A COP-27, Cúpula do Clima das Nações Unidas realizada no Egito entre os dias 6 e 18 de novembro, mais uma vez chamou a atenção do mundo para o urgente tema da crise climática na qual estamos todos mergulhados. Representantes de mais de 190 países — incluindo cerca de 90 chefes de estado — participaram das discussões em meio a um ambiente de tensões locais (com críticas ao regime autocrático do presidente egípcio Abdel Fatah al-Sissi) e globais, considerando-se as consequências da invasão russa na Ucrânia e uma crise inflacionária global que impactou os preços da energia.
Já falamos aqui do paradoxo da tecnologia: a aceleração da crise climática está diretamente ligada ao estilo de vida da sociedade pós-Revolução Industrial, e negócios ao redor do mundo estão buscando mensurar e remediar sua contribuição para o aquecimento global. E um dos aspectos mais relevantes para reversão do efeito estufa envolve, como era de se esperar, a própria tecnologia — em particular, uma área conhecida como clean tech.
A Clean Edge, empresa de pesquisa de tecnologia limpa, descreve a tecnologia limpa como “uma gama diversificada de produtos, serviços e processos que aproveitam materiais e fontes de energia renováveis, reduzem drasticamente o uso de recursos naturais e reduzem ou eliminam emissões e resíduos”. A Clean Edge observa ainda que “as tecnologias limpas são competitivas, se não superiores, às suas contrapartes convencionais. Muitas também oferecem benefícios adicionais significativos, notadamente sua capacidade de melhorar a vida das pessoas em países desenvolvidos e em desenvolvimento”.
Embora a relevância do tema não possa ser questionada, é importante adotar uma análise crítica sobre cada uma das múltiplas soluções em diferentes estágios de desenvolvimento e aplicação. Conforme apontado por Vaclav Smil, professor emérito na Faculdade de Meio Ambiente da Universidade de Manitoba em Winnipeg, Canadá, “por muito tempo – até que todas as energias usadas para produzir turbinas eólicas e células fotovoltaicas venham de fontes de energia renováveis – a civilização moderna permanecerá fundamentalmente dependente de combustíveis fósseis.” Em outras palavras, algumas das tecnologias limpas mais maduras em operação atualmente ainda possuem relevante dependência dos combustíveis fósseis para sua manufatura.
De qualquer modo, conforme discutimos aqui, algumas tecnologias limpas já encontram-se amplamente dentro dos limites de viabilidade econômica: em 2019, o custo nivelado do megawatt/hora nuclear estava em US $155, do carvão em US $109, da eólica em US $41 e da geração de eletricidade através de células fotovoltaicas era de US $40. As cleantechs menos maduras continuam expandido suas áreas de atuação, experimentando um momento de amplo interesse por parte de investidores públicos e privados. Inovações como painéis de vidro solares, que podem ser utilizados em janelas enquanto também capturam a energia do sol convertendo-a em eletricidade, vem sendo desenvolvidos na Michigan State University desde 2017 — mesmo ano em que entrou em operação, na Suíça, a primeira usina que captura gás carbônico diretamente da atmosfera.
As startups de cleantech estão tratando de temas diversos e de interesse global: purificação e filtragem da água, biocombustíveis, transporte pessoal, grids elétricos inteligentes, células de combustível portáteis, técnicas modernas de coleta de lixo e reciclagem, desenvolvimento de novos materiais, embalagens biodegradáveis, captura e transformação de carbono, fazendas hidropônicas que utilizam resíduos produzidos por peixes como fertilizantes, reaproveitamento de resíduos alimentares, agricultura de precisão e proteínas alternativas são apenas alguns exemplos.
De acordo com a empresa de consultoria, pesquisa e eventos Cleantech Group, fundada em 2002 em São Francisco, Califórnia, os investimentos de venture capital em cleantech saltaram de cerca de US$ 10 bilhões em 2010 para US$ 70 bilhões em 2020 — com amplas perspectivas de crescimento. Este crescimento pode ser explicado pela urgência do tema, aliada aos ganhos potenciais de soluções economicamente viáveis e do interesse de empresas ao redor do mundo em reduzirem suas contribuições para o aquecimento global.
Mas não é apenas o setor de cleantech que está atraindo investimentos em níveis recorde — a Renascença da Inteligência Artificial parece estar atingindo um novo patamar de adaptação e popularização. Este será nosso tema para próxima coluna — já em 2023. Até lá, e receba meus votos de um feliz ano novo, repleto de saúde e paz. / FUNDADOR DA GRIDS CAPITAL E AUTOR DO LIVRO “FUTURO PRESENTE - O MUNDO MOVIDO À TECNOLOGIA”, VENCEDOR DO PRÊMIO JABUTI 2020 NA CATEGORIA CIÊNCIAS. É ENGENHEIRO DE COMPUTAÇÃO E MESTRE EM INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL PELA PUC-RIO