na sexta-feira, 12, o Brent chegou aos US$ 90 ao barril em meio ao temor quanto aos ataques. “O que aconteceu até agora tem implicações de curto prazo mais graves do que tivemos desde o ano passado.”

Risco geopolítico

A consultoria de energia norueguesa Rystad Energy avaliou neste domingo,14, que o ataque do Irã contra Israel aumentou drasticamente o risco geopolítico envolvendo o mercado de petróleo. O órgão destacou que na semana passada os preços da commodity já estavam 10% acima do “valor justo”, que considera apenas fatores econômicos e que estaria em US$ 84 o barril.

Na sexta, 12, o barril de petróleo Brent encerrou o dia acima dos US$ 90. O índice de Risco Geopolítico desenvolvido pela Rystad Energy já vinha crescendo, alcançando 1,22 na primeira semana de abril. Na segunda semana, encerrada no sábado 13, o indicador chegou a 1,35, o nível mais elevado desde o início de 2024. ”Ao focar apenas nos dias 13 e 14 de abril, até 14h do Reino Unido, o Índice de Risco Geopolítico saltou ainda mais para 1,41″, diz a consultoria.

Uma possível interpretação dos acontecimentos recentes sugere que as ações do Irã foram uma “retaliação medida” contra a ofensiva registrada em Damasco, atribuída a Israel, embora o país não tenha reivindicado o ataque, afirmou a Rystad.

Ataque de drones foi lançado pelo Irã conta Israel no último sábado, 13 Foto: Amir Cohen

A consultoria acrescentou que a representação do país islâmico na Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o assunto como encerrado, sinalizando que não haverá mais ações. Conforme destacou a consultoria, há incerteza sobre qual será a resposta das forças de Israel ao passo em que o gabinete de guerra do país está reunido para determinar os próximos passos da nação. “O resultado mais favorável seria a redução das tensões, com os Estados Unidos desempenhando um papel crucial”, afirma a consultoria, apontando o envolvimento direto do presidente americano Joe Biden em conjunto com o G7.

Ainda assim, é improvável que o prêmio de risco geopolítico caia para os patamares anteriores a 1º de abril sem sinalizações mais consistentes. Na pior hipótese, uma retaliação vigorosa partindo de Israel poderia desencadear a escalada de um conflito sem precedentes, diz a entidade. “Sob tais circunstâncias, os prêmios geopolíticos aumentariam significativamente”, afirma a consultoria, que acrescentou que novas sanções dos EUA ao Irã podem afetar ainda mais os preços do petróleo no mercado global, aumentando as pressões econômicas já existentes.

Diante dos ataques do Irã a Israel e a escalada de tensão no Oriente Médio, realizados neste sábado, 14, o mercado internacional começa a se movimentar para precificar os impactos econômicos do impasse geopolítico, o que pode trazer possíveis prejuízos para a economia brasileira, conforme avaliam os especialistas ouvidos pelo Estadão.

Para analistas do mercado financeiro e economistas, o recente ataque iraniano pode trazer novas pressões inflacionárias a setores como o de petróleo, atrasar o ritmo de queda dos juros nos Estados Unidos e até impactar a trajetória de queda da Selic no Brasil.

O economista Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre), lembra que o incidente entre os dois países já era algo aventado pelo mercado, o que impactou diretamente o preço do barril de petróleo e também no aumento à aversão ao risco por parte do investidor internacional. Ele explica que a situação afeta diretamente as economias emergentes, como no caso do Brasil, uma vez que os investimentos estrangeiros acabam migrando para ativos de maior segurança, como os títulos de divida norte-americana.

O especialista comenta que a expectativa é de que sem novos ataques e com o arrefecer da tensão entre as duas nações, a pressão inflacionária vista nos últimos dias tende a cair no curto prazo. “A experiência sugere que se a tensão for controlada, essa pressão deve ser controlada, deva ser um efeito transitório, como já aconteceu no passado recente”, avalia.

O pesquisador da FGV Ibre, Armando Castelar vê uma 'pressão inflacionária transitória' caso o incidente geopolítico seja controlado, mas que pode impactar o ritmo de queda dos juros no Brasil  Foto: Fábio Motta/Estadão

Ainda segundo pondera Castelar, o ambiente externo incerto é mais um ingrediente para que o Banco Central Brasileiro seja cauteloso nas futuras reduções da Selic no País.

Tensão no Oriente Médio

Assim como o pesquisador da FGV Ibre, o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, também acredita que o cenário de tensão no Oriente Médio após os ataques do Irã a Israel neste fim de semana pode levar a uma redução no ritmo de cortes da taxa Selic.

De acordo com ele, a escalada dos conflitos na região tem impacto direto sobre os preços do petróleo, o que gera mais pressões inflacionárias nos Estados Unidos e pode atrasar ainda mais a queda dos juros americanos, com impactos sobre as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom). “Se junta o cenário americano com este cenário novo, recente, da guerra do Oriente Médio, está montado o discurso para talvez o Banco Central desacelerar a queda de juros depois da próxima reunião”, afirmou.

Segundo Vale, abre-se a possibilidade de o Copom cortar os juros em 0,5% ponto porcentual na reunião de 8 de maio, mas sinalizar uma redução do ritmo de cortes para 0,25% a partir da reunião de junho. A Selic atualmente está em 10,75% ao ano.

O economista destaca que a inflação americana tem caído de forma lenta mesmo com o aperto monetário por parte do Federal Reserve (o Banco Central americano). Exemplo disso foi a inflação ao consumidor nos EUA em março, que veio acima do esperado e fez o mercado apostar que os cortes dos juros americanos só devem acontecer no final deste ano.

De olho no impasse

Matheus Spiess, economista da Empiricus Research, pondera que é necessário acompanhar o desenrolar do impasse ente os dois países, que já acontecia há alguns meses, desde outubro de 2023. “Ainda há muito ruído. Precisamos ter sobriedade e serenidade para avaliar o que acontece”, afirma. Ele acredita que o mercado ainda precisará acompanhar se a tensão deve escalonar para uma possível guerra, o que no curto prazo não é o que vem se desenhando.

Contudo, Spiess pondera que, caso a tensão volte a escalonar, uma guerra entre as duas nações poderia impactar diretamente na tentativa de reeleição de Joe Biden à Casa Branca, nos Estados Unidos, o que abria caminho para um segundo mandato de Donald Trump e traria novos impactos econômicos na economia global. “Nós teríamos desdobramentos de política econômica para os próximos anos”, diz.

Fuga do capital

Na avaliação do economista da Gauss Capital, Darwin Dib, com o ataque do Irã a Israel, a aversão ao risco acaba sendo precificada pelo mercado global, que afeta diretamente o custo de captação de dinheiro estrangeiro para países como o Brasil, que dependem da poupança internacional como investimento.

Dib destaca que essa situação pode gerar uma fuga de capital do investidor internacional, que deixa o País para buscar ativos vistos como de menor risco, a exemplo dos títulos de dívida dos Estados Unidos e também o ouro. “Assim, em um situação como essa, um País que precisa de poupança externa, como o Brasil, fica prejudicada, pois o custo desta operação fica mais cara”, diz. “O mercado financeiro antecipa muito os eventos, ainda mais neste caso, que foi antecipado pelo próprio Irã.”

Em relação à Selic, no entanto, o especialista acredita que apesar do impacto negativo do ataque iraniano, o incidente não deve alterar o patamar final de Selic e a trajetória de queda dos juros no País. Dib justifica que o mercado de câmbio brasileiro tem reagido bem às pressões internacionais, o que deve dar fôlego ao País em relação aos problemas causados na economia pelo incidente geopolítico. “A boa notícia, é que o mercado de câmbio brasileiro está muito resiliente”, afirma.

Para os especialistas ouvidos pela reportagem, mercado financeiro já 'precificou' atentado que vinha seno anunciado; drones foram interceptados pelas forças armadas de Israel  Foto: Tomer Neuberg/AP

Selic

O presidente do Banco Central brasileiro, Roberto Campos Neto, vinha destacando essas incertezas em discursos recentes. “Eu acho que é mais um elemento em um cenário que estava bastante nebuloso para você ter um Banco Central ainda mais cauteloso”, afirma Vale, da MB Associados.

Para Campos Neto, embora os ataques do Irã a Israel não tenham causado danos ou vítimas e o país persa tenha sinalizado de que não pretende lançar novas ofensivas em um primeiro momento, os preços do petróleo devem subir, dado que os países alinhados ao Irã no conflito têm forte peso na produção mundial da commodity.

“O preço do petróleo provavelmente vai subir, chegar à casa dos US$ 100, e vai ter um peso inflacionário, em especial para a inflação americana”, afirmou. Na sexta-feira, 12, o Brent chegou aos US$ 90 ao barril em meio ao temor quanto aos ataques. “O que aconteceu até agora tem implicações de curto prazo mais graves do que tivemos desde o ano passado.”

Risco geopolítico

A consultoria de energia norueguesa Rystad Energy avaliou neste domingo,14, que o ataque do Irã contra Israel aumentou drasticamente o risco geopolítico envolvendo o mercado de petróleo. O órgão destacou que na semana passada os preços da commodity já estavam 10% acima do “valor justo”, que considera apenas fatores econômicos e que estaria em US$ 84 o barril.

Na sexta, 12, o barril de petróleo Brent encerrou o dia acima dos US$ 90. O índice de Risco Geopolítico desenvolvido pela Rystad Energy já vinha crescendo, alcançando 1,22 na primeira semana de abril. Na segunda semana, encerrada no sábado 13, o indicador chegou a 1,35, o nível mais elevado desde o início de 2024. ”Ao focar apenas nos dias 13 e 14 de abril, até 14h do Reino Unido, o Índice de Risco Geopolítico saltou ainda mais para 1,41″, diz a consultoria.

Uma possível interpretação dos acontecimentos recentes sugere que as ações do Irã foram uma “retaliação medida” contra a ofensiva registrada em Damasco, atribuída a Israel, embora o país não tenha reivindicado o ataque, afirmou a Rystad.

Ataque de drones foi lançado pelo Irã conta Israel no último sábado, 13 Foto: Amir Cohen

A consultoria acrescentou que a representação do país islâmico na Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o assunto como encerrado, sinalizando que não haverá mais ações. Conforme destacou a consultoria, há incerteza sobre qual será a resposta das forças de Israel ao passo em que o gabinete de guerra do país está reunido para determinar os próximos passos da nação. “O resultado mais favorável seria a redução das tensões, com os Estados Unidos desempenhando um papel crucial”, afirma a consultoria, apontando o envolvimento direto do presidente americano Joe Biden em conjunto com o G7.

Ainda assim, é improvável que o prêmio de risco geopolítico caia para os patamares anteriores a 1º de abril sem sinalizações mais consistentes. Na pior hipótese, uma retaliação vigorosa partindo de Israel poderia desencadear a escalada de um conflito sem precedentes, diz a entidade. “Sob tais circunstâncias, os prêmios geopolíticos aumentariam significativamente”, afirma a consultoria, que acrescentou que novas sanções dos EUA ao Irã podem afetar ainda mais os preços do petróleo no mercado global, aumentando as pressões econômicas já existentes.

Diante dos ataques do Irã a Israel e a escalada de tensão no Oriente Médio, realizados neste sábado, 14, o mercado internacional começa a se movimentar para precificar os impactos econômicos do impasse geopolítico, o que pode trazer possíveis prejuízos para a economia brasileira, conforme avaliam os especialistas ouvidos pelo Estadão.

Para analistas do mercado financeiro e economistas, o recente ataque iraniano pode trazer novas pressões inflacionárias a setores como o de petróleo, atrasar o ritmo de queda dos juros nos Estados Unidos e até impactar a trajetória de queda da Selic no Brasil.

O economista Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ibre), lembra que o incidente entre os dois países já era algo aventado pelo mercado, o que impactou diretamente o preço do barril de petróleo e também no aumento à aversão ao risco por parte do investidor internacional. Ele explica que a situação afeta diretamente as economias emergentes, como no caso do Brasil, uma vez que os investimentos estrangeiros acabam migrando para ativos de maior segurança, como os títulos de divida norte-americana.

O especialista comenta que a expectativa é de que sem novos ataques e com o arrefecer da tensão entre as duas nações, a pressão inflacionária vista nos últimos dias tende a cair no curto prazo. “A experiência sugere que se a tensão for controlada, essa pressão deve ser controlada, deva ser um efeito transitório, como já aconteceu no passado recente”, avalia.

O pesquisador da FGV Ibre, Armando Castelar vê uma 'pressão inflacionária transitória' caso o incidente geopolítico seja controlado, mas que pode impactar o ritmo de queda dos juros no Brasil  Foto: Fábio Motta/Estadão

Ainda segundo pondera Castelar, o ambiente externo incerto é mais um ingrediente para que o Banco Central Brasileiro seja cauteloso nas futuras reduções da Selic no País.

Tensão no Oriente Médio

Assim como o pesquisador da FGV Ibre, o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, também acredita que o cenário de tensão no Oriente Médio após os ataques do Irã a Israel neste fim de semana pode levar a uma redução no ritmo de cortes da taxa Selic.

De acordo com ele, a escalada dos conflitos na região tem impacto direto sobre os preços do petróleo, o que gera mais pressões inflacionárias nos Estados Unidos e pode atrasar ainda mais a queda dos juros americanos, com impactos sobre as decisões do Comitê de Política Monetária (Copom). “Se junta o cenário americano com este cenário novo, recente, da guerra do Oriente Médio, está montado o discurso para talvez o Banco Central desacelerar a queda de juros depois da próxima reunião”, afirmou.

Segundo Vale, abre-se a possibilidade de o Copom cortar os juros em 0,5% ponto porcentual na reunião de 8 de maio, mas sinalizar uma redução do ritmo de cortes para 0,25% a partir da reunião de junho. A Selic atualmente está em 10,75% ao ano.

O economista destaca que a inflação americana tem caído de forma lenta mesmo com o aperto monetário por parte do Federal Reserve (o Banco Central americano). Exemplo disso foi a inflação ao consumidor nos EUA em março, que veio acima do esperado e fez o mercado apostar que os cortes dos juros americanos só devem acontecer no final deste ano.

De olho no impasse

Matheus Spiess, economista da Empiricus Research, pondera que é necessário acompanhar o desenrolar do impasse ente os dois países, que já acontecia há alguns meses, desde outubro de 2023. “Ainda há muito ruído. Precisamos ter sobriedade e serenidade para avaliar o que acontece”, afirma. Ele acredita que o mercado ainda precisará acompanhar se a tensão deve escalonar para uma possível guerra, o que no curto prazo não é o que vem se desenhando.

Contudo, Spiess pondera que, caso a tensão volte a escalonar, uma guerra entre as duas nações poderia impactar diretamente na tentativa de reeleição de Joe Biden à Casa Branca, nos Estados Unidos, o que abria caminho para um segundo mandato de Donald Trump e traria novos impactos econômicos na economia global. “Nós teríamos desdobramentos de política econômica para os próximos anos”, diz.

Fuga do capital

Na avaliação do economista da Gauss Capital, Darwin Dib, com o ataque do Irã a Israel, a aversão ao risco acaba sendo precificada pelo mercado global, que afeta diretamente o custo de captação de dinheiro estrangeiro para países como o Brasil, que dependem da poupança internacional como investimento.

Dib destaca que essa situação pode gerar uma fuga de capital do investidor internacional, que deixa o País para buscar ativos vistos como de menor risco, a exemplo dos títulos de dívida dos Estados Unidos e também o ouro. “Assim, em um situação como essa, um País que precisa de poupança externa, como o Brasil, fica prejudicada, pois o custo desta operação fica mais cara”, diz. “O mercado financeiro antecipa muito os eventos, ainda mais neste caso, que foi antecipado pelo próprio Irã.”

Em relação à Selic, no entanto, o especialista acredita que apesar do impacto negativo do ataque iraniano, o incidente não deve alterar o patamar final de Selic e a trajetória de queda dos juros no País. Dib justifica que o mercado de câmbio brasileiro tem reagido bem às pressões internacionais, o que deve dar fôlego ao País em relação aos problemas causados na economia pelo incidente geopolítico. “A boa notícia, é que o mercado de câmbio brasileiro está muito resiliente”, afirma.

Para os especialistas ouvidos pela reportagem, mercado financeiro já 'precificou' atentado que vinha seno anunciado; drones foram interceptados pelas forças armadas de Israel  Foto: Tomer Neuberg/AP

Selic

O presidente do Banco Central brasileiro, Roberto Campos Neto, vinha destacando essas incertezas em discursos recentes. “Eu acho que é mais um elemento em um cenário que estava bastante nebuloso para você ter um Banco Central ainda mais cauteloso”, afirma Vale, da MB Associados.

Para Campos Neto, embora os ataques do Irã a Israel não tenham causado danos ou vítimas e o país persa tenha sinalizado de que não pretende lançar novas ofensivas em um primeiro momento, os preços do petróleo devem subir, dado que os países alinhados ao Irã no conflito têm forte peso na produção mundial da commodity.

“O preço do petróleo provavelmente vai subir, chegar à casa dos US$ 100, e vai ter um peso inflacionário, em especial para a inflação americana”, afirmou. Na sexta-feira, 12, o Brent chegou aos US$ 90 ao barril em meio ao temor quanto aos ataques. “O que aconteceu até agora tem implicações de curto prazo mais graves do que tivemos desde o ano passado.”

Risco geopolítico

A consultoria de energia norueguesa Rystad Energy avaliou neste domingo,14, que o ataque do Irã contra Israel aumentou drasticamente o risco geopolítico envolvendo o mercado de petróleo. O órgão destacou que na semana passada os preços da commodity já estavam 10% acima do “valor justo”, que considera apenas fatores econômicos e que estaria em US$ 84 o barril.

Na sexta, 12, o barril de petróleo Brent encerrou o dia acima dos US$ 90. O índice de Risco Geopolítico desenvolvido pela Rystad Energy já vinha crescendo, alcançando 1,22 na primeira semana de abril. Na segunda semana, encerrada no sábado 13, o indicador chegou a 1,35, o nível mais elevado desde o início de 2024. ”Ao focar apenas nos dias 13 e 14 de abril, até 14h do Reino Unido, o Índice de Risco Geopolítico saltou ainda mais para 1,41″, diz a consultoria.

Uma possível interpretação dos acontecimentos recentes sugere que as ações do Irã foram uma “retaliação medida” contra a ofensiva registrada em Damasco, atribuída a Israel, embora o país não tenha reivindicado o ataque, afirmou a Rystad.

Ataque de drones foi lançado pelo Irã conta Israel no último sábado, 13 Foto: Amir Cohen

A consultoria acrescentou que a representação do país islâmico na Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o assunto como encerrado, sinalizando que não haverá mais ações. Conforme destacou a consultoria, há incerteza sobre qual será a resposta das forças de Israel ao passo em que o gabinete de guerra do país está reunido para determinar os próximos passos da nação. “O resultado mais favorável seria a redução das tensões, com os Estados Unidos desempenhando um papel crucial”, afirma a consultoria, apontando o envolvimento direto do presidente americano Joe Biden em conjunto com o G7.

Ainda assim, é improvável que o prêmio de risco geopolítico caia para os patamares anteriores a 1º de abril sem sinalizações mais consistentes. Na pior hipótese, uma retaliação vigorosa partindo de Israel poderia desencadear a escalada de um conflito sem precedentes, diz a entidade. “Sob tais circunstâncias, os prêmios geopolíticos aumentariam significativamente”, afirma a consultoria, que acrescentou que novas sanções dos EUA ao Irã podem afetar ainda mais os preços do petróleo no mercado global, aumentando as pressões econômicas já existentes.

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