O Banco Central conviverá, nos próximos meses, com expectativas diferentes do habitual. O mercado não olhará apenas suas decisões sobre a taxa de juros, mas também como votaram seus diretores, além de especular em torno de quem será o próximo presidente, na primeira sucessão sob a autonomia operacional, estabelecida por lei em 2021. Não são questões triviais.
Desde a última reunião, quando houve uma divisão de 5 a 4, ficou a imagem de um Copom dividido entre os diretores indicados pelo governo anterior (5), que votaram por um corte de 0,25 ponto porcentual, e os indicados pelo atual (4), que votaram por um corte de 0,5 ponto. Isso acontece porque, como haverá troca no comando, o mercado teme que a próxima gestão venha a ser menos rígida no combate à inflação.
As expectativas do mercado são importantes porque influenciam as expectativas de inflação, que por sua vez influenciam a formação de preços. Quando aceitei o convite para presidir o Banco Central, em 2002, havia certa preocupação no mercado com o novo governo. Muitos acreditavam que o BC no primeiro governo do PT seria leniente com a inflação e, por isso, menos rígido com a taxa de juros.
Combinei com o presidente Lula que atuaria com independência, apesar de não haver ainda a lei da autonomia. Devido à nossa atuação na ocasião, em poucos meses o mercado entendeu que o BC seria rígido no combate à inflação e as expectativas se alinharam.
A constituição da diretoria foi baseada exclusivamente na competência. O Copom não precisa – nem deve – ter pessoas com as mesmas opiniões; precisa ser capaz de decidir de forma exclusivamente técnica para transmitir confiança ao País.
Procurei estabelecer um rito de votação em que a minha opinião como presidente não influenciasse a dos outros.
Nem sempre os diretores vão pensar igual, mesmo diante dos mesmos dados. O que a autoridade monetária precisa é ter credibilidade suficiente para que os agentes econômicos não tenham dúvidas de que está comprometida exclusivamente com o combate à inflação. Quando é assim, as divergências geram menos ruído.
Devido a críticas do presidente da República ao do Banco Central, e a certo falatório político, o mercado teme que a próxima diretoria seja menos rígida com a inflação. Pressão sobre o Banco Central sempre existirá. A única forma de resolver isso é decidir de forma exclusivamente técnica, com base nos dados que permitem enxergar o estado da economia e qual a melhor taxa de juros para trazer a inflação à meta e ancorar as expectativas. Deste modo, a sucessão poderá ser suave.