Temor de intervenção estatal em empresas poderia ser evitado com boa governança, dizem especialistas


Cenário evoluiu nos últimos anos, segundo analistas, mas faltam análises de desempenho e mais critérios na escolha dos conselheiros

Por Beatriz Capirazi

As discussões sobre governança corporativa voltaram ao noticiário em março com a tentativa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de interferir na gestão de grandes empresas. O exemplo mais recente foi a decisão do Conselho de Administração da Petrobras de reter o pagamento de dividendos extraordinários aos acionistas, no valor total de R$ 43 bilhões, numa decisão do próprio presidente Lula. O anúncio frustrou o mercado e fez a estatal perder cerca de R$ 56 bilhões em valor de mercado num único dia.

A Petrobras é uma empresa de capital misto cujo maior detentor de ações é o governo brasileiro, que tem maioria em seu conselho (seis dos 11 assentos). O presidente da estatal, Jean Paul Prates, foi às redes sociais rebater os questionamentos sobre a administração da estatal.

“É preciso de uma vez por todas compreender que a Petrobras é uma corporação de capital misto controlada pelo Estado brasileiro, e que este controle é exercido legitimamente pela maioria do seu conselho de administração. Isso não pode ser apontado como intervenção! É o exercício soberano dos representantes do controle da empresa”, afirmou.

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O executivo defendeu ainda a decisão dos conselheiros indicados pela União. “É legítimo que o CA se posicione orientado pelo presidente da República e pelos seus auxiliares diretos, que são os ministros. Foi exatamente isso o que ocorreu”, disse. Procurada pela reportagem para comentar as críticas sobre interferência, a Petrobras afirmou que não comenta o assunto.

A crise dos dividendos ocorreu num contexto em que o governo já vinha tentando impor sua presença em outra grande companhia brasileira: a Vale. A gestão petista tentou pressionar o conselho da mineradora para emplacar o nome do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como presidente, o que acabou não acontecendo.

Privatizada em 1997, a Vale não tem controlador definido. O governo, na verdade, nem tem direito a assentos diretos no conselho da empresa. A Previ, o fundo de pensão dos funcionários do estatal Banco do Brasil, é que tem direito a duas das 13 cadeiras ― e essa é a influência que o governo poderia ter na empresa. A sucessão tumultuada e a queda do preço do minério de ferro no mercado internacional já levaram a mineradora a perder R$ 70,1 bilhões em valor de mercado neste ano.

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O imbróglio voltou ao centro das atenções quando o conselheiro independente José Luciano Duarte Penido renunciou por “manipulação” na escolha do CEO, alegando “nefasta influência política”. Em sua carta, o executivo afirmou que o processo “vem sendo conduzido de forma manipulada, não atende ao melhor interesse da empresa, e sofre evidente e nefasta influência política”. A Vale divulgou um comunicado afirmando que segue rigorosamente seu estatuto.

No final de fevereiro, Lula afirmou em entrevista à RedeTV! que “as empresas brasileiras precisam estar de acordo com o entendimento de desenvolvimento do governo brasileiro”. Os casos envolvendo as gigantes brasileiras e as declarações do presidente renovaram o temor dos investidores sobre ingerência política na economia.

Do ponto de vista da governança, a diretora-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Valeria Café, diz que, juridicamente, é difícil dizer que houve algum tipo de ingerência no caso da Petrobras. Segundo ela, apesar das discussões sobre uma possível interferência do governo, se olhadas as leis do mercado e a decisão do conselho, aprovada pelos acionistas, nada foi feito ilegalmente.

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Especialistas apontam que o cenário de governança evoluiu nos últimos anos, tanto em companhias estatais quanto privadas; faltam análises de performance e mais critérios na escolha dos conselheiros Foto: Deloitte

Roberto Gonzalez, sócio-diretor da iBluezone, startup especializada em soluções para governança corporativa, destaca que a definição a ser usada nestes casos não seria ingerência, mas sim influência. Ele diz considerar que o comunicado da Petrobras foi feito em um momento errado.

“A fala de uma pessoa em posição de poder pode influenciar os conselheiros. A partir do momento em que a sua fala pode impactar o posicionamento de um conselheiro, isso, sim, é uma influência. Fez algo ilegal? Não. Mas a sua fala, logicamente, pode influenciar. Ingerência é outra coisa. Porque eu não posso falar que você teve ingerência ou mudou o comportamento da empresa”, diz.

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Para ele, a decisão sobre os dividendos, obviamente, movimentaria o mercado financeiro no momento do anúncio. Mas diz considerar que, se tivesse sido anunciada antes da divulgação do balanço e dado tempo para que os acionistas minoritários “digerissem” o cenário, a repercussão talvez fosse menor. “Muitos estavam contando com esse dinheiro. Você paga dividendos extraordinários durante anos e para do nada, é claro que já havia uma expectativa e vai haver reclamação.”

Gonzalez aponta que o barulho no caso da Petrobras é reflexo de um contexto em que o governo não está sendo “bem assessorado” para estabelecer um diálogo com o mercado de capitais. “A realidade é completamente diferente de 2003 (no primeiro governo Lula). Em 2003, compliance e auditoria não estavam em um grau tão avançado quanto estão hoje, mas esse assunto cresceu muito.”

O papel das estatais

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O sócio líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord, aponta que um dos pontos cruciais é o papel das estatais. Ele destaca que uma companhia do porte da Petrobras transcende o status de estatal, considerando sua relevância para o desenvolvimento econômico do País e para o mercado de capitais.

Sócio-líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord Foto: Divulgação/ EY

“Se muitas delas ganharam relevância, é por causa do seu core, óbvio, mas também porque tiveram acionistas privados que investiram por acreditar que seriam administradas de uma determinada maneira”, diz. Ele destaca que o fortalecimento de boas práticas de governança e da transparência garantem uma boa gestão das companhias.

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O professor Carlos Portugal Gouvêa, da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório PGLaw, tem opinião similar. “O histórico de uso da Petrobras para controlar a inflação, ou seja, de uma interferência governamental para orientar a companhia para uma função para a qual ela não foi criada, faz com que o valor das ações da Petrobras seja muito mal avaliada. O melhor que o governo poderia fazer para a governança é indicar conselheiros totalmente independentes e deixar o conselho governar a companhia de uma forma absolutamente técnica”.

O especialista ainda aponta que, segundo a Lei das Sociedades por Ações, a única forma de o governo interferir na companhia é por meio de seus votos na Assembleia Geral, sendo que, neste caso, o controlador estaria isento de seus deveres fiduciários caso buscasse orientar a companhia para atender ao interesse público que justificou a sua criação.

“Esse interesse é o especificado na lei que criou a Petrobras: o de desenvolver o mercado de combustíveis no Brasil. Não existe um interesse público da Petrobras em controlar o índice de inflação, por exemplo. Quem deve decidir onde a companhia vai realizar investimentos é o conselho e a diretoria, de forma totalmente independente do governo, pois o interesse público da companhia é ser a melhor companhia de petróleo que ela pode ser, extrair e refinar o petróleo da forma mais eficiente possível, com a melhor tecnologia, e se preparar para a transição energética de forma a preservar o mercado energético brasileiro no futuro”.

Na época, a companhia afirmou que a “proposição de pagamento de dividendos extraordinários foi realizada com base na avaliação da sua equipe técnica”. Questionada pelo Estadão sobre as especulações, a companhia afirmou que não iria se posicionar.

Procurado para responder sobre as especulações sobre uma suposta ingerência na Petrobras e sobre a suposta tentativa de entrada de Mantega no conselho da mineradora como presidente, a secretaria de comunicação do governo federal afirmou que “não houve interferência política em nenhum dos casos”.

“A Vale é uma empresa privada que discute com o governo acordos de ressarcimentos por desastres ambientais. O retorno total das ações preferenciais da Petrobras entre o fechamento do último dia útil de 2022 até dia 21 deste mês foi de 88,1%. Já no caso das ações ordinárias, o retorno total foi de 64,3% no mesmo período. Vale explicar que o retorno total é o que melhor representa o ganho do acionista, uma vez que considera, além da valorização da ação, os dividendos recebidos. A empresa retomou investimentos e teve o segundo maior lucro da sua história”, disse a secretaria, em nota. Questionada sobre o mesmo assunto, a Vale afirmou que não comenta este assunto.

Boas práticas de governança

Especialistas destacam que a Lei das S/A, que regulamenta as sociedades por ações – tanto as companhias de capital aberto, quanto as de capital fechado, representou um avanço significativo na implementação de boas práticas de governança corporativa nas empresas. No entanto, por terem participação do governo, muitas dessas empresas estão sujeitas a interesses políticos e partidários. A chave para sanar essa dualidade é justamente a manutenção das boas práticas, que pode ajudar a evitar grande parte dos ruídos com o mercado.

“O jogo político existe, sempre existirá, inclusive no setor privado. As leis foram criada para afastar interferências empresariais”, explica Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) Foto: Regis Filho/ IBGC

Para Gregório, a Lei das S/A contribuiu para afastar pessoas com conflitos de interesse político, mas ressalta que ainda falta rigor na seleção e avaliação de administradores, membros do conselho e da diretoria. Ele também lembra que as empresas estatais foram criadas para desenvolver áreas que ainda não ganharam impulso, ou por questões de segurança nacional.

“Será que todas as estatais do País cumprem esse propósito? Se sim, é necessário que demonstrem como e onde estão cumprindo”, destaca Valéria Café.

Gregório diz que haveria menos questionamentos sobre a gestão se houvesse uma revisão periódica para garantir que as empresas estivessem cumprindo os objetivos para os quais foram criadas, o que é essencial para manter a confiabilidade do mercado naquela empresa.

“Se você deixa um cenário muito cinzento sem clareza sobre qual é o papel daquela empresa em políticas públicas e se ela está desempenhando bem esse papel, dá espaço para que a estatal mude da água para o vinho.” Nesse processo, a ampliação da transparência adotada seria de grande valia.

Café aponta que houve uma melhora inegável na governança corporativa nos últimos anos. Ela destaca, no entanto, que outros pontos, como a total independência do colegiado, são áreas que devem ser trabalhadas para fortalecer a pauta.

“A independência dos conselheiros, inclusive financeira, é essencial. Os conselhos devem sempre decidir a favor do melhor interesse para a organização, independentemente dos membros ou da indicação, sem pensar em agradar quem os indicou para conseguir voltar depois. Eles não podem depender financeiramente daquele conselho para viver, não são executivos”, diz.

Valeria Café, diretora-geral do IBGC Foto: Regis Filho/ IBGC

Além disso, outras ações, como a criação de uma política de propriedade estatal e a incorporação de uma avaliação de desempenho do conselho e da diretoria seriam fatores essenciais para garantir uma boa governança para as companhias. “A publicação desses resultados poderia justificar mudanças em relação aos resultados. Essa avaliação, inclusive, ajuda os acionistas a entender quem deveria fazer parte daquela companhia e se os candidatos são compatíveis com as necessidades das companhias”, afirma Gregório.

Ele defende que é preciso elevar o nível de transparência e precisão dos indicadores financeiros e não financeiros das empresas como um todo ao buscar boas políticas de governança. Falando especialmente das companhias estatais ou mistas, ele destaca que essa necessidade é ainda maior. “Os objetivos não financeiros incluem os objetivos de políticas públicas, que explicam como as companhias pretendem cumprir seus objetivos de interesse social, que vão muito além dos acionistas. O objetivo real da empresa. De onde vem e para onde vai.”

O executivo destaca que o artigo 17 da Lei das Estatais, que prevê que “os membros do Conselho de Administração e os indicados para os cargos de diretor, inclusive presidente, diretor-geral e diretor-presidente, serão escolhidos entre cidadãos de reputação ilibada e de notório conhecimento” era essencial para tornar esse processo mais justo. Atualmente, esse artigo está sob análise no Supremo Tribunal Federal (STF) após o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ter entrado com uma ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de liminar, questionando restrições a nomeações para a direção das estatais.

A ação contesta dispositivos que restringem as indicações, para empresas estatais, de conselheiros e diretores que sejam titulares de alguns cargos e que tenham atuado nos três anos anteriores na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral. “Por estar no STF, podemos considerar que ele foi ‘revogado’ e, na prática, não é usado. Esse é um problema, porque ele fala sobre a importância de não ter indicados políticos. Ajudava no processo de seleção e de meritocracia”, aponta Café.

Gregório destaca que alguma influência sempre vai existir, especialmente em empresas que precisam estabelecer um diálogo mais próximo com o governo. No entanto, ele ressalta que a política tinha como foco evitar uma influência excessiva e também fortalecer a pauta de governança corporativa.

“Quando uma empresa privada falha na administração, isso leva a um prejuízo dos acionistas privados, resultando em falência e todas as consequências do erro. Uma empresa estatal não entra em recuperação judicial, e o prejuízo é de todos os brasileiros. A governança das empresas estatais deveria ser ainda mais rigorosa, e não menos”, aponta Diogo Mac Cord, da EY.

Apuração sobre possível interferência

Em 18 de março, o subprocurador-geral do Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, pediu a apuração de eventual interferência na Petrobras por parte do presidente da República.

Furtado afirmou haver indícios de descumprimento da Lei das Estatais, que proíbe a ingerência política em sociedades de economia mista, ainda que a União seja acionista majoritária. Ele ainda alegou que a decisão de não repassar dividendos aos acionistas contrariou a avaliação da área técnica da companhia.

“A empresa conta com suas diretorias e com seu conselho de administração para tomar decisões técnicas, não sendo legítimo que o acionista controlador imponha qualquer tipo de decisão de forma arbitrária e sem os devidos fundamentos”, disse Furtado em nota à imprensa.

Caso os indícios sejam confirmados, o subprocurador pede que seja instaurada uma tomada de contas especial (processo que visa ressarcir danos) e que os agentes envolvidos sejam responsabilizados.

As discussões sobre governança corporativa voltaram ao noticiário em março com a tentativa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de interferir na gestão de grandes empresas. O exemplo mais recente foi a decisão do Conselho de Administração da Petrobras de reter o pagamento de dividendos extraordinários aos acionistas, no valor total de R$ 43 bilhões, numa decisão do próprio presidente Lula. O anúncio frustrou o mercado e fez a estatal perder cerca de R$ 56 bilhões em valor de mercado num único dia.

A Petrobras é uma empresa de capital misto cujo maior detentor de ações é o governo brasileiro, que tem maioria em seu conselho (seis dos 11 assentos). O presidente da estatal, Jean Paul Prates, foi às redes sociais rebater os questionamentos sobre a administração da estatal.

“É preciso de uma vez por todas compreender que a Petrobras é uma corporação de capital misto controlada pelo Estado brasileiro, e que este controle é exercido legitimamente pela maioria do seu conselho de administração. Isso não pode ser apontado como intervenção! É o exercício soberano dos representantes do controle da empresa”, afirmou.

O executivo defendeu ainda a decisão dos conselheiros indicados pela União. “É legítimo que o CA se posicione orientado pelo presidente da República e pelos seus auxiliares diretos, que são os ministros. Foi exatamente isso o que ocorreu”, disse. Procurada pela reportagem para comentar as críticas sobre interferência, a Petrobras afirmou que não comenta o assunto.

A crise dos dividendos ocorreu num contexto em que o governo já vinha tentando impor sua presença em outra grande companhia brasileira: a Vale. A gestão petista tentou pressionar o conselho da mineradora para emplacar o nome do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como presidente, o que acabou não acontecendo.

Privatizada em 1997, a Vale não tem controlador definido. O governo, na verdade, nem tem direito a assentos diretos no conselho da empresa. A Previ, o fundo de pensão dos funcionários do estatal Banco do Brasil, é que tem direito a duas das 13 cadeiras ― e essa é a influência que o governo poderia ter na empresa. A sucessão tumultuada e a queda do preço do minério de ferro no mercado internacional já levaram a mineradora a perder R$ 70,1 bilhões em valor de mercado neste ano.

O imbróglio voltou ao centro das atenções quando o conselheiro independente José Luciano Duarte Penido renunciou por “manipulação” na escolha do CEO, alegando “nefasta influência política”. Em sua carta, o executivo afirmou que o processo “vem sendo conduzido de forma manipulada, não atende ao melhor interesse da empresa, e sofre evidente e nefasta influência política”. A Vale divulgou um comunicado afirmando que segue rigorosamente seu estatuto.

No final de fevereiro, Lula afirmou em entrevista à RedeTV! que “as empresas brasileiras precisam estar de acordo com o entendimento de desenvolvimento do governo brasileiro”. Os casos envolvendo as gigantes brasileiras e as declarações do presidente renovaram o temor dos investidores sobre ingerência política na economia.

Do ponto de vista da governança, a diretora-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Valeria Café, diz que, juridicamente, é difícil dizer que houve algum tipo de ingerência no caso da Petrobras. Segundo ela, apesar das discussões sobre uma possível interferência do governo, se olhadas as leis do mercado e a decisão do conselho, aprovada pelos acionistas, nada foi feito ilegalmente.

Especialistas apontam que o cenário de governança evoluiu nos últimos anos, tanto em companhias estatais quanto privadas; faltam análises de performance e mais critérios na escolha dos conselheiros Foto: Deloitte

Roberto Gonzalez, sócio-diretor da iBluezone, startup especializada em soluções para governança corporativa, destaca que a definição a ser usada nestes casos não seria ingerência, mas sim influência. Ele diz considerar que o comunicado da Petrobras foi feito em um momento errado.

“A fala de uma pessoa em posição de poder pode influenciar os conselheiros. A partir do momento em que a sua fala pode impactar o posicionamento de um conselheiro, isso, sim, é uma influência. Fez algo ilegal? Não. Mas a sua fala, logicamente, pode influenciar. Ingerência é outra coisa. Porque eu não posso falar que você teve ingerência ou mudou o comportamento da empresa”, diz.

Para ele, a decisão sobre os dividendos, obviamente, movimentaria o mercado financeiro no momento do anúncio. Mas diz considerar que, se tivesse sido anunciada antes da divulgação do balanço e dado tempo para que os acionistas minoritários “digerissem” o cenário, a repercussão talvez fosse menor. “Muitos estavam contando com esse dinheiro. Você paga dividendos extraordinários durante anos e para do nada, é claro que já havia uma expectativa e vai haver reclamação.”

Gonzalez aponta que o barulho no caso da Petrobras é reflexo de um contexto em que o governo não está sendo “bem assessorado” para estabelecer um diálogo com o mercado de capitais. “A realidade é completamente diferente de 2003 (no primeiro governo Lula). Em 2003, compliance e auditoria não estavam em um grau tão avançado quanto estão hoje, mas esse assunto cresceu muito.”

O papel das estatais

O sócio líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord, aponta que um dos pontos cruciais é o papel das estatais. Ele destaca que uma companhia do porte da Petrobras transcende o status de estatal, considerando sua relevância para o desenvolvimento econômico do País e para o mercado de capitais.

Sócio-líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord Foto: Divulgação/ EY

“Se muitas delas ganharam relevância, é por causa do seu core, óbvio, mas também porque tiveram acionistas privados que investiram por acreditar que seriam administradas de uma determinada maneira”, diz. Ele destaca que o fortalecimento de boas práticas de governança e da transparência garantem uma boa gestão das companhias.

O professor Carlos Portugal Gouvêa, da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório PGLaw, tem opinião similar. “O histórico de uso da Petrobras para controlar a inflação, ou seja, de uma interferência governamental para orientar a companhia para uma função para a qual ela não foi criada, faz com que o valor das ações da Petrobras seja muito mal avaliada. O melhor que o governo poderia fazer para a governança é indicar conselheiros totalmente independentes e deixar o conselho governar a companhia de uma forma absolutamente técnica”.

O especialista ainda aponta que, segundo a Lei das Sociedades por Ações, a única forma de o governo interferir na companhia é por meio de seus votos na Assembleia Geral, sendo que, neste caso, o controlador estaria isento de seus deveres fiduciários caso buscasse orientar a companhia para atender ao interesse público que justificou a sua criação.

“Esse interesse é o especificado na lei que criou a Petrobras: o de desenvolver o mercado de combustíveis no Brasil. Não existe um interesse público da Petrobras em controlar o índice de inflação, por exemplo. Quem deve decidir onde a companhia vai realizar investimentos é o conselho e a diretoria, de forma totalmente independente do governo, pois o interesse público da companhia é ser a melhor companhia de petróleo que ela pode ser, extrair e refinar o petróleo da forma mais eficiente possível, com a melhor tecnologia, e se preparar para a transição energética de forma a preservar o mercado energético brasileiro no futuro”.

Na época, a companhia afirmou que a “proposição de pagamento de dividendos extraordinários foi realizada com base na avaliação da sua equipe técnica”. Questionada pelo Estadão sobre as especulações, a companhia afirmou que não iria se posicionar.

Procurado para responder sobre as especulações sobre uma suposta ingerência na Petrobras e sobre a suposta tentativa de entrada de Mantega no conselho da mineradora como presidente, a secretaria de comunicação do governo federal afirmou que “não houve interferência política em nenhum dos casos”.

“A Vale é uma empresa privada que discute com o governo acordos de ressarcimentos por desastres ambientais. O retorno total das ações preferenciais da Petrobras entre o fechamento do último dia útil de 2022 até dia 21 deste mês foi de 88,1%. Já no caso das ações ordinárias, o retorno total foi de 64,3% no mesmo período. Vale explicar que o retorno total é o que melhor representa o ganho do acionista, uma vez que considera, além da valorização da ação, os dividendos recebidos. A empresa retomou investimentos e teve o segundo maior lucro da sua história”, disse a secretaria, em nota. Questionada sobre o mesmo assunto, a Vale afirmou que não comenta este assunto.

Boas práticas de governança

Especialistas destacam que a Lei das S/A, que regulamenta as sociedades por ações – tanto as companhias de capital aberto, quanto as de capital fechado, representou um avanço significativo na implementação de boas práticas de governança corporativa nas empresas. No entanto, por terem participação do governo, muitas dessas empresas estão sujeitas a interesses políticos e partidários. A chave para sanar essa dualidade é justamente a manutenção das boas práticas, que pode ajudar a evitar grande parte dos ruídos com o mercado.

“O jogo político existe, sempre existirá, inclusive no setor privado. As leis foram criada para afastar interferências empresariais”, explica Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) Foto: Regis Filho/ IBGC

Para Gregório, a Lei das S/A contribuiu para afastar pessoas com conflitos de interesse político, mas ressalta que ainda falta rigor na seleção e avaliação de administradores, membros do conselho e da diretoria. Ele também lembra que as empresas estatais foram criadas para desenvolver áreas que ainda não ganharam impulso, ou por questões de segurança nacional.

“Será que todas as estatais do País cumprem esse propósito? Se sim, é necessário que demonstrem como e onde estão cumprindo”, destaca Valéria Café.

Gregório diz que haveria menos questionamentos sobre a gestão se houvesse uma revisão periódica para garantir que as empresas estivessem cumprindo os objetivos para os quais foram criadas, o que é essencial para manter a confiabilidade do mercado naquela empresa.

“Se você deixa um cenário muito cinzento sem clareza sobre qual é o papel daquela empresa em políticas públicas e se ela está desempenhando bem esse papel, dá espaço para que a estatal mude da água para o vinho.” Nesse processo, a ampliação da transparência adotada seria de grande valia.

Café aponta que houve uma melhora inegável na governança corporativa nos últimos anos. Ela destaca, no entanto, que outros pontos, como a total independência do colegiado, são áreas que devem ser trabalhadas para fortalecer a pauta.

“A independência dos conselheiros, inclusive financeira, é essencial. Os conselhos devem sempre decidir a favor do melhor interesse para a organização, independentemente dos membros ou da indicação, sem pensar em agradar quem os indicou para conseguir voltar depois. Eles não podem depender financeiramente daquele conselho para viver, não são executivos”, diz.

Valeria Café, diretora-geral do IBGC Foto: Regis Filho/ IBGC

Além disso, outras ações, como a criação de uma política de propriedade estatal e a incorporação de uma avaliação de desempenho do conselho e da diretoria seriam fatores essenciais para garantir uma boa governança para as companhias. “A publicação desses resultados poderia justificar mudanças em relação aos resultados. Essa avaliação, inclusive, ajuda os acionistas a entender quem deveria fazer parte daquela companhia e se os candidatos são compatíveis com as necessidades das companhias”, afirma Gregório.

Ele defende que é preciso elevar o nível de transparência e precisão dos indicadores financeiros e não financeiros das empresas como um todo ao buscar boas políticas de governança. Falando especialmente das companhias estatais ou mistas, ele destaca que essa necessidade é ainda maior. “Os objetivos não financeiros incluem os objetivos de políticas públicas, que explicam como as companhias pretendem cumprir seus objetivos de interesse social, que vão muito além dos acionistas. O objetivo real da empresa. De onde vem e para onde vai.”

O executivo destaca que o artigo 17 da Lei das Estatais, que prevê que “os membros do Conselho de Administração e os indicados para os cargos de diretor, inclusive presidente, diretor-geral e diretor-presidente, serão escolhidos entre cidadãos de reputação ilibada e de notório conhecimento” era essencial para tornar esse processo mais justo. Atualmente, esse artigo está sob análise no Supremo Tribunal Federal (STF) após o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ter entrado com uma ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de liminar, questionando restrições a nomeações para a direção das estatais.

A ação contesta dispositivos que restringem as indicações, para empresas estatais, de conselheiros e diretores que sejam titulares de alguns cargos e que tenham atuado nos três anos anteriores na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral. “Por estar no STF, podemos considerar que ele foi ‘revogado’ e, na prática, não é usado. Esse é um problema, porque ele fala sobre a importância de não ter indicados políticos. Ajudava no processo de seleção e de meritocracia”, aponta Café.

Gregório destaca que alguma influência sempre vai existir, especialmente em empresas que precisam estabelecer um diálogo mais próximo com o governo. No entanto, ele ressalta que a política tinha como foco evitar uma influência excessiva e também fortalecer a pauta de governança corporativa.

“Quando uma empresa privada falha na administração, isso leva a um prejuízo dos acionistas privados, resultando em falência e todas as consequências do erro. Uma empresa estatal não entra em recuperação judicial, e o prejuízo é de todos os brasileiros. A governança das empresas estatais deveria ser ainda mais rigorosa, e não menos”, aponta Diogo Mac Cord, da EY.

Apuração sobre possível interferência

Em 18 de março, o subprocurador-geral do Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, pediu a apuração de eventual interferência na Petrobras por parte do presidente da República.

Furtado afirmou haver indícios de descumprimento da Lei das Estatais, que proíbe a ingerência política em sociedades de economia mista, ainda que a União seja acionista majoritária. Ele ainda alegou que a decisão de não repassar dividendos aos acionistas contrariou a avaliação da área técnica da companhia.

“A empresa conta com suas diretorias e com seu conselho de administração para tomar decisões técnicas, não sendo legítimo que o acionista controlador imponha qualquer tipo de decisão de forma arbitrária e sem os devidos fundamentos”, disse Furtado em nota à imprensa.

Caso os indícios sejam confirmados, o subprocurador pede que seja instaurada uma tomada de contas especial (processo que visa ressarcir danos) e que os agentes envolvidos sejam responsabilizados.

As discussões sobre governança corporativa voltaram ao noticiário em março com a tentativa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de interferir na gestão de grandes empresas. O exemplo mais recente foi a decisão do Conselho de Administração da Petrobras de reter o pagamento de dividendos extraordinários aos acionistas, no valor total de R$ 43 bilhões, numa decisão do próprio presidente Lula. O anúncio frustrou o mercado e fez a estatal perder cerca de R$ 56 bilhões em valor de mercado num único dia.

A Petrobras é uma empresa de capital misto cujo maior detentor de ações é o governo brasileiro, que tem maioria em seu conselho (seis dos 11 assentos). O presidente da estatal, Jean Paul Prates, foi às redes sociais rebater os questionamentos sobre a administração da estatal.

“É preciso de uma vez por todas compreender que a Petrobras é uma corporação de capital misto controlada pelo Estado brasileiro, e que este controle é exercido legitimamente pela maioria do seu conselho de administração. Isso não pode ser apontado como intervenção! É o exercício soberano dos representantes do controle da empresa”, afirmou.

O executivo defendeu ainda a decisão dos conselheiros indicados pela União. “É legítimo que o CA se posicione orientado pelo presidente da República e pelos seus auxiliares diretos, que são os ministros. Foi exatamente isso o que ocorreu”, disse. Procurada pela reportagem para comentar as críticas sobre interferência, a Petrobras afirmou que não comenta o assunto.

A crise dos dividendos ocorreu num contexto em que o governo já vinha tentando impor sua presença em outra grande companhia brasileira: a Vale. A gestão petista tentou pressionar o conselho da mineradora para emplacar o nome do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como presidente, o que acabou não acontecendo.

Privatizada em 1997, a Vale não tem controlador definido. O governo, na verdade, nem tem direito a assentos diretos no conselho da empresa. A Previ, o fundo de pensão dos funcionários do estatal Banco do Brasil, é que tem direito a duas das 13 cadeiras ― e essa é a influência que o governo poderia ter na empresa. A sucessão tumultuada e a queda do preço do minério de ferro no mercado internacional já levaram a mineradora a perder R$ 70,1 bilhões em valor de mercado neste ano.

O imbróglio voltou ao centro das atenções quando o conselheiro independente José Luciano Duarte Penido renunciou por “manipulação” na escolha do CEO, alegando “nefasta influência política”. Em sua carta, o executivo afirmou que o processo “vem sendo conduzido de forma manipulada, não atende ao melhor interesse da empresa, e sofre evidente e nefasta influência política”. A Vale divulgou um comunicado afirmando que segue rigorosamente seu estatuto.

No final de fevereiro, Lula afirmou em entrevista à RedeTV! que “as empresas brasileiras precisam estar de acordo com o entendimento de desenvolvimento do governo brasileiro”. Os casos envolvendo as gigantes brasileiras e as declarações do presidente renovaram o temor dos investidores sobre ingerência política na economia.

Do ponto de vista da governança, a diretora-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Valeria Café, diz que, juridicamente, é difícil dizer que houve algum tipo de ingerência no caso da Petrobras. Segundo ela, apesar das discussões sobre uma possível interferência do governo, se olhadas as leis do mercado e a decisão do conselho, aprovada pelos acionistas, nada foi feito ilegalmente.

Especialistas apontam que o cenário de governança evoluiu nos últimos anos, tanto em companhias estatais quanto privadas; faltam análises de performance e mais critérios na escolha dos conselheiros Foto: Deloitte

Roberto Gonzalez, sócio-diretor da iBluezone, startup especializada em soluções para governança corporativa, destaca que a definição a ser usada nestes casos não seria ingerência, mas sim influência. Ele diz considerar que o comunicado da Petrobras foi feito em um momento errado.

“A fala de uma pessoa em posição de poder pode influenciar os conselheiros. A partir do momento em que a sua fala pode impactar o posicionamento de um conselheiro, isso, sim, é uma influência. Fez algo ilegal? Não. Mas a sua fala, logicamente, pode influenciar. Ingerência é outra coisa. Porque eu não posso falar que você teve ingerência ou mudou o comportamento da empresa”, diz.

Para ele, a decisão sobre os dividendos, obviamente, movimentaria o mercado financeiro no momento do anúncio. Mas diz considerar que, se tivesse sido anunciada antes da divulgação do balanço e dado tempo para que os acionistas minoritários “digerissem” o cenário, a repercussão talvez fosse menor. “Muitos estavam contando com esse dinheiro. Você paga dividendos extraordinários durante anos e para do nada, é claro que já havia uma expectativa e vai haver reclamação.”

Gonzalez aponta que o barulho no caso da Petrobras é reflexo de um contexto em que o governo não está sendo “bem assessorado” para estabelecer um diálogo com o mercado de capitais. “A realidade é completamente diferente de 2003 (no primeiro governo Lula). Em 2003, compliance e auditoria não estavam em um grau tão avançado quanto estão hoje, mas esse assunto cresceu muito.”

O papel das estatais

O sócio líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord, aponta que um dos pontos cruciais é o papel das estatais. Ele destaca que uma companhia do porte da Petrobras transcende o status de estatal, considerando sua relevância para o desenvolvimento econômico do País e para o mercado de capitais.

Sócio-líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord Foto: Divulgação/ EY

“Se muitas delas ganharam relevância, é por causa do seu core, óbvio, mas também porque tiveram acionistas privados que investiram por acreditar que seriam administradas de uma determinada maneira”, diz. Ele destaca que o fortalecimento de boas práticas de governança e da transparência garantem uma boa gestão das companhias.

O professor Carlos Portugal Gouvêa, da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório PGLaw, tem opinião similar. “O histórico de uso da Petrobras para controlar a inflação, ou seja, de uma interferência governamental para orientar a companhia para uma função para a qual ela não foi criada, faz com que o valor das ações da Petrobras seja muito mal avaliada. O melhor que o governo poderia fazer para a governança é indicar conselheiros totalmente independentes e deixar o conselho governar a companhia de uma forma absolutamente técnica”.

O especialista ainda aponta que, segundo a Lei das Sociedades por Ações, a única forma de o governo interferir na companhia é por meio de seus votos na Assembleia Geral, sendo que, neste caso, o controlador estaria isento de seus deveres fiduciários caso buscasse orientar a companhia para atender ao interesse público que justificou a sua criação.

“Esse interesse é o especificado na lei que criou a Petrobras: o de desenvolver o mercado de combustíveis no Brasil. Não existe um interesse público da Petrobras em controlar o índice de inflação, por exemplo. Quem deve decidir onde a companhia vai realizar investimentos é o conselho e a diretoria, de forma totalmente independente do governo, pois o interesse público da companhia é ser a melhor companhia de petróleo que ela pode ser, extrair e refinar o petróleo da forma mais eficiente possível, com a melhor tecnologia, e se preparar para a transição energética de forma a preservar o mercado energético brasileiro no futuro”.

Na época, a companhia afirmou que a “proposição de pagamento de dividendos extraordinários foi realizada com base na avaliação da sua equipe técnica”. Questionada pelo Estadão sobre as especulações, a companhia afirmou que não iria se posicionar.

Procurado para responder sobre as especulações sobre uma suposta ingerência na Petrobras e sobre a suposta tentativa de entrada de Mantega no conselho da mineradora como presidente, a secretaria de comunicação do governo federal afirmou que “não houve interferência política em nenhum dos casos”.

“A Vale é uma empresa privada que discute com o governo acordos de ressarcimentos por desastres ambientais. O retorno total das ações preferenciais da Petrobras entre o fechamento do último dia útil de 2022 até dia 21 deste mês foi de 88,1%. Já no caso das ações ordinárias, o retorno total foi de 64,3% no mesmo período. Vale explicar que o retorno total é o que melhor representa o ganho do acionista, uma vez que considera, além da valorização da ação, os dividendos recebidos. A empresa retomou investimentos e teve o segundo maior lucro da sua história”, disse a secretaria, em nota. Questionada sobre o mesmo assunto, a Vale afirmou que não comenta este assunto.

Boas práticas de governança

Especialistas destacam que a Lei das S/A, que regulamenta as sociedades por ações – tanto as companhias de capital aberto, quanto as de capital fechado, representou um avanço significativo na implementação de boas práticas de governança corporativa nas empresas. No entanto, por terem participação do governo, muitas dessas empresas estão sujeitas a interesses políticos e partidários. A chave para sanar essa dualidade é justamente a manutenção das boas práticas, que pode ajudar a evitar grande parte dos ruídos com o mercado.

“O jogo político existe, sempre existirá, inclusive no setor privado. As leis foram criada para afastar interferências empresariais”, explica Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) Foto: Regis Filho/ IBGC

Para Gregório, a Lei das S/A contribuiu para afastar pessoas com conflitos de interesse político, mas ressalta que ainda falta rigor na seleção e avaliação de administradores, membros do conselho e da diretoria. Ele também lembra que as empresas estatais foram criadas para desenvolver áreas que ainda não ganharam impulso, ou por questões de segurança nacional.

“Será que todas as estatais do País cumprem esse propósito? Se sim, é necessário que demonstrem como e onde estão cumprindo”, destaca Valéria Café.

Gregório diz que haveria menos questionamentos sobre a gestão se houvesse uma revisão periódica para garantir que as empresas estivessem cumprindo os objetivos para os quais foram criadas, o que é essencial para manter a confiabilidade do mercado naquela empresa.

“Se você deixa um cenário muito cinzento sem clareza sobre qual é o papel daquela empresa em políticas públicas e se ela está desempenhando bem esse papel, dá espaço para que a estatal mude da água para o vinho.” Nesse processo, a ampliação da transparência adotada seria de grande valia.

Café aponta que houve uma melhora inegável na governança corporativa nos últimos anos. Ela destaca, no entanto, que outros pontos, como a total independência do colegiado, são áreas que devem ser trabalhadas para fortalecer a pauta.

“A independência dos conselheiros, inclusive financeira, é essencial. Os conselhos devem sempre decidir a favor do melhor interesse para a organização, independentemente dos membros ou da indicação, sem pensar em agradar quem os indicou para conseguir voltar depois. Eles não podem depender financeiramente daquele conselho para viver, não são executivos”, diz.

Valeria Café, diretora-geral do IBGC Foto: Regis Filho/ IBGC

Além disso, outras ações, como a criação de uma política de propriedade estatal e a incorporação de uma avaliação de desempenho do conselho e da diretoria seriam fatores essenciais para garantir uma boa governança para as companhias. “A publicação desses resultados poderia justificar mudanças em relação aos resultados. Essa avaliação, inclusive, ajuda os acionistas a entender quem deveria fazer parte daquela companhia e se os candidatos são compatíveis com as necessidades das companhias”, afirma Gregório.

Ele defende que é preciso elevar o nível de transparência e precisão dos indicadores financeiros e não financeiros das empresas como um todo ao buscar boas políticas de governança. Falando especialmente das companhias estatais ou mistas, ele destaca que essa necessidade é ainda maior. “Os objetivos não financeiros incluem os objetivos de políticas públicas, que explicam como as companhias pretendem cumprir seus objetivos de interesse social, que vão muito além dos acionistas. O objetivo real da empresa. De onde vem e para onde vai.”

O executivo destaca que o artigo 17 da Lei das Estatais, que prevê que “os membros do Conselho de Administração e os indicados para os cargos de diretor, inclusive presidente, diretor-geral e diretor-presidente, serão escolhidos entre cidadãos de reputação ilibada e de notório conhecimento” era essencial para tornar esse processo mais justo. Atualmente, esse artigo está sob análise no Supremo Tribunal Federal (STF) após o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ter entrado com uma ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de liminar, questionando restrições a nomeações para a direção das estatais.

A ação contesta dispositivos que restringem as indicações, para empresas estatais, de conselheiros e diretores que sejam titulares de alguns cargos e que tenham atuado nos três anos anteriores na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral. “Por estar no STF, podemos considerar que ele foi ‘revogado’ e, na prática, não é usado. Esse é um problema, porque ele fala sobre a importância de não ter indicados políticos. Ajudava no processo de seleção e de meritocracia”, aponta Café.

Gregório destaca que alguma influência sempre vai existir, especialmente em empresas que precisam estabelecer um diálogo mais próximo com o governo. No entanto, ele ressalta que a política tinha como foco evitar uma influência excessiva e também fortalecer a pauta de governança corporativa.

“Quando uma empresa privada falha na administração, isso leva a um prejuízo dos acionistas privados, resultando em falência e todas as consequências do erro. Uma empresa estatal não entra em recuperação judicial, e o prejuízo é de todos os brasileiros. A governança das empresas estatais deveria ser ainda mais rigorosa, e não menos”, aponta Diogo Mac Cord, da EY.

Apuração sobre possível interferência

Em 18 de março, o subprocurador-geral do Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, pediu a apuração de eventual interferência na Petrobras por parte do presidente da República.

Furtado afirmou haver indícios de descumprimento da Lei das Estatais, que proíbe a ingerência política em sociedades de economia mista, ainda que a União seja acionista majoritária. Ele ainda alegou que a decisão de não repassar dividendos aos acionistas contrariou a avaliação da área técnica da companhia.

“A empresa conta com suas diretorias e com seu conselho de administração para tomar decisões técnicas, não sendo legítimo que o acionista controlador imponha qualquer tipo de decisão de forma arbitrária e sem os devidos fundamentos”, disse Furtado em nota à imprensa.

Caso os indícios sejam confirmados, o subprocurador pede que seja instaurada uma tomada de contas especial (processo que visa ressarcir danos) e que os agentes envolvidos sejam responsabilizados.

As discussões sobre governança corporativa voltaram ao noticiário em março com a tentativa do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de interferir na gestão de grandes empresas. O exemplo mais recente foi a decisão do Conselho de Administração da Petrobras de reter o pagamento de dividendos extraordinários aos acionistas, no valor total de R$ 43 bilhões, numa decisão do próprio presidente Lula. O anúncio frustrou o mercado e fez a estatal perder cerca de R$ 56 bilhões em valor de mercado num único dia.

A Petrobras é uma empresa de capital misto cujo maior detentor de ações é o governo brasileiro, que tem maioria em seu conselho (seis dos 11 assentos). O presidente da estatal, Jean Paul Prates, foi às redes sociais rebater os questionamentos sobre a administração da estatal.

“É preciso de uma vez por todas compreender que a Petrobras é uma corporação de capital misto controlada pelo Estado brasileiro, e que este controle é exercido legitimamente pela maioria do seu conselho de administração. Isso não pode ser apontado como intervenção! É o exercício soberano dos representantes do controle da empresa”, afirmou.

O executivo defendeu ainda a decisão dos conselheiros indicados pela União. “É legítimo que o CA se posicione orientado pelo presidente da República e pelos seus auxiliares diretos, que são os ministros. Foi exatamente isso o que ocorreu”, disse. Procurada pela reportagem para comentar as críticas sobre interferência, a Petrobras afirmou que não comenta o assunto.

A crise dos dividendos ocorreu num contexto em que o governo já vinha tentando impor sua presença em outra grande companhia brasileira: a Vale. A gestão petista tentou pressionar o conselho da mineradora para emplacar o nome do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega como presidente, o que acabou não acontecendo.

Privatizada em 1997, a Vale não tem controlador definido. O governo, na verdade, nem tem direito a assentos diretos no conselho da empresa. A Previ, o fundo de pensão dos funcionários do estatal Banco do Brasil, é que tem direito a duas das 13 cadeiras ― e essa é a influência que o governo poderia ter na empresa. A sucessão tumultuada e a queda do preço do minério de ferro no mercado internacional já levaram a mineradora a perder R$ 70,1 bilhões em valor de mercado neste ano.

O imbróglio voltou ao centro das atenções quando o conselheiro independente José Luciano Duarte Penido renunciou por “manipulação” na escolha do CEO, alegando “nefasta influência política”. Em sua carta, o executivo afirmou que o processo “vem sendo conduzido de forma manipulada, não atende ao melhor interesse da empresa, e sofre evidente e nefasta influência política”. A Vale divulgou um comunicado afirmando que segue rigorosamente seu estatuto.

No final de fevereiro, Lula afirmou em entrevista à RedeTV! que “as empresas brasileiras precisam estar de acordo com o entendimento de desenvolvimento do governo brasileiro”. Os casos envolvendo as gigantes brasileiras e as declarações do presidente renovaram o temor dos investidores sobre ingerência política na economia.

Do ponto de vista da governança, a diretora-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Valeria Café, diz que, juridicamente, é difícil dizer que houve algum tipo de ingerência no caso da Petrobras. Segundo ela, apesar das discussões sobre uma possível interferência do governo, se olhadas as leis do mercado e a decisão do conselho, aprovada pelos acionistas, nada foi feito ilegalmente.

Especialistas apontam que o cenário de governança evoluiu nos últimos anos, tanto em companhias estatais quanto privadas; faltam análises de performance e mais critérios na escolha dos conselheiros Foto: Deloitte

Roberto Gonzalez, sócio-diretor da iBluezone, startup especializada em soluções para governança corporativa, destaca que a definição a ser usada nestes casos não seria ingerência, mas sim influência. Ele diz considerar que o comunicado da Petrobras foi feito em um momento errado.

“A fala de uma pessoa em posição de poder pode influenciar os conselheiros. A partir do momento em que a sua fala pode impactar o posicionamento de um conselheiro, isso, sim, é uma influência. Fez algo ilegal? Não. Mas a sua fala, logicamente, pode influenciar. Ingerência é outra coisa. Porque eu não posso falar que você teve ingerência ou mudou o comportamento da empresa”, diz.

Para ele, a decisão sobre os dividendos, obviamente, movimentaria o mercado financeiro no momento do anúncio. Mas diz considerar que, se tivesse sido anunciada antes da divulgação do balanço e dado tempo para que os acionistas minoritários “digerissem” o cenário, a repercussão talvez fosse menor. “Muitos estavam contando com esse dinheiro. Você paga dividendos extraordinários durante anos e para do nada, é claro que já havia uma expectativa e vai haver reclamação.”

Gonzalez aponta que o barulho no caso da Petrobras é reflexo de um contexto em que o governo não está sendo “bem assessorado” para estabelecer um diálogo com o mercado de capitais. “A realidade é completamente diferente de 2003 (no primeiro governo Lula). Em 2003, compliance e auditoria não estavam em um grau tão avançado quanto estão hoje, mas esse assunto cresceu muito.”

O papel das estatais

O sócio líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord, aponta que um dos pontos cruciais é o papel das estatais. Ele destaca que uma companhia do porte da Petrobras transcende o status de estatal, considerando sua relevância para o desenvolvimento econômico do País e para o mercado de capitais.

Sócio-líder de Infraestrutura e Mercados Regulados da EY para a América Latina, Diogo Mac Cord Foto: Divulgação/ EY

“Se muitas delas ganharam relevância, é por causa do seu core, óbvio, mas também porque tiveram acionistas privados que investiram por acreditar que seriam administradas de uma determinada maneira”, diz. Ele destaca que o fortalecimento de boas práticas de governança e da transparência garantem uma boa gestão das companhias.

O professor Carlos Portugal Gouvêa, da Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório PGLaw, tem opinião similar. “O histórico de uso da Petrobras para controlar a inflação, ou seja, de uma interferência governamental para orientar a companhia para uma função para a qual ela não foi criada, faz com que o valor das ações da Petrobras seja muito mal avaliada. O melhor que o governo poderia fazer para a governança é indicar conselheiros totalmente independentes e deixar o conselho governar a companhia de uma forma absolutamente técnica”.

O especialista ainda aponta que, segundo a Lei das Sociedades por Ações, a única forma de o governo interferir na companhia é por meio de seus votos na Assembleia Geral, sendo que, neste caso, o controlador estaria isento de seus deveres fiduciários caso buscasse orientar a companhia para atender ao interesse público que justificou a sua criação.

“Esse interesse é o especificado na lei que criou a Petrobras: o de desenvolver o mercado de combustíveis no Brasil. Não existe um interesse público da Petrobras em controlar o índice de inflação, por exemplo. Quem deve decidir onde a companhia vai realizar investimentos é o conselho e a diretoria, de forma totalmente independente do governo, pois o interesse público da companhia é ser a melhor companhia de petróleo que ela pode ser, extrair e refinar o petróleo da forma mais eficiente possível, com a melhor tecnologia, e se preparar para a transição energética de forma a preservar o mercado energético brasileiro no futuro”.

Na época, a companhia afirmou que a “proposição de pagamento de dividendos extraordinários foi realizada com base na avaliação da sua equipe técnica”. Questionada pelo Estadão sobre as especulações, a companhia afirmou que não iria se posicionar.

Procurado para responder sobre as especulações sobre uma suposta ingerência na Petrobras e sobre a suposta tentativa de entrada de Mantega no conselho da mineradora como presidente, a secretaria de comunicação do governo federal afirmou que “não houve interferência política em nenhum dos casos”.

“A Vale é uma empresa privada que discute com o governo acordos de ressarcimentos por desastres ambientais. O retorno total das ações preferenciais da Petrobras entre o fechamento do último dia útil de 2022 até dia 21 deste mês foi de 88,1%. Já no caso das ações ordinárias, o retorno total foi de 64,3% no mesmo período. Vale explicar que o retorno total é o que melhor representa o ganho do acionista, uma vez que considera, além da valorização da ação, os dividendos recebidos. A empresa retomou investimentos e teve o segundo maior lucro da sua história”, disse a secretaria, em nota. Questionada sobre o mesmo assunto, a Vale afirmou que não comenta este assunto.

Boas práticas de governança

Especialistas destacam que a Lei das S/A, que regulamenta as sociedades por ações – tanto as companhias de capital aberto, quanto as de capital fechado, representou um avanço significativo na implementação de boas práticas de governança corporativa nas empresas. No entanto, por terem participação do governo, muitas dessas empresas estão sujeitas a interesses políticos e partidários. A chave para sanar essa dualidade é justamente a manutenção das boas práticas, que pode ajudar a evitar grande parte dos ruídos com o mercado.

“O jogo político existe, sempre existirá, inclusive no setor privado. As leis foram criada para afastar interferências empresariais”, explica Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).

Danilo Gregório, gerente de relações institucionais e governamentais do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) Foto: Regis Filho/ IBGC

Para Gregório, a Lei das S/A contribuiu para afastar pessoas com conflitos de interesse político, mas ressalta que ainda falta rigor na seleção e avaliação de administradores, membros do conselho e da diretoria. Ele também lembra que as empresas estatais foram criadas para desenvolver áreas que ainda não ganharam impulso, ou por questões de segurança nacional.

“Será que todas as estatais do País cumprem esse propósito? Se sim, é necessário que demonstrem como e onde estão cumprindo”, destaca Valéria Café.

Gregório diz que haveria menos questionamentos sobre a gestão se houvesse uma revisão periódica para garantir que as empresas estivessem cumprindo os objetivos para os quais foram criadas, o que é essencial para manter a confiabilidade do mercado naquela empresa.

“Se você deixa um cenário muito cinzento sem clareza sobre qual é o papel daquela empresa em políticas públicas e se ela está desempenhando bem esse papel, dá espaço para que a estatal mude da água para o vinho.” Nesse processo, a ampliação da transparência adotada seria de grande valia.

Café aponta que houve uma melhora inegável na governança corporativa nos últimos anos. Ela destaca, no entanto, que outros pontos, como a total independência do colegiado, são áreas que devem ser trabalhadas para fortalecer a pauta.

“A independência dos conselheiros, inclusive financeira, é essencial. Os conselhos devem sempre decidir a favor do melhor interesse para a organização, independentemente dos membros ou da indicação, sem pensar em agradar quem os indicou para conseguir voltar depois. Eles não podem depender financeiramente daquele conselho para viver, não são executivos”, diz.

Valeria Café, diretora-geral do IBGC Foto: Regis Filho/ IBGC

Além disso, outras ações, como a criação de uma política de propriedade estatal e a incorporação de uma avaliação de desempenho do conselho e da diretoria seriam fatores essenciais para garantir uma boa governança para as companhias. “A publicação desses resultados poderia justificar mudanças em relação aos resultados. Essa avaliação, inclusive, ajuda os acionistas a entender quem deveria fazer parte daquela companhia e se os candidatos são compatíveis com as necessidades das companhias”, afirma Gregório.

Ele defende que é preciso elevar o nível de transparência e precisão dos indicadores financeiros e não financeiros das empresas como um todo ao buscar boas políticas de governança. Falando especialmente das companhias estatais ou mistas, ele destaca que essa necessidade é ainda maior. “Os objetivos não financeiros incluem os objetivos de políticas públicas, que explicam como as companhias pretendem cumprir seus objetivos de interesse social, que vão muito além dos acionistas. O objetivo real da empresa. De onde vem e para onde vai.”

O executivo destaca que o artigo 17 da Lei das Estatais, que prevê que “os membros do Conselho de Administração e os indicados para os cargos de diretor, inclusive presidente, diretor-geral e diretor-presidente, serão escolhidos entre cidadãos de reputação ilibada e de notório conhecimento” era essencial para tornar esse processo mais justo. Atualmente, esse artigo está sob análise no Supremo Tribunal Federal (STF) após o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) ter entrado com uma ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de liminar, questionando restrições a nomeações para a direção das estatais.

A ação contesta dispositivos que restringem as indicações, para empresas estatais, de conselheiros e diretores que sejam titulares de alguns cargos e que tenham atuado nos três anos anteriores na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral. “Por estar no STF, podemos considerar que ele foi ‘revogado’ e, na prática, não é usado. Esse é um problema, porque ele fala sobre a importância de não ter indicados políticos. Ajudava no processo de seleção e de meritocracia”, aponta Café.

Gregório destaca que alguma influência sempre vai existir, especialmente em empresas que precisam estabelecer um diálogo mais próximo com o governo. No entanto, ele ressalta que a política tinha como foco evitar uma influência excessiva e também fortalecer a pauta de governança corporativa.

“Quando uma empresa privada falha na administração, isso leva a um prejuízo dos acionistas privados, resultando em falência e todas as consequências do erro. Uma empresa estatal não entra em recuperação judicial, e o prejuízo é de todos os brasileiros. A governança das empresas estatais deveria ser ainda mais rigorosa, e não menos”, aponta Diogo Mac Cord, da EY.

Apuração sobre possível interferência

Em 18 de março, o subprocurador-geral do Ministério Público (MP) junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), Lucas Furtado, pediu a apuração de eventual interferência na Petrobras por parte do presidente da República.

Furtado afirmou haver indícios de descumprimento da Lei das Estatais, que proíbe a ingerência política em sociedades de economia mista, ainda que a União seja acionista majoritária. Ele ainda alegou que a decisão de não repassar dividendos aos acionistas contrariou a avaliação da área técnica da companhia.

“A empresa conta com suas diretorias e com seu conselho de administração para tomar decisões técnicas, não sendo legítimo que o acionista controlador imponha qualquer tipo de decisão de forma arbitrária e sem os devidos fundamentos”, disse Furtado em nota à imprensa.

Caso os indícios sejam confirmados, o subprocurador pede que seja instaurada uma tomada de contas especial (processo que visa ressarcir danos) e que os agentes envolvidos sejam responsabilizados.

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