BRASÍLIA - Apesar da expectativa de que o projeto de lei que prevê o fim gradual do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) seja votado na semana que vem, o impasse entre o Ministério da Fazenda e a Câmara se mantém. O ministro Fernando Haddad, segundo apurou o Estadão/Broadcast, insiste em manter o teto de faturamento para acesso ao benefício em R$ 78 milhões, o que deixa de fora as empresas tributadas com base no lucro real, mas os deputados querem rever esse critério.
De acordo com parlamentares ouvidos pela reportagem, o chefe da equipe econômica está mais aberto a negociar outros pontos do projeto, como o número de atividades beneficiadas e o ritmo de redução dos incentivos tributários.
A relatora da proposta, a deputada Renata Abreu (Podemos-SP), disse nesta quarta-feira, 10, em coletiva de imprensa, que o limite de faturamento está em debate com os setores. “Essa é a grande discussão, porque o que foi excluído foram as empresas de lucro real. E é importante compreender que também são hoje as empresas de lucro real as que mais estão empregando”, declarou.
Deputados que acompanham o assunto avaliam que retirar as empresas do lucro simplesmente acaba com o programa, porque elas são as mais importantes do Perse. Parlamentares afirmam que Haddad não abre mão desse ponto justamente porque a intenção da Fazenda é reduzir ao máximo os benefícios ao setor de eventos.
Lucro real é um regime de tributação que considera a lucratividade da companhia (receitas menos despesas) em determinado período para calcular o pagamento de impostos. Todas as empresas que têm receita bruta acima de R$ 78 milhões são obrigatoriamente enquadradas nesse regime. Companhias que faturam menos podem optar pelo lucro presumido ou pelo Simples Nacional a depender de determinados critérios.
Em Medida Provisória (MP) editada no fim do ano, o governo determinou o fim do Perse, criado durante a pandemia de covid-19 para socorrer empresas em dificuldade financeira, assim como do regime especial de previdência para os municípios e da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia. Diante da resistência de deputados e empresários, contudo, Haddad decidiu negociar um projeto de lei com propostas intermediárias.
Renata Abreu afirmou, na coletiva de quarta-feira, que a ideia é manter o valor de R$ 5 bilhões por ano de impacto fiscal dos benefícios do Perse, o que sugere mudanças no projeto protocolado pelo líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE). O texto original prevê um “faseamento” do programa, com redução constante dos incentivos até 2026, com objetivo de que a extinção ocorra em 2027.
Para manter até 2026 um valor fechado de R$ 5 bilhões por ano de custo do programa, contudo, seria preciso mudar a escala de diminuição dos benefícios. Pelo texto atual, o desconto nas alíquotas de PIS, Cofins e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), hoje em 100% para os beneficiários do programa, cairia a 45% este ano, a 40% em 2025 e a 25% em 2026. No caso do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), o benefício continuaria integral em 2024, mas passaria para 40% ano que vem e a 25% em 2026.
Renata Abreu também sinalizou que pode haver mudanças nos critérios para a redução dos benefícios, medida que Haddad, segundo deputados, está disposto a negociar. “Você pode criar uma regra de faseamento (escalonamento) desde que seja mantido os R$ 5 bilhões por ano. Esse faseamento vai atingir todas as empresas? Vai ter algum tipo de critério para que entre ou não no faseamento? São discussões que a gente está fazendo internamente”, disse a relatora, na coletiva.
Outra possível mudança com a qual Haddad estaria mais aberto é no número de setores da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAEs) que farão parte do Perse daqui para frente. O projeto original incluía 44 setores, mas depois houve uma redução para 30. No projeto de Guimarães, o número caiu para 12. Mas a relatora afirmou que é preciso entender melhor os critérios de inclusão e exclusão de CNAES.
Na entrevista a jornalistas nesta semana, Renata Abreu defendeu a importância do Perse. “É muito importante que a gente entenda que só de receita que o programa arrecadou nas transações tributárias foi mais de R$ 20 bilhões. Foi o setor que mais gerou empregos no Brasil”, disse.
“Não se pode acabar com um programa inteiro, que visava justamente salvar as empresas que no momento da pandemia fecharam por completo, não podemos por justificativa de erro na fiscalização ou na operacionalização do Perse, prejudicar toda a sociedade civil que contribuiu para a aprovação do projeto”, emendou, em referência às suspeitas de irregularidade no programa.
Guimarães propôs no projeto uma autorregularização para empresas que usaram os benefícios do Perse de forma inadequada, mas, segundo deputados, Haddad não acredita que a arrecadação com essa medida será alta. Essas companhias não precisarão pagar multa se confessarem a irregularidade, mas terão de pagar os tributos devidos, de forma integral e parcelada, com juros. O prazo para aderir a esse programa é de 90 dias a partir da publicação da lei.