Gustavo Franco: Fazer ajuste com alta de imposto agrada ao lado petista do governo, mas não funciona


Para ex-presidente do Banco Central, divergências dentro do governo têm mantida a incerteza sobre os rumos da política fiscal, o que prejudica o trabalho do BC

Por Cícero Cotrim
Foto: FABIO MOTTA | ESTADAO CONTEUDO
Entrevista comGustavo FrancoEx-presidente do BC e sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos

PORTO ALEGRE - Divergências entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o núcleo petista mais duro do governo têm mantido a índole da política fiscal indefinida, o que aumenta a incerteza no cenário do Banco Central. E isso pode afetar o debate sobre a taxa neutra de juros (que não deprime nem estimula a atividade econômica) no segundo semestre, quando a autoridade monetária deve definir o nível da Selic no fim do ciclo de cortes. A avaliação é de Gustavo Franco, ex-presidente do BC, sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos e colunista do Estadão.

“Não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.” Franco conversou com o Estadão/Broadcast na semana passada, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS). Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Analistas do mercado têm expressado dúvidas sobre se o Banco Central vai poder cortar a taxa Selic tanto quanto se esperava, depois da mudança da comunicação do Copom. Qual é a sua avaliação?

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Como regra, eu não gosto de comentar decisões do Copom. A observação geral que eu teria a fazer é que o comitê está chegando a um momento em que, segundo o que está escrito, vai reduzir o ritmo de queda - não a partir da próxima reunião, mas da seguinte. E que o momento de parar de cair vai chegar. A pergunta é até que nível o Copom vai cortar os juros, uma pergunta que leva ao debate sobre qual é a taxa neutra. Esse debate está aberto e vai ocorrer provavelmente até o segundo semestre, de uma forma mais operacional. E o problema é que vai ocorrer mais ou menos na mesma hora em que estará em debate a sucessão de Roberto Campos Neto (presidente do BC), e um debate vai contaminar o outro.

Existe hoje uma preocupação sobre o nome que vai substituir Campos Neto?

Ainda não. Mas eu tenho a impressão de que, daqui a pouco, essa preocupação vai aparecer muito claramente.

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A postura fiscal do governo, com um arcabouço que permite o crescimento real dos gastos, diminui o espaço para a Selic cair até o nível neutro? Ou estamos falando de um aumento do nível neutro?

O Banco Central deve ter e de fato tem um olhar sobre a política fiscal que considera os compromissos do ministro (da Fazenda, Fernando) Haddad, inclusive formalizados no arcabouço fiscal. Mas considera também o ponto de vista do partido do governo, o Partido dos Trabalhadores, e do próprio presidente, que é bastante mais flexível nesse assunto. Portanto, não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.

Sede do Banco Central: para Franco, BC tem de trabalhar se vai prevaler uma política fiscal expansionista ou contracionista Foto: Dida Sampaio/Estadão
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O ajuste proposto pelo governo, apenas pelo lado da receita, tem dado resultado?

Eu acho que não. É cedo para dizer, até porque não teve nada muito contundente pelo lado da receita. E até pelo lado da receita a índole da política fiscal permanece muito indefinida, até pela diferença de opinião que existe sobre esse assunto dentro do governo. A ideia de fazer o ajuste pelo lado de aumento de impostos é boa no discurso, porque tem um sotaque progressista. Mas, na prática, é ruim. O mundo empresarial não gosta, já se paga muito imposto. E a ideia de que não tem nada para fazer na redução de despesas é errada. O governo abraçou essa ideia, e isso satisfaz um lado do governo, que é o lado petista, mas não funciona.

Parte do mercado tem mencionado a ideia de que as reformas dos últimos anos aumentaram o PIB potencial do Brasil. Esse é o diagnóstico correto?

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Acho que sim, as reformas que vêm sendo feitas de forma incremental ao longo dos anos têm um impacto sobre a nossa capacidade de crescer. Não é nada muito avassalador, nada muito espetacular, mas existe. Quisera tivéssemos feito reformas que fizessem o produto potencial crescer de verdade. Há anos que se tenta fazer esse tipo de reforma. É extraordinário e bom que o governo agora reconheça que as reformas elevam o PIB potencial. Então, por que não faz mais?

Nas últimas semanas, as preocupações com uma interferência do governo em empresas como Petrobras e Vale cresceram. Esse é um problema?

Claro que sim, é horrível. É claro que o governo é acionista dessas empresas, e tem políticas para seus representantes nessas empresas. Mas, para começar, não é o único interessado no bom funcionamento dessas empresas. Em muitos casos, é contraditória a ação do governo. E é contraditória a existência de uma empresa que precisa atender a um objetivo que tem a ver com o interesse público, mas também tem um objetivo que é ter o melhor resultado para o sócio minoritário, privado. É o caso da Petrobras. Aí, fica uma permanente tensão política sobre se a Petrobras vai trabalhar para o seu acionista privado ou para o governo, se vai subsidiar a gasolina ou não, em benefício de quem, e com que dinheiro. Esses problemas têm uma solução que começa com a letra ‘p’, e chama-se privatização.

PORTO ALEGRE - Divergências entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o núcleo petista mais duro do governo têm mantido a índole da política fiscal indefinida, o que aumenta a incerteza no cenário do Banco Central. E isso pode afetar o debate sobre a taxa neutra de juros (que não deprime nem estimula a atividade econômica) no segundo semestre, quando a autoridade monetária deve definir o nível da Selic no fim do ciclo de cortes. A avaliação é de Gustavo Franco, ex-presidente do BC, sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos e colunista do Estadão.

“Não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.” Franco conversou com o Estadão/Broadcast na semana passada, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS). Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Analistas do mercado têm expressado dúvidas sobre se o Banco Central vai poder cortar a taxa Selic tanto quanto se esperava, depois da mudança da comunicação do Copom. Qual é a sua avaliação?

Como regra, eu não gosto de comentar decisões do Copom. A observação geral que eu teria a fazer é que o comitê está chegando a um momento em que, segundo o que está escrito, vai reduzir o ritmo de queda - não a partir da próxima reunião, mas da seguinte. E que o momento de parar de cair vai chegar. A pergunta é até que nível o Copom vai cortar os juros, uma pergunta que leva ao debate sobre qual é a taxa neutra. Esse debate está aberto e vai ocorrer provavelmente até o segundo semestre, de uma forma mais operacional. E o problema é que vai ocorrer mais ou menos na mesma hora em que estará em debate a sucessão de Roberto Campos Neto (presidente do BC), e um debate vai contaminar o outro.

Existe hoje uma preocupação sobre o nome que vai substituir Campos Neto?

Ainda não. Mas eu tenho a impressão de que, daqui a pouco, essa preocupação vai aparecer muito claramente.

A postura fiscal do governo, com um arcabouço que permite o crescimento real dos gastos, diminui o espaço para a Selic cair até o nível neutro? Ou estamos falando de um aumento do nível neutro?

O Banco Central deve ter e de fato tem um olhar sobre a política fiscal que considera os compromissos do ministro (da Fazenda, Fernando) Haddad, inclusive formalizados no arcabouço fiscal. Mas considera também o ponto de vista do partido do governo, o Partido dos Trabalhadores, e do próprio presidente, que é bastante mais flexível nesse assunto. Portanto, não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.

Sede do Banco Central: para Franco, BC tem de trabalhar se vai prevaler uma política fiscal expansionista ou contracionista Foto: Dida Sampaio/Estadão

O ajuste proposto pelo governo, apenas pelo lado da receita, tem dado resultado?

Eu acho que não. É cedo para dizer, até porque não teve nada muito contundente pelo lado da receita. E até pelo lado da receita a índole da política fiscal permanece muito indefinida, até pela diferença de opinião que existe sobre esse assunto dentro do governo. A ideia de fazer o ajuste pelo lado de aumento de impostos é boa no discurso, porque tem um sotaque progressista. Mas, na prática, é ruim. O mundo empresarial não gosta, já se paga muito imposto. E a ideia de que não tem nada para fazer na redução de despesas é errada. O governo abraçou essa ideia, e isso satisfaz um lado do governo, que é o lado petista, mas não funciona.

Parte do mercado tem mencionado a ideia de que as reformas dos últimos anos aumentaram o PIB potencial do Brasil. Esse é o diagnóstico correto?

Acho que sim, as reformas que vêm sendo feitas de forma incremental ao longo dos anos têm um impacto sobre a nossa capacidade de crescer. Não é nada muito avassalador, nada muito espetacular, mas existe. Quisera tivéssemos feito reformas que fizessem o produto potencial crescer de verdade. Há anos que se tenta fazer esse tipo de reforma. É extraordinário e bom que o governo agora reconheça que as reformas elevam o PIB potencial. Então, por que não faz mais?

Nas últimas semanas, as preocupações com uma interferência do governo em empresas como Petrobras e Vale cresceram. Esse é um problema?

Claro que sim, é horrível. É claro que o governo é acionista dessas empresas, e tem políticas para seus representantes nessas empresas. Mas, para começar, não é o único interessado no bom funcionamento dessas empresas. Em muitos casos, é contraditória a ação do governo. E é contraditória a existência de uma empresa que precisa atender a um objetivo que tem a ver com o interesse público, mas também tem um objetivo que é ter o melhor resultado para o sócio minoritário, privado. É o caso da Petrobras. Aí, fica uma permanente tensão política sobre se a Petrobras vai trabalhar para o seu acionista privado ou para o governo, se vai subsidiar a gasolina ou não, em benefício de quem, e com que dinheiro. Esses problemas têm uma solução que começa com a letra ‘p’, e chama-se privatização.

PORTO ALEGRE - Divergências entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o núcleo petista mais duro do governo têm mantido a índole da política fiscal indefinida, o que aumenta a incerteza no cenário do Banco Central. E isso pode afetar o debate sobre a taxa neutra de juros (que não deprime nem estimula a atividade econômica) no segundo semestre, quando a autoridade monetária deve definir o nível da Selic no fim do ciclo de cortes. A avaliação é de Gustavo Franco, ex-presidente do BC, sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos e colunista do Estadão.

“Não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.” Franco conversou com o Estadão/Broadcast na semana passada, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS). Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Analistas do mercado têm expressado dúvidas sobre se o Banco Central vai poder cortar a taxa Selic tanto quanto se esperava, depois da mudança da comunicação do Copom. Qual é a sua avaliação?

Como regra, eu não gosto de comentar decisões do Copom. A observação geral que eu teria a fazer é que o comitê está chegando a um momento em que, segundo o que está escrito, vai reduzir o ritmo de queda - não a partir da próxima reunião, mas da seguinte. E que o momento de parar de cair vai chegar. A pergunta é até que nível o Copom vai cortar os juros, uma pergunta que leva ao debate sobre qual é a taxa neutra. Esse debate está aberto e vai ocorrer provavelmente até o segundo semestre, de uma forma mais operacional. E o problema é que vai ocorrer mais ou menos na mesma hora em que estará em debate a sucessão de Roberto Campos Neto (presidente do BC), e um debate vai contaminar o outro.

Existe hoje uma preocupação sobre o nome que vai substituir Campos Neto?

Ainda não. Mas eu tenho a impressão de que, daqui a pouco, essa preocupação vai aparecer muito claramente.

A postura fiscal do governo, com um arcabouço que permite o crescimento real dos gastos, diminui o espaço para a Selic cair até o nível neutro? Ou estamos falando de um aumento do nível neutro?

O Banco Central deve ter e de fato tem um olhar sobre a política fiscal que considera os compromissos do ministro (da Fazenda, Fernando) Haddad, inclusive formalizados no arcabouço fiscal. Mas considera também o ponto de vista do partido do governo, o Partido dos Trabalhadores, e do próprio presidente, que é bastante mais flexível nesse assunto. Portanto, não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.

Sede do Banco Central: para Franco, BC tem de trabalhar se vai prevaler uma política fiscal expansionista ou contracionista Foto: Dida Sampaio/Estadão

O ajuste proposto pelo governo, apenas pelo lado da receita, tem dado resultado?

Eu acho que não. É cedo para dizer, até porque não teve nada muito contundente pelo lado da receita. E até pelo lado da receita a índole da política fiscal permanece muito indefinida, até pela diferença de opinião que existe sobre esse assunto dentro do governo. A ideia de fazer o ajuste pelo lado de aumento de impostos é boa no discurso, porque tem um sotaque progressista. Mas, na prática, é ruim. O mundo empresarial não gosta, já se paga muito imposto. E a ideia de que não tem nada para fazer na redução de despesas é errada. O governo abraçou essa ideia, e isso satisfaz um lado do governo, que é o lado petista, mas não funciona.

Parte do mercado tem mencionado a ideia de que as reformas dos últimos anos aumentaram o PIB potencial do Brasil. Esse é o diagnóstico correto?

Acho que sim, as reformas que vêm sendo feitas de forma incremental ao longo dos anos têm um impacto sobre a nossa capacidade de crescer. Não é nada muito avassalador, nada muito espetacular, mas existe. Quisera tivéssemos feito reformas que fizessem o produto potencial crescer de verdade. Há anos que se tenta fazer esse tipo de reforma. É extraordinário e bom que o governo agora reconheça que as reformas elevam o PIB potencial. Então, por que não faz mais?

Nas últimas semanas, as preocupações com uma interferência do governo em empresas como Petrobras e Vale cresceram. Esse é um problema?

Claro que sim, é horrível. É claro que o governo é acionista dessas empresas, e tem políticas para seus representantes nessas empresas. Mas, para começar, não é o único interessado no bom funcionamento dessas empresas. Em muitos casos, é contraditória a ação do governo. E é contraditória a existência de uma empresa que precisa atender a um objetivo que tem a ver com o interesse público, mas também tem um objetivo que é ter o melhor resultado para o sócio minoritário, privado. É o caso da Petrobras. Aí, fica uma permanente tensão política sobre se a Petrobras vai trabalhar para o seu acionista privado ou para o governo, se vai subsidiar a gasolina ou não, em benefício de quem, e com que dinheiro. Esses problemas têm uma solução que começa com a letra ‘p’, e chama-se privatização.

PORTO ALEGRE - Divergências entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o núcleo petista mais duro do governo têm mantido a índole da política fiscal indefinida, o que aumenta a incerteza no cenário do Banco Central. E isso pode afetar o debate sobre a taxa neutra de juros (que não deprime nem estimula a atividade econômica) no segundo semestre, quando a autoridade monetária deve definir o nível da Selic no fim do ciclo de cortes. A avaliação é de Gustavo Franco, ex-presidente do BC, sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos e colunista do Estadão.

“Não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.” Franco conversou com o Estadão/Broadcast na semana passada, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS). Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Analistas do mercado têm expressado dúvidas sobre se o Banco Central vai poder cortar a taxa Selic tanto quanto se esperava, depois da mudança da comunicação do Copom. Qual é a sua avaliação?

Como regra, eu não gosto de comentar decisões do Copom. A observação geral que eu teria a fazer é que o comitê está chegando a um momento em que, segundo o que está escrito, vai reduzir o ritmo de queda - não a partir da próxima reunião, mas da seguinte. E que o momento de parar de cair vai chegar. A pergunta é até que nível o Copom vai cortar os juros, uma pergunta que leva ao debate sobre qual é a taxa neutra. Esse debate está aberto e vai ocorrer provavelmente até o segundo semestre, de uma forma mais operacional. E o problema é que vai ocorrer mais ou menos na mesma hora em que estará em debate a sucessão de Roberto Campos Neto (presidente do BC), e um debate vai contaminar o outro.

Existe hoje uma preocupação sobre o nome que vai substituir Campos Neto?

Ainda não. Mas eu tenho a impressão de que, daqui a pouco, essa preocupação vai aparecer muito claramente.

A postura fiscal do governo, com um arcabouço que permite o crescimento real dos gastos, diminui o espaço para a Selic cair até o nível neutro? Ou estamos falando de um aumento do nível neutro?

O Banco Central deve ter e de fato tem um olhar sobre a política fiscal que considera os compromissos do ministro (da Fazenda, Fernando) Haddad, inclusive formalizados no arcabouço fiscal. Mas considera também o ponto de vista do partido do governo, o Partido dos Trabalhadores, e do próprio presidente, que é bastante mais flexível nesse assunto. Portanto, não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.

Sede do Banco Central: para Franco, BC tem de trabalhar se vai prevaler uma política fiscal expansionista ou contracionista Foto: Dida Sampaio/Estadão

O ajuste proposto pelo governo, apenas pelo lado da receita, tem dado resultado?

Eu acho que não. É cedo para dizer, até porque não teve nada muito contundente pelo lado da receita. E até pelo lado da receita a índole da política fiscal permanece muito indefinida, até pela diferença de opinião que existe sobre esse assunto dentro do governo. A ideia de fazer o ajuste pelo lado de aumento de impostos é boa no discurso, porque tem um sotaque progressista. Mas, na prática, é ruim. O mundo empresarial não gosta, já se paga muito imposto. E a ideia de que não tem nada para fazer na redução de despesas é errada. O governo abraçou essa ideia, e isso satisfaz um lado do governo, que é o lado petista, mas não funciona.

Parte do mercado tem mencionado a ideia de que as reformas dos últimos anos aumentaram o PIB potencial do Brasil. Esse é o diagnóstico correto?

Acho que sim, as reformas que vêm sendo feitas de forma incremental ao longo dos anos têm um impacto sobre a nossa capacidade de crescer. Não é nada muito avassalador, nada muito espetacular, mas existe. Quisera tivéssemos feito reformas que fizessem o produto potencial crescer de verdade. Há anos que se tenta fazer esse tipo de reforma. É extraordinário e bom que o governo agora reconheça que as reformas elevam o PIB potencial. Então, por que não faz mais?

Nas últimas semanas, as preocupações com uma interferência do governo em empresas como Petrobras e Vale cresceram. Esse é um problema?

Claro que sim, é horrível. É claro que o governo é acionista dessas empresas, e tem políticas para seus representantes nessas empresas. Mas, para começar, não é o único interessado no bom funcionamento dessas empresas. Em muitos casos, é contraditória a ação do governo. E é contraditória a existência de uma empresa que precisa atender a um objetivo que tem a ver com o interesse público, mas também tem um objetivo que é ter o melhor resultado para o sócio minoritário, privado. É o caso da Petrobras. Aí, fica uma permanente tensão política sobre se a Petrobras vai trabalhar para o seu acionista privado ou para o governo, se vai subsidiar a gasolina ou não, em benefício de quem, e com que dinheiro. Esses problemas têm uma solução que começa com a letra ‘p’, e chama-se privatização.

PORTO ALEGRE - Divergências entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o núcleo petista mais duro do governo têm mantido a índole da política fiscal indefinida, o que aumenta a incerteza no cenário do Banco Central. E isso pode afetar o debate sobre a taxa neutra de juros (que não deprime nem estimula a atividade econômica) no segundo semestre, quando a autoridade monetária deve definir o nível da Selic no fim do ciclo de cortes. A avaliação é de Gustavo Franco, ex-presidente do BC, sócio-fundador da Rio Bravo Investimentos e colunista do Estadão.

“Não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.” Franco conversou com o Estadão/Broadcast na semana passada, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre (RS). Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Analistas do mercado têm expressado dúvidas sobre se o Banco Central vai poder cortar a taxa Selic tanto quanto se esperava, depois da mudança da comunicação do Copom. Qual é a sua avaliação?

Como regra, eu não gosto de comentar decisões do Copom. A observação geral que eu teria a fazer é que o comitê está chegando a um momento em que, segundo o que está escrito, vai reduzir o ritmo de queda - não a partir da próxima reunião, mas da seguinte. E que o momento de parar de cair vai chegar. A pergunta é até que nível o Copom vai cortar os juros, uma pergunta que leva ao debate sobre qual é a taxa neutra. Esse debate está aberto e vai ocorrer provavelmente até o segundo semestre, de uma forma mais operacional. E o problema é que vai ocorrer mais ou menos na mesma hora em que estará em debate a sucessão de Roberto Campos Neto (presidente do BC), e um debate vai contaminar o outro.

Existe hoje uma preocupação sobre o nome que vai substituir Campos Neto?

Ainda não. Mas eu tenho a impressão de que, daqui a pouco, essa preocupação vai aparecer muito claramente.

A postura fiscal do governo, com um arcabouço que permite o crescimento real dos gastos, diminui o espaço para a Selic cair até o nível neutro? Ou estamos falando de um aumento do nível neutro?

O Banco Central deve ter e de fato tem um olhar sobre a política fiscal que considera os compromissos do ministro (da Fazenda, Fernando) Haddad, inclusive formalizados no arcabouço fiscal. Mas considera também o ponto de vista do partido do governo, o Partido dos Trabalhadores, e do próprio presidente, que é bastante mais flexível nesse assunto. Portanto, não é garantido que o que vai prevalecer como política fiscal seja estritamente o que o ministro Haddad definiu no arcabouço. Sabemos que a política fiscal é o resultado de influências que são contraditórias, uma para contrair, e outra para expandir. O resultado final só vamos ver no final do exercício, e o Banco Central tem de trabalhar com essa dúvida.

Sede do Banco Central: para Franco, BC tem de trabalhar se vai prevaler uma política fiscal expansionista ou contracionista Foto: Dida Sampaio/Estadão

O ajuste proposto pelo governo, apenas pelo lado da receita, tem dado resultado?

Eu acho que não. É cedo para dizer, até porque não teve nada muito contundente pelo lado da receita. E até pelo lado da receita a índole da política fiscal permanece muito indefinida, até pela diferença de opinião que existe sobre esse assunto dentro do governo. A ideia de fazer o ajuste pelo lado de aumento de impostos é boa no discurso, porque tem um sotaque progressista. Mas, na prática, é ruim. O mundo empresarial não gosta, já se paga muito imposto. E a ideia de que não tem nada para fazer na redução de despesas é errada. O governo abraçou essa ideia, e isso satisfaz um lado do governo, que é o lado petista, mas não funciona.

Parte do mercado tem mencionado a ideia de que as reformas dos últimos anos aumentaram o PIB potencial do Brasil. Esse é o diagnóstico correto?

Acho que sim, as reformas que vêm sendo feitas de forma incremental ao longo dos anos têm um impacto sobre a nossa capacidade de crescer. Não é nada muito avassalador, nada muito espetacular, mas existe. Quisera tivéssemos feito reformas que fizessem o produto potencial crescer de verdade. Há anos que se tenta fazer esse tipo de reforma. É extraordinário e bom que o governo agora reconheça que as reformas elevam o PIB potencial. Então, por que não faz mais?

Nas últimas semanas, as preocupações com uma interferência do governo em empresas como Petrobras e Vale cresceram. Esse é um problema?

Claro que sim, é horrível. É claro que o governo é acionista dessas empresas, e tem políticas para seus representantes nessas empresas. Mas, para começar, não é o único interessado no bom funcionamento dessas empresas. Em muitos casos, é contraditória a ação do governo. E é contraditória a existência de uma empresa que precisa atender a um objetivo que tem a ver com o interesse público, mas também tem um objetivo que é ter o melhor resultado para o sócio minoritário, privado. É o caso da Petrobras. Aí, fica uma permanente tensão política sobre se a Petrobras vai trabalhar para o seu acionista privado ou para o governo, se vai subsidiar a gasolina ou não, em benefício de quem, e com que dinheiro. Esses problemas têm uma solução que começa com a letra ‘p’, e chama-se privatização.

Entrevista por Cícero Cotrim

Cícero Cotrim é repórter do Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado.

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