As repórteres Adriana Fernandes e Anna Carolina Papp mostraram, aqui no Estadão, que o próximo governo deve começar 2023 com R$ 178 bilhões a menos no caixa, devido às medidas eleitoreiras tomadas pela atual gestão. Se somarmos um reajuste aos servidores públicos e as perdas dos Estados com a limitação do ICMS sobre combustíveis e energia, a conta vai a R$ 306 bilhões. É um buraco de grandes proporções.
Contudo, situações-limite como essa criam condições – quando não forçam – para mudanças estruturais por anos adiadas. A reforma da Previdência só foi aprovada em 2019 devido ao estabelecimento do teto de gastos três anos antes: o governo foi obrigado a buscar recursos dentro dos limites do Orçamento. O mesmo pode acontecer em 2023, pois o governo precisará desesperadamente encontrar dinheiro.
Pode ser a oportunidade para fazer uma ampla reforma administrativa. O Brasil precisa reduzir os custos de uma máquina pública inchada. A resistência será enorme. Eu sei, porque enfrentei isso na reforma da Previdência. Tive inúmeras reuniões no Congresso para tratar do assunto, algumas duraram até sete horas. É preciso diálogo, paciência, determinação e firmeza. Se não fosse o teto de gastos e esse trabalho em 2016 e 2017, a reforma da Previdência não teria saído em 2019. Mas os resultados virão rápido. Sei disso porque aprovamos uma dura reforma administrativa em São Paulo durante minha gestão na Secretaria da Fazenda. Resultado: o Estado começou 2022 com R$ 69 bilhões em caixa.
A situação econômica difícil, com baixo crescimento e perspectivas negativas, é propícia para a reforma tributária. Uma das saídas está no Congresso, na forma do substitutivo à PEC 45, encaminhado pelos Estados. O projeto é neutro em arrecadação e acaba com a complexidade tributária – o maior problema do Brasil na área –, o que melhora substancialmente o ambiente de negócios e facilita a atração de investimentos. A reforma tributária sempre pareceu impossível. Mas um quadro fiscal hostil nos dá a oportunidade de fazê-la.
Por fim, as reformas dependem do respeito ao teto de gastos. Os dribles aplicados no teto nos últimos dois anos desmoralizaram a política fiscal, e seu preço aparece no risco-país. Em 2023, em um mundo em recessão, o Brasil terá de mostrar compromisso com uma política fiscal séria para afastar temores de alta na dívida pública e recuperar a confiança perdida. As crises evidenciam fragilidades e cobram caro, mas podem disparar mudanças capazes de superar impasses históricos e proporcionar um salto para o futuro.