Uma pesquisa realizada pela consultoria e auditoria PwC junto a cooperativas de crédito brasileiras apontou que as organizações do setor reconhecem a importância das questões ambientais, sociais e de governança, mas a maior parte delas ainda não tem metas específicas relacionadas à sigla ESG, que abrange as três questões. De acordo com o levantamento, ainda há caminhos para melhora nos três aspectos, principalmente na governança.
Entre as 165 cooperativas ouvidas, 70% classificaram as questões ESG como muito importantes para o desenvolvimento dos negócios, e os 30% restantes como importantes. Quase a totalidade (98%) avalia riscos socioambientais. Mais da metade das entidades entrevistadas (51%) considera que a incorporação de ESG na estratégia da cooperativa é muito relevante para atrair e reter cooperados, e a mesma quantidade diz que os cooperados têm uma percepção positiva do valor que a integração desses temas gera. Ainda assim, 52% das cooperativas admitiram não ter metas específicas para o ESG.
A situação pode ser explicada pela característica do próprio mercado de cooperativas. No setor, há tanto as singulares, que operam sozinhas, quanto as que atuam em três níveis, com uma confederação, centrais regionais e sedes locais, onde normalmente são acessíveis a produtores rurais, segmento em que as cooperativas tem uma participação importante na oferta de crédito. Em ambos os casos, pode se tratar de um processo de evolução e estruturação das cooperativas em torno dos temas. No caso das menores, ainda pode ser custoso e moroso, apesar de necessário - até pela regulação implementada pelo Banco Central (BC) para instituições financeiras.
O BC atualizou a Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC) para as instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional (SFN) em setembro de 2021, com novas regras relativas à avaliação de riscos, ao monitoramento das ações das empresas e à concessão de crédito rural. Em relação à governança, outras normas já haviam sido estabelecidas anteriormente pela instituição.
Na pesquisa da PwC, é apontado que o gerenciamento de riscos é a principal prática adotada pelas cooperativas no quesito governança, realizada por 80%. Porém, ainda há bastante espaço para avanço em outras ações: a presença de compliance é verificada em 63% das entidades e 61% têm uma política definida de ética e transparência. A proporção das que dispõem de uma política de integridade e anticorrupção estabelecida é de apenas 37%, e somente 35% contam com comitês de supervisão.
“Dado muito preocupante”
De acordo com Maurício Colombari, sócio da PwC, os números relativos à governança são preocupantes. “O gerenciamento de risco, supostamente, todas deveriam ter, porque isso é uma obrigação determinada pelo BC. Os programas de ESG começam na governança, na parte de ética e anticorrupção. Esse é um dado muito preocupante, porque além de ser uma melhor prática, existe a obrigatoriedade dos programas mínimos pelo Banco Central. É uma questão de risco e compliance”, comenta.
Assim, é fundamental que mesmo cooperativas pequenas encaminhem as questões, para evitar riscos financeiros que possam prejudicar os associados que tomaram ou emprestaram dinheiro, ou ameaçar outras empresas que se relacionem com elas. Embora a chance de afetar o sistema financeiro nacional seja pequena, há o risco reputacional para a própria cooperativa ou para outras do gênero. “É importante que uma cooperativa de crédito, ao nascer, tenha a ciência que vai ter o bônus, que um grupo de pessoas vai ter acesso a um crédito mais barato, mas que ao mesmo tempo você tem o ônus, de cumprir com uma série de regulamentações, que são instituídas para proteger os próprios associados e não crie risco”, avisa Colombari.
Práticas sociais e ambientais
Em relação às práticas ambientais e sociais, as cooperativas têm uma vantagem: por estarem muito mais próximas dos associados do que os grandes bancos, podem ter um papel educacional junto a eles, promovendo a conscientização sobre questões como respeito às condições de trabalho, saúde e segurança dos colaboradores e programas de diversidade e inclusão por um lado, e temas como agricultura de precisão, descarte de resíduos, utilização de energia e práticas de plantio e colheita mais sustentáveis, com insumos que não agridam o meio ambiente, do outro.
“Esse relacionamento com a comunidade acaba sendo facilitado. A cooperativa em si tem um papel educativo dos associados porque é obrigada em termos de compliance, e porque o objetivo do cooperativismo é justamente esse, juntar um grupo de produtores, buscar o expertise nessas questões para todos eles e compartilhar esse conhecimento”, afirma Colombari.
O levantamento aponta que é comum entre as cooperativas realizar ações como fornecer educação financeira para a comunidade local (85%), promover a inclusão financeira dos pequenos negócios (61%) e a implementação de programas de diversidade e inclusão de funcionários (50%). O apoio à inclusão digital das comunidades é realizado por 28% das entidades.
Nas questões ambientais, além da parte educacional, as cooperativas também devem realizar o monitoramento das ações dos associados, que pode ser feito por meio de checklists e questionários enviados a eles, por pesquisas em consultas públicas para verificar se há processos no nome do cooperado e em visitas e diligências para garantir que as regras estabelecidas estão sendo cumpridas.
Segundo a pesquisa, 72% das cooperativas têm mecanismos formais para realizar esse acompanhamento. “É necessário desenhar uma estratégia e planos de ESG que possam ser colocados em prática, não só na atuação da própria cooperativa, mas na estendida, considerando a operação do associado”, afirma o sócio da realizadora da pesquisa.
No cômputo geral do estudo, Colombari diz que o resultado foi positivo, por demonstrar um crescimento no interesse pelo ESG, principalmente após as novas regras estabelecidas pelo BC em 2021. “A pesquisa denota que o segmento está no caminho certo, o que não é surpresa considerando o DNA do que é o cooperativismo”, diz.
Além do levantamento, a PwC também publicou orientações às cooperativas que desejarem implementar as boas práticas ambientais, sociais e de governança, como incorporar o ESG à estratégia de negócios, usar dados para melhorar a transparência e a prestação de contas e ter um plano de ações delineado.