As discussões sobre o desenvolvimento de uma economia sustentável e agregadora com a floresta devem estar entre as principais pautas abordadas na Cúpula da Amazônia, que começa oficialmente em Belém, no Pará, nesta terça-feira, 8, com a presença de oito chefes de Estado de países da região.
Para especialistas ouvidos pelo Estadão, o evento também será uma oportunidade de ouvir todos os players do Brasil nas atividades necessárias para o desenvolvimento de uma bioeconomia que vá no caminho das necessidades e prioridades da região e dos povos originários.
“A pauta ambiental no Brasil tem ganhado um viés econômico”, afirma a ex-secretária do governo do Estado de São Paulo e cofundadora da AYA Earth Partners, Patricia Ellen, destacando que o Brasil está seguindo uma tendência que já está ganhando peso em outras partes do mundo.
Ela cita como exemplo o lançamento recente de dois grandes pacotes de incentivos econômicos, o Inflation Reduction Act, nos Estados Unidos, e o European Green Deal, na Europa, de US$ 1,8 trilhão e US$ 1,6 trilhão, respectivamente. As iniciativas têm como foco agregar valor à economia local.
Atualmente, a bioeconomia circular é uma oportunidade de negócios de US$ 7,7 trilhões (cerca de R$ 34 trilhões), segundo relatório do Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD). Patrícia Ellen, no entanto, destaca que o Brasil não participa dessa bioeconomia de valor agregado.
“É por isso que a Cúpula passa a ser fundamental, com o País liderando esse debate para a inclusão do sul global e dos países da Pan Amazônia nos debates que devem dominar o G20 e a COP deste ano”, afirma.
Ela diz ser preciso olhar a pauta de forma integrada, revisitando seus acordos bilaterais para impulsionar países do sul global. “De nada adianta discutir pacotes de emergência climática, quando os pacotes econômicos estão navegando exatamente no sentido oposto no que tange à justiça climática e geopolítica”.
Para a presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Marina Grossi, o evento é uma oportunidade de o País realmente se comprometer a acabar com o desmatamento ilegal na Amazônia e outras práticas que impedem o desenvolvimento de uma bioeconomia.
“Se o Brasil adotar opções baseadas na economia verde, cerca de R$ 2,8 trilhões podem ser adicionados ao PIB nacional. Além disso, há expectativa de acréscimo líquido de 2 milhões de empregos na economia brasileira. Esse, aliás, é um modelo que pode ser aplicado a todos os países amazônicos”, afirma.
A especialista da instituição destaca que hoje já existem negócios bem-sucedidos na Amazônia, mas é preciso ganhar escala para, de fato, gerar uma nova economia amazônica.
O presidente do Instituto Capitalismo Consciente Brasil, Hugo Bethlem, é de uma opinião similar. Ele destaca que um dos grandes diferenciais do evento é reunir os países com presença na Amazônia.
“Não vamos resolver os problemas de desmatamento e degradação florestal sem envolver todos os que possuem responsabilidade sobre a Amazônia, mesmo que o Brasil seja o principal responsável por esse cuidado”, afirma.
Para ele, no entanto, é preciso mudar a percepção sobre os produtos já presentes na região, como o açaí e o guaraná. Bethlem afirma que a partir do momento que estes produtos ganharem escala, será possível não só proteger os ecossistemas amazônicos, mas também atender aos interesses das populações locais.
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Hoje, o principal desafio enfrentado pelo Brasil para o desenvolvimento de uma economia sustentável, segundo o presidente do Instituto Capitalismo Consciente, é o crime organizado. “A ameaça é o crime organizado no Brasil, Colômbia e Peru, mas devem ser um foco de todos. Caso contrário, a promessa do presidente Lula de zerar esse desmatamento em 2030 não será realizada”.
A diretora-executiva adjunta do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Patricia Cota Gomes, diz que durante o fórum Diálogos Amazônicos, evento que começou na última sexta-feira, 4, como um “esquenta” para a Cúpula, foi dado um destaque à bioeconomia como uma pauta está se tornando intrínseca à discussão na Amazônia, mostrando o peso da discussão econômica na pauta de meio ambiente.
Ela afirma que, embora a discussão tenha sido relevante durante estes primeiros dias, é preciso haver investimentos, de fato, neste novo modelo econômico para que ele se desenvolva e se torne uma realidade. “É essencial olharmos para essa pauta como olhamos para as commodities 40 anos atrás. Hoje é parte estratégica da nossa economia e somos um player relevante, mas pela importância que damos para a pauta desde o início.”