‘Se não for feito o dever de casa no gasto público, cenário será de estresse’, diz CEO do Bradesco


Marcelo Noronha diz manter expectativa positiva quanto ao pacote fiscal, mas considera que, se demorar mais e as medidas não forem adequadas, será ruim para o Brasil

Por Aline Bronzati
Entrevista comMarcelo NoronhaPresidente do Bradesco

NOVA YORK - O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, espera que o pacote de corte de gastos do governo Lula saia “rapidamente” e seja “agressivo” a ponto de mudar a trajetória de crescimento da dívida pública brasileira em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). O banqueiro, porém, não arrisca um palpite.

“Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo”, diz, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, durante evento do banco, em Nova York.

Noronha mantém a expectativa ainda positiva quanto ao pacote fiscal, mas considera que, se demorar mais e as medidas não forem adequadas, será “ruim” para o Brasil. “É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom”, diz.

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A seguir, os principais trechos da entrevista.

Quais efeitos a eleição de Donald Trump deve ter no Brasil, considerando medidas protecionistas e inflacionárias ?

Em primeiro lugar, acho que temos de esperar um pouco mais para ver de fato o que ele vai fazer. Tem duas questões: o aumento da taxa de importação e a questão da imigração, que podem ter consequências para a inflação dos Estados Unidos. Eu acho que não é tão racional. Será que vai ser radical assim? Eu fico na dúvida. Por isso, quero esperar para ver. Mas se ele fizer isso, tem risco inflacionário.

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E para o Brasil?

O Brasil e os EUA têm cerca de US$ 60 bilhões em comércio bilateral. Os principais produtos da exportação brasileira são petróleo, aço e aviões. Atualmente, a taxa de importação do petróleo é de 5,5%. Então, se Trump aumentar para 10%, será que vai ficar menos competitivo? Eu tenho dúvida. Para mim, o cenário é neutro em relação à economia do Brasil.

Mas e o dólar mais forte?

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Temos de ver qual é o cenário de fato que Trump vai implementar. Se a taxa de juros nos EUA continuar caindo como esperamos, para a faixa de 3,25% a 3,50% ao ano em 2025, talvez o dólar não fique tão forte assim. Vai depender, efetivamente, dessa conjunção do cenário. A taxa de juro mais alta nos EUA obviamente representa dólar mais forte.

Bancos têm revisado as expectativas para os juros nos EUA para patamares mais elevados na gestão de Trump, num momento em que o Brasil está elevando as suas taxas por causa de pressões inflacionárias e fiscais. Quanto esse cenário preocupa?

De fato, é um cenário pior para mercados emergentes. Dólar forte é ruim para mercados emergentes, mas vamos ver se vai ser assim mesmo. O dano interno seria tão grande que eu fico pensando: será que isso vai ser assim mesmo? Uma coisa é promover um protecionismo contra um ou dois países, outra é uma ação de forma generalizada. Agora, se de fato o dólar ficar forte, e somos afetados por isso, isso bate na nossa inflação, então, é um cenário potencialmente ruim para o Brasil. Mas acho que os nossos desafios são mais internos do que externos.

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Qual o principal desafio do Brasil?

É realizar ajustes na política fiscal em um patamar que a curva de endividamento se estabilize nos próximos anos. Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo. Mas o meu cenário base não é esse. É que a gente venha com medidas e que sejam aprovadas também pelo Congresso Nacional e que promovam a inflexão da curva da dívida.

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O pacote fiscal atrasou, com o governo deixando para depois do G-20, que terminou. O sr. espera que seja anunciado esta semana?

Eu tenho esperança que saia rapidamente. Quando é rapidamente? Não está na minha capacidade de responder. O que eu tenho ouvido de interlocutores é que está sendo finalizado. Então, tenho expectativa ainda positiva porque se demorar e não vier o pacote adequado, é ruim para o Brasil. Sou um torcedor.

Qual o custo desse atraso?

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É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom.

Torce para qual número?

Um número que seja muito expressivo. Não vou te dar um número, mas muito expressivo significa conter a trajetória da dívida/PIB e fazer com que ela se inflexione. Se isso não acontecer, o mercado vai trabalhar de novo com expectativa ruim. Essa é a realidade.

Recentemente, tivemos uma melhora no rating do Brasil pela Moody’s que foi extremamente criticada. Se o governo acerta a mão no pacote fiscal, o grau de investimento vem nesse governo?

Não sei. Não consigo prognosticar isso, mas eu acho que o upgrade que a gente recebeu tem justificativa, sim. O Brasil tem uma reserva internacional de cerca de US$ 360 bilhões e não tem risco de default externo. Então, foi natural a melhora do rating para o País. E comparando com pares, o Brasil já merecia.

Como está o olhar estrangeiro para o Brasil?

O estrangeiro está mais arredio em relação ao mercado brasileiro e a sua participação está em um patamar bem inferior do que já tivemos no passado. Com a taxa de juros alta, esse investidor não vê perspectiva para a renda variável e o nível do câmbio levanta uma desconfiança sobre o que virá do fiscal. Se o real se apreciar um pouco, tivermos sinais de uma taxa de juros menor no ano que vem e de queda no segundo semestre, e conseguirmos ancorar as expectativas, aí eu acho que voltamos a atrair esse investidor.

E os empresários brasileiros? Qual a principal preocupação?

Eu não escutei nenhum empresário se queixando de que o seu negócio vai mal. Todos estão otimistas, com os negócios em crescimento. Tem expectativa também de entrega da política fiscal. Uns com mais, outros com menos. Mas, assim, ninguém está parando de investir. Tivemos várias concessões em rodovias, em saneamento e leilões de transmissão de energia. Os investimentos em infraestrutura previstos até 2026 são da ordem de R$ 280 bilhões. E metade já foi feita. Também vemos crescimento do agronegócio no próximo ano. A economia real está diferente da financeira, dessa crise de expectativas que estamos vivendo. Esperamos que a entrega fiscal permita que 2025 seja um bom ano e o ano de 2026 melhor ainda.

O sr. completa um ano na presidência do Bradesco nos próximos dias. O que vê quando olha pelo retrovisor?

Fizemos um bocadinho de coisa. Entregamos um segmento de pequenas e médias empresas, com 122 agências, e vamos entregar mais 28 este ano. Serão 150. Montamos uma unidade de negócios de crédito com 180 pessoas, executivos de níveis diferentes, incrementamos modelos, alteramos políticas e estamos competitivos. Entregamos o segmento Principal, com três escritórios, e que vai crescer bem ao longo de 2025. Contratamos mais de mil profissionais de nível sênior em tecnologia, mudamos o processo do banco de atacado para melhorar a sua competitividade, entregamos duas novas plataformas no Bradesco Express, mexemos com a cultura da organização, e não foi só isso, mudamos a remuneração variável da liderança.

Também houve movimentos inorgânicos...

Dois. Fechamos o capital da Cielo, concluído em setembro. E compramos 50% do Banco John Deere, que eu quero concluir ainda neste trimestre. Essa é a minha expectativa. É muita coisa ao mesmo tempo. É meio insano a quantidade de coisas, mesmo com apoio do Conselho e do time, para fazer acontecer.

Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho

Quanto aos desafios à frente, o mercado vê a rentabilidade do Bradesco se recuperando em um ritmo mais lento que o de seus concorrentes...

O mercado gostaria de ver uma rentabilidade bem maior amanhã. E eu disse que amanhã não vai ver. Continuamos investindo. Poderíamos gerar uma rentabilidade maior no curto prazo, mas não necessariamente o grau de competitividade que queremos entregar no longo prazo. Estamos entregando resultados melhores trimestre a trimestre. E o mercado quer mais, sempre mais. Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho. Não é que os desafios tenham acabado.

No passado, o Bradesco rivalizava com o Itaú em várias métricas. Mas aí veio a compra do Unibanco, e o banco acabou ficando em segundo lugar em alguns quesitos. O Banco do Brasil se recuperou em outros. Quando o Bradesco vai chegar mais perto dos pares novamente?

Não temos promessa de prazo. Vamos entregar melhores retornos com o passar do tempo, sem promessa, com entrega. O pessoal fica me pressionando para dar a data. Eu não escrevo data, nem dia, nem hora. Mas a gente chega lá. E vai entregar um banco mais competitivo.

O sr. já disse que o Bradesco opera hoje como se fosse dois bancos: um que mantém a engrenagem e um novo, que é a aposta do conglomerado para inovações e mudança nos processos. Quando esses dois bancos serão um?

Já são. Os dois bancos estão trabalhando lado a lado. A diferença é que há iniciativas diferentes. Na área de crédito, tivemos entregas bem importantes. Se não tivéssemos esse processo azeitado, talvez, não estivéssemos crescendo no ritmo que temos apresentado.

Mas o cenário macroeconômico, de perspectiva de juros altos, não representa riscos ao crédito e à inadimplência?

Se estressar, eu puxo um pouco mais o freio de mão, posso crescer mais devagar, mas com a tranquilidade de ter um portfólio sob controle, diferentemente do que tínhamos no passado. Mas estamos tranquilos em relação a isso, crescendo em linhas com garantias, fazendo o dever de casa, como manda o figurino.

Quais as perspectivas para os negócios nos Estados Unidos, o Bradesco Bank?

Estamos renovando o Bradesco Bank para que seja mais ágil e entregue experiências cada vez melhores para os clientes, que são originados no Brasil, para o segmento Principal, que vai ter acesso ao nosso banco nos Estados Unidos, e também o Private.

Aquisições fazem sentido nos EUA?

Não.

E no Brasil? Tem o Julius Baer vendendo o seu negócio de gestão de fortunas no País...

No Brasil, sempre vamos olhar negócios que façam sentido dentro da nossa estratégia e que tenham preço condizente com o retorno. Fizemos vários negócios como a compra das carteiras locais de alta renda do JP Morgan, do BNP Paribas, e depois uma joint venture com o BV, e o banco John Deere.

O Bradesco continua comprador?

Sim.

NOVA YORK - O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, espera que o pacote de corte de gastos do governo Lula saia “rapidamente” e seja “agressivo” a ponto de mudar a trajetória de crescimento da dívida pública brasileira em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). O banqueiro, porém, não arrisca um palpite.

“Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo”, diz, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, durante evento do banco, em Nova York.

Noronha mantém a expectativa ainda positiva quanto ao pacote fiscal, mas considera que, se demorar mais e as medidas não forem adequadas, será “ruim” para o Brasil. “É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom”, diz.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Quais efeitos a eleição de Donald Trump deve ter no Brasil, considerando medidas protecionistas e inflacionárias ?

Em primeiro lugar, acho que temos de esperar um pouco mais para ver de fato o que ele vai fazer. Tem duas questões: o aumento da taxa de importação e a questão da imigração, que podem ter consequências para a inflação dos Estados Unidos. Eu acho que não é tão racional. Será que vai ser radical assim? Eu fico na dúvida. Por isso, quero esperar para ver. Mas se ele fizer isso, tem risco inflacionário.

E para o Brasil?

O Brasil e os EUA têm cerca de US$ 60 bilhões em comércio bilateral. Os principais produtos da exportação brasileira são petróleo, aço e aviões. Atualmente, a taxa de importação do petróleo é de 5,5%. Então, se Trump aumentar para 10%, será que vai ficar menos competitivo? Eu tenho dúvida. Para mim, o cenário é neutro em relação à economia do Brasil.

Mas e o dólar mais forte?

Temos de ver qual é o cenário de fato que Trump vai implementar. Se a taxa de juros nos EUA continuar caindo como esperamos, para a faixa de 3,25% a 3,50% ao ano em 2025, talvez o dólar não fique tão forte assim. Vai depender, efetivamente, dessa conjunção do cenário. A taxa de juro mais alta nos EUA obviamente representa dólar mais forte.

Bancos têm revisado as expectativas para os juros nos EUA para patamares mais elevados na gestão de Trump, num momento em que o Brasil está elevando as suas taxas por causa de pressões inflacionárias e fiscais. Quanto esse cenário preocupa?

De fato, é um cenário pior para mercados emergentes. Dólar forte é ruim para mercados emergentes, mas vamos ver se vai ser assim mesmo. O dano interno seria tão grande que eu fico pensando: será que isso vai ser assim mesmo? Uma coisa é promover um protecionismo contra um ou dois países, outra é uma ação de forma generalizada. Agora, se de fato o dólar ficar forte, e somos afetados por isso, isso bate na nossa inflação, então, é um cenário potencialmente ruim para o Brasil. Mas acho que os nossos desafios são mais internos do que externos.

Qual o principal desafio do Brasil?

É realizar ajustes na política fiscal em um patamar que a curva de endividamento se estabilize nos próximos anos. Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo. Mas o meu cenário base não é esse. É que a gente venha com medidas e que sejam aprovadas também pelo Congresso Nacional e que promovam a inflexão da curva da dívida.

O pacote fiscal atrasou, com o governo deixando para depois do G-20, que terminou. O sr. espera que seja anunciado esta semana?

Eu tenho esperança que saia rapidamente. Quando é rapidamente? Não está na minha capacidade de responder. O que eu tenho ouvido de interlocutores é que está sendo finalizado. Então, tenho expectativa ainda positiva porque se demorar e não vier o pacote adequado, é ruim para o Brasil. Sou um torcedor.

Qual o custo desse atraso?

É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom.

Torce para qual número?

Um número que seja muito expressivo. Não vou te dar um número, mas muito expressivo significa conter a trajetória da dívida/PIB e fazer com que ela se inflexione. Se isso não acontecer, o mercado vai trabalhar de novo com expectativa ruim. Essa é a realidade.

Recentemente, tivemos uma melhora no rating do Brasil pela Moody’s que foi extremamente criticada. Se o governo acerta a mão no pacote fiscal, o grau de investimento vem nesse governo?

Não sei. Não consigo prognosticar isso, mas eu acho que o upgrade que a gente recebeu tem justificativa, sim. O Brasil tem uma reserva internacional de cerca de US$ 360 bilhões e não tem risco de default externo. Então, foi natural a melhora do rating para o País. E comparando com pares, o Brasil já merecia.

Como está o olhar estrangeiro para o Brasil?

O estrangeiro está mais arredio em relação ao mercado brasileiro e a sua participação está em um patamar bem inferior do que já tivemos no passado. Com a taxa de juros alta, esse investidor não vê perspectiva para a renda variável e o nível do câmbio levanta uma desconfiança sobre o que virá do fiscal. Se o real se apreciar um pouco, tivermos sinais de uma taxa de juros menor no ano que vem e de queda no segundo semestre, e conseguirmos ancorar as expectativas, aí eu acho que voltamos a atrair esse investidor.

E os empresários brasileiros? Qual a principal preocupação?

Eu não escutei nenhum empresário se queixando de que o seu negócio vai mal. Todos estão otimistas, com os negócios em crescimento. Tem expectativa também de entrega da política fiscal. Uns com mais, outros com menos. Mas, assim, ninguém está parando de investir. Tivemos várias concessões em rodovias, em saneamento e leilões de transmissão de energia. Os investimentos em infraestrutura previstos até 2026 são da ordem de R$ 280 bilhões. E metade já foi feita. Também vemos crescimento do agronegócio no próximo ano. A economia real está diferente da financeira, dessa crise de expectativas que estamos vivendo. Esperamos que a entrega fiscal permita que 2025 seja um bom ano e o ano de 2026 melhor ainda.

O sr. completa um ano na presidência do Bradesco nos próximos dias. O que vê quando olha pelo retrovisor?

Fizemos um bocadinho de coisa. Entregamos um segmento de pequenas e médias empresas, com 122 agências, e vamos entregar mais 28 este ano. Serão 150. Montamos uma unidade de negócios de crédito com 180 pessoas, executivos de níveis diferentes, incrementamos modelos, alteramos políticas e estamos competitivos. Entregamos o segmento Principal, com três escritórios, e que vai crescer bem ao longo de 2025. Contratamos mais de mil profissionais de nível sênior em tecnologia, mudamos o processo do banco de atacado para melhorar a sua competitividade, entregamos duas novas plataformas no Bradesco Express, mexemos com a cultura da organização, e não foi só isso, mudamos a remuneração variável da liderança.

Também houve movimentos inorgânicos...

Dois. Fechamos o capital da Cielo, concluído em setembro. E compramos 50% do Banco John Deere, que eu quero concluir ainda neste trimestre. Essa é a minha expectativa. É muita coisa ao mesmo tempo. É meio insano a quantidade de coisas, mesmo com apoio do Conselho e do time, para fazer acontecer.

Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho

Quanto aos desafios à frente, o mercado vê a rentabilidade do Bradesco se recuperando em um ritmo mais lento que o de seus concorrentes...

O mercado gostaria de ver uma rentabilidade bem maior amanhã. E eu disse que amanhã não vai ver. Continuamos investindo. Poderíamos gerar uma rentabilidade maior no curto prazo, mas não necessariamente o grau de competitividade que queremos entregar no longo prazo. Estamos entregando resultados melhores trimestre a trimestre. E o mercado quer mais, sempre mais. Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho. Não é que os desafios tenham acabado.

No passado, o Bradesco rivalizava com o Itaú em várias métricas. Mas aí veio a compra do Unibanco, e o banco acabou ficando em segundo lugar em alguns quesitos. O Banco do Brasil se recuperou em outros. Quando o Bradesco vai chegar mais perto dos pares novamente?

Não temos promessa de prazo. Vamos entregar melhores retornos com o passar do tempo, sem promessa, com entrega. O pessoal fica me pressionando para dar a data. Eu não escrevo data, nem dia, nem hora. Mas a gente chega lá. E vai entregar um banco mais competitivo.

O sr. já disse que o Bradesco opera hoje como se fosse dois bancos: um que mantém a engrenagem e um novo, que é a aposta do conglomerado para inovações e mudança nos processos. Quando esses dois bancos serão um?

Já são. Os dois bancos estão trabalhando lado a lado. A diferença é que há iniciativas diferentes. Na área de crédito, tivemos entregas bem importantes. Se não tivéssemos esse processo azeitado, talvez, não estivéssemos crescendo no ritmo que temos apresentado.

Mas o cenário macroeconômico, de perspectiva de juros altos, não representa riscos ao crédito e à inadimplência?

Se estressar, eu puxo um pouco mais o freio de mão, posso crescer mais devagar, mas com a tranquilidade de ter um portfólio sob controle, diferentemente do que tínhamos no passado. Mas estamos tranquilos em relação a isso, crescendo em linhas com garantias, fazendo o dever de casa, como manda o figurino.

Quais as perspectivas para os negócios nos Estados Unidos, o Bradesco Bank?

Estamos renovando o Bradesco Bank para que seja mais ágil e entregue experiências cada vez melhores para os clientes, que são originados no Brasil, para o segmento Principal, que vai ter acesso ao nosso banco nos Estados Unidos, e também o Private.

Aquisições fazem sentido nos EUA?

Não.

E no Brasil? Tem o Julius Baer vendendo o seu negócio de gestão de fortunas no País...

No Brasil, sempre vamos olhar negócios que façam sentido dentro da nossa estratégia e que tenham preço condizente com o retorno. Fizemos vários negócios como a compra das carteiras locais de alta renda do JP Morgan, do BNP Paribas, e depois uma joint venture com o BV, e o banco John Deere.

O Bradesco continua comprador?

Sim.

NOVA YORK - O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, espera que o pacote de corte de gastos do governo Lula saia “rapidamente” e seja “agressivo” a ponto de mudar a trajetória de crescimento da dívida pública brasileira em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). O banqueiro, porém, não arrisca um palpite.

“Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo”, diz, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, durante evento do banco, em Nova York.

Noronha mantém a expectativa ainda positiva quanto ao pacote fiscal, mas considera que, se demorar mais e as medidas não forem adequadas, será “ruim” para o Brasil. “É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom”, diz.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Quais efeitos a eleição de Donald Trump deve ter no Brasil, considerando medidas protecionistas e inflacionárias ?

Em primeiro lugar, acho que temos de esperar um pouco mais para ver de fato o que ele vai fazer. Tem duas questões: o aumento da taxa de importação e a questão da imigração, que podem ter consequências para a inflação dos Estados Unidos. Eu acho que não é tão racional. Será que vai ser radical assim? Eu fico na dúvida. Por isso, quero esperar para ver. Mas se ele fizer isso, tem risco inflacionário.

E para o Brasil?

O Brasil e os EUA têm cerca de US$ 60 bilhões em comércio bilateral. Os principais produtos da exportação brasileira são petróleo, aço e aviões. Atualmente, a taxa de importação do petróleo é de 5,5%. Então, se Trump aumentar para 10%, será que vai ficar menos competitivo? Eu tenho dúvida. Para mim, o cenário é neutro em relação à economia do Brasil.

Mas e o dólar mais forte?

Temos de ver qual é o cenário de fato que Trump vai implementar. Se a taxa de juros nos EUA continuar caindo como esperamos, para a faixa de 3,25% a 3,50% ao ano em 2025, talvez o dólar não fique tão forte assim. Vai depender, efetivamente, dessa conjunção do cenário. A taxa de juro mais alta nos EUA obviamente representa dólar mais forte.

Bancos têm revisado as expectativas para os juros nos EUA para patamares mais elevados na gestão de Trump, num momento em que o Brasil está elevando as suas taxas por causa de pressões inflacionárias e fiscais. Quanto esse cenário preocupa?

De fato, é um cenário pior para mercados emergentes. Dólar forte é ruim para mercados emergentes, mas vamos ver se vai ser assim mesmo. O dano interno seria tão grande que eu fico pensando: será que isso vai ser assim mesmo? Uma coisa é promover um protecionismo contra um ou dois países, outra é uma ação de forma generalizada. Agora, se de fato o dólar ficar forte, e somos afetados por isso, isso bate na nossa inflação, então, é um cenário potencialmente ruim para o Brasil. Mas acho que os nossos desafios são mais internos do que externos.

Qual o principal desafio do Brasil?

É realizar ajustes na política fiscal em um patamar que a curva de endividamento se estabilize nos próximos anos. Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo. Mas o meu cenário base não é esse. É que a gente venha com medidas e que sejam aprovadas também pelo Congresso Nacional e que promovam a inflexão da curva da dívida.

O pacote fiscal atrasou, com o governo deixando para depois do G-20, que terminou. O sr. espera que seja anunciado esta semana?

Eu tenho esperança que saia rapidamente. Quando é rapidamente? Não está na minha capacidade de responder. O que eu tenho ouvido de interlocutores é que está sendo finalizado. Então, tenho expectativa ainda positiva porque se demorar e não vier o pacote adequado, é ruim para o Brasil. Sou um torcedor.

Qual o custo desse atraso?

É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom.

Torce para qual número?

Um número que seja muito expressivo. Não vou te dar um número, mas muito expressivo significa conter a trajetória da dívida/PIB e fazer com que ela se inflexione. Se isso não acontecer, o mercado vai trabalhar de novo com expectativa ruim. Essa é a realidade.

Recentemente, tivemos uma melhora no rating do Brasil pela Moody’s que foi extremamente criticada. Se o governo acerta a mão no pacote fiscal, o grau de investimento vem nesse governo?

Não sei. Não consigo prognosticar isso, mas eu acho que o upgrade que a gente recebeu tem justificativa, sim. O Brasil tem uma reserva internacional de cerca de US$ 360 bilhões e não tem risco de default externo. Então, foi natural a melhora do rating para o País. E comparando com pares, o Brasil já merecia.

Como está o olhar estrangeiro para o Brasil?

O estrangeiro está mais arredio em relação ao mercado brasileiro e a sua participação está em um patamar bem inferior do que já tivemos no passado. Com a taxa de juros alta, esse investidor não vê perspectiva para a renda variável e o nível do câmbio levanta uma desconfiança sobre o que virá do fiscal. Se o real se apreciar um pouco, tivermos sinais de uma taxa de juros menor no ano que vem e de queda no segundo semestre, e conseguirmos ancorar as expectativas, aí eu acho que voltamos a atrair esse investidor.

E os empresários brasileiros? Qual a principal preocupação?

Eu não escutei nenhum empresário se queixando de que o seu negócio vai mal. Todos estão otimistas, com os negócios em crescimento. Tem expectativa também de entrega da política fiscal. Uns com mais, outros com menos. Mas, assim, ninguém está parando de investir. Tivemos várias concessões em rodovias, em saneamento e leilões de transmissão de energia. Os investimentos em infraestrutura previstos até 2026 são da ordem de R$ 280 bilhões. E metade já foi feita. Também vemos crescimento do agronegócio no próximo ano. A economia real está diferente da financeira, dessa crise de expectativas que estamos vivendo. Esperamos que a entrega fiscal permita que 2025 seja um bom ano e o ano de 2026 melhor ainda.

O sr. completa um ano na presidência do Bradesco nos próximos dias. O que vê quando olha pelo retrovisor?

Fizemos um bocadinho de coisa. Entregamos um segmento de pequenas e médias empresas, com 122 agências, e vamos entregar mais 28 este ano. Serão 150. Montamos uma unidade de negócios de crédito com 180 pessoas, executivos de níveis diferentes, incrementamos modelos, alteramos políticas e estamos competitivos. Entregamos o segmento Principal, com três escritórios, e que vai crescer bem ao longo de 2025. Contratamos mais de mil profissionais de nível sênior em tecnologia, mudamos o processo do banco de atacado para melhorar a sua competitividade, entregamos duas novas plataformas no Bradesco Express, mexemos com a cultura da organização, e não foi só isso, mudamos a remuneração variável da liderança.

Também houve movimentos inorgânicos...

Dois. Fechamos o capital da Cielo, concluído em setembro. E compramos 50% do Banco John Deere, que eu quero concluir ainda neste trimestre. Essa é a minha expectativa. É muita coisa ao mesmo tempo. É meio insano a quantidade de coisas, mesmo com apoio do Conselho e do time, para fazer acontecer.

Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho

Quanto aos desafios à frente, o mercado vê a rentabilidade do Bradesco se recuperando em um ritmo mais lento que o de seus concorrentes...

O mercado gostaria de ver uma rentabilidade bem maior amanhã. E eu disse que amanhã não vai ver. Continuamos investindo. Poderíamos gerar uma rentabilidade maior no curto prazo, mas não necessariamente o grau de competitividade que queremos entregar no longo prazo. Estamos entregando resultados melhores trimestre a trimestre. E o mercado quer mais, sempre mais. Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho. Não é que os desafios tenham acabado.

No passado, o Bradesco rivalizava com o Itaú em várias métricas. Mas aí veio a compra do Unibanco, e o banco acabou ficando em segundo lugar em alguns quesitos. O Banco do Brasil se recuperou em outros. Quando o Bradesco vai chegar mais perto dos pares novamente?

Não temos promessa de prazo. Vamos entregar melhores retornos com o passar do tempo, sem promessa, com entrega. O pessoal fica me pressionando para dar a data. Eu não escrevo data, nem dia, nem hora. Mas a gente chega lá. E vai entregar um banco mais competitivo.

O sr. já disse que o Bradesco opera hoje como se fosse dois bancos: um que mantém a engrenagem e um novo, que é a aposta do conglomerado para inovações e mudança nos processos. Quando esses dois bancos serão um?

Já são. Os dois bancos estão trabalhando lado a lado. A diferença é que há iniciativas diferentes. Na área de crédito, tivemos entregas bem importantes. Se não tivéssemos esse processo azeitado, talvez, não estivéssemos crescendo no ritmo que temos apresentado.

Mas o cenário macroeconômico, de perspectiva de juros altos, não representa riscos ao crédito e à inadimplência?

Se estressar, eu puxo um pouco mais o freio de mão, posso crescer mais devagar, mas com a tranquilidade de ter um portfólio sob controle, diferentemente do que tínhamos no passado. Mas estamos tranquilos em relação a isso, crescendo em linhas com garantias, fazendo o dever de casa, como manda o figurino.

Quais as perspectivas para os negócios nos Estados Unidos, o Bradesco Bank?

Estamos renovando o Bradesco Bank para que seja mais ágil e entregue experiências cada vez melhores para os clientes, que são originados no Brasil, para o segmento Principal, que vai ter acesso ao nosso banco nos Estados Unidos, e também o Private.

Aquisições fazem sentido nos EUA?

Não.

E no Brasil? Tem o Julius Baer vendendo o seu negócio de gestão de fortunas no País...

No Brasil, sempre vamos olhar negócios que façam sentido dentro da nossa estratégia e que tenham preço condizente com o retorno. Fizemos vários negócios como a compra das carteiras locais de alta renda do JP Morgan, do BNP Paribas, e depois uma joint venture com o BV, e o banco John Deere.

O Bradesco continua comprador?

Sim.

NOVA YORK - O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, espera que o pacote de corte de gastos do governo Lula saia “rapidamente” e seja “agressivo” a ponto de mudar a trajetória de crescimento da dívida pública brasileira em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). O banqueiro, porém, não arrisca um palpite.

“Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo”, diz, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, durante evento do banco, em Nova York.

Noronha mantém a expectativa ainda positiva quanto ao pacote fiscal, mas considera que, se demorar mais e as medidas não forem adequadas, será “ruim” para o Brasil. “É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom”, diz.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Quais efeitos a eleição de Donald Trump deve ter no Brasil, considerando medidas protecionistas e inflacionárias ?

Em primeiro lugar, acho que temos de esperar um pouco mais para ver de fato o que ele vai fazer. Tem duas questões: o aumento da taxa de importação e a questão da imigração, que podem ter consequências para a inflação dos Estados Unidos. Eu acho que não é tão racional. Será que vai ser radical assim? Eu fico na dúvida. Por isso, quero esperar para ver. Mas se ele fizer isso, tem risco inflacionário.

E para o Brasil?

O Brasil e os EUA têm cerca de US$ 60 bilhões em comércio bilateral. Os principais produtos da exportação brasileira são petróleo, aço e aviões. Atualmente, a taxa de importação do petróleo é de 5,5%. Então, se Trump aumentar para 10%, será que vai ficar menos competitivo? Eu tenho dúvida. Para mim, o cenário é neutro em relação à economia do Brasil.

Mas e o dólar mais forte?

Temos de ver qual é o cenário de fato que Trump vai implementar. Se a taxa de juros nos EUA continuar caindo como esperamos, para a faixa de 3,25% a 3,50% ao ano em 2025, talvez o dólar não fique tão forte assim. Vai depender, efetivamente, dessa conjunção do cenário. A taxa de juro mais alta nos EUA obviamente representa dólar mais forte.

Bancos têm revisado as expectativas para os juros nos EUA para patamares mais elevados na gestão de Trump, num momento em que o Brasil está elevando as suas taxas por causa de pressões inflacionárias e fiscais. Quanto esse cenário preocupa?

De fato, é um cenário pior para mercados emergentes. Dólar forte é ruim para mercados emergentes, mas vamos ver se vai ser assim mesmo. O dano interno seria tão grande que eu fico pensando: será que isso vai ser assim mesmo? Uma coisa é promover um protecionismo contra um ou dois países, outra é uma ação de forma generalizada. Agora, se de fato o dólar ficar forte, e somos afetados por isso, isso bate na nossa inflação, então, é um cenário potencialmente ruim para o Brasil. Mas acho que os nossos desafios são mais internos do que externos.

Qual o principal desafio do Brasil?

É realizar ajustes na política fiscal em um patamar que a curva de endividamento se estabilize nos próximos anos. Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo. Mas o meu cenário base não é esse. É que a gente venha com medidas e que sejam aprovadas também pelo Congresso Nacional e que promovam a inflexão da curva da dívida.

O pacote fiscal atrasou, com o governo deixando para depois do G-20, que terminou. O sr. espera que seja anunciado esta semana?

Eu tenho esperança que saia rapidamente. Quando é rapidamente? Não está na minha capacidade de responder. O que eu tenho ouvido de interlocutores é que está sendo finalizado. Então, tenho expectativa ainda positiva porque se demorar e não vier o pacote adequado, é ruim para o Brasil. Sou um torcedor.

Qual o custo desse atraso?

É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom.

Torce para qual número?

Um número que seja muito expressivo. Não vou te dar um número, mas muito expressivo significa conter a trajetória da dívida/PIB e fazer com que ela se inflexione. Se isso não acontecer, o mercado vai trabalhar de novo com expectativa ruim. Essa é a realidade.

Recentemente, tivemos uma melhora no rating do Brasil pela Moody’s que foi extremamente criticada. Se o governo acerta a mão no pacote fiscal, o grau de investimento vem nesse governo?

Não sei. Não consigo prognosticar isso, mas eu acho que o upgrade que a gente recebeu tem justificativa, sim. O Brasil tem uma reserva internacional de cerca de US$ 360 bilhões e não tem risco de default externo. Então, foi natural a melhora do rating para o País. E comparando com pares, o Brasil já merecia.

Como está o olhar estrangeiro para o Brasil?

O estrangeiro está mais arredio em relação ao mercado brasileiro e a sua participação está em um patamar bem inferior do que já tivemos no passado. Com a taxa de juros alta, esse investidor não vê perspectiva para a renda variável e o nível do câmbio levanta uma desconfiança sobre o que virá do fiscal. Se o real se apreciar um pouco, tivermos sinais de uma taxa de juros menor no ano que vem e de queda no segundo semestre, e conseguirmos ancorar as expectativas, aí eu acho que voltamos a atrair esse investidor.

E os empresários brasileiros? Qual a principal preocupação?

Eu não escutei nenhum empresário se queixando de que o seu negócio vai mal. Todos estão otimistas, com os negócios em crescimento. Tem expectativa também de entrega da política fiscal. Uns com mais, outros com menos. Mas, assim, ninguém está parando de investir. Tivemos várias concessões em rodovias, em saneamento e leilões de transmissão de energia. Os investimentos em infraestrutura previstos até 2026 são da ordem de R$ 280 bilhões. E metade já foi feita. Também vemos crescimento do agronegócio no próximo ano. A economia real está diferente da financeira, dessa crise de expectativas que estamos vivendo. Esperamos que a entrega fiscal permita que 2025 seja um bom ano e o ano de 2026 melhor ainda.

O sr. completa um ano na presidência do Bradesco nos próximos dias. O que vê quando olha pelo retrovisor?

Fizemos um bocadinho de coisa. Entregamos um segmento de pequenas e médias empresas, com 122 agências, e vamos entregar mais 28 este ano. Serão 150. Montamos uma unidade de negócios de crédito com 180 pessoas, executivos de níveis diferentes, incrementamos modelos, alteramos políticas e estamos competitivos. Entregamos o segmento Principal, com três escritórios, e que vai crescer bem ao longo de 2025. Contratamos mais de mil profissionais de nível sênior em tecnologia, mudamos o processo do banco de atacado para melhorar a sua competitividade, entregamos duas novas plataformas no Bradesco Express, mexemos com a cultura da organização, e não foi só isso, mudamos a remuneração variável da liderança.

Também houve movimentos inorgânicos...

Dois. Fechamos o capital da Cielo, concluído em setembro. E compramos 50% do Banco John Deere, que eu quero concluir ainda neste trimestre. Essa é a minha expectativa. É muita coisa ao mesmo tempo. É meio insano a quantidade de coisas, mesmo com apoio do Conselho e do time, para fazer acontecer.

Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho

Quanto aos desafios à frente, o mercado vê a rentabilidade do Bradesco se recuperando em um ritmo mais lento que o de seus concorrentes...

O mercado gostaria de ver uma rentabilidade bem maior amanhã. E eu disse que amanhã não vai ver. Continuamos investindo. Poderíamos gerar uma rentabilidade maior no curto prazo, mas não necessariamente o grau de competitividade que queremos entregar no longo prazo. Estamos entregando resultados melhores trimestre a trimestre. E o mercado quer mais, sempre mais. Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho. Não é que os desafios tenham acabado.

No passado, o Bradesco rivalizava com o Itaú em várias métricas. Mas aí veio a compra do Unibanco, e o banco acabou ficando em segundo lugar em alguns quesitos. O Banco do Brasil se recuperou em outros. Quando o Bradesco vai chegar mais perto dos pares novamente?

Não temos promessa de prazo. Vamos entregar melhores retornos com o passar do tempo, sem promessa, com entrega. O pessoal fica me pressionando para dar a data. Eu não escrevo data, nem dia, nem hora. Mas a gente chega lá. E vai entregar um banco mais competitivo.

O sr. já disse que o Bradesco opera hoje como se fosse dois bancos: um que mantém a engrenagem e um novo, que é a aposta do conglomerado para inovações e mudança nos processos. Quando esses dois bancos serão um?

Já são. Os dois bancos estão trabalhando lado a lado. A diferença é que há iniciativas diferentes. Na área de crédito, tivemos entregas bem importantes. Se não tivéssemos esse processo azeitado, talvez, não estivéssemos crescendo no ritmo que temos apresentado.

Mas o cenário macroeconômico, de perspectiva de juros altos, não representa riscos ao crédito e à inadimplência?

Se estressar, eu puxo um pouco mais o freio de mão, posso crescer mais devagar, mas com a tranquilidade de ter um portfólio sob controle, diferentemente do que tínhamos no passado. Mas estamos tranquilos em relação a isso, crescendo em linhas com garantias, fazendo o dever de casa, como manda o figurino.

Quais as perspectivas para os negócios nos Estados Unidos, o Bradesco Bank?

Estamos renovando o Bradesco Bank para que seja mais ágil e entregue experiências cada vez melhores para os clientes, que são originados no Brasil, para o segmento Principal, que vai ter acesso ao nosso banco nos Estados Unidos, e também o Private.

Aquisições fazem sentido nos EUA?

Não.

E no Brasil? Tem o Julius Baer vendendo o seu negócio de gestão de fortunas no País...

No Brasil, sempre vamos olhar negócios que façam sentido dentro da nossa estratégia e que tenham preço condizente com o retorno. Fizemos vários negócios como a compra das carteiras locais de alta renda do JP Morgan, do BNP Paribas, e depois uma joint venture com o BV, e o banco John Deere.

O Bradesco continua comprador?

Sim.

NOVA YORK - O presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, espera que o pacote de corte de gastos do governo Lula saia “rapidamente” e seja “agressivo” a ponto de mudar a trajetória de crescimento da dívida pública brasileira em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). O banqueiro, porém, não arrisca um palpite.

“Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo”, diz, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast, durante evento do banco, em Nova York.

Noronha mantém a expectativa ainda positiva quanto ao pacote fiscal, mas considera que, se demorar mais e as medidas não forem adequadas, será “ruim” para o Brasil. “É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom”, diz.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

Quais efeitos a eleição de Donald Trump deve ter no Brasil, considerando medidas protecionistas e inflacionárias ?

Em primeiro lugar, acho que temos de esperar um pouco mais para ver de fato o que ele vai fazer. Tem duas questões: o aumento da taxa de importação e a questão da imigração, que podem ter consequências para a inflação dos Estados Unidos. Eu acho que não é tão racional. Será que vai ser radical assim? Eu fico na dúvida. Por isso, quero esperar para ver. Mas se ele fizer isso, tem risco inflacionário.

E para o Brasil?

O Brasil e os EUA têm cerca de US$ 60 bilhões em comércio bilateral. Os principais produtos da exportação brasileira são petróleo, aço e aviões. Atualmente, a taxa de importação do petróleo é de 5,5%. Então, se Trump aumentar para 10%, será que vai ficar menos competitivo? Eu tenho dúvida. Para mim, o cenário é neutro em relação à economia do Brasil.

Mas e o dólar mais forte?

Temos de ver qual é o cenário de fato que Trump vai implementar. Se a taxa de juros nos EUA continuar caindo como esperamos, para a faixa de 3,25% a 3,50% ao ano em 2025, talvez o dólar não fique tão forte assim. Vai depender, efetivamente, dessa conjunção do cenário. A taxa de juro mais alta nos EUA obviamente representa dólar mais forte.

Bancos têm revisado as expectativas para os juros nos EUA para patamares mais elevados na gestão de Trump, num momento em que o Brasil está elevando as suas taxas por causa de pressões inflacionárias e fiscais. Quanto esse cenário preocupa?

De fato, é um cenário pior para mercados emergentes. Dólar forte é ruim para mercados emergentes, mas vamos ver se vai ser assim mesmo. O dano interno seria tão grande que eu fico pensando: será que isso vai ser assim mesmo? Uma coisa é promover um protecionismo contra um ou dois países, outra é uma ação de forma generalizada. Agora, se de fato o dólar ficar forte, e somos afetados por isso, isso bate na nossa inflação, então, é um cenário potencialmente ruim para o Brasil. Mas acho que os nossos desafios são mais internos do que externos.

Qual o principal desafio do Brasil?

É realizar ajustes na política fiscal em um patamar que a curva de endividamento se estabilize nos próximos anos. Se a gente não fizer o dever de casa a ponto de mudar a trajetória do gasto público, pode ser um cenário de estresse e colocar mais pressão em cima da política monetária, que se torna passageira. Seria um cenário mais complexo. Mas o meu cenário base não é esse. É que a gente venha com medidas e que sejam aprovadas também pelo Congresso Nacional e que promovam a inflexão da curva da dívida.

O pacote fiscal atrasou, com o governo deixando para depois do G-20, que terminou. O sr. espera que seja anunciado esta semana?

Eu tenho esperança que saia rapidamente. Quando é rapidamente? Não está na minha capacidade de responder. O que eu tenho ouvido de interlocutores é que está sendo finalizado. Então, tenho expectativa ainda positiva porque se demorar e não vier o pacote adequado, é ruim para o Brasil. Sou um torcedor.

Qual o custo desse atraso?

É ruim porque vai deteriorando as expectativas. Ou seja, o real desvaloriza, o que não é bom.

Torce para qual número?

Um número que seja muito expressivo. Não vou te dar um número, mas muito expressivo significa conter a trajetória da dívida/PIB e fazer com que ela se inflexione. Se isso não acontecer, o mercado vai trabalhar de novo com expectativa ruim. Essa é a realidade.

Recentemente, tivemos uma melhora no rating do Brasil pela Moody’s que foi extremamente criticada. Se o governo acerta a mão no pacote fiscal, o grau de investimento vem nesse governo?

Não sei. Não consigo prognosticar isso, mas eu acho que o upgrade que a gente recebeu tem justificativa, sim. O Brasil tem uma reserva internacional de cerca de US$ 360 bilhões e não tem risco de default externo. Então, foi natural a melhora do rating para o País. E comparando com pares, o Brasil já merecia.

Como está o olhar estrangeiro para o Brasil?

O estrangeiro está mais arredio em relação ao mercado brasileiro e a sua participação está em um patamar bem inferior do que já tivemos no passado. Com a taxa de juros alta, esse investidor não vê perspectiva para a renda variável e o nível do câmbio levanta uma desconfiança sobre o que virá do fiscal. Se o real se apreciar um pouco, tivermos sinais de uma taxa de juros menor no ano que vem e de queda no segundo semestre, e conseguirmos ancorar as expectativas, aí eu acho que voltamos a atrair esse investidor.

E os empresários brasileiros? Qual a principal preocupação?

Eu não escutei nenhum empresário se queixando de que o seu negócio vai mal. Todos estão otimistas, com os negócios em crescimento. Tem expectativa também de entrega da política fiscal. Uns com mais, outros com menos. Mas, assim, ninguém está parando de investir. Tivemos várias concessões em rodovias, em saneamento e leilões de transmissão de energia. Os investimentos em infraestrutura previstos até 2026 são da ordem de R$ 280 bilhões. E metade já foi feita. Também vemos crescimento do agronegócio no próximo ano. A economia real está diferente da financeira, dessa crise de expectativas que estamos vivendo. Esperamos que a entrega fiscal permita que 2025 seja um bom ano e o ano de 2026 melhor ainda.

O sr. completa um ano na presidência do Bradesco nos próximos dias. O que vê quando olha pelo retrovisor?

Fizemos um bocadinho de coisa. Entregamos um segmento de pequenas e médias empresas, com 122 agências, e vamos entregar mais 28 este ano. Serão 150. Montamos uma unidade de negócios de crédito com 180 pessoas, executivos de níveis diferentes, incrementamos modelos, alteramos políticas e estamos competitivos. Entregamos o segmento Principal, com três escritórios, e que vai crescer bem ao longo de 2025. Contratamos mais de mil profissionais de nível sênior em tecnologia, mudamos o processo do banco de atacado para melhorar a sua competitividade, entregamos duas novas plataformas no Bradesco Express, mexemos com a cultura da organização, e não foi só isso, mudamos a remuneração variável da liderança.

Também houve movimentos inorgânicos...

Dois. Fechamos o capital da Cielo, concluído em setembro. E compramos 50% do Banco John Deere, que eu quero concluir ainda neste trimestre. Essa é a minha expectativa. É muita coisa ao mesmo tempo. É meio insano a quantidade de coisas, mesmo com apoio do Conselho e do time, para fazer acontecer.

Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho

Quanto aos desafios à frente, o mercado vê a rentabilidade do Bradesco se recuperando em um ritmo mais lento que o de seus concorrentes...

O mercado gostaria de ver uma rentabilidade bem maior amanhã. E eu disse que amanhã não vai ver. Continuamos investindo. Poderíamos gerar uma rentabilidade maior no curto prazo, mas não necessariamente o grau de competitividade que queremos entregar no longo prazo. Estamos entregando resultados melhores trimestre a trimestre. E o mercado quer mais, sempre mais. Estamos entregando segurança e crescimento com o pé no chão. Não vamos perder o foco e o nosso caminho. Não é que os desafios tenham acabado.

No passado, o Bradesco rivalizava com o Itaú em várias métricas. Mas aí veio a compra do Unibanco, e o banco acabou ficando em segundo lugar em alguns quesitos. O Banco do Brasil se recuperou em outros. Quando o Bradesco vai chegar mais perto dos pares novamente?

Não temos promessa de prazo. Vamos entregar melhores retornos com o passar do tempo, sem promessa, com entrega. O pessoal fica me pressionando para dar a data. Eu não escrevo data, nem dia, nem hora. Mas a gente chega lá. E vai entregar um banco mais competitivo.

O sr. já disse que o Bradesco opera hoje como se fosse dois bancos: um que mantém a engrenagem e um novo, que é a aposta do conglomerado para inovações e mudança nos processos. Quando esses dois bancos serão um?

Já são. Os dois bancos estão trabalhando lado a lado. A diferença é que há iniciativas diferentes. Na área de crédito, tivemos entregas bem importantes. Se não tivéssemos esse processo azeitado, talvez, não estivéssemos crescendo no ritmo que temos apresentado.

Mas o cenário macroeconômico, de perspectiva de juros altos, não representa riscos ao crédito e à inadimplência?

Se estressar, eu puxo um pouco mais o freio de mão, posso crescer mais devagar, mas com a tranquilidade de ter um portfólio sob controle, diferentemente do que tínhamos no passado. Mas estamos tranquilos em relação a isso, crescendo em linhas com garantias, fazendo o dever de casa, como manda o figurino.

Quais as perspectivas para os negócios nos Estados Unidos, o Bradesco Bank?

Estamos renovando o Bradesco Bank para que seja mais ágil e entregue experiências cada vez melhores para os clientes, que são originados no Brasil, para o segmento Principal, que vai ter acesso ao nosso banco nos Estados Unidos, e também o Private.

Aquisições fazem sentido nos EUA?

Não.

E no Brasil? Tem o Julius Baer vendendo o seu negócio de gestão de fortunas no País...

No Brasil, sempre vamos olhar negócios que façam sentido dentro da nossa estratégia e que tenham preço condizente com o retorno. Fizemos vários negócios como a compra das carteiras locais de alta renda do JP Morgan, do BNP Paribas, e depois uma joint venture com o BV, e o banco John Deere.

O Bradesco continua comprador?

Sim.

Entrevista por Aline Bronzati

Nova York

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