‘Em alguns meses, a inflação argentina estará em mais de 200% ao ano’, diz Fabio Giambiagi


Milei arrisca criar uma ‘profecia autocumprida’ se continuar falando de hiperinflação no começo do mandato, diz economista

Por Carlos Eduardo Valim
Atualização:
Foto: Estadão
Entrevista comFabio Giambiagipesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre)

O economista Fabio Giambiagi, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre), nasceu no Brasil e se mudou para a terra de seus pais argentinos aos 10 meses de idade. De volta ao seu país de origem desde a adolescência, continuou acompanhando através das décadas, principalmente pelo viés econômico, os destinos e agruras da nação onde viveu em seus anos de formação.

Agora, com um novo governo empossado, do presidente Javier Milei, as incertezas são muitas para a economia da Argentina, diz. A começar pelas intenções do novo mandatário de cumprir ou não as promessas mais radicais que fez durante a campanha, como as de dolarizar a economia e de acabar com o Banco Central local.

Giambiagi acredita que os desafios para a nova gestão vão se impor desde o início e que Milei arrisca o seu governo ao dizer, já em sua posse, que haverá hiperinflação logo no começo do mandato, algo que pode se tornar uma “profecia autocumprida”.

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Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

O economista Fabio Giambiagi, nascido no Brasil e que passou a infância na Argentina Foto:

Existem condições econômicas e políticas para o governo de Milei e as suas promessas darem certo?

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Primeiramente, é preciso definir o que significa dar certo. Milei anunciou, a princípio, um conjunto de medidas para atacar o problema do déficit público. É praticamente uma unanimidade na Argentina que esse é um grande problema. Mas existem duas incógnitas quanto a isso. Quando se toma medidas pelo lado da diminuição dos gastos, surgem efeitos recessivos. São paralisadas as construções. Há um efeito dominó com reflexos sobre a administração do país. Embora medidas fortes sobre gastos sejam importantes, no momento, há estimativas preocupantes quanto ao nível de atividade, se a queda da economia em 2024 será de 1% ou mais.

Qual é a segunda incógnita?

Mesmo que haja pleno sucesso no combate ao déficit, os economistas sabem, pela experiência brasileira e argentina, que é necessário também algum componente de desindexação. Em alguns meses, a inflação argentina estará em mais de 200% ao ano. Não há antecedentes no mundo do combate de uma inflação a mais de 200% cair para em torno de 5% ou 10% ao ano só com base em ajuste fiscal. Esse passo dois do plano está sendo solenemente ignorado.

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Como o governo poderia fazer isso?

Na campanha, se acenava com a dolarização, tema que sumiu nos últimos 15 dias. Alguns acreditam que ela não foi eliminada do plano, mas suspensa por enquanto. Mas a questão fundamental, para a qual não existe resposta ainda, é qual a dinâmica que a inflação vai ter. Ela vinha sendo de 10% ao mês, e começou a se falar de números para dezembro de em torno de 14%, e as previsões já estão chegando em 20%. Como os agentes econômicos, em particular os salários, vão reagir em relação a isso?

Existe o risco de a inflação sair ainda mais do controle?

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Se ela rumar sistematicamente para cima, gera uma psiquê coletiva e comportamental, e todo mundo passará a agir nos próximos meses como agem hoje. Se um vendedor vai faturar o produto vendido em 30 dias, ele joga o preço para cima. Se ele acha que a inflação pode ser de 14% ou de 20%, ele vai jogar 20% para cima. Nos anos 1980, se falava de profecias autocumpridas. Quando se acha que o pior vai vir, ele acaba vindo.

Em sua posse, parece que Milei tentou se proteger das consequências deste cenário, dizendo que a economia vai piorar bastante antes de melhorar. Isso pode ajudá-lo a manter capital político durante esse período mais difícil?

Fala-se muito sobre qual será o período da lua-de-mel. Mas não vai ser exatamente uma lua-de-mel. Será uma situação trágica. Não existe lua-de-mel com inflação a 20% ao mês. O novo governo gostaria de, seis meses à frente, fazer com que a inflação de 15% ou 20% ao mês vá se aproximando dos 5%, e acenando com a possibilidades de novas quedas. Mas ninguém sabe se ela vai acabar subindo de 15% para 18% ou 22%. Milei tem adotado uma estratégia incompreensível. Nunca vi um presidente da República dizer que tem uma hiperinflação na virada da esquina, porque ele vai acabar contaminando a psiquê das pessoas se continuar repetindo isso.

O economista Fabio Giambiagi, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre), nasceu no Brasil e se mudou para a terra de seus pais argentinos aos 10 meses de idade. De volta ao seu país de origem desde a adolescência, continuou acompanhando através das décadas, principalmente pelo viés econômico, os destinos e agruras da nação onde viveu em seus anos de formação.

Agora, com um novo governo empossado, do presidente Javier Milei, as incertezas são muitas para a economia da Argentina, diz. A começar pelas intenções do novo mandatário de cumprir ou não as promessas mais radicais que fez durante a campanha, como as de dolarizar a economia e de acabar com o Banco Central local.

Giambiagi acredita que os desafios para a nova gestão vão se impor desde o início e que Milei arrisca o seu governo ao dizer, já em sua posse, que haverá hiperinflação logo no começo do mandato, algo que pode se tornar uma “profecia autocumprida”.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

O economista Fabio Giambiagi, nascido no Brasil e que passou a infância na Argentina Foto:

Existem condições econômicas e políticas para o governo de Milei e as suas promessas darem certo?

Primeiramente, é preciso definir o que significa dar certo. Milei anunciou, a princípio, um conjunto de medidas para atacar o problema do déficit público. É praticamente uma unanimidade na Argentina que esse é um grande problema. Mas existem duas incógnitas quanto a isso. Quando se toma medidas pelo lado da diminuição dos gastos, surgem efeitos recessivos. São paralisadas as construções. Há um efeito dominó com reflexos sobre a administração do país. Embora medidas fortes sobre gastos sejam importantes, no momento, há estimativas preocupantes quanto ao nível de atividade, se a queda da economia em 2024 será de 1% ou mais.

Qual é a segunda incógnita?

Mesmo que haja pleno sucesso no combate ao déficit, os economistas sabem, pela experiência brasileira e argentina, que é necessário também algum componente de desindexação. Em alguns meses, a inflação argentina estará em mais de 200% ao ano. Não há antecedentes no mundo do combate de uma inflação a mais de 200% cair para em torno de 5% ou 10% ao ano só com base em ajuste fiscal. Esse passo dois do plano está sendo solenemente ignorado.

Como o governo poderia fazer isso?

Na campanha, se acenava com a dolarização, tema que sumiu nos últimos 15 dias. Alguns acreditam que ela não foi eliminada do plano, mas suspensa por enquanto. Mas a questão fundamental, para a qual não existe resposta ainda, é qual a dinâmica que a inflação vai ter. Ela vinha sendo de 10% ao mês, e começou a se falar de números para dezembro de em torno de 14%, e as previsões já estão chegando em 20%. Como os agentes econômicos, em particular os salários, vão reagir em relação a isso?

Existe o risco de a inflação sair ainda mais do controle?

Se ela rumar sistematicamente para cima, gera uma psiquê coletiva e comportamental, e todo mundo passará a agir nos próximos meses como agem hoje. Se um vendedor vai faturar o produto vendido em 30 dias, ele joga o preço para cima. Se ele acha que a inflação pode ser de 14% ou de 20%, ele vai jogar 20% para cima. Nos anos 1980, se falava de profecias autocumpridas. Quando se acha que o pior vai vir, ele acaba vindo.

Em sua posse, parece que Milei tentou se proteger das consequências deste cenário, dizendo que a economia vai piorar bastante antes de melhorar. Isso pode ajudá-lo a manter capital político durante esse período mais difícil?

Fala-se muito sobre qual será o período da lua-de-mel. Mas não vai ser exatamente uma lua-de-mel. Será uma situação trágica. Não existe lua-de-mel com inflação a 20% ao mês. O novo governo gostaria de, seis meses à frente, fazer com que a inflação de 15% ou 20% ao mês vá se aproximando dos 5%, e acenando com a possibilidades de novas quedas. Mas ninguém sabe se ela vai acabar subindo de 15% para 18% ou 22%. Milei tem adotado uma estratégia incompreensível. Nunca vi um presidente da República dizer que tem uma hiperinflação na virada da esquina, porque ele vai acabar contaminando a psiquê das pessoas se continuar repetindo isso.

O economista Fabio Giambiagi, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre), nasceu no Brasil e se mudou para a terra de seus pais argentinos aos 10 meses de idade. De volta ao seu país de origem desde a adolescência, continuou acompanhando através das décadas, principalmente pelo viés econômico, os destinos e agruras da nação onde viveu em seus anos de formação.

Agora, com um novo governo empossado, do presidente Javier Milei, as incertezas são muitas para a economia da Argentina, diz. A começar pelas intenções do novo mandatário de cumprir ou não as promessas mais radicais que fez durante a campanha, como as de dolarizar a economia e de acabar com o Banco Central local.

Giambiagi acredita que os desafios para a nova gestão vão se impor desde o início e que Milei arrisca o seu governo ao dizer, já em sua posse, que haverá hiperinflação logo no começo do mandato, algo que pode se tornar uma “profecia autocumprida”.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

O economista Fabio Giambiagi, nascido no Brasil e que passou a infância na Argentina Foto:

Existem condições econômicas e políticas para o governo de Milei e as suas promessas darem certo?

Primeiramente, é preciso definir o que significa dar certo. Milei anunciou, a princípio, um conjunto de medidas para atacar o problema do déficit público. É praticamente uma unanimidade na Argentina que esse é um grande problema. Mas existem duas incógnitas quanto a isso. Quando se toma medidas pelo lado da diminuição dos gastos, surgem efeitos recessivos. São paralisadas as construções. Há um efeito dominó com reflexos sobre a administração do país. Embora medidas fortes sobre gastos sejam importantes, no momento, há estimativas preocupantes quanto ao nível de atividade, se a queda da economia em 2024 será de 1% ou mais.

Qual é a segunda incógnita?

Mesmo que haja pleno sucesso no combate ao déficit, os economistas sabem, pela experiência brasileira e argentina, que é necessário também algum componente de desindexação. Em alguns meses, a inflação argentina estará em mais de 200% ao ano. Não há antecedentes no mundo do combate de uma inflação a mais de 200% cair para em torno de 5% ou 10% ao ano só com base em ajuste fiscal. Esse passo dois do plano está sendo solenemente ignorado.

Como o governo poderia fazer isso?

Na campanha, se acenava com a dolarização, tema que sumiu nos últimos 15 dias. Alguns acreditam que ela não foi eliminada do plano, mas suspensa por enquanto. Mas a questão fundamental, para a qual não existe resposta ainda, é qual a dinâmica que a inflação vai ter. Ela vinha sendo de 10% ao mês, e começou a se falar de números para dezembro de em torno de 14%, e as previsões já estão chegando em 20%. Como os agentes econômicos, em particular os salários, vão reagir em relação a isso?

Existe o risco de a inflação sair ainda mais do controle?

Se ela rumar sistematicamente para cima, gera uma psiquê coletiva e comportamental, e todo mundo passará a agir nos próximos meses como agem hoje. Se um vendedor vai faturar o produto vendido em 30 dias, ele joga o preço para cima. Se ele acha que a inflação pode ser de 14% ou de 20%, ele vai jogar 20% para cima. Nos anos 1980, se falava de profecias autocumpridas. Quando se acha que o pior vai vir, ele acaba vindo.

Em sua posse, parece que Milei tentou se proteger das consequências deste cenário, dizendo que a economia vai piorar bastante antes de melhorar. Isso pode ajudá-lo a manter capital político durante esse período mais difícil?

Fala-se muito sobre qual será o período da lua-de-mel. Mas não vai ser exatamente uma lua-de-mel. Será uma situação trágica. Não existe lua-de-mel com inflação a 20% ao mês. O novo governo gostaria de, seis meses à frente, fazer com que a inflação de 15% ou 20% ao mês vá se aproximando dos 5%, e acenando com a possibilidades de novas quedas. Mas ninguém sabe se ela vai acabar subindo de 15% para 18% ou 22%. Milei tem adotado uma estratégia incompreensível. Nunca vi um presidente da República dizer que tem uma hiperinflação na virada da esquina, porque ele vai acabar contaminando a psiquê das pessoas se continuar repetindo isso.

O economista Fabio Giambiagi, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV-Ibre), nasceu no Brasil e se mudou para a terra de seus pais argentinos aos 10 meses de idade. De volta ao seu país de origem desde a adolescência, continuou acompanhando através das décadas, principalmente pelo viés econômico, os destinos e agruras da nação onde viveu em seus anos de formação.

Agora, com um novo governo empossado, do presidente Javier Milei, as incertezas são muitas para a economia da Argentina, diz. A começar pelas intenções do novo mandatário de cumprir ou não as promessas mais radicais que fez durante a campanha, como as de dolarizar a economia e de acabar com o Banco Central local.

Giambiagi acredita que os desafios para a nova gestão vão se impor desde o início e que Milei arrisca o seu governo ao dizer, já em sua posse, que haverá hiperinflação logo no começo do mandato, algo que pode se tornar uma “profecia autocumprida”.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista:

O economista Fabio Giambiagi, nascido no Brasil e que passou a infância na Argentina Foto:

Existem condições econômicas e políticas para o governo de Milei e as suas promessas darem certo?

Primeiramente, é preciso definir o que significa dar certo. Milei anunciou, a princípio, um conjunto de medidas para atacar o problema do déficit público. É praticamente uma unanimidade na Argentina que esse é um grande problema. Mas existem duas incógnitas quanto a isso. Quando se toma medidas pelo lado da diminuição dos gastos, surgem efeitos recessivos. São paralisadas as construções. Há um efeito dominó com reflexos sobre a administração do país. Embora medidas fortes sobre gastos sejam importantes, no momento, há estimativas preocupantes quanto ao nível de atividade, se a queda da economia em 2024 será de 1% ou mais.

Qual é a segunda incógnita?

Mesmo que haja pleno sucesso no combate ao déficit, os economistas sabem, pela experiência brasileira e argentina, que é necessário também algum componente de desindexação. Em alguns meses, a inflação argentina estará em mais de 200% ao ano. Não há antecedentes no mundo do combate de uma inflação a mais de 200% cair para em torno de 5% ou 10% ao ano só com base em ajuste fiscal. Esse passo dois do plano está sendo solenemente ignorado.

Como o governo poderia fazer isso?

Na campanha, se acenava com a dolarização, tema que sumiu nos últimos 15 dias. Alguns acreditam que ela não foi eliminada do plano, mas suspensa por enquanto. Mas a questão fundamental, para a qual não existe resposta ainda, é qual a dinâmica que a inflação vai ter. Ela vinha sendo de 10% ao mês, e começou a se falar de números para dezembro de em torno de 14%, e as previsões já estão chegando em 20%. Como os agentes econômicos, em particular os salários, vão reagir em relação a isso?

Existe o risco de a inflação sair ainda mais do controle?

Se ela rumar sistematicamente para cima, gera uma psiquê coletiva e comportamental, e todo mundo passará a agir nos próximos meses como agem hoje. Se um vendedor vai faturar o produto vendido em 30 dias, ele joga o preço para cima. Se ele acha que a inflação pode ser de 14% ou de 20%, ele vai jogar 20% para cima. Nos anos 1980, se falava de profecias autocumpridas. Quando se acha que o pior vai vir, ele acaba vindo.

Em sua posse, parece que Milei tentou se proteger das consequências deste cenário, dizendo que a economia vai piorar bastante antes de melhorar. Isso pode ajudá-lo a manter capital político durante esse período mais difícil?

Fala-se muito sobre qual será o período da lua-de-mel. Mas não vai ser exatamente uma lua-de-mel. Será uma situação trágica. Não existe lua-de-mel com inflação a 20% ao mês. O novo governo gostaria de, seis meses à frente, fazer com que a inflação de 15% ou 20% ao mês vá se aproximando dos 5%, e acenando com a possibilidades de novas quedas. Mas ninguém sabe se ela vai acabar subindo de 15% para 18% ou 22%. Milei tem adotado uma estratégia incompreensível. Nunca vi um presidente da República dizer que tem uma hiperinflação na virada da esquina, porque ele vai acabar contaminando a psiquê das pessoas se continuar repetindo isso.

Entrevista por Carlos Eduardo Valim

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