BRASÍLIA - O governo federal anunciou um novo bloqueio de R$ 6 bilhões no Orçamento deste ano para compensar um crescimento acima do esperado em despesas obrigatórias, puxadas pelos benefícios previdenciários. Com isso, o total de gastos congelados no Orçamento passa para 19,3 bilhões.
Os números fazem parte do 5º Relatório Bimestral de Receitas e Despesas de 2024, enviado pela equipe econômica nesta sexta-feira, 22, ao Congresso Nacional. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já havia antecipado nesta quinta-feira que o bloqueio ficaria na casa dos R$ 5 bilhões.
Segundo o Ministério do Planejamento e Orçamento, o bloqueio foi motivado pelo aumento de R$ 7,7 bilhões na estimativa de gastos com a Previdência Social. Por outro lado, segundo a pasta, houve revisão para baixo de R$ 1,9 bilhão nos gastos previstos com pessoal e encargos sociais.
O governo projeta um déficit de R$ 28,7 bilhões neste ano - dentro do limite de tolerância da meta zero, que permite um saldo negativo de até R$ 28,8 bilhões nas contas (-0,25% do PIB). Por isso, não houve a necessidade de contingenciamentos (entenda mais abaixo).
Segundo o economista Fábio Serrano, do BTG Pactual, o governo conta com o chamado “empoçamento” para cumprir a meta, quando os ministérios não conseguem executar gastos previstos. O ideal, diz, é que o contingenciamento fosse adotado.
“Pelo lado da receita, a redução na projeção do governo ficou aquém do necessário. A aposta do governo é que o empoçamento ao final do ano fará com a meta de primário seja cumprida, o que realmente deve ocorrer. Contudo, um gerenciamento conservador do orçamento recomendaria não contar com o empoçamento, recorrendo ao contingenciamento para garantir a meta”.
O Planejamento ainda vai informar quais órgãos serão atingidos pelo bloqueio. A projeção é que isso ocorra no próximo dia 29, e os órgãos ainda terão até o dia 6 de dezembro para indicar que programas serão afetados.
O governo revisou para baixo as estimativas de despesas totais no ano, em R$ 7,28 bilhões. Houve o cancelamento de R$ 4 bilhões em créditos extraordinários, redução de R$ 2,5 bilhões para subsídios, subvenção e Proagro (espécie de seguro rural para pequenos agricultores) e queda de R$ 1,9 bilhão com pessoal e encargos sociais, além de mudanças em outras rubricas.
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A estimativa para o déficit da Previdência teve um aumento de R$ 13,62 bilhões. O Planejamento revisou para baixo a projeção de arrecadação, em R$ 5,4 bilhões, ao mesmo tempo em que elevou a projeção de gastos com benefícios em R$ 8,1 bilhões. Com isso, o déficit total agora é previsto para R$ 296,85 bilhões. Em relação ao previsto na peça orçamentária, o aumento chega a R$ 25,67 bilhões.
No último relatório bimestral, o governo reverteu cerca R$ 3,8 bilhões de gastos contingenciados. Na ocasião, o total congelado no orçamento caiu de R$ 15 bilhões para R$ 13,3 bilhões, o que gerou críticas de especialistas em contas públicas. Eles apontam que o governo está contando com o chamado “empoçamento” de gastos do Orçamento, quando Ministérios não conseguem executar despesas até o término do ano.
O anúncio acontece em meio a expectativa para o pacote de cortes que o Ministério da Fazenda negocia com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tentar dar mais sustentabilidade às regras do arcabouço fiscal. O ministro Fernando Haddad afirmou que levará a Lula na segunda-feira, 25, pela manhã, a minuta das medidas que serão tomadas pelo governo, incluindo o acordo que foi feito com o Ministério da Defesa de mudanças na previdência dos militares.
Déficit ‘real’ de R$ 65,3 bi
O déficit primário total do ano contudo, está calculado em R$ 65,3 bilhões - uma melhora de R$ 3,5 bilhões em relação ao relatório do quatro bimestre. Nessa conta, entram despesas que foram legalmente excluídas da meta, mas que são consideradas para a contabilidade da dívida bruta do governo.
Entre as despesas fora do resultado estão despesas com a calamidade no Rio Grande do Sul, de R$ 33,64 bilhões, os incêndios florestais, pela emergência climática, de R$ 1,45 bilhão, além de crédito de R$ 1,34 bilhão em favor do Poder Judiciário, e perdas de arrecadação de R$ 124 milhões, também com o RS.
Receitas
Do lado da arrecadação, houve uma redução de R$ 2 bilhões na projeção de receitas primárias em 2024 em relação ao relatório anterior.
Um dos principais pontos revistos foi a redução de R$ 5,4 bilhões com contribuição previdenciária por causa da menor arrecadação. Também houve uma revisão de menos R$ 6,3 bilhões no item “outras receitas administradas”.
De acordo com o governo, a mudança se deve por causa da “realização da arrecadação em valores inferiores aos previstos no período de janeiro a outubro de 2024, especialmente em relação à recuperação de créditos tributários em litígio associados às transações resolutivas de litígios”.
Por outro lado, houve uma reestimativa em R$ 2,439 bilhões a mais com Imposto de Importação. O número melhor é explicado, em parte, pela mudança de patamar do câmbio - agora na casa de R$ 5,80 - e pelo valor em dólar das importação.
Outro destaque do relatório é ganho esperado melhor de 2,748 bilhões com IPI (Imposto sobre Produto Industrializado). Há ainda uma estimativa maior de R$ 4,5 bilhões com dividendos e participações.
O governo informou ainda que espera R$ 17 bilhões em receitas até o fim de 2024 com as medidas arrecadatórias aprovadas no Congresso no ano passado. Em setembro, o cálculo era de que seriam arrecadados ainda R$ 33,7 bilhões. A estimativa não detalha, no entanto, o quanto já foi arrecadado com cada medida nos meses anteriores.
O pacote arrecadatório que foi aprovado pelo Congresso no ano passado previa uma arrecadação de R$ 168,3 bilhões ao longo do ano para garantir o cumprimento da meta zero.
Veja abaixo o quanto o governo espera arrecadar até o final do ano com cada proposta:
- Subvenção de ICMS: R$ 4,702 bilhões
- Voto de qualidade do Carf: R$ 424 milhões
- Apostas online: R$ 132 milhões
- Compensações tributárias: R$ 4 bilhões
- Transações tributárias da Receita Federal: R$ 5 bilhões
- Transações tributárias da PGFN: R$ 2,749 bilhões
Qual a diferença entre bloqueio e contingenciamento?
No contingenciamento, o governo congela despesas quando há frustração de receitas, a fim de cumprir a meta fiscal (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida). Para este ano e para 2025, a meta é de zerar o déficit das contas públicas.
Como a meta tem uma banda (intervalo de tolerância) de 0,25 ponto porcentual do PIB para cima e para baixo, o governo cumpre a meta desde que não extrapole o piso da banda – ou seja, um déficit de R$ 28,8 bilhões (-0,25% do PIB).
Já o bloqueio é realizado para cumprir o limite de despesas do arcabouço fiscal. Assim, quando há aumento de gastos obrigatórios (como aposentarias, por exemplo), o governo bloqueia despesas não obrigatórias (como custeio e investimentos) para compensar.
Decisão do STF sobre emendas deve ‘ajudar’ governo a cumprir regras fiscais em 2024
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o pagamento de emendas parlamentares deve se transformar em ajuda extra para o cumprimento das regras fiscais neste ano, conforme o Estadão antecipou.
O processo no STF foi relatado pelo ministro Flávio Dino. Além de exigir transparência, o magistrado determinou que os recursos passem a respeitar as regras fiscais. O Congresso aprovou um projeto para liberar os repasses, em acordo com o governo, mas o presidente Lula ainda não sancionou a proposta. Só depois do STF deve tomar uma decisão.
As emendas que não forem pagas neste ano acabarão contribuindo para o fechamento das contas, pois deixarão de gerar pressão no resultado primário e no próprio equilíbrio do arcabouço fiscal, ficando “penduradas” e sendo transferidas para 2025. Por outro lado, vão concorrer com o espaço de despesas no próximo ano.
Dos R$ 49,2 bilhões em emendas previstas para 2024, aproximadamente R$ 25 bilhões estão travados em função da decisão do STF. Desse montante, 11,6 bilhões não foram nem empenhados, ou seja, ainda não passaram pela primeira fase de execução, que envolve análises técnicas e decisão política de liberação, procedimentos que também estão travados pelo Supremo.
Se as emendas não forem liberadas, todo o montante voltaria para o Poder Executivo e não seria executado. Mesmo que o STF destrave os repasses, não haveria tempo hábil para todas as transferências ainda em 2024, o que “ajudaria” no cumprimento da meta. O valor final do “alívio” dependerá de qual for a decisão do STF, de quando ela for tomada e também dos procedimentos que o governo adotará para liberar os recursos no final do ano./Colaboraram Fernanda Trisotto e Amanda Pupo